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A adoção em famílias homoafetivas

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08/03/2015 às 10:38
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2 GENERALIDADES À ENTIDADE DA ADOÇÃO

A adoção é o ato jurídico irrevogável pelo qual é conferida ao adotando a condição de filho, e aos adotantes a condição de pais, se esta situação traduzir-se em benefício real para a criança ou o adolescente. A adoção implica no rompimento de todo o vínculo jurídico entre a criança ou adolescente e sua família biológica, de maneira que a mãe e o pai biológicos perdem todos os direitos e deveres em relação àquela e vice-versa (há exceção quando se adota o filho do companheiro ou cônjuge). O registro civil de nascimento original é cancelado, para a elaboração de outro, onde irá constar os nomes daqueles que adotaram, podendo-se até alterar o prenome da criança ou adolescente.

De acordo com Marcos Bandeira:

Esse vínculo tem caráter irrevogável e atribui ao adotado os mesmos direito do filho natural, inclusive, sucessórios, designando-o de qualquer vínculo com os pais biológicos e parentes naturais, ressalvando-se os impedimentos matrimoniais.[62]

O Código Civil de 2002 regula o instituto da adoção de menores e maiores e não revoga expressamente o Estatuto da Criança e Adolescente[63], sendo com ele compatível, por trazer a mesma noção de servir aos interesses do adotado, aplicando à adoção regras do direito parental.A nova legislação não trouxe muitas novidades, pois é considerada uma lei geral, neste sentido tem-se as palavras de Ana Paula Ariston Barion Peres:

 A promulgação da nova legislação pouca novidade trouxe em matéria de adoção, pois objetivou disciplinar o instituto de forma global, com o intuito de ser uma lei geral, na linha dos princípios clássicos da codificação.Por isso, os princípios fundamentais norteadores do instituto continuam sendo regulados pelo ECA, bem como aplica-se a legislação estatutária em tudo que não conflitar com a nova legislação civil.[64]

O código atual estabelece que a adoção de maiores de 18 anos dependerá da assistência do Poder Judiciário e de sentença constitutiva, deixando de existir a modalidade de adoção por escritura pública para o maior de 18 anos. Porém esta adoção será submetida ao mesmo regime da adoção do ECA, inclusive do princípio constitucional da igualdade entre os filhos.

Podem adotar, de acordo com a legislação vigente, os maiores de 18 anos, pois o Código Civil de 2002 reduziu a maioridade civil de 21 para 18 anos, não prevalecendo a exigência do Estatuto da Criança e Adolescente em relação à idade mínima de 21 anos para adotar, desde que sejam pelo menos 16 anos mais velhos que o menor a quem se pretende adotar.  Os solteiros, casados ou ainda os companheiros, e até mesmo os separados judicialmente ou divorciados,estão aptos adotar, desde que o estágio de convivência com a criança ou o adolescente tenha se iniciado na constância do casamento ou na união.

A preocupação dos técnicos, psicólogos, assistentes sociais, promotores e juizes é com a felicidade e segurança da criança a ser adotada. Por isso, os técnicos e psicólogos, fazem entrevistas, buscam informações, analisam dados e visitam as residências dos pretensos adotantes, tudo com o objetivo de fornecer ao promotor e ao juiz todos os subsídios possíveis que possam esclarecer sobre a conduta social e familiar dos futuros adotantes.

Não existe, juridicamente, regra expressa  que vede aos homossexuais adotar crianças ou adolescentes, apesar de que o casal homoafetivo ainda não conquistou o direito ao casamento civil.

Cabe salientar ainda que duas pessoas, sendo elas heterossexuais ou homossexuais, só poderão adotar se forem casadas ou viverem em união estável, lembrando-se a hipótese dos separados ou divorciados.Como a união homossexual ainda não é legal no Brasil, apenas um dos companheiros poderá figurar no processo de adoção, como pretendente solteiro.

2.1 DEFINIÇÃO

Adoção é um processo legal no qual uma criança é permanentemente assumida como filho(a) por uma pessoa ou por um casal, sendo que tal criança não é filho biológico desta pessoa ou do casal. Quando isto acontece, as responsabilidades e os direitos dos pais biológicos em relação à criança adotada passam para a pessoa ou o casal que está adotando a criança.

