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Fundamentos jurídicos:

uma abordagem sobre as principais correntes jurídicas e suas influências na formação e interpretação do Direito

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08/12/2015 às 10:03
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Comparações entre as diferentes escolas de pensamento do Direito e os fundamentos jurídicos do paradigma moderno podem ajudar a tomar decisões melhores?

Resumo: O presente trabalho busca apresentar os fundamentos jurídicos, sob o enfoque das principais correntes jurídicas, e como eles influenciam na interpretação jurídica, bem como na concepção de Direito. As correntes jurídicas, formadas a partir de uma comunhão de pensamentos provenientes de juristas e jusfilósofos convergentes dão fundamento e estabelecem um paradigma no ato de interpretação para o aplicador da norma. Sendo assim, o presente trabalho procurará esclarecer como esses fundamentos ou pressupostos determinam a interpretação jurídica, e consequente entendimento do Direito. Quanto à metodologia do presente trabalho, houve a utilização da técnica de pesquisa bibliográfica, como é de praxe no Direito, e consequentemente o método dedutivo, haja vista que se partiu dos ensinamentos gerais de doutrinadores para fomentar este trabalho. Não se exclui, contudo, o método histórico-comparativo no desenvolvimento do trabalho. Por meio dele, foi possível perceber semelhanças e diferenças nos fundamentos das correntes jurídicas, bem como lograr ao estabelecer as conclusões do presente trabalho.

Palavras chaves: Fundamentos do Direito. Correntes Jurídicas. Escolas do Direito. Interpretação do Direito.


1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho se propõe a esclarecer, apresentando as principais correntes jurídicas que influenciam na concepção do Direito, como o Direito é entendido e interpretado pelos juristas e jusfilósofos.

A Ciência Jurídica e a Filosofia Jurídica estudam o problema do conceito de Direito no decorrer da história, com auge no século XIX e seguintes, causando diversas interpretações acerca do mencionado conceito, resultando na criação de várias correntes de pensamento jurídicos, todavia, este trabalho estudará apenas as de maior repercussão. Mesmo um magistrado atual vê-se em dificuldade em interpretar e aplicar a norma ao caso concreto, devendo partir de algumas das correntes jurídicas que serão apresentadas, a saber, o jusnaturalismo, o juspositivismo e suas ramificações (escola exegética, normativismo, sociologismo), o historicismo e o tridimensionalismo jurídicos.

Assim, mostra-se importante o presente trabalho, no sentido de que se tentará trazer a tona como essas correntes de pensamento jurídicos influenciam na interpretação e aplicação do direito pelos juristas (em sentido amplo), porquanto estudando as correntes de pensamento em pauta, é possível entender como a ideia de Direito se desenvolveu na história do direito, bem como entender como os grandes representantes da Ciência Jurídica e da Filosofia Jurídica interpretaram o Direito e quais os fundamentos que eles usaram para isso.

Não obstante o fator histórico, parte-se ainda dessas concepções, na realidade atual, para interpretar o Direito. Considerando a interpretação jurídica como sendo a definição do sentido objetivo da norma, bem como o alcance dela, infere-se que os estudos dos fundamentos e das correntes que influenciaram na elaboração desta norma são imprescindíveis ao jurista.

Construiu-se o presente estudo, primeiramente, apresentando o que são fundamentos jurídicos, para depois apresentar as principais correntes de pensamento jurídicas, para por fim chegar às considerações finais da pesquisa.


2 FUNDAMENTOS JURÍDICOS

Como é de natural do ser humano, todos os fenômenos e fatos que são merecedores de serem investigados. Do mesmo modo, o Direito como fenômeno social, não é excluído dessa necessidade humana de explicação racional e empírica dos objetos. Por conseguinte, a visão do Direito como simples fato destituído de fundamentação não obteve êxito na história.

