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Acções levadas a cabo pelo governo, ONGs e outras entidades no âmbito da promoção, protecção e divulgação dos direitos de saúde sexual e reprodutiva

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06/12/2015 às 14:33
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5.Acções levadas a cabo no âmbito da promoção, protecção, divulgação e defesa dos direitos de saúde sexual e reprodutiva

5.1.Acções levadas a cabo pelo governo

Quando falávamos das teorias de eficácia dos direitos, neste caso em particular dos direitos de saúde sexual e reprodutiva, vimos que o Estado tinha um papel muito importante na garantia dos mesmos.

Como foi aflorado há um leque vasto de Direitos de Saúde Sexual aos quais cabe ao estado, numa perspectiva vertical, criar condições para o seu exercício e garantir, resultantes de pactos Internacionais assumidos a nível Internacional, assim como em legislação extravagante existente.

O governo deve adoptar politicas e estratégias que permitam aos cidadãos o gozo e exercício pleno dos Direitos de Saúde Sexual e Reprodutiva, por força da alínea a), do nº 1, do art.º 204 da CRM.

A nível Internacional, o governo celebrou alguns acordos e tratados que visam a protecção e defesa dos Direitos de Saúde Sexual e Reprodutiva.

A nível interno governo de Moçambique adoptou várias Políticas e Estratégias no âmbito da promoção e Protecção dos direitos de saúde Sexual e Reprodutiva, tanto em resultado de compromissos assumidos a nível Internacional, como resultantes de factores internos.

5.1.1.A nível Internacional

Note-se, dizemos a nível internacional, por uma questão de sistematização, porque em bom rigor e isso resulta do disposto no art.º 18 da CRM, as normas do Direito Interno quando recebidas pelo direito interno passam a ser normas internas e deixam de ter o seu cariz internacional.

A nível Internacional o governo de Moçambique adoptou dois pactos internacionais nesta área, que merecem especial destaque:

5.1.1.1.Programa da Conferência Internacional de População e Desenvolvimento (CIPD)

A Conferência de população é considerada o principal marco para o despertar de atenção face a estes direitos. Foi realizada em Cairo em de 5 a 13 de Setembro de 1994.

Como resultado da conferência foi aprovado pela Assembleia Geral das Nações Unidas o “Programa de Ação da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento”

Na conferência os estados foram consentâneos em considerar os direitos de saúde sexual e reprodutiva são direitos fundamentais, com especial enfoque para o direito ao planeamento familiar, sem os quais o homem não pode desenvolver plenamente.

Este Programa dedicou dois capítulos aos DSSR: Capítulo VII (Direitos de reprodução e saúde reprodutiva) e Capítulo VIII (Saúde Morbidade e Mortalidade)

O capítulo VII, integra cinco áreas de acção[27] que são:

- Direito de reprodução e saúde reprodutiva (ponto 7.1. do programa da CIPD),cujo objectivo principal é assegurar o acesso a informação sobre os serviços de assistência à saúde reprodutiva, e garantir a sua acessibilidade aos usuários.

- Planeamento Familiar (ponto 7.12), que tem como objectivo principal é garantir que os casais façam filhos numa estrutura que promova a saúde, a responsabilidade e o bem-estar familiar e acima de tudo a liberdade reprodutiva das pessoas.

- Doenças sexualmente transmissíveis e prevenção contra o HIV (ponto 7.27), cujo objectivo é prevenir, reduzir a incidência de doenças sexualmente transmissíveis e prover seu tratamento, inclusive do HIV/SIDA.

- Sexualidade humana e relações entre os sexos (ponto 7.34), cujo objectivo é promover o adequado desenvolvimento da sexualidade responsável, que propicie relações de igualdade e de mútuo respeito entre os sexos e contribua para melhorar a qualidade de vida dos indivíduos

- Adolescentes (ponto 7.41.), com o objectivo de tratar os problemas de saúde sexual e reprodutiva do adolescente. Estes problemas englobam a gravides indesejada, o aborto inseguro, doenças sexualmente transmissíveis. Tem ainda a componente da promoção da abstinência, que deve ser implementada em paralelo com a provisão de serviços que permitam dar o acompanhamento aos adolescentes.

O Capítulo VIII possui 3 áreas de acção dedicadas aos DSSR:

- Assistência primária de saúde e o sector de assistência à saúde, que em vista aumentar, o acesso, a disponibilidade, a aceitação e a permissibilidade dos serviços de saúde a todos

- Saúde da mulher e maternidade segura, que visa promover a saúde da mulher e a maternidade segura, através provisão e aumento de serviços de saúde materna, nos quais esteja inclusa a componente sobre de educação em maternidade segura.

