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ICMS ecológico como instrumento de preservação ambiental:

importância de sua implementação no estado do Amazonas

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19/02/2015 às 13:35
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3. ICMS ECOLÓGICO E A PRESERVAÇÃO AMBIENTAL 

3.1. Noções Gerais do ICMS 

O ICMS é um imposto que incide sobre as operações relativas à circulação de mercadorias e sobre as prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e prestações se iniciem no exterior.

Possui caráter estritamente financeiro, destinando-se a fornecer receitas aos Estados, que têm liberdade para adotarem regras próprias relativas à distribuição desse imposto, respeitando os requisitos mínimos fixados pela Constituição de 1988.

Com a arrecadação total do que se cobra do ICMS, o Estado faz a repartição entre os seus Municípios, em virtude do art. 158, IV, da Carta Magna, que estabelece:

Art. 158 Pertencem aos Municípios:

IV – Vinte e cinco por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestação de serviço de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação.

Parágrafo único: as parcelas da receita pertencentes aos Municípios, mencionadas no inciso IV, serão creditadas conforme os seguintes, critérios:

I – três quartos, no mínimo, na proporção do valor adicionado nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, realizadas em seu território.

II – até um quarto, de acordo com o que dispuser lei estadual ou, no caso dos territórios, lei Federal.

Com base no supracitado artigo, infere-se que 25% do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicações – ICMS, de competência Estadual, devem ser repassados aos Municípios.

Neste diapasão, 75% (3/4) da parcela destinada aos Municípios possui critério de aferição rígido, resultante da participação dos próprios Municípios na arrecadação do ICMS. Por outro lado, 25% (1/4) podem ser destinados de acordo com o que dispuser a lei estadual.

Assim, os Estados têm autonomia para determinar os critérios de repartição do montante que cabe aos Municípios. O ICMS Ecológico, portanto, vem introduzir não um tributo diverso, mas sim um novo método de redistribuição do ICMS.

É relevante mencionar as lições de Loureiro (2002, p. 52-53):

O ICMS Ecológico surgiu da aliança entre um movimento de Municípios e o Poder Público estadual, mediado pela Assembleia Legislativa. Os Municípios sentiam suas economias combalidas pela restrição de uso do solo, originada por serem mananciais de abastecimento para Municípios vizinhos e por integrarem 53 unidades de conservação. O Poder Público sentia a necessidade de modernizar seus instrumentos de política pública. Nascido sob a égide da compensação, o ICMS Ecológico evoluiu, transformando-se em mecanismo de incentivo à conservação ambiental, o que mais o caracteriza.

Tendo o ICMS por escopo prover as receitas públicas, a fim de que os Estados custeiem as despesas com os serviços públicos e cumpram suas funções estabelecidas, e dentre elas encontra-se a proteção ambiental, é mister que haja a implantação de políticas públicas visando a sustentabilidade, sendo a utilização do ICMS Ecológico uma valorosa opção.

3.2. Conceito e Relevância do ICMS Ecológico 

O ICMS Ecológico tem sua raiz pautada na busca de alternativas para o financiamento público em municípios nos quais as ressalvas ao uso do solo são graves obstáculos ao desenvolvimento de atividades econômicas, assim como visa conferir uma repaginação às políticas ambientais.

O ICMS Ecológico se originou como uma forma de compensar os municípios pela restrição de uso do solo em unidades de conservação e outras áreas de preservação específicas, pelo fato de algumas atividades econômicas serem restritas ou mesmo proibidas em determinados locais, a fim de garantir sua preservação.

Tal instrumento mostra-se como um benefício financeiro destinado dos Estados aos Municípios que tomam atitudes protetoras em relação ao meio ambiente, por meio das transferências constitucionais.

Neste sentido, conceitua João (2004, p.89):

O termo ICMS-Ecológico foi proposto com o intuito de popularizar o imposto extrafiscal e torná-lo o mais democrático possível, possibilitando a busca de informações e o aguçamento da curiosidade popular a fim de facilitar o processo de transparência na sua gestão.

Ademais, o termo ICMS Ecológico é usado para embasar as prerrogativas da fração de ICMS relacionadas com a garantia da preservação ambiental e a geração de benefícios difusos, determinando a parcela que cada município deve receber na repartição dos recursos financeiros arrecadados.

Como instrumento econômico de política pública ambiental, o ICMS Ecológico representa uma ingerência positiva do Estado, sendo um instrumento de regulação não coercitiva, através do subsídio fiscal intergovernamental. Assim, induz os Municípios a investirem em ações pautadas na melhoria da qualidade ambiental, produzindo resultados bem mais vantajosos se comparados ao modelo tradicional de penalização no descumprimento de imposições legais.

