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ICMS ecológico como instrumento de preservação ambiental:

importância de sua implementação no estado do Amazonas

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19/02/2015 às 13:35
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1. TRIBUTOS E A EXTRAFISCALIDADE 

1.1. Tributação 

O Estado tem por finalidade regular a vida humana em sociedade, desenvolvendo atividades políticas, econômicas, sociais, administrativas, financeiras e educacionais, para a realização do bem comum com a satisfação das necessidades públicas.

Com o escopo de arrecadar as receitas cogentes para a efetivação de tais atividades, a Administração Pública possui o poder de tributar, definido por um conjunto de princípios constitucionais tributários, que preceituam igualmente as limitações desse poder, os procedimentos administrativos públicos para o lançamento, a fiscalização e a cobrança dos tributos, e a repartição das correspondentes receitas em um regime federativo.

Nestes termos, o conceito de tributo está previsto no artigo 3°, do Código Tributário Nacional (CTN), podendo ser definido como “toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituído em lei e cobrado mediante atividade administrativa plenamente vinculada”. 

Destarte, o tributo deve ser pago em dinheiro, não em serviços, tampouco em trabalho ou bens. Para aqueles tributos cujo valor não é previsto em reais, admite-se a cobrança por meio dos indexadores. O dever de pagar o tributo é obrigatório, não decorrendo da manifestação de vontade do devedor. Distingue-se de penalidade, tendo em vista que esta, ao contrário daquela, decorre de ato ilícito. Por fim, a obrigação tributária é diretamente decorrente de lei, com base constitucional especificamente expressa no princípio da estrita legalidade em matéria tributária, previsto no artigo 150, inciso I, da Carta Magna. 

1.2. Espécies Tributárias 

1.2.1.  Impostos 

Segundo previsão no artigo 16, do CTN, os impostos são tributos cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal vinculada, concernente ao sujeito passivo da obrigação tributária. Possuem efeito fiscal, tendo por objetivo a arrecadação de receitas para cobrir as despesas públicas.

Diante da crise ambiental, já se torna possível e necessária a ressignificação do imposto para que cumpra também uma finalidade sustentável. Neste sentido, afirma Oliveira (1999, p. 72):

Alerte-se que o imposto verde não é necessariamente sinônimo de imposto novo. Frequentemente, ele é uma aplicação especial dos impostos existentes visando à defesa do meio ambiente. Com criatividade, é possível adaptar os tributos conhecidos à finalidade preservacionista, em que o poluidor é levado a não poluir, ou a reduzir a poluição, para não ser tributado ou ter carga tributária reduzida, e o não poluidor é isentado. 

Neste diapasão, já se conceitua os impostos ambientais em sentido próprio e impróprio. Os primeiros possuem como principal objetivo a prevenção e precaução dos danos ambientais, atuando diretamente sobre os comportamentos empresariais, com a estimulação da adoção de práticas sustentáveis, a fim de resguardar possíveis danos ambientais. Já os impróprios visam a recuperação do equilíbrio ecológico, com a obtenção de receitas para serem aplicadas em projetos de defesa ambiental e a indenização da população pelos danos causados pelas práticas lesivas ao meio ambiente.

Assim, no sistema tributário nacional é possível observar a aplicação do imposto ambiental no Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, Imposto Territorial Rural - ITR, Imposto Predial e Territorial Urbano - IPTU, Imposto sobre a Propriedade dos Veículos Automotores - IPVA e Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS Ecológico, o qual será abordado a diante.

1.2.2. Taxas 

A taxa, por sua vez, é um tributo vinculado a uma atuação do Estado, específica e divisível, relativa ao contribuinte. Tem como fato gerador a utilização, efetiva ou potencial, dos serviços públicos, bem como o exercício regular do poder de polícia, que é um poder de fiscalização, prestado ao contribuinte ou posto a sua disposição, conforme previsão do artigo 77, do CTN.

Na seara ambiental, informa Oliveira (1999, p. 57-58):

No direito brasileiro, à luz do artigo 77 do CTN, parecem admissíveis como fato geradores o licenciamento, a fiscalização e a limpeza ou recuperação ambiental, guardando uma razoável equivalência com o custo dos serviços públicos de licenciamento e fiscalização, e da limpeza ou recuperação ambiental correlacionáveis, exemplificativamente, a situações individuais dos contribuintes (tipo de estabelecimento/instalações/atividades, área fiscalizada, etc.) e aos volumes de emissões, despejos ou produção de resíduos poluidores. 

Contudo, afirmam Fiorillo e Ferreira (2005, p. 120) “ser extremamente difícil a instituição de taxa voltada à preservação do meio ambiente, que não fira os preceitos e o direcionamento traduzido pela Carta de 1988 em relação à sua espécie tributária”.

Conclui-se, portanto, que uma taxa de preservação ambiental somente pode ser criada caso respeite as limitações constitucionais e axiológicas do correspondente tipo tributário, observados o fato gerador e a vinculação de suas receitas.

