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A possibilidade de prorrogação de contratos administrativos com sociedades empresárias que constem no rol de restritas do SICAF e do CADIN

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22/04/2016 às 13:24
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É possível a prorrogação de contratos administrativos com empresas que estejam com restrição no SICAF e no CADIN? E quanto ao pagamento de serviços já prestados?

1 - Introdução

Analisa-se neste estudo se é possível, juridicamente, a prorrogação de contratos administrativos com sociedades empresárias que estejam constando no rol de restritas do Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores - SICAF e do Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal – CADIN, bem como alguns desdobramentos.


2 - Restrição no SICAF, retenção de pagamento e possibilidade de contratação/prorrogação com a administração pública

O fundamento para retenções de pagamento às empresas com restrição no SICAF encontraria respaldo na Lei n. 8.666/93, artigo 55, inciso XIII, que acentua o seguinte:

“Art. 55. São cláusulas necessárias em todo contrato as que estabeleçam:

(...)

XIII – a obrigação do contratado de manter, durante toda a execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação.”

Com o objetivo de resguardar o interesse público, restringindo o acesso de empresas inidôneas, assim consideradas pela legislação federal, de participarem de certames com a Administração Pública, editou-se o Decreto n°. 3.722, de 09 de janeiro de 2001, posteriormente alterado pelo Decreto n°. 4.485/2002, cujo art. 1°, § 1°, inciso I e II, que trata da emissão da nota de empenho, assim dispõe, verbis:

“I – como condição necessária para emissão de nota de empenho, cada administração deverá realizar prévia consulta ao SICAF, para identificar possível proibição de contratar com o Poder Público; (...)”;

II – “nos casos em que houver necessidade de assinatura do instrumento de contrato, e o proponente homologado não estiver inscrito no SICAF, o seu cadastramento deverá ser feito pela Administração, sem ônus para o proponente, antes da contratação, com base no reexame da documentação apresentada para habilitação, devidamente atualizada.”

Como se observa dos textos acima, não há determinação para a suspensão de pagamento de serviços prestados, contendo apenas a determinação de realização de consulta prévia à emissão da nota de empenho, para identificar possível proibição de contratar com o Poder Público, o que indica medida para o futuro, e não relativa ao contrato cumprido.

Vale mencionar que a Instrução Normativa MARE nº. 5, de 21.07.1995, também regulamenta o assunto, mas não traz dispositivos impedindo o pagamento por serviços já realizados.

De todo caso, ainda que o decreto ou a Instrução Normativa MARE nº. 5, de 21.07.1995, fossem específicos e restringissem o pagamento por irregularidades cadastrais no SICAF, o que não o fazem, repita-se, seriam de duvidosa legalidade, senão vejamos.

A retenção da contraprestação por parte da Administração em face dos serviços executados pelas contratadas pode consubstanciar enriquecimento sem causa, e ainda coloca em risco a continuidade da atividade empresarial das empresas, eis que pode ensejar atraso no pagamento a seus empregados e das contribuições ou tributos devidos, resultando num círculo sem fim, a empresa não cumpre com seus encargos porque não recebe da Administração e esta não paga o que deve às empresas porque estas se encontram irregulares com suas obrigações tributárias.

Assim, resta incontroverso que a retenção de pagamentos por serviços realizados em decorrência de inadimplência junto ao SICAF não possui amparo legal e não encontra respaldo no Judiciário, que considera irregular a retenção de valores devidos por serviços já prestados pelas empresas contratadas pelo Poder Público, entendendo configurar hipótese de enriquecimento ilícito da Administração.

Esse é o entendimento do TRF da 1ª Região, além dos outros Tribunais Regionais, como se pode ver pela amostra a seguir:

“ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRATOS DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. RETENÇÃO DE PAGAMENTO POR IRREGULARIDADE JUNTO AO SISTEMA DE CADASTRAMENTO UNIFICADO DE FORNECEDORES - SICAF. ILEGITIMIDADE.

1. Ilegítimo o ato administrativo de reter o pagamento de serviços já prestados, oriundos de contrato administrativo, em razão de a empresa contratada encontrar-se em situação irregular perante o SICAF, porque inexiste amparo legal para tanto, bem como implica enriquecimento ilícito.

