Ano após ano, milhares de bacharéis em Direito se formam nas instituições de ensino superior brasileiras, muitos ávidos para ingressarem na Administração Pública, como defensores, promotores, juízes e delegados; mas, outros preferem seguir o caminho da advocacia (podendo ser pública ou particular), que, para isso, prestam o Exame de Ordem e que, após a sua aprovação e o seu devido registro no Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, onde exercerão sua profissão, passarão, assim, a serem caracterizados como advogados.
A advocacia, por previsão constitucional (artigo 133), é essencial para que se possa ter a excelência na prestação da função jurisdicional do Estado, juntamente com as figuras do juiz (agente político representante do Poder Judiciário), assim como o promotor de Justiça (membro do Ministério Público), constando, atualmente, nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, segundo dados do seu Conselho Federal (de acordo com pesquisa realizada em 08/01/2.015, no sítio eletrônico http://www.oab.org.br/institucionalconselhofederal/quadroadvogados), o número de 916.302 advogados devidamente inscritos e aptos a exercerem o seu múnus público. E diante da sua importância no cenário nacional e da quantidade de profissionais, interessante é se estudar quando o advogado no seu atuar deverá responder civilmente (ou seja, patrimonialmente) por danos provocados ao seu cliente ou a terceiros, por erro grosseiro ou não, ou em situações, como aventadas recentemente pela doutrina, por exemplo, encampadas sob o manto da teoria da “perda de uma chance”, e de que forma se dará essa responsabilização (qual legislação a se adotar na espécie – Estatuto da Advocacia/Código de Ética, Código de Defesa do Consumidor e as consequências jurídicas em se utilizar uma norma em detrimento da outra). Para isso, utilizamos de doutrina especializada acerca do tema, assim como jurisprudência e legislação pertinente à matéria, para, ao final, propormos sua solução jurídica.
Primeiramente, a responsabilidade civil (ou patrimonial) se caracteriza como o dever monetário de reparar que surge toda vez que alguém lesione outrem em seu direito material ou moral, por ato próprio, de pessoa ou coisa que esteja sob sua guarda, ou com o descumprimento de obrigação imposta por lei ou por negócio assumido, o que para Gagliano e Pamplona Filho (apud BUSNELLO; PAQUALINI, 2.012), o instituto:
[...], para o Direito, nada mais é, portanto, que uma obrigação derivada – um dever jurídico sucessivo – de assumir as consequências jurídicas de um fato, consequências essas que podem variar (reparação dos danos e/ou punição pessoal do agente lesionante) de acordo com os interesses lesados.
No início da humanidade, toda vez que surgisse um dano a alguém provocado por outro membro da sociedade primitiva, havia a possibilidade de que a vítima causasse o mesmo mal ao seu ofensor (autotutela), no período da famosa “Lei de Talião”. Não se questionava acerca da culpa ou dolo do ofensor, tornando-se importante, tão-somente, a reparação do mal cometido, ficando a critério da precária “Administração Pública” impor somente quando e como a vítima poderia se valer da “justiça com as próprias mãos”. Porém, tal conduta não reparava o dano surgido, anteriormente, da forma como é entendida em nossos tempos; pior: provocava uma nova lesão a direito, não trazendo uma solução satisfatória tanto para o agressor, assim como para o agredido.
Contudo, a responsabilidade civil, com a forma que conhecemos, atualmente, de reparar o dano, não através de um sofrimento físico ao agressor (ficando essa imposição a cargo da responsabilização penal, não sendo objeto do presente estudo), mas sim por meio de uma indenização financeira à vítima, teve origem, no Direito Romano, com duas importantes normas legais: a “Lex Poetelia Papiria”, no século IV antes de Cristo, que conforme bem exposto por Washington de Barros Monteiro (apud BUSNELLO; PASQUALINI, 2.012), estabelecia que “os bens e não o corpo do devedor deveriam responder pelas suas dívidas (pecuniae creditae bona debitoris non corpus ob noxium esse)”; e, também, por meio da Lex Aquilia de Damno, na época de Justiniano, no século XI antes de Cristo, proibindo-se de que o lesado fizesse valer a sua “autotutela”, transferindo ao Estado a tarefa de sancionar o agressor, recaindo a pena em seu patrimônio, quando comprovado o elemento subjetivo em sua conduta danosa (dolo ou culpa). Nesse sentido, expõe Silvio de Salvo Venosa (apud CAVAZZANI, 2.007):
De qualquer forma, a Lex Aquilia é o divisor de águas da responsabilidade civil. Esse diploma, de uso restrito a princípio, atinge dimensão ampla na época de Justiniano, como remédio jurídico de caráter geral; como considera o ato ilícito uma figura autônoma, surge, desse modo, a moderna concepção da responsabilidade extracontratual.