Em cada um dos momentos históricos vividos pelo homem, foram atribuídos argumentos às regras de conduta para justificar a obediência a elas pelas pessoas sob o seu domínio. Primeiramente, se reconheceu a força como imperativo da norma, depois, esta força foi embasada na vontade divina. Posteriormente, houve um endeusamento das normas, e mais tarde, os direitos do homem foram reconhecidos.[3]

Em cada um desses momentos explicava-se o direito a partir de premissas ou fundamentos, indagando-se o conteúdo das normas jurídicas. Assim, a questão do conteúdo do Direito resumia-se na seguinte pergunta: “Qual deve ser o conteúdo do direito, ou melhor, quando é válido o conteúdo direito”.[4]

Entende-se por fundamentos ou conteúdos jurídicos, segundo GAMA:

Os diferentes modos de pensar em torno de assuntos jurídicos refletindo sobre a realidade ou alterando a concepção a seu respeito. Pode-se dizer que é gerado um sistema complexo de pensamentos com o fim de explicar a formação e o desenvolvimento das regras jurídicas.[5]

Essa tendência dos juristas e filósofos em atribuir conteúdo as regras jurídicas de determinada época fez surgir as correntes de pensamento jurídico. Por correntes entende-se “os grandes caminhos percorridos pelo pensamento jurídico, pelo qual grande número de juristas perseguiu uma fundamentação universal para o direito ou uma explicação exaustiva para o fenômeno jurídico.”[6]

Partir-se-á, na sequência, para o estudo das correntes jurídicas, seus corifeus, seus pressupostos, suas explicações acerca do direito, etc.


3 JUSNATURALISMO

Por jusnaturalismo, ou Escola do Direito Natural (esta compreendendo apenas a fase racionalista), entende-se a imensa corrente de jusfilósofos e juristas que davam primazia aos princípios anteriores ao homem, os princípios e regras ditos naturais, justas, como o princípio da dignidade humana e o princípio do direito a vida. “Pode-se dizer, em linhas gerais, que essa escola foi fundada no pressuposto de que existe uma lei natural, eterna e imutável; uma ordem preexistente, de origem divina ou decorrente da natureza, ou, ainda, da natureza social do ser humano.”[7]

Para os jusnaturalistas:

A lei natural é imutável em seus primeiros princípios. Odireito natural, imanente à natureza humana, independe do legislador humano. As demais normas, construídas pelos legisladores, são aplicações dos primeiros princípios naturais às contingências da vida, mas não são naturais, embora derivem do direito natural.[8]

O jusnaturalismo passou por três estágios na história, compreendendo três vertentes: a teológica, a humana e a racionalista. A primeira, com vigência na Idade Antiga e na Idade Média, o direito natural ligava-se à Religião.  O fenômeno jurídico estavasubordinado à vontade divina. A escola teológica “posiciona Deus como legislador, acusando as condutas a serem consideradas ilícitas e impondo punições graduadas conforme o bem ofendido.”[9] Assim, em suma, esta fase do jusnaturalismo embasava-se nas leis advindas de Deus.

A segunda fase, uma versão intermediária do direito natural na Idade Média, de cunho tomista, divide o direito natural em: normas eternas, naturais, humanas e divinas. As eternas são universais e atemporais. As naturais são fruto da busca pela felicidade terrestre. As humanas são criadas pela Razão. E as divinas são produto da criação divina.[10]

A terceira fase, o jusracionalismo, contou com o jurista holândes Hugo Grócio, considerado o “pai do direito natural”, para laicizar o conceito de direito natural[11], bem como defender que os princípios do direito natural são frutos da razão.

Segundo a escola jusracionalista, o método para conhecer a ordenação natural é a Razão. “É através da razão que, voltando-se para si mesma, investiga, para descobrir na própria consciência, os princípios e as leis naturais, válidas desde sempre”.[12]

Em suma, o jusracionalismo procura humanizar o direito natural e afastá-lo da dependência divina, tornando-o autônomo e acessível a todos aqueles que estivessem dispostos a usar a razão para conhecê-lo. Diz GAMA que:

Objetivamente, os defensores dessa corrente tentam evidenciar a autonomia do direito, funcionando de forma independente com relação aos demais ramos do conhecimento. Naturalmente, a norma decorre do trabalho do legislador numa operação semelhante ao exercício da razão humana diante dos casos que se lhe apresenta.[13]