- Infecção do HIV/SIDA, que tem como objectivo evitar, reduzir a disseminação da infecção do HIV e minimizar seu impacto e ainda garantir assistência médica aos já infectados.

Portanto, é uma política bem ampla que cobre vários direitos e que possui componentes objectivos concretos e bem estabelecidos que permitem proteger os DSSR.

5.1.1.2.PLANO DE ACÇÃO DE MAPUTO (2007-2010)

O “Plano de acção de Maputo para a operacionalização do quadro da política continental para a saúde e direitos sexuais e reprodutivos (2007-2010)” ou plano de acção de Maputo, foi aprovado na conferencia dos chefes de estado e de governo em Maputo no ano de 2006.

Este plano possui 9 áreas de acção das quais interessam ao nosso trabalho as seguintes:

- Integração dos Serviços Sexuais de Saúde Reprodutiva nos Serviços de Cuidados Primários de Saúde, facto que pressupõe a revisão daqueles que são os cuidados primários de saúde e permitir que os direitos de saúde sexual lá sejam integrados.

- Reposicionamento do Planeamento Familiar, de modo a de alcançar o ODM 5 (melhorar a saúde materna).

- Serviços Amigos do Jovem, com vista a satisfação das necessidades de saúde sexual e reprodutiva dos adolescentes e jovens como uma componente muito importante neste domínio

- Abordo Inseguro, pressuposto desta componente é ver resolvido o problema do aborto inseguro, que apresenta índices alarmantes. 

- Maternidade Segura, que envolve a prestação de serviços de qualidade e acessíveis com vista promover a maternidade segura, assim como saúde para as mães.

5.1.2.A nível Nacional

Em termos de Politicas e estratégias existentes no país existentes no país no âmbito destes direitos merecem destaque:

5.1.2.1.Programa Geração Biz

Este programa foi lançado no ano de 1999, fruto de uma parceria entre o Governo de Moçambique e o Fundo das Nações Unidas para a População (FNUAP), criado com o objectivo principal da promoção da saúde sexual e reprodutiva nos adolescentes e jovens e a prevenção contra o HIV/SIDA. Nestes termos o grupo alvo destes direitos são adolescentes e jovens.

É um programa multissectorial conduzido pelos Ministérios da Saúde, da educação, e Juventude e Desporto, todos eles em coordenação.

As acções do programa focalizam-se em três componentes: clínica, escolar e comunitária.

 A componente clínica pressupõe a provisão de serviços clínicos, focalizados especialmente para os jovens.

A componente escolar pressupõe actividades educativas e de sensibilização para jovens na escola, e fora dela (componente comunitária)

É um programa de âmbito nacional, com acções que incidem até nas zonas rurais, permitindo um acesso justo ao mesmo, sem distinção em razão do local de nascimento.

5.1.2.2.O Plano Estratégico Nacional de Resposta ao HIV/SIDA 2010-2014

A ONU definiu em 2000 como ODM[28] 6: combater o HIV/SIDA. O Plano Estratégico Nacional de Resposta ao HIV/SIDA, também designado PEN III, foi aprovado na 10ª secção do Conselho de Ministros do ano de 2009 com vista alcáçar este ODM.

Este plano tem dois precedentes[29], nomeadamente o PEN I (2000-2002) e o PEN II (2005-2009)

O PEN III tem como principal objectivo “contribuir para a redução do número de novas infecções pelo HIV em Moçambique, a promoção da melhoria da qualidade de vida pessoas vivendo com HIV e SIDA e a redução do impacto do SIDA nos esforços do desenvolvimento nacional”[30]

Um aspecto muito importante do PEN III é que ele consagra nos seus princípios orientadores, “o respeito pelos direitos humanos universais”[31]. É preciso salientar que esta como as demais políticas e estratégias aqui em análise são relativas aos direitos humanos, direitos humanos de saúde sexual e reprodutiva, daí que olhamos de forma muito positiva para estes aspecto na medida é que denota-se o «animus» e a sensibilidade do estado pelos mesmos.

O PEN III comporta essencialmente quatro componentes: a prevenção, a redução do risco e vulnerabilidade, tratamento e cuidados e a componente da mitigação das consequências.