A ideia de responsabilidade civil, com o passar do tempo, foi evoluindo, com o desenvolvimento de diversas teorias, alargando o seu campo de incidência, mas, persistindo o objetivo inicial trazido pela lei aquiliana, como exposto alhures, de reparar o dano provocado por meio de uma compensação financeira à vítima, podendo, atualmente, ser classificada, sob o ponto de vista do seu fundamento, como: contratual e extracontratual; de resultado e de meio; subjetiva e objetiva.
Para que possa existir a responsabilidade civil, devemos visualizar, no caso em concreto, elementos essenciais para que, assim, nasça o direito a uma indenização: a) uma conduta, caracterizada por uma ação ou omissão humana; b) um dano a direito; e c) nexo causal, ou seja, a relação existente entre a atividade e a lesão. Reunidos e comprovados esses, minimamente, em um processo judicial, passa a vítima a possuir o direito subjetivo a uma compensação financeira, através da caracterização da responsabilização civil objetiva, que se fundamenta na teoria do risco[1]. Essa modalidade do instituto em comento é a exceção em nosso ordenamento jurídico, devendo a legislação prever expressamente a sua caracterização ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano for prejudicial aos direitos de outrem, conforme determina o artigo 927, § único do Código Civil, não se questionando, portanto, a respeito de culpa ou dolo do ofensor. É a regra adotada, por exemplo, na responsabilidade do Estado por atos de seus agentes (artigo 37, § 6º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1.988) e do fornecedor de um produto ou prestador do serviço, conforme determinam os artigos 12, 13 e 14 do Código de Defesa do Consumidor (lei nacional 8.078/90). Nesta seara, nós temos o risco profissional, ou seja, o dever de indenizar advém de uma atividade laborativa que acarreta excepcional perigo para terceiros expostos à sua prática (por exemplo, a atividade nuclear), devendo por tal motivo ocorrer a sua indenização, conforme determina o artigo 927, § único do Código Civil, independente de se verificar qualquer elemento subjetivo do agente, tarefa essa dificultosa para a vítima, conforme expõe Silvio de Salvo Venosa (2.003, p. 17):
Todas as teorias e adjetivações na responsabilidade objetiva decorrem da mesma ideia. Qualquer que seja a qualificação do risco, o que importa é sua essência: em todas as situações socialmente relevantes, quando a prova da culpa é um fardo pesado ou intransponível para a vítima, a lei opta por dispensá-la.
A respeito da responsabilidade civil objetiva, afirma Maria Helena Diniz (apud CAVAZZANI, 2.007) que:
Como em certos casos a teoria da culpa, que funda a responsabilidade civil na culpa, caracterizada como uma violação de um dever contratual ou extracontratual, não oferece solução satisfatória, devido, p. ex., aos progressos técnicos, que trouxeram um grande aumento de acidentes, a corrente objetivista desvinculou o dever de reparação do dano da idéia de culpa, baseando-se na atividade lícita ou no risco com o intuito de permitir ao lesado, ante a dificuldade de prova da culpa, a obtenção de meios para reparar os danos experimentados.
Lado outro, quando a atividade do causador de um dano a direito de outrem não for de risco ou não houver, para o caso em concreto, legislação expressa estabelecendo o contrário, a responsabilidade civil será subjetiva, ou seja, para a sua caracterização, necessário se faz verificar, além dos pressupostos essenciais vistos na modalidade objetiva (conduta, dano e nexo causal), mais importante será analisar e comprovar pela vítima o elemento subjetivo (dolo ou culpa) do agente agressor. Esta é a regra no ordenamento jurídico brasileiro, conforme previsto no Código Civil, e como bem expõe o doutrinador Flávio Tartuce (apud SILVA, 2.013):
(...) a responsabilidade subjetiva constitui regra geral em nosso ordenamento jurídico, baseada na teoria da culpa. Dessa forma, para que o agente indenize, ou seja, para que responda civilmente, é necessária a comprovação da sua culpa genérica, que inclui o dolo (intenção de prejudicar) e a culpa em sentido restrito (imprudência, negligência ou imperícia).