2. Apelação do DNIT e remessa oficial desprovidas.

(TRF 1ª Região; AC 2004.34.00.020221-3/DF; Relator: Desembargador Federal Fagundes De Deus; Julgamento: 17/12/2008; Publicação: 27/02/2009, e-DJF1, p.281)”

“ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. CONTRATO CELEBRADO COM EMPRESA PARA FORNECIMENTO DE REFEIÇÕES. SERVIÇOS PRESTADOS. RETENÇÃO DO PAGAMENTO SOB A ALEGAÇÃO DE IRREGULARIDADE NO SICAF. IMPOSSIBILIDADE.

O Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores – SICAF tem como finalidade cadastrar e habilitar, parcialmente, pessoas físicas e jurídicas interessadas em participar de licitações realizadas pelas entidades da Administração Pública Federal, tendo como base legal disposto no art. 34, da Lei nº 8.666/93 - Nos termos da lei, a comprovação de regularidade dos licitantes perante o Sistema de Cadastramento Unificado de Fornecedores – SICAF, somente é exigida por ocasião da fase de habilitação, não havendo qualquer previsão no sentido de que tal exigência também deve ser observada quando da execução do contrato.

Como ato normativo secundário, não pode a Instrução Normativa MARE nº 05/95 condicionar o pagamento dos valores devidos pelo órgão licitante à comprovação de regularidade do contratado perante o SICAF, sob pena de violação ao Princípio da Legalidade e configuração de abuso do poder regulamentar.

A retenção do pagamento em virtude de irregularidade do contratado perante o SICAF configura verdadeiro enriquecimento ilícito por parte da Administração Pública, o que é vedado pelo ordenamento jurídico brasileiro, sobretudo porque os serviços foram inteira e satisfatoriamente prestados.

Recurso e remessa improvidos.

(TRF 2ª Região; AMS 44894; Processo: 200151010184160/RJ; Relator: Desembargador Federal RICARDO REGUEIRA; Julgamento: 28/03/2007; Publicação: DJU, 16/04/2007, p. 254)”

“Administrativo. Contrato de prestação de serviços. Realização do serviço. Empresa contratada inscrita no SICAF. A retenção dos pagamentos dos serviços prestados importa em enriquecimento ilícito por parte da Administração Pública. Precedentes. Agravo de instrumento improvido.

(TRF 5ª Região; AG 66244; Processo: 200605000001720/RN; Relator: Desembargador Federal Lazaro Guimarães; Julgamento: 29/08/2006; Publicação: DJ, 13/10/2006, p. 1125)”

“ADMINISTRATIVO. SUSPENSÃO DO PAGAMENTO. SERVIÇOS EFETIVAMENTE PRESTADOS. REGULARIDADE PERANTE O SICAF.

I. A recusa em efetuar o pagamento dos serviços efetivamente prestados à administração pública, executados em razão de contrato administrativo, sob o argumento de irregularidade da contratada perante o SICAF, implica o enriquecimento ilícito da administração. Precedentes do TRF da 1ª Região.

II. Remessa oficial improvida.

(TRF 5ª Região; REO 88220; Processo: 200383000231680/PE; Relator: Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho; Julgamento: 31/05/2005; Publicação: DJ, 05/07/2005, p. 443)”

“PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RETENÇÃO DE PAGAMENTO. SERVIÇOS REGULARMENTE CONTRATADOS E EFETIVAMENTE PRESTADOS. IRREGULARIDADE PERANTE O SICAF. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. ENRIQUECIMENTO INDEVIDO DA ADMINISTRAÇÃO.

1. É ilegal a retenção de pagamento devido em função de serviços regularmente contratados e efetivamente prestados ao argumento de que a contratada está em situação irregular perante o SICAF, por ausência de previsão legal e por configurar enriquecimento ilícito da Administração Pública.

2. O artigo 1º, § 1º, inc. I do Decreto 3.722/01 impõe a consulta prévia ao SICAF tão-somente para identificar eventual proibição de contratar com o Poder Público, nada dispondo acerca da suspensão do pagamento de serviços contratados e prestados.

3. Agravo de instrumento improvido.

(AG 2003.01.00.035327-7/DF, Quinta Turma, Rel. Desembargadora Federal Selene Maria de Almeida, DJ 08/03/2004, p. 106)”

“MANDADO DE SEGURANÇA. INSCRIÇÃO NO SICAF. LIBERAÇÃO DE VERBA POR SERVIÇOS JÁ PRESTADOS.

