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Propriedade de informações e dados postados em ambiente virtual, limites e extensões

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17/01/2016 às 14:03
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4. O Direito Autoral e a Desobediência Civil Eletrônica

O (CAE), Coletivo Critical Art Ensemble, introduziu por volta de 1994 a idéia hackativista de desobediência civil eletrônica (electronic civil disobedience), como uma forma alternativa de resistência cultural. É daí que parte a crítica do coletivo, em seu livro Distúrbio Eletrônico (2001). Para o CAE, a revolução das tecnologias trouxe uma nova geografia às relações de poder no Primeiro Mundo. A estado virtual promoveu uma nova sede do poder, baseada numa zona nômade, sem fronteiras. A passagem de um espaço fixo para redes eletrônicas criou um novo tipo de poder nômade.

Os sistemas de proteção do ciberespaço, seja técnico ou jurídico, estão sendo progressivamente desenvolvidos, tanto por governos quanto por empresas privadas.  Contudo, esses sistemas não adquiriram um pleno grau de segurança.  O ciberespaço se amplia e se transforma forma tão dinâmica que as forças de segurança não conseguem acompanhá-lo com tanta eficácia e na mesma velocidade. Para o CAE, ainda é possível se oferecer resistência nesse espaço, mas não se trata de uma garantia eterna.

Dessa maneira, podemos pensar que a transferência do poder para o ciberespaço pressupõe também a transferência da resistência ao poder para esse mesmo espaço. Assim, “Da mesma forma como a autoridade localizada nas ruas era combatida por meio de manifestações e barricadas, a autoridade que se localiza no campo eletrônico deve ser combatida através da resistência eletrônica”.[30] Nesse sentido, a ausência dessa perspectiva enfraquece os movimentos sociais, tornando-os anacrônicos. O poder da elite hoje não pode mais ser destruído por estratégias criadas para a contestação de um poder sedentário.

No Brasil, o coletivo Sabotagem é uma célula anarquista que oferece resistência às leis de direito autoral por meio da desobediência civil eletrônica. Existente desde 2004, o grupo começou sua ação direta disponibilizando livros protegidos pelos direitos autorais, de domínio público ou sob licenças livres, digitalizados e disponíveis em sua  página. Em períodos mais recentemente, ele vêm postando, além de livros, vídeos,  textos e softwares relacionados à digitalização e ao acesso ao conteúdo digital na Rede. São, ao todo, 263 livros de várias matérias, como: literatura, filosofia, sociologia, história, geografia, antropologia, ciência política, poesia etc

Em seu primeiro manifesto no dia 12 de Agosto de 2004 no site intitulado “O Movimento somos Nós”, o coletivo se afirma como parte de um movimento contestatório múltiplo e descentralizado, que tem como território o ciberespaço - além de declarar o alvo de suas ações: a indústria de livros e sua respectiva  gerência, que  impossibilitam  o  livre  acesso  de  obras  importantes  para  a compreensão da sociedade atual.

4.1. A Desobediência Civil e as redes P2P

Devido a diversos aspectos sociais difusos, desde a desigualdade de recursos até mesmo as questões ideológicas, a desobediência civil na Internet configurada pela Lei de Direitos Autorais, já citada neste trabalho, é cada vez mais comum e vem ganhando adeptos em grande escala. Entretanto, verifica-se que existem alguns tipos organizados dentro desse fenômeno da desobediência civil, grupos que criticam o sistema do direito autoral e que propõem uma ação política direta. Pode-se citar como exemplo o “Coletivo Sabotagem”, cujas práticas são parecidas com as de células anarquistas e contam com a interatividade dos usuários de um website organizado, para publicar materiais protegidos pelo Direito Autoral, entretanto, no que tange à popularidade, seu reconhecimento é pequeno.

Nessa linha também é possível citar o “Coletivo Wu Ming”, que se trata de um grupo pequeno e com pouca visibilidade aos olhos da grande massa de internautas. Se individualiza em relação a outros grupos pelo fato de ser um grupo extremamente fechado e as suas ações não dependem da interação com os usuários da rede. Apenas publicam materiais na rede que eles mesmo produzem e têm um foco de atuação delimitado, que é o da indústria cultural, criticando o direito autoral e o todo o sistema mercadológico envolvido.

Por fim, é importante citar o grupo mais conhecido de atuação em prol da liberdade da rede, o coletivo sueco “The Pirate Bay”[31] (TPB) possui uma grande legitimidade frente aos usuários da Internet que praticam o compartilhamento de arquivos e tem uma atuação política de alcance internacional. Resumidamente, pode-se dizer que se trata do grupo (dentre os citados anteriormente) de maior adeptos na esfera do compartilhamento de arquivos na internet. O TPB vincula a prática da desobediência civil a uma atuação política, que conta com diversos dos usuários da Rede (ainda que o aqueles que apenas usam a estrutura do TPB para adquirir produtos de forma gratuita) e que, pela preocupação de se organizarem representativamente, representam uma ameaça a determinadas formas de uso atuais do direito autoral. 