A seu turno, a diferenciação fundamental existente entre a responsabilidade civil contratual e extracontratual (delitual ou aquiliana) se dá que naquela se baseia em um vínculo jurídico previamente existente (o que não há nesta última) entre o agressor e a vítima, por meio de um acordo, e que ocorrendo o inadimplemento de uma obrigação assumida anteriormente, surge daí o dano e, por consequência, o dever de indenizar, o que é reafirmado nas sábias palavras de Silvio Rodrigues (apud BUSNELLO; PASQUALINI, 2.012): “Na hipótese de responsabilidade contratual, antes de a obrigação de indenizar emergir, existe, entre o inadimplente e seu co-contratante, um vínculo jurídico derivado da convenção [...]”. Diferenciará entre uma e outra, também, o dever probatório, pois na responsabilização contratual, deverá o lesado somente comprovar o descumprimento do pacto, transferindo ao suposto infrator o ônus de provar que não houve a ruptura do trato ou de que, se ocorreu, se deve a fato externo a sua vontade e de que não restou caracterizada a sua culpa ou dolo no inadimplemento. Diferentemente restará a situação na responsabilidade extracontratual, pois a vítima, em regra, tem obrigação processual de comprovar o elemento subjetivo do infrator (além, logicamente, do dano, conduta e nexo causal) para ter o direito à indenização pelos danos suportados, sendo excepcionado esse dever nas hipóteses previstas legalmente, conforme afirmado, anteriormente, ao se explicar a respeito da responsabilidade objetiva.
Por fim, a última classificação da responsabilidade civil importante para o presente estudo se limita a verificar a responsabilização de meio ou de fim: aquela se dá quando o devedor se compromete em realizar sua atividade da melhor forma possível, com diligência e prudência necessárias para a consecução do objetivo, o qual não é obrigado a se atingir, e que, em regra, se dá de maneira subjetiva, ou seja, o lesado deverá comprovar que o lesante agiu de maneira culposa e que, por tal motivo, não adimpliu o pactuado, v.g., o trabalho de médicos e engenheiros; ao contrário, na responsabilidade de fim, o contratado se obriga a alcançar o objetivo determinado no pacto, devendo, nesta hipótese, para excluir eventual indenização pleiteada, comprovar que o não alcance do resultado adveio de circunstância alheia a sua vontade (responsabilidade objetiva). É o caso, por exemplo, dos transportadores ou cirurgião plástico estético.
Assim, independentemente da espécie (objetiva e subjetiva; contratual e extracontratual; de meio ou de fim), sempre que ocorrer um dano a direito de outrem provocado por uma ação ou omissão de alguém, em nosso ordenamento jurídico, nascerá a responsabilidade civil e, por consequência, o direito do lesado a uma indenização para compensar a dor infligida por aquela lesão.
No tocante ao advogado, ou seja, o bacharel em Direito devidamente inscrito no Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil, onde exerce com predomínio sua profissão, que poderá pleitear judicial ou extrajudicialmente em nome do seu cliente, assim como prestar consultoria ou assessoria jurídica, diante da importância da sua atividade (inclusive com previsão constitucional, como dito em parágrafos anteriores), o mesmo exerce verdadeira função social, já que participa, com o seu múnus público, na implementação da justiça na sociedade, zelando, com o seu mister, pelos direitos da coletividade ou, individualmente, de seus membros, não possuindo qualquer hierarquia no seu desempenhar com juízes e membros do Ministério Público, já que todos exercem funções diferentes em um processo judicial (postulação, julgamento e fiscalização, respectivamente). E, por isso, mesmo na defesa a direitos individuais, de caráter privado, ainda assim, sua atividade será regida pelas regras do Direito Público, já que presta ofício em prol social. Aplica-se a esse profissional (regendo o seu desempenhar), pelo critério da especialidade, o Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (lei nacional 8.906/94), com o seu Regulamento Geral, combinado com o Código de Ética e Disciplina e por demais atos regulatórios expedidos pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.