1.2.3. Contribuições de Melhoria 

As contribuições de melhoria se originam da realização de obra pública que implique valorização de imóvel do contribuinte, tendo como limite total a despesa realizada e a despesa individual o valor que a obra resultar para cada imóvel beneficiado, mediante artigo 145, inciso III, da Constituição Federal.

Segundo Geraldo Ataliba (1964, p. 11), a “contribuição de melhoria é o tributo que onera os sobrevalores imobiliários consequentes a obras públicas, sem considerar a capacidade contributiva”.

Ou seja, atribui à contribuição de melhoria um caráter de tributo propter rem, vinculado, assim, diretamente ao imóvel valorizado pela obra pública, e não à pessoa do contribuinte em si, não sendo, por isto, uma espécie tributária adstrita ao princípio da capacidade contributiva, posto que não se exige do proprietário do imóvel patrimônio líquido, além do imobilizado no bem valorizado pela obra pública.

Na prática, as contribuições de melhoria dificilmente são cobradas e observar-se que estas poderiam valer-se como um bom instrumento de utilização ambiental, com a construção de praças, rede de esgotos, etc., da mesma forma poder-se-ia aplicar às taxas. 

1.2.4. Empréstimos Compulsórios

Os empréstimos compulsórios são constituídos por lei complementar e têm por finalidade buscar receitas para o Estado a fim de promover o financiamento de despesas extraordinárias ou urgentes, quando o  interesse nacional esteja presente, conforme estabelecido no artigo 148 da CF: 

Art. 148 - A União, mediante lei complementar, poderá instituir Empréstimo Compulsório:

I - para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência;

II - no caso de investimento público de caráter urgente e de relevante interesse nacional, observado o disposto no Art. 150, III, (b).

Parágrafo único - A aplicação dos recursos provenientes de empréstimo compulsório será vinculada à despesa que fundamentou sua instituição. 

Não é possível a aplicação do empréstimo compulsório na esfera da proteção ambiental, em virtude de já estarem estabelecidas as hipóteses constitucionais em que o mesmo poderá ser utilizado.

1.2.5. Contribuições Parafiscais 

As contribuições parafiscais são tributos instituídos para promover o financiamento de atividades públicas. São, portanto, tributos finalísticos, nos quais sua essência pode ser encontrada no destino dado, pela lei, ao que foi arrecadado.

Previstos no artigo 149, a Constituição fez uma divisão teleológica destas contribuições, atendendo a determinadas funções estatais ou públicas. Nestes termos, destaca Greco (2000, p. 135):

Nesta norma atributiva de competência para instituir a exação, tipifica-se uma validação finalística, de modo que as leis instituidoras estarão em sintonia com a Constituição, e dentro do respectivo âmbito de competência, se atenderem às finalidades identificadas a partir das ‘áreas de atuação’ qualificadas pelo art. 149.

Uma espécie de contribuição especial aplicada ao meio ambiente é a Contribuição de Intervenção no Desenvolvimento Econômico (CIDE) – Combustíveis, que tem por finalidade o financiamento de projetos ambientais para a redução das externalidades negativas geradas pela indústria de petróleo e gás, bem como o incentivo de projetos de recuperação e pesquisa ambiental, que visem novas fórmulas de combustíveis renováveis e menos poluentes, na busca pela sustentabilidade econômica. 

1.3. Extrafiscalidade Tributária

A função fiscal dos tributos serve como um meio de custear os gastos comuns e básicos do Estado, nas áreas da saúde, da educação, da assistência social, etc. Ocorre que, por diversas vezes, o Estado age com vistas a regular o mercado ou a economia do país, buscando incentivar comportamentos econômicos, a fim de proteger os valores previstos na Carta Magna, dentre eles os valores sociais e ambientais, sendo esta sua atuação extrafiscal.

Nestes termos, o artigo 151, inciso I, da Carta Magna prevê a possibilidade da concessão de incentivos fiscais que tenham como objetivo o equilíbrio do desenvolvimento socioeconômico entre os entes que compõe a federação brasileira, autorizando que os tributos possam ser instituídos com outros objetivos que não sejam o da mera arrecadação financeira.

Para Berti (2006, p. 13):

O tributo, além de constituir um importante instrumento para financiar os gastos públicos referentes à prestação de serviços que visam a satisfazer às necessidades da coletividade, é utilizado também em algumas ocasiões como instrumento de política extrafiscal do governo, regulamentando o mercado financeiro, estimulando ou não, as importações, fomentando o crescimento industrial e o desenvolvimento de algumas regiões específicas, tudo ao sabor da política adotada pelos governantes, responsáveis pela gestão da máquina pública.

Também explana Melo (2008, p. 404) que a extrafiscalidade restará demonstrada quando “o Poder Público estabelece situações desonerativas de gravames tributários, mediante a concessão de incentivos e benefícios fiscais, com o natural objeto de estimular o contribuinte à adoção de determinados comportamentos”.

Conforme os ensinamentos de Ataliba (1990, p. 233):

Consiste a extrafiscalidade no uso de instrumentos tributários para a obtenção de finalidades não arrecadatórias, mas estimulantes, indutoras ou coibidoras de comportamentos, tendo em vista outros fins, a realização de outros valores constitucionalmente consagrados.