A Componente prevenção continua sendo, a semelhança dos PENs anteriores, o principal enfoque deste plano. A meta aqui é reduzir a taxa de prevalência de mulheres gravidas (dos 15-24 anos) para 8% contra os 11.3 registrados em 2007[32].

As áreas prioritárias desta componente são essencialmente: a prevenção do HIV nas raparigas[33], a promoção do uso consistente do preservativo (masculino e feminino), a promoção da mudança social e comportamental, prevenção da transmissão vertical, garantia biossegurança e disponibilidade de serviços de circuncisão masculina. 

A Componente redução e risco visa reduzir o grau de risco e vulnerabilidade da população Moçambicana ao HIV, com especial enfoque as populações mais vulneráveis. O plano prevê intervenções no ambiente geral de risco e vulnerabilidade a infecção pelo HIV[34], com o objectivo de confrontar e limitar as condições precárias que facilitam um ambiente propício para o aumento do risco e da vulnerabilidade ao HIV. Estas intervenções visam limitar a índice de vulnerabilidade em função das desigualdades de género e dos factores culturais, educacionais, demográficos, legais, económicos e políticos[35]

A componente tratamento e cuidados comporta a essência dos DSSR do plano. A espectativa aqui é ver reduzida a mortalidade resultante do HIV para 5% até 2014.

Esta componente comporta cinco áreas de provisão de serviços[36], todas interrelacionadas, são elas: A massificação do aconselhamento e testagem em saúde; a provisão de serviços de continuidade de cuidados (para doentes de HIV elegíveis ou não para o TARV); melhoria do rastreio de TB para doentes vivendo com HIV positivo e vice-versa; Garantia de apoio psicossocial e o apoio nutricional e cuidados domiciliários.

A componente mitigação das consequências prevê expectativa de ter mitigada a magnitude dos impactos do HIV e SIDA no seio dos agregados familiares, comunidades e no grupo de crianças órfãs e vulneráveis. É um intento cuja materialização vai depender da participação activa dos líderes e outros influentes na comunidade para acelerar o processo de resposta.

As áreas estratégicas desta componente são: a redução das consequências do HIV e SIDA nas PVHS[37], agregados familiares, crianças órfãs e vulneráveis, comunidades e instituições

Notamos que em todas as componentes desta política, em particular a da prevenção, não se toma em conta as várias orientações sexuais, privilegiando-se os heterossexuais, deixando assim os homo,bi ou transsexuais vulneráveis ao HIV, devendo se prevenir com custos próprios, que muitas vezes são escassos. Assim entendemos que esta política nestes termos é discriminatória em função da orientação sexual.

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5.1.2.3.A Estratégia de Planeamento Familiar e Contracepção 2011-2015

Aprovada no ano de 2010, esta estratégia foi elaborada em cumprimento das deliberações da Conferencia Internacional Sobre População e Desenvolvimento no sentido de “capacitar casais e indivíduos a decidir livre e responsavelmente sobre o número e o espaçamento de seus filhos e a ter a informação e os meios de assim o fazer e assegurar opções conscientes e tornar disponível toda uma série de métodos eficientes e seguros”[38].

O Objectivo desta estratégia é o de “Aumentar a utilização dos Serviços de Planeamento Familiar e Contracepção pela população Moçambicana”[39]

A estratégia possui quatro componentes de actividades, que permitem alcançar o objectivo pelo qual foi criada, das quais interessam-nos duas:

- Aumentar a disponibilidade e qualidade dos serviços de PF e Contracepção, o que vai constituir na maior provisão de anticonceptivos em todas as unidades as unidades sanitárias, atendendo sempre a situação de necessidade; garantir a formação de profissionais de saúde e aumentar o acesso aos serviços de planeamento familiar a nível comunitário.

- Incrementar a procura dos serviços de Planeamento Familiar e Contracepção, o que pressupõe a mobilização da sociedade para a utilização dos serviços de planeamento familiar e de saúde sexual em geral.

Como se sabe a nossa sociedade é dominada por correntes patriarcais em que o homem é que decide sobre o número de filhos. Esta estratégia vem inovar ao promover a participação do homem no planeamento familiar, nesta componente de incremento da procura dos serviços de planeamento familiar, o que permite com que as mulheres possam decidir livremente sobre a sua vida reprodutiva.