Atualmente, o jusnaturalismo vislumbra o direito natural apenas como um conjunto de princípios que orientam o legislador na elaboração das leis positivas.[14] Princípios estes que não podem ser preteridos, sob pena de injustiça na ordem jurídica. São compreendidos, pois, pelos princípios fundamentais como o direito à vida, o direito a liberdade, o direito à igualdade de oportunidade e participação, o direito ao mínimo de civilidade, etc. Foram esses princípios que nortearam os legisladores da Declaração de Direitos Humanos.

No que toca aos caracteres do direito natural, a doutrina tradicional elenca os seguintes: imutável, eterno e universal. Todavia, pode-se enumerar caracteres de uma forma mais detalhada como fez Eduardo Novoa Monreal:

1.Universalidade (comum a todos os povos); 2) perpetuidade (válido para todas as épocas); 3) imutabilidade (da mesma forma que a natureza humana, o Direito Natural não se modifica); 4) indispensabilidade (é um direito irrenunciável); 5) indelegabilidade(no sentido que não podem os direitos naturais ser esquecidos pelo coração e consciência dos homens); 6) unidade (porque é igual para todos os homens); 7) obrigatoriedade (deve ser obedecido por todos os homens); 8) necessidade (nenhuma sociedade pode viver sem o Direito Natural); 9) validez (seus princípios são válidos e podem ser impostos aos homens em qualquer situação em que se encontrem).[15]

Como se pode concluir, o Direito Natural fundamenta-se nos ideais de Justiça. São princípios atemporais e imutáveis, sem os quais, o direito torna-se injusto. São descobertos pela Razão e sistematizados por ela. Além disso, como se verá adiante, o jusnaturalismo se opõe ao juspositivismo, porquanto esta corrente enxerga o direito somente como as normas emanadas do Estado, sendo que tudo fora dele não é direito, principalmente o direito natural, que é congênito e anterior ao Estado. Diferentemente do juspositivismo, o único método de interpretação e aplicação da norma, no jusnaturalismo, é o dedutivo, uma vez que as leis naturais são gerais e universais e, portanto, devem ser tomadas como paradigmas absolutos na interpretação do caso concreto.


4 JUSPOSITIVISMO

O positivismo jurídico é a doutrina do positivismo de Auguste Comte aplicada no Direito. Parte dos mesmos princípios, nega abstrações metafísicas e especulações sem experimentação fática. Fiel ao positivismo, o positivismo jurídico nega qualquer elemento de abstração no Direito, sobretudo o Direito Natural, por considerá-lo metafísico e anticientífico.[16]

Nessa corrente, o objeto de investigação do Direito deve ser apenas as normas jurídicas existentes e provenientes do Estado, excluindo os juízos de valor do Direito. Para o juspositivista, importa apenas estudar a realidade fática, sem considerar ideias irracionais, como o valor Justiça, do Direito. Por conseguinte, infere-se que os juspositivistas davam primazia absoluta à legislação elaborada pelo poder Legislativo.[17]Em resumo, o Direito Postivo é o único válido no juspositivismo, independente de comportar fundamento ou conteúdo na letra da lei.

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A expressão Direito Positivo ganha tal denominação, primeiramente por se opor ao Direito Natural. É positivo porque suas regras são reais, ou no mínimo propensas a se efetivarem. É o direito vigente em determinada sociedade, mutável e reflexo do poder estatal[18]

“Como método de pesquisa e construção, só admite como válido o método indutivo, que se baseia nos fatos da experiência”.[19] Para os positivistas, isso garante certeza jurídica, já que o Direito deve estar restrito às normas impostas pelo Estado e escritas.

Os juspositivistas condenam o Direito Natural por considerá-lo não só metafísico, como também conservador, pois os direitos imanentes são tomados como dogmas pelos jusnaturalistas, de modo que toda aplicação normativa ao caso concreto deve partir dos direitos naturais. Segundo os juspositivistas, esse conservadorismo do Direito Natural torna o Direito estático, não acompanhando as necessidades sociais de cada momento histórico, sendo inútil para a ordem social de dado momento.