De acordo com Bandeira, pode-se afirmar que a adoção é uma das formas de colocação do menor em um lar:

Destarte, pode-se afirmar que à Luz do Estatuto da Criança e do Adolescente a adoção é uma das formas de colocação do menor em lar substituto, ao lado da Guarda e da Tutela, revestindo-se, entretanto, de maior complexidade em virtude das conseqüências do ato, o qual a rigor é irrevogável.[65]

A paternidade não está relacionada somente ao ser humano e aquele que foi gerado biologicamente por este, podendo haver a relação de paternidade com filho adotivo, fazendo com que uma pessoa possa gozar do estado de filho de outra, independentemente do vínculo sanguíneo. De acordo com o art. 227, § 6º da Carta Magna, bem como o art. 1.596 do Código Civil[66], os filhos havidos ou não da relação do casamento, bem como por adoção terão os mesmos direitos e qualificações, levando-se em conta também o art. 1.593 do Código Civil[67], classificando que o parentesco pode ser de forma natural ou civil, conforme a consangüinidade ou outra origem.

À luz do Estatuto da Criança e do Adolescente, pode-se afirmar que a adoção é uma forma de inserir o menor em um lar substituto, juntamente com a guarda e a tutela, entretanto, sendo de maior complexidade em virtude das conseqüências do ato o qual, a rigor é irrevogável. Para o ato se concretizar, é exigido o consentimento dos pais biológicos - se estes não forem desconhecidos ou tiverem sido destituídos do pátrio poder, do representante legal do adotando, sendo este guardião, tutor ou curador, quando maior de 12 anos é necessária a prévia destituição do pátrio poder, o que pode ocorrer nos próprios autos do pedido de adoção.[68]

Segundo Caio Mário da Silva Pereira, a adoção “é o ato jurídico pelo qual uma pessoa recebe outra como filho, independentemente de existir entre elas qualquer relação de parentesco consangüíneo ou afinidade.”[69]

Washington de Barros Monteiro afirma, ainda, que pai e filho são parentes naturais, pois seu parentesco foi criado pela própria natureza através do sangue. O parentesco civil é criado por lei, através do instituto da adoção.[70]

A paternidade adotiva é uma paternidade eletiva, pois é oriunda da vontade do adotando, fundado na liberdade, suprindo o fato biológico da gestação. Diferentemente da paternidade fisiológica, a adoção é um fenômeno jurídico desvinculado da materialidade da gestação, permitindo que se estabeleça a relação típica de paternidade-filiação.

Neste sentido, observa Mário Aguiar Moura:

Uma pessoa, denominada adotante, assume a posição jurídica de pai ou mãe relativamente à outra, denominada adotada. A opção eletiva dos interessados, valorizada pelo direito e que,portanto, se funda na liberdade, supre o fato biológico da geração.[71] .

Conforme Jason Albergaria,” a paternidade adotiva é uma paternidade eletiva e espiritual, porque visa dar um lar a um menor sem família, visto na qualidade de membro do gênero humano e filho de Deus.” [72]

Para o Professor João Baptista Villela a “ adoção prefigura a paternidade do futuro, enraizada no exercício da liberdade: tem esta paternidade tanto de autodoação, de gratuidade, de engajamento íntimo que não é suscetível de imposição coativa.”[73]

A civilista Maria Helena Diniz, define a adoção como sendo:

[...]ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de qualquer relação de parentesco consangüíneo ou afim, um vinculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho, pessoa que, geralmente, lhe é estranha.[74]

Segundo Antônio Chaves a adoção pode ser definida:

[...]como ato sinalagmático e solene, pelo qual, obedecidos os requisitos da Lei, alguém estabelece, geralmente com um estranho, um vínculo fictício de paternidade e filiação legítimas, de efeitos ilimitados e sem total desligamento do adotando da sua família de sangue.[75]

A adoção é instituto jurídico polêmico, que está mais ligado ao coração que ao cérebro, dizendo mais respeito a sentimentos do que à razão.Em palavras plenas de sabedoria, afirma o Professor João Batista Villela:

A paternidade adotiva não é uma paternidade de segunda classe. Ao contrário: suplanta, em origem, a de procedência biológica, pelo seu maior teor de autodeterminação. Não será mesmo demais afirmar, tomadas em conta as grandes linhas evolutivas do direito de família, que a adoção prefigura a paternidade do futuro, por excelência enraizada no exercício da liberdade. Somente ao pai adotivo é dada a faculdade de um dia poder repetir aos seus filhos o que Cristo disse aos seus apóstolos: ‘Não fostes vós que Me escolhestes, mas fui eu que escolhi a vós. Suprema expressão da autonomia paterna, que liberta, gratifica e faz crescer quem a pode manifestar e quem a pode ouvir. [76]

João Batista afirma ainda que a paternidade eletiva estava escrito no Novo Testamento:

Seja dito, a propósito, que o ideal da paternidade no Novo Testamento é sobretudo eletivo. O Antigo Testamento é, num certo sentido, o gênese e sua extensão: a formação do universo e a do povo de Israel. O seu Deus se revela, assim, por excelência, o Deus Criador. Poderoso e distante. Forte e temido, feito carne, assume a dor do mundo e se faz, de novo, Pai. Não por dever ou direito de criação, mas por ato gratuito de amor. Eu diria que o Antigo Testamento corresponde a proposta biológica de que falei. Não nos esqueçamos, contudo, de que não foi senão com a sua livre aceitação que o mundo conheceu a mais radical experiência de paternidade.[77]

Neste sentido, deve ser lembrado que o filho por natureza é amado porque é filho, já o filho por adoção é filho por que se ama.

De acordo com o professor Fábio Ulhoa Coelho o requisito mais importante para a adoção é a vantagem para o adotado e a legitimidade da motivação do adotante. [78]

Portanto, a adoção é uma escolha, pois depende necessariamente da vontade dos pais adotandos, permitindo que haja a relação típica de pais e filhos entre o adotante e o adotando. Devendo sempre ser levado em conta a vantagem para o adotado, visto sua fragilidade.

2.2 EVOLUÇÃO DA ADOÇÃO NO BRASIL

A adoção é um dos mais antigos institutos de Direito, sendo impossível determinar sua origem. Ela já existia no mundo antigo, entre os povos egípcios, hebreus e romanos. Ressaltando-se que na antiguidade a adoção era destinada à perpetuação do culto dos antepassados, o filho adotado dava continuidade ao culto sagrado do pai adotivo, pois o culto sagrado era a base da família, sendo assim, a família que não tivesse filhos estaria extinta. Nesta época, a adoção estava ligada mais à religião que ao próprio direito. [79]

No Brasil a instituição da adoção, foi introduzida no sistema jurídico brasileiro somente no Código Civil de 1916, que disciplinou a adoção com base no direito romano e seus princípios, sendo destinada a proporcionar a continuidade da família aos casais estéreis.

Neste sentido, Carlos Roberto Gonçalves afirma que o Código Civil de 1916 era considerado:

 [...] instituição destinada a proporcionar a continuidade da família, dando aos casais estéreis os filhos que a natureza lhes negara. Por essa razão, a adoção só era permitida aos maiores de 50 anos, sem prole legítima ou ilegítima, pressupondo-se que, nessa idade, era grande a probabilidade de não virem a tê-la.[80]

Entretanto, houve grandes críticas dos doutrinadores à regulamentação dada à adoção, pois pela redação original, somente os maiores de 50 (cinqüenta) anos que não tivessem filhos “dados pela natureza” podiam adotar, devendo ser de no mínimo 18 (dezoito) anos a diferença entre o adotante e o adotado. Sendo que ainda era exigido o consentimento dos pais, do tutor ou ainda do próprio adotando, no caso de ser maior ou emancipado.

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Nas palavras de Gonçalves:

O Código Civil de 1916 disciplinou a adoção com base nos princípios romanos, como instituição destinada a proporcionar a continuidade da família, dando aos casais estéreis os filhos que a natureza lhes negara. Por essa razão, a adoção só era permitida aos maiores de 50 anos, sem prole legítima ou ilegitimada, pressupondo-se que, nessa idade, era grande a probabilidade de não virem a tê-la.[81]

A Lei 3.133/57, entre outras alterações, modificou a idade limite para adotar, sendo que reduziu a idade de 50 (cinqüenta) para 30 (trinta) anos, eliminou a exigência de não ter prole legítima ou legitimada, a idade em relação ao adotando de 18 para 16 anos, a eliminação da exigência do consentimento do adotando, se maior de 18 anos, ou do seu representante legal, em caso de menores.[82]