5.1.2.4.Política e Estratégia de Saúde Reprodutiva de Adolescentes e Jovens (PESRAJ)

O PESRAJ tem como objectivo a “Promoção da saúde reprodutiva do adolescente, dentro do respeito dos direitos sexuais do adolescente, respeito pelos valores morais, culturais e da família e dentro do princípio da igualdade do género.”[40]

O PESRAJ possui 7 (sete) áreas de abordagem, mas nos vamos referir somente a 5 (cinco) que são as que nos interessam:

- Criação de ambiente favorável para SSRAJ/DTS/HIV/SIDA e advocacia. Com esta componente visa-se desmitificar vários aspectos ligados a saúde sexual, nos pais, educadores, líderes religiosos, entre outras autoridades e a até nos próprios jovens.

No fundo e em termos hábeis o objectivo aqui é a promoção e a divulgação do que seja a saúde integral e a saúde sexual, clarificando-se a dialéctica entre a saúde sexual e saúde reprodutiva de modo a que haja uma aderência maior aos serviços que são fornecidos nos hospitais para área da saúde sexual e reprodutiva.

-Informação Educação e Comunicação para mudança de comportamento, cujo objectivo é dotar os jovens (principal grupo alvo da estratégia) de conhecimentos sobre saúde sexual e reprodutiva e sobre biologia reprodutiva, com especial enfoque para a promoção do sexo seguro, a prevenção de doenças e adiamento da idade de início da actividade sexual, que lhe permitam uma vivência mais responsável no concerne a vida sexual e reprodutiva.

Esta componente comporta ainda o combate a práticas tradicionais contrárias a saúde sexual e reprodutiva dos indivíduos, desencorajando-se as mesmas por meio da informação e de acções concretas

- Fortalecimento da capacidade técnica e formação. Esta componente que prevê a reforma curricular na qual se espera integrar uma vertente de saúde dos adolescentes, nos programas de formação dos profissionais de saúde e dos médicos.

- Provisão de serviços e aumento de sua utilização, cujo objectivo é primeiro o incentivo ao uso dos serviços existentes e segundo a ampliação e melhoramento dos mesmos serviços.

Entre os serviços prestados

- Envolvimento dos jovens e melhoria de suas habilidades para a vida. O grupo alvo desta política são os jovens e ela prevê especialmente nesta componente, o envolvimento dos jovens no processo de elaboração, na tomada de decisão e na implementação dos programas.

Esta democratização da estratégia permite primeiro, que seja mais abrangente e por ultimo que seja mais eficiente e eficaz, afinal de contas os jovens sabem melhor que ninguém como chegar aos seus semelhantes, neste caso a outros jovens.

5.1.2.5.Estratégia Nacional de Prevenção e tratamento de  fístula obstétrica

A fístula obstétrica “é uma lesão que resulta de um trabalho de parto complicado, demorado, e sem assistência médica adequada”[41]. Estas lesões podem causar a infertilidade[42], estando em causa aqui um direito de saúde sexual, e reprodutiva em particular, caso não haja provimento de serviços de saúde que permitem o seu tratamento.

Têm sido apontados como causas da fístula obstétrica[43], a fraca acessibilidade às unidades sanitárias, a insuficiente rede de cobertura ao parto, a fraca preparação dos técnicos de saúde e os casamentos prematuros.

Porque um índice elevado de mortalidade das gestantes pós-parto ou no decurso do mesmo era devido a fístula obstétrica, o Governo adoptou em 2012 a Estratégia Nacional de Prevenção e tratamento da fístula obstétrica (FO), com o objectivo principal de “reduzir a incidência e prevalência das Fístulas Obstétricas através de actividades de advocacia, prevenção, tratamento e reintegração social/reabilitação física e psicológica das mulheres que vivem com Fístula Obstétrica”[44]

Esta estratégia prevê seis áreas de Intervenção com vista alcançar o objectivo da estratégia:

- Melhorar o ambiente político e social, através da IEC e advocacia, para a redução da prevalência das FO, que consiste na promoção e educação em saúde sexual e reprodutiva com vista redução da incidência, do estigma e a discriminação face às FO. Estas acções tem como grupo alvo: família, comunidade, professores, lideres (políticos, religiosos e comunitários), legisladores e ONGs

- Aumentar a capacidade do sector Saúde na prevenção e rastreio de FO, na qual se integram actividades de planeamento familiar, partos institucionais e cuidados pós-parto para adolescentes e jovens e a integração de conteúdos de prevenção das FO nos programas de saúde e nos curricula de formação formal.

