5 CONCLUSÃO
O contrato de corretagem é disciplinado pelo Código Civil, nos artigos 722 e seguintes. Referido contrato pretende a aproximação de partes distintas para a realização de um negócio.
A contratação da corretagem se dá pela parte interessada em realizar o negócio (o ofertante, ou o possível comprador). O corretor não é um profissional imparcial. O fato do artigo 723 do Código Civil, com redação da Lei 12.236/2010, afirmar que o corretor é responsável pela mediação, não o torna imparcial em relação às partes.
O corretor não se equipara ao mediador. O corretor tem interesse comum com a parte que o contratou.
É verdade que a Lei nº 12.236/2010 alterou os dispositivos do Código Civil sobre o contrato de corretagem. Houve a inclusão da obrigação do corretor prestar informações sobre o andamento do negócio e outros dados relevantes sobre o contrato.
Apesar desse acréscimo nas funções do corretor, não há que se falar em imparcialidade. As alterações tratam de aspecto acessório do contrato. Não houve mudança na essência do contrato, que continua ligando corretor e contratante por um interesse comum.
Ademais, mesmo antes da Lei 12.236/2010, havia o dever de boa-fé e a necessidade de prestação de informações verídicas pelos envolvidos na negociação, dentre eles, o corretor.
Verifica-se, portanto, que todos os deveres inseridos pela Lei 12.236/2010 já estavam presentes no Código Civil, não sendo propriamente correto falar em inovação da ordem jurídica.
Segundo a legislação de regência, consumidor é a pessoa física ou jurídica que adquire produto ou serviço para benefício próprio ou de outrem, na qualidade de consumidor final. Isto é, sem a finalidade de revenda.
Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica que, com habitualidade, fornece bens e serviços no mercado de consumo. Note-se que o traço mais relevante na conceituação de fornecedor é a habitualidade.
O Código de Defesa do Consumidor toma como premissa para conceituação de consumidor e fornecedor a hipossuficiência econômica ou técnica.
Diante dos conceitos legais, é de rigor afirmar que a relação entre construtora e adquirente final de unidade imobiliária é regida pelo Código de Defesa do Consumidor.
No caso em análise, não há que se falar em qualquer intermediação (corretagem) prestada ao consumidor. É o consumidor que, espontaneamente, se apresenta para realizar a compra. Portanto, não há prestação de serviço de corretagem nos termos do art. 722 e seguintes do Código Civil. E, mesmo se houvesse qualquer intermediação, jamais seria em favor do consumidor.
Logo, se não há prestação de serviços, é evidente que o consumidor não pode ser compelido ao pagamento de qualquer comissão.
A existência de cláusula contratual afirmando que a compra e venda é feita por intermédio de corretores e que o consumidor contratou os respectivos serviços, não legitima a cobrança de comissão.
Não se pode falar em livre contratação do serviço de corretagem pelo consumidor. Ao consumidor só é permitido adquirir o imóvel se fizer a aquisição formal do serviço de corretagem. Afinal, a obrigação da contratação consta de cláusula inserida unilateralmente pelo fornecedor em contrato de adesão. Assim, sendo prática abusiva (venda casada), a existência de cláusula contratual não legitima a cobrança de comissão de corretagem.
O dogma do liberalismo do Século XIX, pacta sunt servanda, não se aplica no caso em comento, regido pelo Código de Defesa do Consumidor. Não se pode falar em liberdade de contratação e partes igualitárias no contrato.
Caso tenha sido realizado o pagamento pelo consumidor, há o direito à repetição dos valores a título de comissão de corretagem. Segundo o artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor, a referida repetição deve ser feita em dobro, acrescida de juros e correção monetária.
Contudo, esse não é o entendimento que prevalece no Tribunal de Justiça de São Paulo. O referido tribunal afirma que, diante da ausência de má-fé das construtoras, não se pode impor a obrigação de devolução em dobro, sendo de rigor a devolução simples dos valores.
Não concordamos com essa posição do Tribunal de Justiça de São Paulo, na medida em que, frente ao artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor, não é necessária má-fé para determinar a repetição em dobro.
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Notas
[1] DINIZ, Maria Helena. Direito Civil Brasileiro. 3º Volume. 21ª. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 440/442.
[2] LOUREIRO, Luiz Guilherme. Curso Completo de Direito Civil. 3ª. ed. São Paulo: Método, 2010. p. 572/573.
[3] FILOMENO, José Geraldo Brito. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado. 6ª. ed. São Paulo: Forense Universitária, 1999. p. 40/46.
[4] NUNES, Luis Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 90/91.
[5] TJ-SP. Apelação nº 0016596-91.2012.8.26.0114. 3ª Câmara de Direito Privado. Julgado em 26/11/2013.
[6] BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcellos. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado. 6ª. ed. São Paulo: Forense Universitária, 1999. p. 312/313.
[7] NUNES, Luis Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 482/483.
[8] TJ-SP. Apelação nº 0113205-18.2011.8.26.0100. 10ª Câmara de Direito Privado. Julgado em 26/11/2013.
[9] TJ-SP. Apelação nº 0015720-74.2013.8.26.0576. 7ª Câmara de Direito Privado. Julgado em 02/09/2014.
[10] JUNIOR, Nelson Nery. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado. 6ª. ed. São Paulo: Forense Universitária, 1999. p. 433/434.
[11] TJ-SP. Apelação nº 9166422-65.2007.8.26.0000. 9ª Câmara de Direito Privado. Julgado em 30/08/2011.
[12] NUNES, Luis Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 510/512.
[13] TJ-SP. Apelação nº 0015720-74.2013.8.26.0576. 7ª Câmara de Direito Privado. Julgado em 02/09/2014.