Desde 2003, ano em que a organização anticopyright sueca “Piratbyran” criou o TPB, este se auto intitula como o maior Bit Torrent (serviço de compartilhamento P2) do mundo. Por seu meio, arquivos são baixados diretamente dos computadores dos usuários, e trackers (servidores) indexam os endereços dos computadores conectados em um arquivo de extensão torrent. Assim, da mesma forma como nas redes P2P, os servidores de torrent não fazem a distribuição aleatória de arquivos compartilhados, mas sim indexam o endereço de todos os computadores conectados em rede que detenham um determinado arquivo de interesse. Inicialmente o referido sistema foi criado apenas para servir como referência de compartilhamento de distribuições Gnu/Linux59, é hoje mostra-se um dos meios mais eficazes para se compartilhar músicas, vídeos, fotografias, gifs, filmes, seriados, softwares etc.

Ainda que não tenha alcançado seu principal objetivo dentro da política, o PP conquistou alguns avanços sobre as discussões de direito autoral na Suécia. Influenciados pelo PP, o Partido Verde Sueco foi o incluiu a legalização do compartilhamento pessoal de arquivos em seus princípios, bem como o Partido Moderado e, posteriormente o Partido de Esquerda Sueco. Devido a percepção de grande representabilidade ao tocar na questão do livre acesso e compartilhamento de bens plena internet, tais partidos políticos dispostos a revisar as leis de direito autoral suecas para permitir o compartilhamento doméstico, alegando que não podem perseguir toda uma geração de jovens e que a rigidez das leis era endereçada à pirataria comercial e não direcionada especificamente à criminalização dos casos de cópias privada.


5. Economia e a gratuidade de acesso a bens pela Internet

As novas tecnologias de informação abriram um precedente para se reestruturar flexibilização do direito autoral (por parte dos usuários e das doutrinas do direito) que, ao ritmo das evoluções sociais e tecnológicas deixou de pertencer exclusivamente a órgãos controladores da produção e distribuição. Leis autorais vindas de baixo puderam ser reformuladas, como criações licenças que protegessem uma nova forma de produção e distribuição de produtos imateriais. A criação e popularização das tecnologias digitais, em descompasso de ritmo coma lei, caracterizou o usuário comum no que se chama de “desobediência civil”, o que evidenciou a ilegitimidade da disputa das atuais leis de direito autoral contra a distribuição dos produtos culturais na Internet.

Uma outra característica da prática de compartilhamento espontâneo de arquivos é que não se pretende inaugurar uma reformulação das leis de direito autoral a partir das demandas conhecidas da sociedade civil, pois a maior parte dos usuários desconhecem tais leis a favor das novas formas de distribuição dos produtos culturais digitalizados. Essas pessoas o fazem não tanto pela intenção de questionar as leis que restringem tais trocas, mas sim para fomentar uma “economia gratuita”, baseada na distribuição do conhecimento e acesso à informação.


6. Conclusão

A sociedade de hoje vive um momento novo, sem qualquer precedente na História, o que nos leva a questões e consequências que não podem ser necessariamente previstas. Entretanto, existe a oportunidade de se ampliar todo o acesso à produção, ao compartilhamento de obras, à informação e ao conhecimento, mas isso exige que nos posicionemos quanto ao modelo de sociedade que iremos construir.

As transformações nas leis são justificadas como indispensáveis à proteção da criatividade comercial. Todavia, como se sabe, a medida protecionista não está mais relacionada à proteção do autor, criador ou artista, e sim às formas de negócios que envolvem o monopólio da produção e distribuição da cultura comercial.  A ameaça apresentada pelas novas tecnologias – por sua arquitetura de troca e de compartilhamento da cultura comercial e não comercial – foi suficiente para que empresas se unissem com o intuito de pressionar os legisladores a usarem a lei para proteger suas formas de negócio. 

Entretanto, devemos nos questionar sobre o uso que fazemos da informação e do conhecimento na nossa era, a era digital. Devemos seguir numa sociedade onde há disponibilidade e circulação da informação, de bens culturais, ou um num lugar onde toda a informação é limitada, restrita, controlada? O conhecimento humano já nos mostrou do que somos capazes, de agora em diante é uma questão de decisão.


7. Referências Bibliográficas

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Notas

[1] BITTAR, Calor Alberto, Direito do Autor, 1992, 1ª. Ed. Forense Universitária.

[2] SILVEIRA, Newton, Propriedade Intelectual, 2010, 4ª Ed. Manole.

[3] LEMOS, Ronaldo, Direito, Tecnologia e Cultura, 2005, 1ª Ed., Editora FGV.

[4] Berne Convention for the Protection of Literary and Artistic Works. World Intellectual Property Organization. Página visitada em 30 de fevereiro de 2014.