Para Chomitz (1999) apud Veiga, (2000 p. 42):

Uma das intenções mais importantes do ICMS Ecológico é contrapor a percepção local de que as áreas protegidas reduzem a possibilidade de geração de receitas para o município. Ele dá ao município um incentivo para a criação e manutenção de áreas protegidas, ao invés de permitir a expansão de atividades pouco interessantes, tanto do ponto de vista ambiental, quanto econômico.

O instrumento, que aloca parte da arrecadação do ICMS com base em critérios de proteção ambiental, possui grande importância na medida em que visa o desenvolvimento sustentável, por meio da justiça fiscal, redimensionando os aspectos fundamentais para um meio ambiente saudável, e estimula na ação espontânea dos municípios que desejam uma maior receita, assegurando, também, um maior investimento na melhoria da qualidade de vida dos munícipes.

O ICMS Ecológico vem derrubar a ultrapassada concepção de que economia e meio ambiente são conceitos opostos, já que, além de atuar como um incentivo para os municípios continuarem investindo na preservação ambiental, também contribui como uma relevante fonte de renda, agindo, portanto, como um importante instrumento de fomento ao desenvolvimento sustentável.

Portanto, O ICMS Ecológico como incentivo extrafiscal mostra-se como um dos mais imperiosos mecanismos compensatórios e/ou de estímulo à preservação ambiente existente nacionalmente.


4.    APLICAÇÃO DO ICMS ECOLÓGICO NO ESTADO DO AMAZONAS 

4.1. Histórico Brasileiro do ICMS Ecológico 

O ICMS Ecológico vem se mostrando um ótimo meio de incentivar os municípios a criar ou defender a instituição de mais áreas de preservação e a melhorar a qualidade das áreas já protegidas, com o fito de aumentar a arrecadação.

Assim, alguns estados do Brasil legislaram utilizando esse recurso para premiar os municípios que comprovadamente preservarem o meio ambiente, de acordo com os critérios estabelecido em Lei. São eles: Paraná, São Paulo, Minas Gerais, Rondônia, Amapá, Rio Grande do Sul, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Tocantins, Acre, Rio de Janeiro, Ceará, Goiás, Piauí, Paraíba, Pará e Pernambuco.

Neste sentido, o Paraná foi o primeiro Estado brasileiro a adotar instrumentos normativos que instituíssem o ICMS Ecológico, como solução diante de reivindicações dos municípios lesados com as restrições ao desenvolvimento costumeiro, em função da preservação ambiental.

Destarte, foi aprovado um dispositivo na Constituição Estadual e, sucessivamente, adotados a Lei Estadual n°. 9.491, a Lei Complementar n°. 59 e o Decreto Estadual n°. 974/91, que introduziram e regulamentaram critérios ecológicos para repasse das verbas municipais do ICMS.

A adoção do instrumento no Paraná foi tão benéfica, com um número crescente de municípios atingidos positivamente, que, por via de consequência, estimulou uma preservação ambiental em constante crescimento, conseguindo, inclusive, resultados maiores e melhores do que ao longo de anos de políticas públicas em áreas protegidas.

Na sequência, por meio da Lei 8.510, de 29 de dezembro de 1993, São Paulo passou a utilizar o ICMS Ecológico, e legislou destinando 0,5%, em função de espaços territoriais especialmente protegidos existentes nos municípios.

Os municípios localizados nesta área de Mata Atlântica já se sentem mais recompensados por meio de tal incentivo, buscando alternativas para o seu desenvolvimento, investindo vultosamente em projetos de ecoturismo. Ademais, verificou-se também um considerável aumento de receita dos Municípios beneficiados, muitos dos quais passaram a ter, pelos critérios do ICMS Ecológico, a maior parcela de seus recursos, significando basilar melhoria em seu desenvolvimento.

Outro bom exemplo de implantação do novo sistema de eco-repartição financeira ocorreu em Minas Gerais, com a instituição da Lei Estadual n°. 12.040, de 28 de dezembro de 1995, depois modificada pela Lei n°. 13.803/00, designando ao meio ambiente 1% da quota-parte pertencente aos Municípios. Essa quantia determinada de 1% é subdividida, de acordo com o artigo 1° da Constituição Estadual.

Conhecida como “Lei Robin Hood”, Minas Gerais inovou quanto aos critérios de repasse dos 25% de ICMS aos municípios, ao beneficiar não apenas os municípios que abrigam unidades de conservação e espaços especialmente protegidos, como também os que possuem sistema de tratamento de esgoto ou disposição final de lixo, destinando 0,5% para cada uma das especificidades, atendendo, assim, a maior parte da população e introduzindo, além disso, critérios de educação, patrimônio histórico e saúde, entre outros.