1. A inscrição em cadastro de inadimplentes é motivo que impede a participação na licitação e a assinatura de contrato, mas não o pagamento por serviço já executado a contento, sob pena de enriquecimento ilícito da Administração.

2. Nega-se provimento ao agravo de instrumento.

(AG 2003.01.00.012293-9/DF, Sexta Turma, Rel. Desembargadora Federal Maria Isabel Gallotti Rodrigues, DJ 15/09/2003, p. 105)”

Não bastasse, é também o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

“ADMINISTRATIVO. CONTRATO. ECT. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE. DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE MANTER A REGULARIDADE FISCAL. RETENÇÃO DO PAGAMENTO DAS FATURAS. IMPOSSIBILIDADE.

1. A exigência de regularidade fiscal para a participação no procedimento licitatório funda-se na Constituição Federal, que dispõe no § 3º do art. 195 que "a pessoa jurídica em débito com o sistema da seguridade social, como estabelecido em lei, não poderá contratar com o Poder Público nem dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios", e deve ser mantida durante toda a execução do contrato, consoante o art. 55 da Lei 8.666/93.

2. O ato administrativo, no Estado Democrático de Direito, está subordinado ao princípio da legalidade (CF/88, arts. 5º, II, 37, caput, 84, IV), o que equivale assentar que a Administração poderá atuar tão-somente de acordo com o que a lei determina.

3. Deveras, não constando do rol do art. 87 da Lei 8.666/93 a retenção do pagamento pelo serviços prestados, não poderia a ECT aplicar a referida sanção à empresa contratada, sob pena de violação ao princípio constitucional da legalidade. Destarte, o descumprimento de cláusula contratual pode até ensejar, eventualmente, a rescisão do contrato (art. 78 da Lei de Licitações), mas não autoriza a recorrente a suspender o pagamento das faturas e, ao mesmo tempo, exigir da empresa contratada a prestação dos serviços.

4. Consoante a melhor doutrina, a supremacia constitucional "não significa que a Administração esteja autorizada a reter pagamentos ou opor-se ao cumprimento de seus deveres contratuais sob alegação de que o particular encontra-se em dívida com a Fazenda Nacional ou outras instituições. A administração poderá comunicar ao órgão competente a existência de crédito em favor do particular para serem adotadas as providências adequadas. A retenção de pagamentos, pura e simplesmente, caracterizará ato abusivo, passível de ataque inclusive através de mandado de segurança." (Marçal Justen Filho.

Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, São Paulo, Editora Dialética, 2002, p. 549).

5. Recurso especial a que se nega provimento.

(REsp 633432 / MG; Relator: Ministro LUIZ FUX, Julgamento: 22/02/2005; Publicação: DJ, 20/06/2005, p. 141)”

“ADMINISTRATIVO. CONTRATO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS.  RETENÇÃO DE

PAGAMENTO. VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 368 E 373 DO CÓDIGO CIVIL. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO.

1. A ausência de prequestionamento dos dispositivos legais tidos por violados - artigos  368 e 373 do Código Civil - impede o conhecimento do recurso especial. Incidência das Súmulas 282 e 356/STF.

2. Pode a Administração rescindir o contrato em razão de descumprimento de uma de suas cláusulas e ainda imputar penalidade ao contratado descumpridor. Todavia a retenção do pagamento devido, por não constar do rol do art. 87 da Lei nº 8.666/93, ofende o princípio da legalidade, insculpido na Carta Magna.

3. Agravo regimental não provido.

(AgRg no Ag 1030498/RO, Relator: Ministro CASTRO MEIRA; Julgamento: 09/09/2008; Publicação: DJe 10/10/2008).”

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“RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE "QUENTINHAS". SERVIÇOS PRESTADOS AO DISTRITO FEDERAL. RETENÇÃO DO PAGAMENTO PELA NÃO-COMPROVAÇÃO DA REGULARIDADE FISCAL. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA E LEGALIDADE.

Não se afigura legítima a retenção do pagamento do serviço prestado, após a efetivação do contrato e a prestação dos serviços contratados, pelo fato de a empresa contratada não comprovar sua regularidade fiscal.