Conforme Gonçalves, em relação à Lei 3.133 de 8 de maio de 1957, afirmou:

Com a evolução do instituto da adoção, passou ela a desempenhar papel de inegável importância, transformando-se em instituto filantrópico, de caráter acentuadamente humanitário, destinado não apenas a dar filhos a casais impossibilitado pela natureza de tê-los, mas também a possibilitar que um maior número de menores desamparados, sendo adotado, pudesse ter um novo lar.[83]

De acordo com Silvio Rodrigues, com a Lei 3.133/57, houve mudança no enfoque da adoção:

O legislador não teve em mente remediar a esterelidade, mas sim facilitar as adoções, possibilitando que um maior número de pessoas, sendo adotado, experimentasse melhoria em sua condição moral e material.[84]

A Lei 4.655/65 introduziu, no Brasil, a “legitimação adotiva”. Mantendo a idade mínima de 30 anos para os casais interessados na legitimação, autorizou o procedimento antes desta idade, desde que o matrimônio tivesse mais de cinco anos e comprovada a esterilidade do casal. A legitimação era dada somente após decisão judicial, sempre acompanhada pelo Ministério Público.[85]

O “Código de Menores”, Lei 6.697/79, criou a “adoção plena”, mais abrangente, sem modificar por inteiro o instituto, mantendo a adoção do Código Civil, passando a vigorar as duas formas de adoção: a legitimação adotiva e a adoção simples pelo Código de Menores.[86] A adoção plena distingue-se  da adoção simples pelo fato de incluir o adotado na família do adotante, rompendo o laço com a família biológica.[87]

Nas palavras de Gonçalves sobre adoção simples e adoção plena temos:

Enquanto a primeira dava origem a um parentesco civil somente entre adotante e adotado sem desvincular o último da sua família de sangue, era revogável pela vontade das partes e não extinguia os direitos e deveres resultantes do parentesco natural, como foi dito, a adoção plena, ao contrário, possibilitava que o adotado ingressasse na família do adotante como se fosse filho de sangue, modificando-se o seu assento de nascimento para esse fim, de modo a apagar o anterior parentesco com a família natural.[88]

O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90) estabeleceu uma nova regulamentação, trazendo como principal inovação a regra de que a adoção seria somente plena para menores de 18 anos, mantendo as regras do Código Civil de 1916 para os maiores de idade, obedecendo ao princípio constitucional do art. 227, parágrafo 5°[89]. O Novo Código Civil transcreveu muitas regras do Estatuto, deixando para o intérprete o desafio de preencher as lacunas controversas.[90]

Segundo Marcos Bandeira, o ECA trouxe mudanças ao ordenamento anterior, entre elas a possibilidade de maiores de 21 anos adotar, independente de estado civil, exigindo apenas um limite de 16 anos de diferença de idade entre o adotante e o adotado, a possibilidade de um cônjuge adotar o filho do outro. Assim, é perceptível que o ECA veio ampliar o leque da adoção, levando sempre em conta os reais interesses de salvaguarda do menor.[91]Conforme Lindajara O. Couto, a matéria de adoção, hodiernamente tem uma visão clara em solucionar problemas de abando no de menores:

A legislação brasileira, que trata a matéria, tem como objetivo proteger os interesses do menor e solucionar a situação dos menores órfãos, abandonados ou provindos de famílias marginalizadas.[92]

Desde a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Criança e do adolescente, de 1990, a adoção passou a ser uma medida protetiva à criança e ao adolescente. Muito mais que os interesses dos adultos envolvidos, é relevante para a lei e para o juiz que irá decidi-la, se a adoção trará à criança ou adolescente a ser adotado reais vantagens para seu desenvolvimento físico, educacional, moral e espiritual. Sua finalidade é satisfazer o direito da criança e do adolescente à convivência familiar sadia.

2.3 NATUREZA JURÍDICA DA ADOÇÃO

No Estado liberal vingou a concepção do contrato, porém, hodiernamente não há como se falar que a adoção é um simples contrato, pois  a igualdade das partes, a autonomia da vontade estão muito distantes de seu sentido, já que o menor carece de capacidade para contratar.