Em contrapartida, o juspositivismo sofre críticas severas dos jusnaturalistas, por estes considerarem o Direito Positivo um conjunto de normas que não satisfazem o anseio por justiça. As leis positivas só garantem a segurança, mas excluem a justiça e os valores inerentes ao ser humano. O Direito Positivo é válido simplesmente por ser vigente, sem precisar abarcar valores de significação social.[20]Desse modo, o direito justifica as atitudes arbitrárias por quem se encontrar no poder. Foi assim que Adolf Hitler justificou suas atrocidades durante a Segunda Guerra Mundial, por se basear no direito estatal.

Em decorrência do positivismo jurídico, algumas ramificações doutrinárias de formaram, sobretudo a escola da exegese, o normativismo jurídico e sociologismo jurídico, explicados na sequência.

4.1 Escola Exegética

Essa escola firmou conceitos e princípios ainda usados na Dogmática Jurídica contemporânea. Derivada do positivismo jurídico teve seu apogeu no século XIX, principalmente após a codificação francesa. Foi o Código Francês de Napoleão, de1804, que impulsionou a ascensão da escola exegética.[21]

A idolatria do referido código levou aos juristas a darem grande valor ao texto legislativo do código, partindo de pressupostos de completude da lei, isto é, um texto legislativo sem lacunas, como era vislumbrado o Code Napoleão, redundando na criação de um método de interpretação limitada ao texto legal e a intenção do legislador, relegando o hermeneuta a mero aplicador da lei sob a forma mecânica do silogismo. Nesse sentido, o verdadeiro jurista é aquele que parte do Direito Positivo para interpretar e aplicar, não procurando subsídios e repostas fora da lei em sua labuta, uma vez que a lei é completa e perfeita, cabendo ao jurisprudente dar sentido e amplitude de uma lei a partir de outra.[22]Por isso infere NUNES que:

Sendo a lei a única fonte das decisões jurídicas, a resolução de um problema dar-se-ia, então, na conclusão de um silogismo, no qual a premissa maior seria a lei, a premissa menor seria o enunciado do fato concreto apresentado como problema a se solucionar, e a conclusão corresponderia à resolução do problema.[23]

Da assertiva acima mencionada, é possível inferir que o aplicador da lei deveria partir de uma interpretação literal ou gramatical, restrita à mens legislatoris, não significando a rejeição total do direito natural na interpretação normativa, pois se admitia que os códigos eram fruto da razão humana, que é natural.

Explica MARIA HELENA DINIZ que:

Para a escola da exegese, a totalidade do direito positivo se identifica por completo com a lei escrita; com isso a ciência jurídica se apegou à tese de que a função específica do juristas era ater-se com rigor absoluto ao texto legal e revelar seu sentido. Todavia, é preciso não olvidar que o exegetismo não negou o direito natural, pois chegou a admitir que os códigos elaborados de modo racional, eram expressão humana do direito natural, por isso o estudo do direito deveria reduzir-se a mera exegese dos códigos.[24]

Embora a interpretação do direito se baseasse na lei, a escola exegética não era estática. Seus teóricos adaptavam-na às exigências do seu tempo, resistindo às críticas ferrenhas dos opositores da época.[25]Tanto que os adeptos da escola exegética elaboraram a interpretação histórica para desvendar a vontade do legislador sob as circunstâncias que o levaram a elaborar determinada lei, possibilitando a abstração do verdadeiro sentido e amplitude da lei no momento da elaboração.[26]

4.2 Normativismo Jurídico

A teoria normativista, ou teoria pura do direito, compreende o conjunto de estudos do austríaco Hans Kelsen que reduz o Direito a um só elemento: a norma jurídica.[27]Compreende, pois, “a corrente que define, desenvolve, e fundamenta o direito exclusivamente com elementos jurídicos.”[28]Para Kelsen, o Direito é uma ciência que tem objeto de investigação próprio, desvinculado de qualquer outra ciência, que é a norma jurídica, assim como pugna por um direito geral positivo, sendo a sua teoria de abrangência universal.Nas palavras de Kelsen:

A Teoria Pura do Direito é uma teoria do Direito positivo – do Direito positivo em geral, não de uma ordem jurídica especial. É teoria geral do Direito, não interpretação de particulares normas jurídicas, nacionais ou internacionais. [...] Como teoria, quer única e exclusivamente conhecer o seu próprio objeto. Procura responder a esta questão: o que é e como é o Direito? Mas já não lhe importa a questão de saber como deve ser o Direito, ou como deve ele ser feito. É ciência jurídica e não política do Direito. Quando designa a si própria como “pura” teoria do Direito, isto significa que ela se propõe garantir um conhecimento tudo quanto não pertença ao seu objeto, tudo quanto não se possa, rigorosamente, determinar como Direito. Isto quer dizer que ela pretende libertar a ciência jurídica de todos os elementos que lhe são estranhos. Esse é o seu princípio metodológico fundamental.[29]

Nesse sentido, Kelsen almeja separar o Direito de todas as demais ciências, a fim de torná-lo ciência autônoma, por isso, a denominação teoria pura, usada por Kelsen. Assim, completa GAMA:

Elevou-se aqui o valor da norma em patamares jamais vistos, apregoando-se que o direito poderia ser contemplado somente com a legislação, devendo todos os esforços jurídicos serem concentrados na elaboração, interpretação e aplicação das regras jurídicas elaboradas pelo poder legislativo. Apregoava-se uma libertação do direito com relação às demais áreas de conhecimento, sendo estudado somente o fenômeno jurídico. A idéia de pureza do direito não permite que o fato jurídico seja estudado sobre qualquer outro enfoque, seja sob a visão sociológica, histórica, filosófica, psicológica... O direito passou a ser concebido como ciência jurídica com métodos próprios, desvinculada das demais ciências.[30]

Segundo a teoria kelsiana, a realidade mundana é separada em dois: o mundo do ser (realidade fática) e o mundo do dever-ser (realidade formal). Kelsen situa o direito neste último, bem como defende a impossibilidade do ser e do dever-ser se unirem ou se fundarem um no outro. Assim, a norma jurídica só poderia fundar outra norma jurídica, sob uma estrutura piramidal, até chegar a Norma Fundamental, que é a primeira norma, a que sustenta todo o ordenamento jurídico.[31] Kelsen diz que para não incorrer no regresso infinito (uma norma fundamentando outra infinitamente) é necessária a consideração da Norma Fundamental, sendo que esta não é fundamentada por nenhuma outra e deve ser pressuposta como válida em si mesma, por uma necessidade lógica do sistema normativo.

Para elaborar essa teoria, Kelsen partiu de uma ideologia positivista, excluindo qualquer juízo de valor, bem como o Direito Natural, da Ciência Júridica. Desprezando qualquer aspecto valorativo da norma, Kelsen pôde afirmar que expressou o Direito como ele é, e não como deveria ser.

Outro aspecto a ser ressaltado da teoria de Kelsen foi a sua concepção monística de Direito/Estado, Direito subjetivo/objetivo e Direito interno/internacional. Para Kelsen, O Estado é a simples personificação jurídica coercitiva do ordenamento. No mesmo sentido, inexiste direito subjetivo, sendo este um simples resultado do direito positivo. Há, também, a confusão do Direito interno com o Direito internacional, sendo este o que dá legitimidade àquele. Destarte, o direito internacional é superior a todos os outros direitos nacionais. Nesse viés, explica GUSMÃO acerca da concepção monística kelsiana ora estudada:

Na ordem unificada, escalonada em pirâmide, abaixo da comunidade internacional, estão os Estados nacionais, as pessoas jurídicas de direito público e de direito privado e as pessoas físicas. Integrou-os Kelsen normativamente, pois só assim poderiam ser juridicamente pensados. Conseqüência: deixa de haver distinção entre direito e Estado, entre, portanto, teoria do direito e teoria do Estado, por ser o direito a personificação da ordem jurídica coativa, “ponto de imputação” de atos e de efeitos jurídicos, e não, como tem sido equivocadamente sustentado, ente social.[32]