Na região Amazônica, o primeiro Estado a ser beneficiado pelo ICMS Ecológico foi Rondônia, criado em 1996, pela Lei Complementar Estadual n.º 147 (art. 1°, alínea “e”), que altera e acrescenta dispositivos à Lei Complementar nº. 115/94.

A divisão desse critério ambiental de 5% entre os Municípios é referente, somente, às unidades de conservação das mesmas.

Ademais, relevante questão da lei rondoniense é a previsão de um abatimento da parcela dada aos Municípios que detenham unidades de conservação prejudicadas por invasões ou explorações ilegais.

4.2. ICMS Ecológico no Amazonas 

Seguindo as exitosas experiências demonstradas pelos Estados já adotantes do ICMS Ecológico, com resultados amplamente positivos no que tange às políticas ambientais municipais, considera-se satisfatório o uso deste tipo de intervenção econômica por parte dos poderes públicos, fazendo com que seus méritos ecoem pelo Brasil afora.

No Estado do Amazonas, berço da Floresta Amazônica e de áreas que necessitam continuarem sendo preservadas para o benefício da região e de todo o país, é imprescindível que exista a implementação do ICMS Ecológico.

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Neste diapasão, a Lei Estadual n. 3.135/07, que dispõe sobre a Política Estadual sobre Mudanças Climáticas, Conservação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável no Amazonas, em seu artigo 15, concedeu tratamento tributário seletivo às operações sujeitas ao ICMS, com a finalidade de preservar o meio ambiente, prevendo:   

Art. 15. Fica o Poder Executivo autorizado a conceder, na forma e condições que estabelecer:

I - diferimento, redução da base de cálculo, isenção, crédito outorgado e outros incentivos fiscais relativos ao ICMS, nas seguintes operações:

a) - com biodigestores que contribuam para a redução da emissão de gases de efeito estufa;

b) - com metanol, inclusive insumos industriais e produtos secundários empregados na sua produção, destinado ao processo produtivo de biodiesel;

c) - com biodiesel, inclusive insumos industriais e produtos secundários empregados na sua produção;

d) - de geração de energia baseada em queima de lixo;

e) - realizadas pelas sociedades empresárias que se dediquem exclusivamente ao ecoturismo, que tenham práticas ambientais corretas e que instituam programa de educação ambiental em mudanças climáticas por intermédio de estrutura de hospedagem, observada a quantidade de leitos prevista em regulamento e desde que localizada fora das zonas urbanas;

[...]

Art. 16. Ocorrerá aumento da carga tributária, mediante a redução ou revogação de benefício fiscal, na forma de regulamento, na aquisição de motoserras ou prática de quaisquer atos que impliquem o descumprimento da política instituída por esta lei.

Assim, observa-se que tal política de incentivo fiscal à práticas concernentes à utilização de biodigestores, biodiesel, à geração de energia pautada na queima do lixo e ao emprego do ecoturismo mostra-se apenas como um embrião do modelo de política extrafiscal de eco-repartição financeira desejável. 

Os exemplos vitoriosos dos outros estados que já implantaram o ICMS Ecológico vem balizar a imprescindibilidade da utilização deste sistema equânime de desenvolvimento sustentável, unificando economia e preservação ambiental, nos municípios do Estado que é o berço da Floresta Amazônica. 

Outrossim, os benefícios gerados especialmente em Rondônia e nos outros estados da região Norte já contemplados apresentam-se como um forte marco para rechaçar a tese de alguns políticos e empresários que defendem a exploração sem critérios da Amazônia como exclusivo meio de aquisição de recursos na região.

Ademais, inegável e imperioso mencionar que o Amazonas possui dimensões superativas, sendo o maior estado brasileiro, representando um terço das florestas tropicais do mundo, além de concentrar a maior biodiversidade já conhecida, sendo cogente a necessidade de ampliação de políticas protetivas ambientais e que, por outra sorte, também contemplem e valorizem os moradores locais que primam pelo desenvolvimento de forma sustentável.  

Por todo exposto, urge que o ICMS Ecológico seja implementado no Estado do Amazonas, de forma séria e abrangente, com critérios de distribuição aplicáveis às especificidades da região. Deve-se abranger, portanto, Unidades de Conservação; desmatamento evitado; redução do risco de queimadas; conservação do solo; sistema de gerenciamento de resíduos sólidos; proteção dos mananciais de abastecimento; reservatórios de água destinados à geração de energia elétrica; fontes de poluição, tanto atmosférica, quanto sonora e visual; e terras e povos indígenas.

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Sobre a autora
Talita Benaion

Graduada em Direito pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM). Pós-graduanda em Direito Público pelo Damásio de Jesus.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BEZERRA, Talita Benaion. ICMS ecológico como instrumento de preservação ambiental:: importância de sua implementação no estado do Amazonas . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4250, 19 fev. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/34915. Acesso em: 25 abr. 2024.

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