- Aumentar a capacidade dos profissionais de Saúde, no tratamento e reparação de FO, o que pressupõe a introdução de serviços de reparação das FO a nível das unidades sanitárias, com especial atenção as zonas rurais

- Assegurar a provisão de serviços de integração social para as sobreviventes de FO, o que pressupõe um estudo sobre quadro clinico geral das mulheres com a FO, de modo a elaborar um plano de resposta apto a resolver os seus problemas. Criar serviços clínicos de reparação e tratamento das FO, Serviços que deverão estar equipados com Kits cirúrgicos e de tratamento.

-Estabelecer os mecanismos de gestão e financiamento das actividades de prevenção e tratamento das FO, criando um grupo de trabalho multidisciplinar constituído por várias instituições directamente ligadas ao assunto.

Todas estas políticas (Internacionais e internas) prevêm um mecanismo de avaliação e monitoria das mesmas, que precisam funcionar e fazer um rastreio real da situação da implementação das políticas de modo a garantir que não políticas no mero plano formal, mas políticas implementadas na prática.

De um modo geral, quer parecer que não temos aqui um problema de existência de políticas, políticas existem, por uma questão prática mostra-se necessária a aprovação de uma política central de protecção destes direitos que poderia ser desintegrada atendendo a especificidade de cada direito contido nela.

Mas há um quadro de políticas que não nos permitem dizer que o estado nada faz e tem feito para a promoção e protecção destes direitos e pensamos que com o tempo chegamos a era “Direitos Humanos”

 A elaboração de políticas de saúde e em especial as políticas de saúde no âmbito dos DSSR deve “estar voltadas para a justiça social, e para isso, elas tem de ser formuladas e executadas, levando em conta as desigualdades de género, de classe, de raça e de expressão sexual ”[45].

Estas políticas exprimem este facto e em alguns casos dão primazia aos adolescentes, jovens e mulheres de modo a garantir o acesso igualitário (no plano material) aos serviços de saúde sexual e reprodutiva.

Mas muitas das políticas senão todas, ignoram os Direitos de saúde sexual e reprodutiva das pessoas cuja orientação sexual não seja hétero. Este facto é violador destes direitos, portanto, devia haver um trabalho de revisão das políticas e alicerçar este grupo vulnerável nas mesmas, de modo a que possam exercer os seus direitos.

5.2.Acções desencadeadas por outras autoridades

5.2.1.Assembleia da República

Como afirma o Prof. Jorge Miranda “o acesso ao direito é o acesso ao conhecimento do direito”[46], conhecimento este que só é possível após a sua consagração em um texto legal. Nestes termos, entendemos que antes é preciso estudar o que de ponto de vista legal foi feito de modo a proporcionar um ambiente propício ao gozo, protecção e garantia destes direitos.

A Assembleia da República ainda não aprovou uma lei que regula de forma especial os direitos de saúde sexual e reprodutiva, quanto menos dos direitos sexuais e reprodutivos. Como referimos anteriormente muitos deles resultam de tratados internacionais dos quais poucos foram domesticados o que põe em causa a efectividade dos mesmos, pois como referiu a Dra. Terezinha “os tribunais não aplicam as normas do direito Internacional assumidas pelo estado moçambicano”[47]. Parece que a compreensão dos nossos juízes em relação ao princípio da legalidade é de que este significa aplicar o direito interno.

Mas esta falta de sensibilidade em relação aos direitos de saúde sexual e reprodutiva não é exclusividade do nosso estado, a nível Internacional ainda não foi aprovada uma convenção relativa a estes direitos. Mas esta não pode ser em algum momento uma desculpa para não se adoptar legislação específica para estes direitos. O facto da comunidade internacional não ter adoptado uma convenção não nos impede de ser inovadores, até porque temos a experiencia do Brasil que instituiu um quadro legal para protecção destes direitos e adoptou políticas públicas que protegem largamente estes direitos.

Assim, apesar de não ser nenhum El dourado dos direitos humanos, pensamos que há muita experiencia boa que se pode colher do regime instituído para a protecção dos DSSR no Brasil[48].

5.2.2.A Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH)

A CNDH foi criada pela lei 33/2009[49] de 22 de Dezembro. É Pessoa Coletiva de Direito público e goza de autonomia administrativa e funcional (art.º 3).

 Dentre as funções que lhe estão reservadas há duas muito importantes no âmbito da nossa abordagem que são:

-“Promover, proteger e defender os direitos humanos ” (al. a do art.º 5 da referida lei).