Nas palavras de Jason Albergaria tem-se:

Com efeito,a natureza jurídica da adoção varia ao longo do tempo, segundo a sua evolução. Atendeu à evolução do Estado de Direito. No Estado Liberal vingo a concepção do contrato, em respeito à autonomia da vontade. No Estado Intervencionista ou Social predominava o conceito do ato jurídico, seguido pelo conceito da instituição jurídica.[93]

Para concessão de uma adoção é a necessário motivos legítimos que represente reais vantagens para o adotando, exigências prevalentes atualmente na doutrina e na legislação comparada, revelam que a noção do contrato está em crise e não mais justifica o instituto.Portanto, a adoção define-se agora, como uma instituição jurídica de ordem pública com a intervenção do órgão jurisdicional, para criar entre duas pessoas, ainda que estranhas entre elas, relações de paternidade e filiação semelhantes às que sucedem na filiação legítima.

No mesmo sentindo, Albergaria defende a tese de que, hodiernamente, adoção é uma instituição jurídica de ordem pública, conforme abaixo descrito:

Define-se, nessa fase, a adoção como uma instituição jurídica de ordem pública, com a intervenção do órgão jurisdicional, para criar entre duas pessoas relações de paternidade e filiação, semelhantes às que ocorrem na filiação legítima.[94]

Ou seja, sentença do juiz é de natureza constitutiva do novo estado civil do adotando, produzindo efeitos "ex tunc", isto é, a partir do trânsito em julgado.

Neste sentido, Bandeira se posiciona da seguinte forma:

Infere-se, desta forma, que a natureza contratual da adoção encontra-se superada, não havendo mais lugar para ela em nosso ordenamento jurídico, tendo em vista a sua natureza de instituição jurídica que reclama a intervenção obrigatória do Poder Jurisdicional, no sentido de se preservar os reais interesses do adotado.[95]

Segundo Albergaria:

No Estado Democrático de Direito potencia-se a sua função protetiva em face da infância abandonada, pois o que define esta proteção é estar a serviço da pessoa humana, isto é, de todos os cidadãos e não de uma minoria privilegiada.[96]

Maria Helena Diniz, por sua vez, como anteriormente exposto, apresenta contesto baseado nas definições formuladas por diversos autores como sendo:

Adoção é o ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de qualquer relação de parentesco consangüíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho, pessoa que geralmente lhe é estranha.[97]

Segundo Gonçalves:

A adoção não mais estampa o caráter contratualista de outrora, como ato praticado entre adotante e adotado, pois, em consonância com o  preceito constitucional mencionado, o legislador ordinário ditará as regras segundo as quais o Poder Público dará assistência aos atos de adoção. Desse modo, como também sucede com o casamento,podem ser observados dois aspectos na adoção: o de sua formação, representado por um ato de vontade submetido aos requisitos peculiares, e o do status que gera, preponderantemente de natureza institucional.[98]

Conforme Lindajara Couto, a adoção é ato civil pelo qual alguém requer um filho através de ato judicial.[99]

Dessa forma, entende-se a adoção como ato jurídico solene, pois exige sentença judicial, pelo qual alguém recebe em sua família, no atributo de filho, pessoa estranha, levando-se sempre em conta a o melhor interesse da criança.

2.4 DA DIGNIDADE HUMANA DA CRIANÇA

De acordo com os princípios proclamados na Carta das Nações Unidas, o reconhecimento da dignidade inerente e dos direitos iguais e inalienáveis de todos os membros da família humana constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo.As Nações Unidas proclamaram na Declaração Universal dos Direitos Humanos e nos Pactos Internacionais de Direitos Humanos que toda pessoa humana possui todos os direitos e liberdades nele enunciados, sem distinção de qualquer tipo, tais como raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou outra, de origem nacional ou social, posição econômica, nascimento ou outra condição Proclamaram também, que a infância tem direito a cuidados e assistência especiais.

 O ordenamento jurídico brasileiro, em consonância com a tendência mundial, prestigia os princípios de defesa dos Direitos Humanos e dos Direitos de personalidade, consagrando em sede constitucional os Direitos Fundamentais.

