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Da prescrição virtual no Direito Penal

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26/01/2015 às 08:49

Resumo:


  • A prescrição virtual é baseada na pena provavelmente aplicada ao indiciado, reconhecendo a impossibilidade de instauração da relação processual se a prescrição retroativa ocorrer entre a data do fato e o recebimento da denúncia.

  • A prescrição retroativa é calculada pela pena concreta aplicada, iniciando-se a contagem a partir do trânsito em julgado da sentença condenatória, e a Lei Federal nº 12.234/2010 restringiu sua aplicação entre a data do fato e o recebimento da denúncia.

  • A aplicação da prescrição virtual, mesmo não prevista de forma expressa na legislação, é defendida com base nos princípios da economia processual, proporcionalidade e dignidade da pessoa humana, visando evitar processos inúteis que resultem em morosidade e danos marginais ao acusado.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

5 CONCLUSÃO

A Constituição Federal veicula princípios explícitos e implícitos. A relevância dos princípios decorre do fato de que orientam e limitam a criação das demais normas, bem como orientam a interpretação realizada pelos operadores do direito.

Merecem destaque os Princípios da Economia Processual, Proporcionalidade e, ainda, da Dignidade da Pessoa Humana.

A Dignidade da Pessoa Humana é um princípio da Constituição Federal que garante, no aspecto objetivo, um mínimo existencial ao ser humano, atendendo a suas necessidades básicas, como moradia, saúde, etc. No aspecto subjetivo, trata-se do sentimento de respeitabilidade e autoestima, inerentes ao ser humano.

O princípio da Proporcionalidade pode ser compreendido como o dever da Administração Pública de repelir a prática de atos inúteis, desvantajosos, desarrazoados e desproporcionais. Vale dizer, a prática de qualquer ato pela administração deve ser inspirada pelo binômio utilidade e necessidade.

Finalmente, cumpre destacar o princípio constitucional da Economia Processual, que estabelece: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (artigo 5º, LXXVIII da Constituição Federal).

Diante dos referidos princípios constitucionais, é possível afirmar que uma condição básica do processo cível e penal é a existência do chamado interesse de agir. O interesse de agir é fixado no binômio necessidade e utilidade, bem como da adequação.

A adequação, em apertada síntese, seria a utilização do rito e instrumento processual correto para o provimento jurisdicional pleiteado. Assim, somente pode ser instaurada a relação processual se estiver presente a necessidade, a utilidade e a adequação do provimento jurisdicional pleiteado.

Nesse contexto, a persecução penal só pode ser inaugurada se não tiver ocorrido a prescrição da pretensão punitiva. A prescrição é a perda da pretensão punitiva ou da pretensão executória, em face da inércia do Estado durante determinado tempo legalmente previsto.

Não seria razoável impor ao acusado, por toda sua vida, a ameaça do processo e da condenação criminal.

Assim, com a prescrição da pretensão punitiva, não há interesse legítimo para andamento do processo penal, sendo de rigor a rejeição da denúncia ou queixa. Caso já tenha sido iniciado o processo, é de rigor a declaração da extinção da punibilidade. A prescrição da pretensão punitiva retira todos os efeitos da sentença condenatória já proferida, principais ou acessórios, penais ou extrapenais.

A prescrição retroativa, que afeta a pretensão punitiva, é calculada pela pena concreta aplicada. Depende do trânsito em julgado da sentença condenatória. A prescrição retroativa começa a correr a partir da publicação (transitado em julgado para a acusação). A contagem ocorre a partir da sentença ou acórdão para trás, tendo como termo final a data do recebimento da denúncia ou queixa.

Não há mais que se falar em prescrição retroativa entre a data do fato e o recebimento da denúncia ou queixa. A Lei Federal nº 12.234/2010 procedeu à extinção parcial da prescrição retroativa. Após a vigência da referida norma, a prescrição retroativa somente tem aplicação na fase processual, não sendo aplicada na fase de investigação. Não pode ser reconhecida entre a data do fato e do recebimento da denúncia ou queixa.

A prescrição virtual (antecipada, ou em perspectiva) é aquela que se baseia na pena provavelmente aplicada ao indiciado, caso haja processo e ocorra condenação. É fundamental, para a prescrição virtual, a ideia de prescrição retroativa e utilidade do processo penal.

É verdade que a Lei Federal nº 12.234/2010, ao afastar a aplicação da prescrição retroativa entre a data do fato e do recebimento da denúncia, reduziu, substancialmente, a utilidade da aplicação do instituto da prescrição virtual. Isso porque, inexistindo prescrição retroativa entre a data do fato e o recebimento da denúncia, torna-se impossível impedir a instauração de processo criminal, se não houver sido consumada a prescrição em abstrato. Afinal, não se pode, de início, afirmar que a instrução não será cumprida em prazo hábil para evitar a prescrição retroativa.