-Impulsionar na adopção de leis que visam a protecção de normas que protejam os direitos humanos, faculdade esta que resulta disposto na al. c) do art.º 5

Nestes termos a CNDH deve agir de forma proactiva de modo a promover os direitos de saúde sexual e reprodutiva. Garantir que o conhecimento acerca dos mesmos se desconcentre dos centros urbanos e ainda nesses centros urbanos que se desconcentre do centro para as periferias.

Este é um órgão que pelo menos em termos legais foi democratizado, permitindo o acesso aos indivíduos singularmente considerados para peticionar face ao órgão (nº 1 do art.º 4 do estatuto)

O carácter público do organismo lhe faz gozar das prerrogativas que um órgão estatal dispõe:

- “Direito de agir oficiosamente face a violação grave de direitos” (nº 2 do art.º 5 do estatuto da CNDH), o “direito de obter cooperação de outras entidades públicas e dever das mesmas de cooperar” (nº1 do art.º 6 do estatuto) e o “poder de convocar entidades públicas e privadas para prestar esclarecimentos” (nº 2 do art.º 6 do estatuto)

Mas alguns inconvenientes têm afectado no desempenho desta instituição.

Em primeiro lugar é de referir que a CNDH tem apenas 1 ano de funcionamento, isto é, só tem 1 ano de existência desde que foi legalmente constituída, pese embora tenha sido criada por lei em 2009

Falávamos início que a CNDH gozava de autonomia administrativa e funcional, mas não de autonomia financeira, facto que em algum momento pode afectar no funcionamento desta, atendendo e considerando que esta visa a protecção de direitos humanos face aos abusos e violações do estado, estado este que é o mesmo que financia as suas actividades. É realmente uma questão muito controvertida que precisa ser vista com muita atenção.

Ate uns meses atras a comissão não tinha ainda instalações para poder funcionar[50]

A comissão vai apresentar o seu primeiro relatório sobre os direitos humanos em cumprimento do disposto na al. f) do art.º 5 da lei 33/2009 e espera-se que neste haja alguma referencia a violação destes direitos em Moçambique, que é um facto notório e algo urgente precisa ser feito para mudar o cenário.

5.2.3.Provedor de justiça

A constituição da República de 2004 introduziu a figura do provedor de justiça que é um “órgão com função a garantia dos direitos dos cidadãos, a defesa da legalidade e da justiça na actuação da Administração Pública”[51]. Como referimos anteriormente, a garantia de um direito passa antes pelo titular conhecer esses direitos e esse conhecimento parte necessariamente pela promoção e divulgação dos mesmos.

Nestes termos entendemos que tem o Provedor de Justiça, tem um papel preponderante na divulgação e promoção de direitos sexuais e reprodutivos no âmbito da actuação da administração pública.

É também um órgão democratizado, em termos legais, pois permite que indivíduos singularmente considerados possam peticionar (art.º 3 da lei 7/2006 de 16 de Agosto[52]) directamente a este quando um seu direito seja violado por órgão público.

Este órgão ainda não trouxe ainda resultados palpáveis das suas acções no âmbito dos direitos de saúde sexual e reprodutiva. Esperamos mais acção por parte do mesmo, porque como em toda a parte do mundo situações de assédio sexual na administração pública são frequentes.

Em linhas gerais, verificamos que não temos um órgão do estado ao qual incumbe a monitoria específica destes direitos, desde o suporte legal até a sua implementação. Achamos que a institucionalização de um órgão do género traria avanços no respeito por estes direitos.

5.3.Acções desencadeadas pelas ONGs

O movimento em prol da Promoção e Protecção e defesa Direitos de Saúde Sexual e Reprodutiva tem sido assumido com maior enfoque pelas ONGs, muitas delas de carácter feminista, ou que tenham como fim Protecção das Mulheres e dos seus Direitos.

Já referíamo-nos anteriormente que a eficácia destes direitos comportava fora da vertical, uma acepção horizontal, sendo as pessoas (singulares ou colectivas) no âmbito das relações privadas o garante das mesmas.

É inquestionável a acção das organizações não-governamentais nestes direitos, desde a sua integração no ordenamento jurídico nacional, até a sua efectivação prática no dia-a-dia. ONGs que trabalham na promoção, divulgação e defesa dos direitos sexuais e reprodutivos são muitas, eis que consideramos que só um estudo minucioso e que só aborda as acções das ONGs seria capaz de ser tão exaustivo ao ponto de falar das actividades de todas as elas que operam no nosso país. Nestes termos vamos fazer referência aqui, às acções levadas a acabo por ONGs que se destacam pelas suas acções em Moçambique.