Neste sentido, Thiago H. B. Thomaz afirma que “se a dignidade da pessoa humana é algo perceptível, coerente consagra-se esse estado como um dos alicerces fundamentais da sociedade brasileira.”[100]

Em relação aos Direitos Fundamentai, Rosana Fachin salienta que:

[...] família, “repersonalizacao” e Direitos Fundamentais têm parentescos epistemológico indiscutível, já que os novos rumos assumidos pelo Direito de Família encontram desafios para superar o sistema jurídico privado clássico e adequar-se ao modelo constitucional esculpido pela constituição de 1988, cuja estrutura é plural e fundada em princípios da promoção da dignidade humana da solidariedade, onde a família é concebida como referencia de liberdade e igualdade, em busca da felicidade de seus membros. [101]

O princípio da Dignidade da Pessoa Humana pode ser considerado como uma cláusula geral de tutela dos direitos da personalidade que está previsto na Constituição Federal em seu art. 1°, III. [102]

Neste sentido, Cleber Francisco Alves, assegura a eficácia normativa autônoma do principio da dignidade da pessoa humana.

[...] esse principio, como tantos outros princípios fundamentais inscritos na Constituição, não é apenas “fonte de solução jurídica enquanto pressuposto de validade e enquanto elemento de interpretação e integração das normas”, mas podem servir de fonte autônoma de solução jurídica para determinados casos onde, apesar da ausência de regras especificas, se depare com uma situação concreta submetida à decisão judicial que deva se regulada de modo a salvaguardar a proeminência dos valores existenciais da pessoa humana.[103]

A idéia de dignidade da pessoa humana é simultaneamente limite e tarefa dos poderes estatais e da comunidade em geral, de todos e de cada um, não bastando a liberdade formal, mas sim que deva concretizar-se no plano histórico –cultural.Como limite da atividade dos poderes públicos, a dignidade é algo que pertence necessariamente a cada um e que não pode ser perdido e alienado,pois se não existisse, não haveria fronteira a ser respeitada.[104]

O princípio da Dignidade da Pessoa Humana serve como uma mola de propulsão da intangibilidade da vida do ser humano, dele decorrendo o necessário respeito à sua integridade física e psíquica e às condições básicas de igualdade e liberdade, além da afirmação da garantia de pressupostos materiais mínimos para que se possa viver. A proclamada dignidade humana torna cada pessoa merecedora de respeito e proteção autônomos, concretos, voltados para as suas prementes necessidades básicas vitais, assegurada sua integridade física e psíquica contra todo ato que possa violar suas condições existenciais mínimas.

Pode ser afirmado que, com a consagração do Princípio da Dignidade Humana, implica em considerar-se o homem como centro do universo jurídico, reconhecendo este que abrange todos os seres e não apenas indivíduos determinados, de sorte que os efeitos irradiados pela ordem jurídica não hão de manifesta-se, a principio, de modo diverso ante duas pessoas.[105]

A dignidade da pessoa humana é conceituada por Ingo Sarlet como sendo:

[...] a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem à pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, alem de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.[106]

A família é considerada unidade fundamental da sociedade e meio natural para o crescimento e bem-estar de todos os seus membros, em particular das crianças, e deve proporcionar proteção e assistência necessária para que a criança possa assumir plenamente suas responsabilidades na comunidade. Sua personalidade deve crescer em um ambiente familiar, em clima de felicidade, amor e compreensão. É reconhecido que a criança, para o desenvolvimento pleno e harmonioso de personalidade, deve crescer em um ambiente familiar, em clima de felicidade, amor e compreensão.

Certamente a família é a fonte da formação e desenvolvimento da personalidade dos filhos, sendo seu primeiro agente de socialização.[107] Sem o meio familiar, no qual a criança deva receber amor, carinho, educação, ou seja, elementos básicos para seu desenvolvimento, ela não realizará sua vocação pessoal de crescer. Porém, terá condições de crescer em família substituta, se esta for capaz de oferecer à criança o meio familiar de formar e desenvolver a sua personalidade.

Juan Pera incorpora a família natural e a família substituta ao ideal ético de comunicar a educação no amor:

O ideal ético é fazer que as famílias sejam capazes de comunicar a educação no amor, e somente quando não existe a família enquanto educadora, então ter-se-á que recorrer a um substituto para a mesma, a uma família capaz de expressar o melhor possível: o amor.[108]

Cabe afirmar que a adoção, na sua concepção, visa resgatar a dignidade da criança abandonada.

Segundo o art. 227 da Constituição[109], bem como o art. 4° do Estatuto da Criança de do Adolescente,[110] há co-responsabilidade da família, da sociedade e do Estado na efetiva proteção dos direitos fundamentais da criança e do adolescente.