Como bem asseverou a Corte de origem, "se a Administração, no momento da habilitação dos concorrentes, não exige certidão de regularidade fiscal (Lei 8.666/93, art. 29, III), não pode, após contratar e receber os serviços, deixar de pagá-los, invocando, para tanto, decreto regulamentar" (fl. 107).

Recebida a prestação executada pelo contratado, não pode a Administração se locupletar indevidamente, e, ao argumento da não-comprovação da quitação dos débitos perante a Fazenda Pública, reter os valores devidos por serviços já prestados, o que configura violação ao princípio da moralidade administrativa. Precedentes.

Na lição de Marçal Justen Filho, a Administração não está autorizada a "reter pagamentos ou opor-se ao cumprimento de seus deveres contratuais sob alegação de que o particular encontra-se em dívida com a Fazenda Nacional ou com outras instituições" ("Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, 9ª ed. São Paulo: 2002, Dialética, p. 549).

Recurso especial improvido.

(REsp 730800/DF, Rel. Ministro  FRANCIULLI NETTO, SEGUNDA TURMA, julgado em 06.09.2005, DJ 21.03.2006 p. 115)”

Portanto, a simples retenção dos pagamentos, após a realização dos serviços, por descumprimento do inciso XIII do artigo 55 da Lei nº 8.666/93, em especial a irregularidade junto ao SICAF/CADIN, não encontra guarida no ordenamento jurídico, tanto que o Judiciário, como registrado acima, reiteradamente reconhece o direito às empresas que buscam a liberação dos pagamentos.

Observa-se que, posteriormente à liberação judicial dos pagamentos retidos sob o argumento de irregularidade junto ao SICAF, os contratados costumam ingressar com nova medida judicial, reclamando o pagamento de juros, correção monetária e outros prejuízos, o que, certamente, provoca sérios danos ao erário.

Em casos de tais ações, além da defesa obrigatória do órgão/entidade da Administração, que é feita pelo órgão competente da AGU, algumas Consultorias Jurídicas fazem as seguintes recomendações aos respectivos administradores:

i) comunique oficialmente, especificando objetiva e claramente a irregularidade verificada, à empresa que o descumprimento do inciso XIII, do artigo 55 da lei 8666/93 configura inadimplência contratual e poderá ensejar a sua rescisão/paralisação sem prejuízo das multas correspondentes;

ii) comunique a todos os entes (municipais/estaduais/federais) que ensejaram a inclusão da empresa no cadastro do SICAF da existência de crédito pendente da empresa para que estes tomem as devidas providências a fim de resguardar os interesses da coletividade; e

iii) após prazo razoável da comunicação à empresa (30 dias), caso não seja regularizada a situação, ou devidamente justificada, que se proceda à referida rescisão/paralisação contratual, com a aplicação das multas cabíveis, sob pena de responsabilização judicial/administrativa, por descumprimento do citado dispositivo legal.

Ocorre que à Administração nem sempre é conveniente e oportuno rescisão/paralisação contratual em plena execução de seu objeto, tendo em vista que, em muitos casos, essas medidas, se adotadas, resultariam em prejuízo maior ao erário e à sociedade em geral do que a continuação do contrato com a execução das obras contratadas, ainda que a contratada esteja irregular junto ao SICAF.

Apenas para figurar, imagine-se a construção de uma ponte em que a irregularidade cadastral ocorra no meio da execução do contrato, com metade das obras concluídas. O que fazer? Paralisa-se a obra faltando a outra metade da ponte? Abre-se nova licitação ou contrata-se a empresa seguinte na ordem de classificação? Ou, ainda, deixa-se o contrato continuar para que sejam concluídas as obras restantes e a ponte seja totalmente concluída o mais rápido possível?

Ora, sabe-se que a exclusão da contratada e a opção pela abertura de novo procedimento licitatório ou a contratação da segunda colocada no certame original pode levar meses, em muitos casos até anos, devido a entraves burocráticos, realocação de equipamentos ou mesmo ausência de recursos, resultando, no mais das vezes, em obras inacabadas cujos efeitos dispensam maiores esclarecimentos.

Assim, nessa hipótese, a toda evidência, meia ponte equivale a nenhuma ponte, o resultado é o mesmo, não restando dúvidas de que a melhor solução é a continuidade das obras. Mas a contratada não pode continuar a executar o contrato se não houver a contrapartida, cujo pagamento encontra-se retido devido às irregularidades cadastrais. Como resolver o impasse?