Se destacam no nosso país, acções de ONGs como: Fórum Mulher, WLSA, Redes e a Lambda

5.3.1.O Fórum Mulher

Criada em 1994, o Fórum Mulher é uma associação, de reconhecida personalidade jurídica que tem como objectivo: “promover a igualdade, a justiça e o aumento do poder real das mulheres em Moçambique”[53]

Com vista alcançar este objectivo o fórum desenvolve acções como:

- Investigação científica que consiste na elaboração de estudos e pesquisas na área de saúde sexual e reprodutiva, tendo já produzido alguns livros, artigos científicos, periódicos entre outros materiais didáticos que promovem o respeito pelos direitos de saúde sexual, com maior enfoque para a mulher.

- Formação. O fórum tem desenvolvido acções de “Formação sobre Direitos Sexuais e Reprodutivos na perspectiva de Género para a promoção da Saúde Sexual e Reprodutiva das Adolescentes e Jovens”, nas escolas secundarias.

Estas formações têm como objectivo principal “Promover os Direitos Humanos das Mulheres através da sensibilização sobre os Direitos Sexuais e Reprodutivos com uma perspectiva de género para a promoção da saúde sexual e reprodutiva”[54].

O fórum mulher trabalha muito em coordenação, com seus parceiros assim como com outras ONGs que advogam na área dos direitos da mulher.

5.3.2.A Woman Law Southen Africa (WLSA)

A WLSA é uma ONG que opera em Moçambique[55] desde 1987. E desde a data da sua implantação no país trabalham na área da violência domestica

A WLSA tem desenvolvido várias actividades no âmbito da promoção destes direitos. O seu campo de acção está direcionado a elaboração de estudos nas áreas ligadas à Saúde Sexual e Reprodutiva, ao género, ao HIV/SIDA e outras áreas conexas. Esta actividade culminou com a elaboração de vários manuais que promovem os DSSR, e chama atenção a necessidade de maior protecção dos mesmos.

Uma particularidade da WLSA no âmbito desta actividade é o estudo profundo de práticas sociais e culturais que contrariam os direitos de saúde sexual e reprodutiva e sabemos todos que há várias práticas culturais no país que contrariam estes direitos.

A WLSA possui, ainda no plano da investigação científica, um periódico denominado “outras vozes” na qual se publicam vários artigos relativos a sexualidade e aos direitos de saúde sexual e reprodutiva.

A WLSA desenvolve ainda acções de formação para jovens organizados ou para associações juvenis (como a AMODEFU e a AEFUN), a ONP e a PRM.

A WLSA tem também no leque das suas actividades uma componente de suporte legal, na qual contribuem com opiniões e propostas de leis face a órgão com iniciativa de lei para alteração do quadro legal existente de modo a permitir o gozo destes direitos. A organização teve um papel preponderante na aprovação da Lei contra a violência domestica e na revisão do livro IV do Código Civil e consequente aprovação da lei da família (Lei 10/2004 de 25 de Agosto). Integrada na REDES, também participam com sugestões para a revisão do código penal.

Realização de debates, que tem como objectivo buscar sensibilidades e sensibilizar a sociedade sobre a necessidade de maior respeito pelos direitos de saúde sexual e reprodutiva. No corrente ano realizou em parceria com outras organizações[56] em de Setembro do corrente ano um debate público sobre Políticas Públicas, Paternidade e Igualdade de Género

5.3.3.A REDES (Rede de Defesa dos Direitos Sexuais e Reprodutivos)

A REDES é uma associação de várias ONGs[57], todas feministas que vem trabalhado no âmbito da promoção da igualdade de Género e HIV/SIDA em Moçambique.

A REDES Tem como objectivo[58]: Contribuir para a defesa dos Direitos Sexuais e Reprodutivos, aumento da cobertura do planeamento reprodutivo e tornar visível a importância dos direitos sexuais e reprodutivos para a saúde pública e para o exercício da cidadania

 A REDES tem intervindo no processo legislativo nacional, com vista a promoção dos DSSR e nesse âmbito elaboraram em Novembro de 2011 uma carta que contem uma proposta para revisão dos artigos relativos ao aborto (no sentido de se descriminalizar o aborto, para que se possa institucionalizar o aborto seguro) no quadro do processo de revisão do Código penal, dirigida ao presidente da comissão parlamentar dos assuntos jurídicos, constitucionalidade e direitos humanos.