Assim, por meio da tributação extrafiscal é possível chegar ao desenvolvimento sustentável e à justiça social, na qual a extrafiscalidade poderá ser implantada pelo Estado como instrumento de incentivo, fiscalização, estímulo ou desestímulo das atividades econômicas que preservem ou depredem o meio ambiente.

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Neste sentido, variados instrumentos de incentivos podem ser utilizados para produzir esse aspecto extrafiscal a determinado tributo, como os métodos da seletividade de alíquotas, da progressividade e regressividade, da concessão de isenção, dentre outros.

Portanto, nota-se que extrafiscalidade é mister para a plena implementação das políticas públicas que visem o desenvolvimento sustentável, em consonância com a Constituição Federal.


2.      TRIBUTAÇÃO AMBIENTAL PARA FINS DA SUSTENTABILIDADE ECONÔMICA E ECOLÓGICA

A Administração Pública, por disposição expressa do art. 225, §1º da Carta Magna, poderá valer-se da função extrafiscal dos tributos para se alcançar a proposta de preservação ambiental através do desestímulo de condutas degradantes, praticadas pelo indivíduo ao meio ambiente, bem como pelo estímulo a condutas individuais convenientes à comunidade, desprezando, assim, a sua utilização para fins meramente arrecadatórios.

Neste diapasão, argumenta Badr (2011, p. 115):

Quando o Estado se utiliza da tributação para intervir na economia ou quando tem interesses outros além da mera arrecadação, seja de cunho social, político ou econômico, diz-se que tal tributo tem finalidade extrafiscal.

E aponta Pozzetti (2000, p. 35):                              

O Código Tributário Nacional (art. 16) possibilita que os impostos indiretos sobre a produção e o consumo possam ser utilizados como instrumentos de tributação ambiental (...) de sorte a estimular a fabricação de produtos mais eficientes e menos poluidores e desestimular a produção dos que sejam ineficientes e poluidores ou cujo processo produtivo cause poluição ou que de alguma forma possa significar ameaça ao meio ambiente.

Ademais, segundo prevê Modé (2004, p. 24), “o tratamento das questões ambientais transcende à análise das necessidades individuais”, mostrando-se imprescindível a atuação do Estado na adoção de condutas compatíveis ao meio ambiente equilibrado e sadio, seja repressivamente ou preventivamente, estimulando a produção e consumo de fontes de energia limpa ou com menor potencial ofensivo.

Assim, a tributação ambiental vem se tornando um importante instrumento de preservação ambiental, no combate às externalidades negativas geradas pelos agentes econômicos e no incentivo ao comportamento de utilização de mecanismos corretos de produção e de redução dos índices de poluição por parte dos empresários.

Neste sentido, Ribeiro e Ferreira (2005, p. 665) define que a tributação ambiental:

[...] pode ser entendida como o emprego de instrumentos tributários com duas finalidades: a geração de recursos para o custeio de serviços públicos de natureza ambiental e a orientação do comportamento do contribuinte para a preservação do meio ambiente.

Outrossim, importante destacar que os tributos ambientais não possuem caráter sancionatório, posto que não têm como hipótese de incidência tributária ato ilícito, mas possuem sua relevante atuação na preservação do meio ambiente, com a intervenção do Estado sendo um verdadeiro incentivador de práticas positivas na proteção ambiental.

Destaca Modé (2004, p. 123):

A tributação ambiental diferencia-se do caráter sancionatório por não se aplicar a atividade ilícita. A tributação ambiental aplica-se tão somente a atividades líticas, assim consideradas pelo legislador porque necessárias, em que pese seu impacto causado ao meio ambiente. A tributação ambiental diferencia-se ainda do caráter sancionatório por aplicar-se antes da ocorrência do fato danoso ao meio ambiente, ou de modo que o potencial danoso tenha sido reduzido.

No tocante à busca pela sustentabilidade econômica e ambiental, nota-se que a extrafiscalidade ambiental possui vantagens em relação a outros instrumentos econômicos inibidores da destruição do meio ambiente, tais como, afirma Modé (2004, p. 96), “a flexibilidade, o incentivo permanente, a aplicação do princípio da prevenção e a socialização da responsabilidade sobre a preservação ambiental [...]”.

Segundo Motta, Oliveira e Margulis (2000, p. 11), a extrafiscalidade ambiental “é um modo eficiente de mudar a carga fiscal das ‘coisas boas’, como o capital e o trabalho, para as ‘coisas más’, como a poluição e a exaustão dos recursos naturais”.

Neste viés, observa-se, portanto, que a tributação verde possui grande relevância ao agir como um instrumento eficaz para a adoção de práticas pautadas na sustentabilidade ambiental, a fim de reformular condutas e implantar uma conscientização ambiental.

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Sobre a autora
Talita Benaion

Graduada em Direito pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM). Pós-graduanda em Direito Público pelo Damásio de Jesus.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BEZERRA, Talita Benaion. ICMS ecológico como instrumento de preservação ambiental:: importância de sua implementação no estado do Amazonas . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4250, 19 fev. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/34915. Acesso em: 26 abr. 2024.

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