A respeito da origem e evolução da atividade advocatícia na sociedade brasileira, destaca Rui Stoco (apud SILVA, 2.013) que:
O exercício da advocacia, como instrumento de defesa dos direitos das pessoas, seus bens e interesses, nasceu no terceiro milênio antes de Cristo, na Suméria. No Brasil esse exercício como profissão reconhecida teve início com a criação dos cursos jurídicos em 11.08.1.827, sendo certo que a OAB foi criada em 1930, através do art. 17 do Dec. 19.408, do Governo Provisório, segundo narrativa de Justino Magno Araújo (Aspectos da responsabilidade civil do advogado. Revista da Escola Paulista da Magistratura, São Paulo, ano 06, n. 01, p. 41-61, jul.-dez./2.005).
Em seu atuar, o advogado deverá proceder com toda a probidade, honestidade, independência, decoro e permanente qualificação exigida, diligências necessárias essas para se alcançar todas as benesses que se originam do seu múnus público. Não procedendo desta maneira, acarretando dano de qualquer natureza a seu cliente ou a terceiros em seu atuar profissional, nascerá, por consequência, a sua responsabilidade civil, com o seu dever de reparar a lesão provocada (acarretará também sua responsabilização administrativa, sujeitando-se, assim, à sanção disciplinar da Ordem dos Advogados do Brasil). Contudo, devemos definir de que maneira será regida a sua obrigação de indenizar patrimonialmente, que é o objetivo deste trabalho: quais hipóteses, legislação aplicada ao caso, elementos mínimos necessários para a sua caracterização e o valor desta compensação financeira devida.
O advogado com o seu cliente se vinculam, em regra, por meio de um mandato[2], que poderá ser acompanhado por um contrato de honorários advocatícios, que conterá cláusulas que regerão a relação entre ambos. Ou seja, inicialmente, se houver danos provocados ao patrocinado no desempenhar deste pacto profissional, a responsabilidade do causídico será contratual[3]. Nesse sentido, o ensinamento de Rui Stoco (citado por SILVA, 2.013):
Efetivamente, a responsabilidade de qualquer profissional liberal – gênero de que os advogados são espécie – será, em regra, contratual, ainda, que não tenha firmado instrumento escrito com seu cliente. Recebendo a procuração, o advogado tem o dever contratual de acompanhar o processo em todas as suas fases, observando os prazos e cumprindo as imposições do patrocínio, como seja: falar nas oportunidades devidas, comparecer às audiências, apresentar as provas cabíveis, agir na defesa do cliente e no cumprimento das legítimas instruções recebidas (Caio Mário da Silva Pereira. Responsabilidade Civil. 03. ed. Rio de Janeiro: Forense, p. 162 – 163). (...) Obtempera com acerto Carlos Roberto Gonçalves ao recordar que o mandato é uma das formas de contrato previstas no Código Civil e impõe responsabilidade de natureza contratual do advogado perante seus clientes (ob. cit., 08. ed., 2.003, p. 382).
Desta feita, por nascer a relação do cliente com o seu advogado de um negócio jurídico (que poderá ser materializado em um instrumento de mandato), onde se obriga a exercer determinada atividade jurídica, a lesão a este pacto acarretará a responsabilidade civil deste profissional, que, em regra, sua obrigação será de meio, ou seja, comprometendo-se em desempenhar adequadamente o seu mister, com dedicação, diligência e com o devido conhecimento técnico, sem se obrigar a atingir qualquer resultado (esse se originará de uma decisão judicial – síntese – após a apresentação da tese e da antítese pelos advogados da parte autora e da ré). Nesta hipótese, se advir qualquer dano, a vítima deverá comprovar que o agente causador agiu, minimamente, com imprudência, negligência ou imperícia (culpa em sentido estrito), para auferir qualquer compensação financeira pela lesão sofrida[4]. É o que determina o artigo 32 do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (EAOAB), ao afirmar que: “O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa”. Ou seja, a regra é a responsabilidade civil subjetiva do advogado.