[5]  SANTIAGO, Vanisa. [Informações via e-mail] 24 mai. 2013. Rio de Janeiro [para] Patrícia Mello, Porto Alegre. Solicita informações sobre Direitos Autorais.

[6] Estatuto do ECAD, disponível em: http://www.abramus.org.br/musica/201/ecad-estatuto/ (acesso em 02/02/2014).

[7] Segundo TIM O’Reilly, criador da expressão Web 2.0, trata-se do “entendimento de que a rede (internet) é a plataforma. Sobre esta plataforma de rede as regras para negócios costumam ser diferentes e sua principal regra é: Usuários agregam valor! Entendendo como construir seus bancos de dados, eles ficam melhores quanto mais às pessoas o usam, é na verdade o segredo das origens de toda empresa 2.0” disponível em www.youtube.com/watch?v=87LG-MQrEu0 (acesso em 02/02/2014).

[8] Lei nº 9.610 de 19 de fevereiro de 1998, disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9610.htm  (acesso em 02/02/2014).

[9] PARANAGUÁ, Pedro e BRANCO, Sérgio, Direitos Autorais, 2009, Ed. FGV, p.73

[10] Copyright and creation, London School of Economics and Political Science: http://pt.scribd.com/doc/172985274/LSE-MPP-Policy-Brief-9-Copyright-and-Creation (acesso em 02/02/2014)

[11] TAKAHASHI, Tadao (Org.). Livro Verde para a Sociedade da Informação no Brasil. Brasília, Ministério da Ciência e Tecnologia – MCT, 2000, p. 5.

[12] SÜSSEKIND, Arnaldo. et. al. Instituições de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 2000.

[13] SHIRKY, Clay, A Cultura da Participação: criatividade e generosidade no mundo conectado, traduzido por Celina Portocarrero, Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2011, p. 14

[14] Whatching Alone: Relational Goods, Television and Happiness, 2008, Journal of Economic Behavior & Organization 65-3-4 (2008):506-28.

[15] “Television Viewing, Satisfaction and Happiness: Facts and Fictions, University of Milan-Biocca, Department of Economics Working Paper Series, 167 (2009), http://dipeco.economia.unimib.it/repec/pdf/mibwpaper167.pdf (acesso em 02/02/2014)

[16]IDGNow!:http://idgnow.com.br/internet/2005/05/11/idgnoticia.2006-03-12.8302279770/#sthash.6lNsmIkT.dpuf (acesso em 02/02/2014)

[17] Wikipedia:  http://pt.wikipedia.org/wiki/Wikipedia (acesso em 02/02/2014)

[18] Wikipedia: http://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_da_Internet (acesso em 02/02/2014)

[19] IBOPE Media: http://www.ibope.com.br/pt-br/noticias/paginas/brasil-e-o-terceiro-pais-em-numero-de-usuarios-ativos-na-internet.aspx (acesso em 02/02/2014)

[20] IBICT: www.ibict.br (acesso em 02/02/2014)

[21] LESSIG, Lawrence apud SILVEIRA, Sérgio Amadeu. O Conceito de Commons na Cibercultura. Revista Líbero - Ano XI - nº 21 - Jun 2008, p. 22.

[22] SIMON, Imre. A propriedade intelectual na era da internet. DataGramaZero – Revista de Ciência da Informação – v.1, nº 3, jun/2000.

[23] BENJAMIN, Walter. A obra de arte na época de sua reprodutibilidade técnica, In: ADORNO et al. Teoria da Cultura de massa. Trad. de Carlos Nelson Coutinho. São Paulo: Paz e Terra, 2000. p. 221-254.

[24] LESSIG, Lawrence. Free Culture, sob licença Creative Commons (2004).

[25] LESSIG, Lawrence. Free Culture, sob licença Creative Commons (2004), p. 30.

[26] CASTELLS, Manuel. A Galáxia Internet: reflexões sobre a Internet, negócios e a sociedade, 1ª Ed. Jorge Zahar, 2003.

[27] CASTELLS, Manuel. A Galáxia Internet: reflexões sobre a Internet, negócios e a sociedade, 1ª Ed. Jorge Zahar, 2003, p. 83.

[28] CASTELLS, Manuel. A Galáxia Internet: reflexões sobre a Internet, negócios e a sociedade, 1ª Ed. Jorge Zahar, 2003, p. 268.

[29] ASCENÇÃO, José. Direito da Internet e da Sociedade da Informação, 1ª Ed, Editora Forense, 2001, p. 02.

[30] CAE [Critical Art Ensemble]. Distúrbio eletrônico. São Paulo: Conrad, 2001, p.33.

[31] http:// thepiratebay.org (acesso em 20/03/2014)

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Sobre o autor
Aline Martins

bacharelanda em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo (SP)<br>

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINS, Aline. Propriedade de informações e dados postados em ambiente virtual, limites e extensões. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4582, 17 jan. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/33385. Acesso em: 26 dez. 2024.

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