Portanto, a adoção de ser realizada sempre respeitando o princípio da dignidade humana da criança, levando em conta seu bem estar social e psicológico, analisando as vantagens para a criança.

2.5 EFEITOS PESSOAIS DA ADOÇÃO

A adoção promove a união por completo do adotado com o adotante, na qual será recebido como filho, com os mesmos direitos e deveres dos filhos naturais, incluindo os direitos sucessórios, desligando-se de forma definitiva da família biológica, salvo para fins de impedimentos para o casamento, pois a lei não pode permitir a realização de uniões incestuosas.[111]

Carlos Roberto Gonçalves afirma que a adoção gera um parentesco entre o adotante e o adotado, chamado de civil, mas em tudo equiparado ao consangüíneo.[112]

Nas palavras de Marcos Banderia, tem-se:

A adoção representa a mais completa forma de colocação de em lar substituto e um dos mais valiosos instrumentos de política social, considerando que rompe, definitivamente, o vínculo de filiação com os pais biológicos e respectivos parentes, ressalvando-se, os impedimentos matrimoniais, em face da prevalência do fundamento ético e científico, mo particular.[113]

A sentença constitutiva da adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres do filho biológico, sendo proibida qualquer discriminação, conforme  parágrafo 6° do art. 227 da Constituição Federal.[114]

Conforme Jason Albergaria, os efeitos pessoais compreendem o direito do adotando ao nome e o parentesco com a família adotiva.[115]As relações de parentesco entre o adotado e o adotante são estabelecidas, não somente entre si, mas também aos descentes do adotado como também a todos os parentes do adotante.[116]Com a adoção, o filho adotivo é igualado ao biológico sob todos os aspectos, ficando sujeito ao poder familiar, transferido do pai natural para o adotante com todos os direitos e deveres que lhe são pertinentes, especificados no art. 1634 do Código Civil,[117] incluindo a administração e usufruto de bens, conforme art. 1689 da mesma Lei.[118]

De acordo com o art. 1627 do Código Civil[119], o nome do adotando poderá ser modificado, tanto a pedido do adotando como a pedido do adotante. Salienta-se que o sobrenome do pai é direito do adotando. É acentuado este direito se o adotante já possui outros filhos, biológicos ou adotados, para evitar a discriminação entre os filhos.[120]Assim, juntamente com a sentença de adoção, vem o direito do adotando em ter o sobrenome dos pais adotantes, pois o direito ao nome é um dos direitos fundamentais da criança. O nome é expressão da personalidade e possibilita ao adotado a integração na família adotiva como também na vida social, exercendo os mesmos direito do filho natural, caso houver.

O sobrenome dos pais adotantes é direito do adotando. Mais se acentua a correta finalidade da norma em apreço quando os adotantes já têm outros filhos, biológicos ou adotados. Neste caso, o sobrenome deve ser comum, para não gerar discriminação, vedada constitucionalmente.[121]

A Lei de n°. 6.015 de 1973 trouxe a possibilidade da mudança do prenome, porém não em função da sentença procedente da adoção. Somente com o Estatuto da Criança e Adolescente, em seu art. 47[122], houve a possibilidade expressa da mudança do prenome do adotando, promovendo, ainda mais, a integração da criança na família, extinguindo qualquer lembrança do passado. Nas palavras de Jason Albergaria:

A mudança do prenome e o nome exclusivo do adotante objetivam a proteção do menor contra os riscos de possíveis extorsões dos pais inescrupulosos, o que justificará o sigilo da adoção.[123]

Geralmente, a mudança do prenome é requerida quando o adotando é de tenra idade e ainda não atende pelo nome original. Levando em conta que os pais têm o direito de escolher o prenome dos filhos, e que a adoção procura igualar os filhos adotivos com os filhos naturais, a lei permite que os adotantes também escolham o prenome do adotado, como se tivessem um filho natural, de acordo com o Estatudo da Criança e Adolescente[124].

A adoção, no sistema do Código Civil de 2002, produz seus efeitos a partir do trânsito da sentença que deferiu a adoção, exceto no caso de adoção post mortem, quando terá força retroativa à data do óbito.[125]

A irrevogabilidade da adoção está expressamente prevista no art. 48 do Estatuto da Criança e do Adolescente,[126] todavia não é mencionada no Código Civil de 2002, porém é vigente, uma vez que o art. 1626[127] deste diploma afirma que após a adoção o adotado desliga-se de qualquer vínculo com os pais consangüíneos.