Atualmente tem-se resolvido com medidas judiciais, o que não é o melhor caminho, pois, além de criar demandas cujo resultado já se sabe – o deferimento do pedido da contratada -, acaba-se por abarrotar o judiciário com causas desnecessárias, gerando prejuízos, em último caso à própria Administração, e gera, ainda, outra demanda, qual seja, reclamação pelo pagamento de juros, correção monetária e outros prejuízos, o que certamente provoca mais danos ao erário.

Portanto, nos casos em que o serviço contratado foi devidamente prestado, mas não foi quitado em razão de pendência no SICAF, e para evitar enriquecimento ilícito da Administração, frise-se que a Lei nº 8.666/93 prevê a possibilidade de pagamento pelos serviços decorrentes do contrato nulo, a título de indenização. Nesse sentido, o art. 59 da citada Lei fornece o regramento aplicável aos efeitos decorrentes dos contratos administrativos nulos, estabelecendo:

“Art. 59 – A declaração de nulidade do contrato administrativo opera retroativamente, impedindo os efeitos jurídicos que ele, ordinariamente, deveria produzir, além de desconstituir os já produzidos.

Parágrafo único – A nulidade não exonera a Administração do dever de indenizar o contratado pelo que houver executado até a data em que ela for declarada e por outros prejuízos regularmente comprovados, contanto que não lhe seja imputável, promovendo-se a responsabilidade de quem lhe deu causa.”

Assim, à vista do disposto no parágrafo único do artigo 59, não está a Administração Pública dispensada do pagamento de eventuais serviços prestados por qualquer contratada, sob pena de se violar o princípio geral de direito que veda o enriquecimento sem causa.

A propósito do tema, o eminente administrativista Marçal Justen Filho ensina:

“A questão se torna ainda mais complexa se o terceiro tiver executado, total ou parcialmente, as prestações que o contrato (nulo) lhe impunha. A Administração Pública tem de arcar com as consequências dos atos praticados por seus agentes. Em caso de ato lesivo ao particular, a Administração está obrigada a indenizar, de modo mais amplo e complexo, as perdas e danos daquele derivado. Nem se pode cogitar de enriquecimento sem causa da Administração Pública. Se a Administração recebesse a prestação executada pelo particular e se recusasse a cumprir o contrato por invocar sua nulidade, haverá seu locupletamento indevido. (Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Ed. Dialética, 2000, p. 534)”

Nesse sentido, também é a Orientação Normativa AGU n.º 04, de 1º de abril de 2009, inclusive quanto ao reconhecimento da obrigação de indenizar: “A despesa sem cobertura contratual deverá ser objeto de reconhecimento da obrigação de indenizar nos termos do art. 59, parágrafo único, da Lei n.º 8.666/1993, sem prejuízo da apuração da responsabilidade de quem lhe der causa”.

Ressalte-se, ainda, que o procedimento de indenização de despesas deve ser utilizado somente em caráter excepcional, devendo a Administração adotar medidas com o fim de erradicar a descontinuidade contratual, para proceder a instauração de novo procedimento licitatório, se for o caso.

Assim, mesmo que seja juridicamente possível reconhecer dívida decorrente de prestação de serviços sem a necessária cobertura contratual e realizar seu pagamento, isto não faz deste um expediente de que a Administração possa se servir alternativa ou corriqueiramente.

Repita-se, então, que eventual irregularidade no SICAF não deve ser óbice ao pagamento do serviço já prestado às contratadas, salvo na existência de pendências com os encargos trabalhistas, cujo acerto deverá envolver os empregados, com o fito de evitar a condenação subsidiária da Administração.

Sobre a questão referente à possibilidade ou não de se prorrogar os contratos nos casos em que as empresas estejam com restrição no SICAF, entende-se que a regra é a da não possibilidade. Todavia, quando o administrador avaliar e concluir que poderá haver graves prejuízos à Administração em caso de rescisão de contratos, nesses casos as demandas devem ser encaminhadas às respectivas Consultorias Jurídicas, para melhor exame.

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Sobre o autor
João José Alves da Silva

Procurador Federal. Especialista em Direito Público.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, João José Alves. A possibilidade de prorrogação de contratos administrativos com sociedades empresárias que constem no rol de restritas do SICAF e do CADIN. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4678, 22 abr. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/34594. Acesso em: 22 dez. 2024.

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