Em síntese, o normativismo jurídico consiste em reduzir o Direito e o Estado à norma, bem como vislumbrar o Direito como ciência autônoma, independente das demais ciências humanas. Tal concepção contribuiu no sentido de que o Direito passou a ser considerado como ciência nas elucubrações dos juristas e dos jusfilósofos. Contribui, também, ao conceber o Direito como um conjunto de normas escalonadas e sistemáticas, numa unidade denominada ordenamento jurídico, onde uma norma se subordina a outra, chegando à norma fundamental.  Analogamente, pode-se dizer que o Direito Brasileiro se estrutura da mesma forma, sendo a norma fundamental a Constituição Federal, e as demais normas subordinadas a ela denominadas de normas infraconstitucionais.

Por outro lado, o normativismo sofre críticas ferrenhas dos juristas antikelsianos, devido à obscuridade da norma fundamental. Do mesmo modo, censura-se a fusão do Estado ao Direito, bem como a indiferença do Direito aos valores, como o ideal Justiça[33], por considerarem os antikelsianos uma forma de os dirigentes tiranos justificarem suas atrocidades, uma vez que o Direito vigente é válido, indiferente da Moral, e o Estado age juntamente com o Direito como um fim em si mesmo.

4.3 Sociologismo Jurídico

O sociologismo, ou escola sociológica, surgiu com Émile Durkheim, sociólogo do século XIX que influenciou o Direito com seus estudos. O sociologismo compreende a reunião de conceitos que vislumbram o Direito sob o prisma predominante do fato social, considerando-o mero componente dos fenômenos sociais suscetível de ser estudado segundo nexos de causalidade, assim como ocorre nas ciências naturais.[34]

É, pois, a corrente que se embasa no fato social para explicar o Direito. Aplica-se, aqui, o método sociológico, isto é, investigar a partir do “princípio fundamental de que os fatos sociais devem ser estudados como coisas”[35], assim como o produto dos estudos da Sociologia Jurídica. Nesse sentido, identifica o Direito não com lei ou com jurisprudência, mas com o fato social. Desvincula o Direito do Estado, concebendo-o como simples fenômeno social, primeiro formado pelo povo na forma de costume e depois transformado em lei estatal.[36]

É corrente positivista por ser fundamentada no empirismo de Émile Durkheim ao defender a investigação do Direito a partir da consideração dele como fato social.Duguit, constitucionalista francês, sob a influência durkheiniana, chega a afirmar que “nada fazer que atente contra a solidariedade social em qualquer uma das formas e fazer tudo o que for de natureza a realizá-la, perpetuá-la e desenvolvê-la.”[37]

Segundo REALE o sociologismo jurídico:

Traduz uma exarcebação ou exagero da Sociologia Jurídica, pois esta, quando se contém em seus justos limites, não pretende explicar todo o mundo jurídico através de seus esquemas e leis, até ao ponto de negar autonomia à Jurisprudência, reduzindo-a a uma arte de bem decidir com base nos conhecimentos fornecidos pelos estudiosos da realidade coletiva.[38]

Portanto, na visão sociológica, o Direito é vislumbrado parcialmente, uma vez que as normas são identificadas como fato social. Devido ao brocardo ubi jus, ubi societas a escola sociológica ganha força no final do século XIX, considerando a existência do direito como simples fenômeno social de controle.[39]

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Sobre o autor
Luan Lincoln Almeida Paulino

Acadêmico de Direito pela Faculdade do Norte Novo de Apucarana - FACNOPAR.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PAULINO, Luan Lincoln Almeida. Fundamentos jurídicos:: uma abordagem sobre as principais correntes jurídicas e suas influências na formação e interpretação do Direito. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4542, 8 dez. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/33633. Acesso em: 11 out. 2024.

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