Porém, se um dos cônjuges ou companheiro adota o filho do outro, é mantido o vínculo de filiação do pai ou mãe biológico, conforme parágrafo único do art. 1626 do Código Civil de 2002.[128]

A irrevogabilidade da adoção impede o restabelecimento do pátrio poder dos genitores do adotado, impedindo que o adotado, por morte, arrependimento ou qualquer outro motivo, retorne à sua família biológica. Porém, não impede que o adotante seja destituído do pátrio poder e que o adotado seja novamente adotado por outra família. Neste sentido, tem-se as palavras de Marcos Bandeiras:

Nada impede que esta família, em face da existência de motivos que coloquem o menor em situação de risco social ou moral (maus-tratos, abuso sexual, etc) e justifique a destituição do pátrio poder.[129]

Com a adoção, o filho adotivo é nivelado ao consangüíneo sob todos os aspectos, ficando sujeito, o poder familiar, transferido do pai natural para o adotante com todos os direitos e deveres que lhe são próprios, incluindo administração e usufruto de bens. [130]

2.6 EFEITOS PATRIMONIAIS DA ADOÇÃO

Após a sentença procedente do pedido de adoção, o adotado passa a ter direitos alimentares e sucessórios. Passa a ser herdeiro necessário na ordem hereditária ao lado dos demais filhos. Ou seja, terão os mesmos direitos que os filhos biológicos.

Juntamente com o direito dos adotados, vem o dever dos adotantes, pois também responderão civilmente pelos atos ilícitos praticados pelos menores.[131]Segundo Albergaria, os efeitos patrimoniais são de duas espécies: o direito a alimentos e o direito à sucessão.[132]Os alimentos são devidos reciprocamente, entre adotante e adotado. São devidos, ainda, pelo adotado ao adotante nos mesmos casos em que os filhos biológicos devam aos seus pais biológicos. Quanto aos alimentos aos adotados, estes possuem direito de receber quando menores ou quando impossibilitados de prover seu próprio sustento, levando sempre em conta o binômio da necessidade do alimentado e a possibilidade do alimentante.

Tal prestação é decorrência do parentesco que então fora estabelecido, levando em conta que os alimentos deverão satisfazer as necessidades básicas da pessoa, como: saúde, alimentação, vestuário, segurança, instrução e educação do adotado, abrangendo, ainda, a integridade física e moral.

Salienta-se que o adotante, no exercício de seu poder familiar, é administrador e usufrutuário dos bens do adotado, conforme art. 1.689 do Código Civil de 2002.[133]

Com relação ao direito sucessório, o filho adotivo concorre igualmente com os filhos de sangue, sendo que não há sucessão por morte dos parentes biológicos, pois com a sentença de adoção fora afastados todos os laços de parentesco.[134]Em conseqüência da adoção, os direitos hereditários envolvem a sucessão dos colaterais e dos avós, igualmente como ocorrido na hereditariedade biológica. Na linha colateral, se houver falta de parentes mais próximos, o adotivo, da mesma forma que o biológico, sucede até o quarto grau, ou seja, poderá ser contemplado no inventário pelas morte dos tios.

O filho adotado, assim como o filho consangüíneo poderá ser deserdado conforme as hipóteses do art. 1962 do Código Civil de 2002: por ofender fisicamente, injuriar gravemente, ter relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto e desamparar o ascendente com alienação mental ou grave enfermidade.[135]É, de igual forma, autorizada a deserdação dos descendentes por seus ascendentes nas normas do ar. 1963 do Código Civil de 2002: ofensa física; injúria grave; relações ilícitas com a mulher ou companheira do filho ou a do neto, ou com o marido ou companheiro da filha ou o da neta e desamparo do filho ou neto com deficiência mental ou grave enfermidade. [136]

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Sobre a autora
Rossana Rostirolla

Bacharel de Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade do Vale do Rio do Sinos – UNISINOS

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROSTIROLLA, Rossana. A adoção em famílias homoafetivas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4267, 8 mar. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/36967. Acesso em: 23 dez. 2024.

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