Excepcionalmente, pelas circunstâncias do caso em concreto, a responsabilidade civil do advogado poderá ser de resultado, quando este profissional se compromete em atingir aquilo que fora pactuado em contrato, obter um efetivo ganho ao seu cliente, exercendo a função de conselheiro, parecerista[5], na elaboração de um contrato. Devemos mencionar, ainda, a hipótese também do advogado proceder com abuso de direito, caracterizando-se, pois a violação de obrigação contratual. Nestas hipóteses, a vítima deverá somente comprovar que o objetivo não fora alcançado, independentemente de se verificar qualquer elemento subjetivo do agente causador do dano (responsabilidade objetiva), já que a culpa deste prestador de serviço é presumida.
E sendo objetiva a responsabilidade do advogado, não poderemos, ainda, defender a adoção, em face desse profissional, da teoria do risco (prevista no artigo 927, § único do Código Civil), presumindo-se, por consequência, absolutamente, a culpa na sua atividade. O risco necessário para a caracterização desta responsabilização, excepcionalmente, é o possível ou efetivo perigo de dano que determinada conduta, na busca de um proveito econômico, pode causar a terceiros (à sociedade), como, por exemplo, na atividade nuclear, o que não se visualiza na atividade de um profissional liberal como o advogado (risco esse que poderá ser visualizado, lado outro, no desempenho assumido por uma sociedade advocatícia, já que, contrariando o disposto no Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil, diversas bancas têm mercantilizado essa atividade, trazendo diversas práticas comerciais para esta seara, e que são proibidas por aquela legislação, como a captação de clientela, a título de ilustração).
Nesse ponto, importante se faz caracterizar se no exercício profissional do advogado deverá ser utilizado ou não o Código de Defesa do Consumidor (lei nacional 8.078/90), já que, por esta legislação, a regra adotada, em sede de responsabilidade civil, é a modalidade objetiva, e que se nos valermos desta norma legal, as regras especiais aí inseridas deverão ser empregadas na relação entre o advogado e seu cliente, como, por exemplo, a inversão do ônus da prova (artigo 6º, VIII do CDC).
Conforme determinação do artigo 02º do Código de Defesa do Consumidor, "consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final". É adotada, portanto, para a caracterização da parte hipossuficiente numa relação consumerista, a teoria finalista, devendo a pessoa física ou jurídica ser a destinatária final do produto ou serviço posto no mercado para consumo, não podendo repassá-lo adiante, em uma atitude de revenda. É expandido esse conceito, já que a própria lei nacional 8.078/90, em seu artigo 17, determina que todos aqueles lesados por evento que se originou de uma relação de consumo, mesmo não participando desta, inicialmente, poderão ser enquadrados como consumidores por equiparação e fazerem valer das regras previstas naquele estatuto consumerista.
Na outra ponta da relação de consumo, temos o fornecedor (ou prestador) de um produto ou de um serviço e que, conforme o artigo 03º do Código de Defesa do Consumidor, pode ser definido como: “(...) toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”.
E analisando-se ambos os conceitos, assim, podemos enquadrar tanto o advogado na definição de prestador de serviço, assim como seu cliente na capitulação de consumidor e que, por tal motivo, é perfeitamente plausível utilizarmos, para reger as suas relações, as regras previstas no Código de Defesa do Consumidor (lei nacional número 8.078/90) e que, por essa norma legal, reiterando o já afirmado no Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil, no seu artigo 32, a responsabilidade do profissional liberal[6] por danos provocados ao vulnerável consumidor se dará de forma subjetiva (artigo 14, § 4º), ou seja, dependente de se visualizar o dolo ou a culpa daquele (inclusive com igual entendimento do Superior Tribunal de Justiça e de grandes doutrinadores como Sérgio Cavalieri Filho e Paulo de Tarso Vieira Sanseverino) [7]. Portanto, o advogado será responsabilizado, em regra, de maneira subjetiva, diante da sua obrigação de meio, fundada em um contrato/mandato, podendo ser invertido o ônus da prova a favor de seu hipossuficiente cliente.
Nesse sentido, o exposto por CAVAZZANI (2.007):
No tocante à responsabilidade dos profissionais liberais, - e aqui se enquadra o advogado – o CDC apresenta uma regra diferente daquelas que regem os demais fornecedores de serviços, uma vez que para esses profissionais a referida legislação estabelece a responsabilidade subjetiva, isto é, para ser responsabilizado por sua conduta, a vítima deve demonstrar que o profissional liberal agiu com culpa, fato este que não descaracteriza a existência de relação de consumo. Os demais princípios da relação consumerista continuam a serem aplicados, como o da inversão do ônus da prova em favor do consumidor.