Por sinal esta posição não foi atendida, porque o aborto continua a constar como crime nos art.ºs 163 e seguintes do ante-projecto que brevemente será aprovado. Este é um exemplo claro do que a Dra. Terezinha referiu, de que “nem sempre as recomendações são implementadas e tomadas em conta para alterar as leis e os programas do governo”[59] facto que frustra as expectativas previstas com as pesquisas que realizam.

5.3.4.A Associação Lambda (AL)

A Associação Lambda com cerca de 6 (seis) anos de existência é uma pessoa colectiva de direito privado, a operar no país, apesar de não ter ainda o reconhecimento por parte do estado moçambicano.

A Lambda tem como objectivo “a defesa e promoção dos direitos e interesses dos seus associados, bem como a promoção e garantia dos direitos humanos e sexuais dos cidadãos, especialmente os relativos à orientação sexual e identidade de género”[60].

Na prossecução desse objectivo tem realizado actividades como:

- Investigação científica na área de direitos sexuais e reprodutivos das Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transsexuais (LGBT), que culminou com a produção de vários artigos científicos, brochuras, panfletos entre outros que promovem o respeito pelos direitos de saúde sexual e reprodutiva das minorias sexuais.

Um desses estudos muito recente e muito rico em abordagem denominado “atitudes face aos homossexuais”[61] faz uma abordagem profunda acerca das percepções sobre a homossexualidade no país estudos como estes permitem um maior conhecimento sobre os mesmos, o modo como eles são concebidos e daí saber como mudar a consciência da sociedade de modo a que estas minorias sexuais possam gozar destes direitos.

A Lambda tem assumido um papel muito importante naquilo que é a defesa dos direitos das minorias sexuais, porque como podemos ver, apesar deste ambiente propício de liberdade para o exercício livre da sexualidade, ainda existe muita discriminação face aos homossexuais, tanto por parte dos provedores dos serviços de saúde como por parte da sociedade em si e o estado pouco ou nada faz[62] para reverter este cenário, seja em adopção de leis que os protejam assim como em politicas e provisão de serviços específicos da sua condição de homossexuais.

O “estudo sobre vulnerabilidade e risco de infecção pelo HIV entre Homens que fazem sexo com Homens” realizado pela Lambda revela que “poucas são as iniciativas dirigidas a grupos específicos, especialmente populações socialmente minoritárias, como é o caso dos Homens que fazem sexo com Homens (HSH) em Maputo”[63], a maior se não todas as iniciativas ligadas a promoção e divulgação dos métodos de protecção ao HIV e SIDA estão virados aos heterossexuais, facto que constitui uma violação dos direitos de saúde sexual e reprodutiva.

-Realização de debates sobre a homossexualidade. Um evento muito importante desta actividade será a realização do 1º Simpósio sobre Direitos das minorias sexuais[64], previsto para Dezembro do corrente ano na cidade capital de Moçambique.

5.3.5. Outras ONGs

Outras ONGs que embora não se destaquem como as que atrás referenciámos, sem querer ser exaustivos, advogam na área dos direitos de saúde sexual e reprodutiva: a ActionAid (que advoga na área dos direitos das Mulheres e Igualdade de Género), a “Mulher, lei e Desenvolvimento (Muleide)”, a Coalizão da Juventude ( Cujo objectivo é contribuir para a estabilidade dos adolescentes e jovens, através da promoção do seu desenvolvimento harmonioso e promover o exercício dos seus direitos sexuais e reprodutivos)

Podem ser referenciadas a Rede Moçambicana de Organizações contra a SIDA-MONASO; Rede Nacional de Associações de Pessoas Vivendo com HIV/SIDA-RENSIDA; Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade-FDC; Associação de Empresários contra SIDA – ECOSIDA; Associação Moçambicana para o Desenvolvimento da Família-AMODEFA

Estas ONGs todas têm contribuído de modo significativo para a promoção, protecção e defesa destes direitos. É de salutar as iniciativas de coordenação entre as mesmas com vista a protecção continua destes direitos, como diz o ditado “a união faz a força” e juntos há maior probabilidade de alcançar os objectivos das suas acções.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DAVID, Gerson Scolfield. Acções levadas a cabo pelo governo, ONGs e outras entidades no âmbito da promoção, protecção e divulgação dos direitos de saúde sexual e reprodutiva. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4540, 6 dez. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/33681. Acesso em: 26 abr. 2024.

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