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“Lei do bem” e a desinformação do setor privado brasileiro

05/04/2015 às 08:22
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Apesar da estagnação econômica do Brasil e do mundo, o setor privado brasileiro não possui plena ciência do seu potencial inovador e de quanto isto poderia acarretar na redução de seus custos tributários.

Através da globalização e desenvolvimento de tecnologias no mundo, o crescimento dos países passou a ser pautado pelo nível de investimento em pesquisa e inovação. Diante deste paradigma, o governo federal brasileiro, por meio do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), começou a utilizar o mecanismo do benefício fiscal com intuito de incentivar investimentos em inovação com foco no setor privado, visando o aumento da competitividade das empresas brasileiras em um mercado cada vez mais diversificado e exigente.

Com isso, houve uma tentativa de aproximação entre as empresas privadas e as universidades, juntamente com institutos de pesquisa, potencializando os resultados em P&D. A Lei 11.196/05, que ficou conhecida como “Lei do bem”, cria a concessão de abatimentos fiscais às pessoas jurídicas que realizarem pesquisa e desenvolvimento de inovação tecnológica.

Como conceito de inovação tecnológica, temos:

“concepção de novo produto ou processo de fabricação, bem como a agregação de novas funcionalidades ou características ao produto ou processo que implique em melhorias incrementais e efetivo ganho de qualidade ou produtividade, resultando maior competitividade no mercado”.

Entretanto, há ainda grande dificuldade em se esclarecer a definição das atividades de Pesquisa e Desenvolvimento de Inovação Tecnológica e sua aplicação na prática por esta possuir significado extremamente amplo. Sendo assim, o governo, ao criar a Lei do Bem, utilizou-se das definições obtidas no Manual de Frascati (reconhecido internacionalmente) para esclarecer o que realmente faz ou não parte de Pesquisa e Desenvolvimento.

Com base neste Manual, temos que o conceito de P&D é subdividido em quatro grupos:

I – pesquisa básica dirigida – atividades executadas com o objetivo de adquirir conhecimentos quanto à compreensão de novos fenômenos, com vistas ao desenvolvimento de produtos, processos ou sistemas inovadores;

II – pesquisa aplicada – atividades executadas com o objetivo de adquirir novos conhecimentos, com vistas ao desenvolvimento ou aprimoramento de produtos, processos e sistemas;

III – desenvolvimento experimental – atividades sistemáticas delineadas a partir de conhecimentos preexistentes, visando à comprovação ou demonstração da viabilidade técnica ou funcional de novos produtos, processos, sistemas e serviços ou, ainda, um evidente aperfeiçoamento dos já produzidos ou estabelecidos; e

IV – serviços de apoio técnico – serviços indispensáveis à implantação e à manutenção das instalações ou dos equipamentos destinados, exclusivamente, à execução de projetos de pesquisa, desenvolvimento ou inovação tecnológica, bem como à capacitação dos recursos humanos a eles dedicados, diretamente vinculados às atividades relacionadas nos itens I a III.

Infelizmente, apesar da estagnação econômica do Brasil e do mundo, o setor privado brasileiro não possui plena ciência do seu potencial inovador e de quanto isto poderia acarretar na redução de seus custos tributários. Esta contradição está constatada nos últimos relatórios do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) sobre a aplicação da Lei do Bem no Brasil. Apesar de contar com um ativo corpo de pesquisadores, responsáveis pela publicação de 40 mil artigos científicos em revistas especializadas a cada ano, o Brasil permanece inovando pouco.

Tamanha discrepância se deve ao fato de que a maior parte dos pesquisadores brasileiros (80%) esteja vinculada às universidades e aos órgãos públicos, enquanto que apenas 20% se concentra em empresas do setor privado. Contrapondo este cenário, os países com alto índice de inovação e competitividade apresentam exatamente o oposto, uma vez que a iniciativa privada, nestes países, absorve, de forma rápida e significativa, os cientistas, engenheiros e pesquisadores recém-formados.

Apesar das evidentes vantagens oferecidas aos empresários inovadores, a Lei do Bem ainda é subestimada diante do potencial brasileiro. Conforme relatórios do MCTI, das mais de 7 milhões de empresas brasileiras, cerca de 30 mil declaram investimentos em P&D sem utilização do benefício. Dessas, o MCTI calcula que mais de 4 mil estariam aptas a reivindicar o benefício fiscal.

De forma muito clara, fica fácil concluir que a grande barreira aos empresários brasileiros, além dos requisitos formais para a obtenção do benefício, é a desinformação. 

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Sobre a autora
Stefani Ventura Vargas

Advogada OAB/SP - Graduada em Direito na Universidade Federal do Rio Grande. Pós-Graduada em Direito Tributário. Iniciou a carreira em uma Big Four (PwC) onde adquiriu know-how sobre diversos segmentos. Posteriormente, trabalhou na área de Planejamento Tributário de uma indústria pertencente ao Grupo Coca-Cola e na Construtora Camargo Corrêa. Atualmente é Advogada do consultivo em impostos indiretos no Escritório Zilveti Advogados.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VARGAS, Stefani Ventura. “Lei do bem” e a desinformação do setor privado brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4295, 5 abr. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/37480. Acesso em: 29 mar. 2024.

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