Portanto, não há impedimento algum em se utilizar tanto do Estatuto da Advocacia/Código de Ética, assim como do Código de Defesa do Consumidor, para se apurar a responsabilidade civil do advogado em sua atividade, pois tanto em uma como na outra norma legal, a regra a ser utilizada é a responsabilização subjetiva do profissional, ou seja, dependente de se apurar o dolo ou a culpa do agente causador do dano (artigo 14, § 4º do CDC; artigo 32 do EAOAB). Poderão, assim, serem utilizadas as regras especiais da legislação de defesa do consumidor, como a inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII do CDC). Corroborando neste sentido, a sábia lição de Sérgio Cavalieri Filho (apud MASSO, 2.011, p. 125):
(...) o Código do Consumidor não criou para os profissionais liberais nenhum regime especial. A única exceção que se lhes abriu foi quanto à responsabilidade objetiva. E se foi preciso estabelecer essa exceção é porque estão subordinados aos demais princípios do CDC. Assim, o médico, o advogado, o mecânico, o marceneiro, o costureiro, todos estão subordinados aos princípios da boa-fé, da informação, da transparência, da inversão do ônus da prova etc.
Por determinação do Código de Defesa do Consumidor, aplicável, portanto, às relações entre o advogado e seu cliente, que tem como regra a responsabilização subjetiva do profissional liberal[8] e dentre os diversos direitos básicos do consumidor a efetiva prevenção e reparação dos danos patrimoniais e morais, há diferenciação dos defeitos apresentados na prestação do serviço e, por isso, em suas consequências jurídicas: se ocorrer vício de qualidade do serviço, ou seja, quando o mesmo se caracterizar como inadequado para o fim a que se espera, como ingressar com uma medida judicial que se mostra não correta ao caso em concreto (habeas data ao invés de mandado de segurança), a lei nacional 8.078/90 adota (em seu artigo 20), excepcionalmente, a responsabilidade civil objetiva, ou seja, sem necessidade de se visualizar a culpa do profissional[9]. Nesse caso, poderá o advogado ser penalizado: com a reexecução do serviço, quando possível; a restituição da quantia paga (honorários advocatícios), monetariamente atualizada, mais perdas e danos; ou o abatimento proporcional do preço.
No caso de um advogado empregado ou membro de uma sociedade advocatícia que provoca um dano ao cliente desta, outorgante esse de uma procuração para todos os integrantes daquela coletividade profissional, aquela será responsabilizada objetivamente pela lesão auferida pelo patrocinado e, de maneira subsidiária, todos os sócios, ilimitadamente, conforme previsto no artigo 17 do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil, podendo-se ingressar, posterior e regressivamente, em face do autor do prejuízo original, que responderá subjetivamente, conforme determina o artigo 32 daquela norma legal, assim como o artigo 14, § 4º do Código de Defesa do Consumidor. Nesse sentido, o exposto por Fernando Antônio de Vasconcelos (apud CAVAZZANI, 2.007):
O preceito do art. 14, § 4º, da L. 8.078/90 (responsabilidade subjetiva do profissional liberal), aplica-se ao advogado que trabalha individualmente. Quando o serviço é prestado por sociedades de advogados, a responsabilidade deixa de ser subjetiva (dependente de culpa) e regula-se pela objetiva, ou seja, independente da prova de culpa. Evidente que não se outorga procuração a uma sociedade de advogados; contudo, mesmo se emitindo mandato para determinados sócios, a sociedade de advogados responderá de forma objetiva e, depois, poderá exercer o direito de regresso em face do profissional culpado. No caso de o dano ser provocado por advogado empregado de uma empresa, a sociedade empregadora responderá e, da mesma forma, poderá exercer o direito de regresso ao culpado.
Assim, se houver a caracterização da prestação pelo advogado de um serviço defeituoso, com previsão no artigo 14, §1º do Código de Defesa do Consumidor, a sua responsabilidade será subjetiva (a regra para os profissionais liberais no CDC, de acordo com o artigo 14, § 4º, conforme afirmado anteriormente), podendo ser utilizada, pelo juiz, no caso em concreto, da inversão do ônus da prova, quando este entender verossímil a alegação ou quando for o consumidor hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência. Pode, lado outro, o advogado excluir ou minimizar sua responsabilidade se comprovar culpa exclusiva, concorrente ou comum à sua, da vítima ou de terceiros, caso fortuito ou força maior, a inexistência do defeito na prestação do serviço e as excludentes genéricas como o estado de necessidade, legítima defesa, o exercício regular de um direito e o estrito cumprimento do dever legal.