Apesar da validade dos argumentos acima, em todos os crimes praticados até o início da vigência da Lei Federal nº 12.234/2010, o acusado tem o direito ao reconhecimento da prescrição retroativa entre a data do fato e o recebimento da denúncia ou queixa.

Atualmente, prevalece o entendimento fixado pelo STJ na Súmula 438: “É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal”.

A solução vislumbrada pelo STJ quanto à prescrição virtual, referendada pelo STF, não parece ser a melhor. Para os crimes praticados até a entrada em vigor da Lei Federal nº 12.234/2010, não se vislumbra razão para não aplicação do instituto, mesmo diante da ausência de norma legal expressa.

Os Princípios da Economia Processual, Proporcionalidade e, ainda, da Dignidade da Pessoa Humana implicam a ampla utilização do instituto da prescrição virtual.

Ofende aos mencionados princípios constitucionais impor ao indiciado um dano marginal desnecessário quando, com segurança, sabe-se que haverá a incidência da prescrição retroativa. O processo penal não é um fim em si mesmo. Trata-se, somente, de instrumento para aplicação da sanção penal.

É claro que, se houver dúvida, deve prevalecer o interesse da sociedade, com o afastamento da prescrição virtual. Mas, note-se que essa dúvida precisa ser objetiva e não pode ser invocada para afastar a aplicação do instituto quando é inegável a incidência da prescrição retroativa.

Todos esses argumentos fundamentam a ideia no sentido de que o foco principal para o acolhimento da prescrição virtual é, além do respeito aos princípios constitucionais acima citados, a falta de interesse de agir.

Não há necessidade e utilidade em um processo penal que, ao final, trará como resultado, somente, a morosidade da justiça e o dano marginal ao acusado.

Assim, julga-se que, para os crimes praticados até a entrada em vigor da Lei Federal nº 12.234/2010, é de rigor a aplicação da prescrição virtual, sob pena de violação a diversos princípios constitucionais.


6 REFERÊNCIAS

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Notas

[1] MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 11ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p. 150.

[2] SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 19889. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011. P. 73.

[3] FREITAS, Juarez. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. São Paulo: Malheiros, 1997. P. 56

[4] CABRAL, Antonio do Passo. A duração razoável do processo e a gestão do tempo no projeto de novo código de processo civil. In: FREIRE, Alexandre; DANTAS, Bruno; NUNES, Dierle; DIDIER JR, Fredie; MEDINA, José Miguel Garcia; FUX, Luiz; CAMARGO, Luiz Henrique Volpe; OLIVEIRA, Pedro Miranda de (Coord.). Novas tendências do processo civil. Salvador: Jus Podivm, 2013. P. 75-99.

[5] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 10º Ed. São Paulo: RT, 2013. P. 204.

[6] MASSON, Cleber. Direito Penal. 1º Volume. 6º Ed. São Paulo: Método, 2012. P. 888.

[7] FARIA, Bento. Código Penal Brasileiro Comentado. 3º Volume. Rio de Janeiro: Record, 1961. P. 197.

[8] MASSON, Cleber. Direito Penal.1º Volume. 6º Ed. São Paulo: Método, 2012. P. 893/894.

[9] JESUS, Damásio E de.  Prescrição penal. 10º Ed. São Paulo: Saraiva, 1995. P. 130.

[10] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 10º Ed. São Paulo: RT, 2013. P. 204/205.

[11] HC 99.035, Redator para o acórdão o Ministro Dias Toffoli, Relator o Ministro Ministro Marco Aurélio, DJe 14.12.2010.

[12] STF. RE 602.527 QO-RG, Relator Min. Cezar Peluso, tribunal pleno, por unanimidade, DJ 18.12.2009.

[13] ATAÍDE, Fábio. A prescrição antecipada entre o julgar e o fazer de conta. Boletim IBCCRIM: São Paulo, ano 17, n. 202, p. 14-15, set. 2009.

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Sobre o autor
Marcelo Carita Correra

Procurador Federal,<br>exerceu a advocacia privada em São Paulo/SP<br>Bacharel em Direito pela PUC-SP<br>Especialista em Direito Tributário pela PUC-SP<br>

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CORRERA, Marcelo Carita. Da prescrição virtual no Direito Penal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4226, 26 jan. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/33460. Acesso em: 22 dez. 2024.

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