Nessa discussão, verificamos a importância de se trazer à tona a teoria da “perda de uma chance” tão difundida pela doutrina e jurisprudência e que pode ser aplicada na relação entre o advogado e seu cliente. A “chance” aqui apresentada pode ser caracterizada como a oportunidade real que uma pessoa tem de obtenção de um proveito de natureza econômica, mas que, por circunstâncias alheias à sua vontade, deixa de percebê-lo. A indenização a que terá direito levará em conta a quantificação do prejuízo auferido pela vítima, ou seja, o quanto que deixou de ganhar por um erro que pode ter sido provocado pelo advogado, por exemplo, ao perder o prazo para ingresso com o recurso cabível, no caso em concreto, onde se visualiza uma clara oportunidade de um resultado favorável ao cliente, em segunda instância (lado outro, parte da doutrina entende não ser cabível a adoção desta teoria, já que as perdas e danos, conforme exposto no artigo 1.059 do Código Civil, englobariam somente o dano emergente e o lucro cessante e não um eventual ganho, onde paira a incerteza do seu efetivo resultado).
E o prejuízo pela perda de uma oportunidade (por exemplo, com a não impetração do recurso cabível), nesse caso, se materializaria na modalidade de “dano moral”, como bem expõe o doutrinador Novais Dias (apud CAVAZZANI, 2.007), ao afirmar que:
[...] nas situações em que, pela matéria discutida, não havia probabilidade de sucesso, não se pode cogitar de dano patrimonial causado pelo advogado, porque o prejuízo material sofrido pelo cliente não terá decorrido da falta de recurso, pois este, sem chances de êxito, nenhuma alteração para melhor ensejaria em favor do cliente. Neste caso, o dano que se pode considerar, embora nem sempre ocorra, é extrapatrimonial, ou dano moral, consistente na frustração decorrente de não ver sua pretensão reexaminada por um órgão jurisdicional superior.
O advogado deverá sempre, portanto, atuar com o máximo de diligência possível na sua atividade profissional, desde uma simples consulta verbal em seu escritório, assim como ao postular judicial ou extrajudicialmente em defesa dos direitos do seu patrocinado, pois se aquele se omitir em um conselho, numa petição, num recurso, se tornará responsável pelo ocorrido, podendo ser condenado a pagar uma indenização à vítima por seu mau proceder que se caracterizou por uma perda de uma chance devidamente comprovada. Independente de ser uma simples falta, já é o suficiente para caracterizar o seu dever de reparar[10], porém, o julgador, no caso em concreto, deverá analisar com razoabilidade o pedido de indenização, não se caracterizando, pois, falta do profissional se o erro se deve a um mínimo detalhe que somente um advogado com notório conhecimento do tema conheceria acerca desse meandro. Não será responsabilizado, todavia, se o dano sofrido pelo cliente foi originado por sua própria omissão, como, por exemplo, o não pagamento do preparo devido ao recurso, já que o advogado não deverá arcar com tal obrigação, sendo, nesse caso, uma hipótese de exclusão da responsabilidade civil do causídico.
Nesse sentido, a seguinte jurisprudência:
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ADVOGADO. PERDA DE UMA CHANCE. Danos morais e materiais. INOCORRÊNCIA. Para se acolher pleitos indenizatórios veiculados com base na “teoria da perda de uma chance”, impõe-se que esteja caracterizada a afirmada incorreta prestação de serviços pelo advogado réu em processos judiciais em que representou o autor e, outrossim, a real possibilidade de que se obtivesse êxito naquelas ações se não ocorressem as falhas do advogado. Caso em que esses requisitos não estão presentes, razão pela qual se mantém a sentença que julgou improcedentes os pedidos de indenização formulados pelo autor, ora apelante (TJRS, Apelação Cível número 70034929737, 16ª câmara cível, Apelante Tadeu Trindade, Apelado Ilan Thernin Himelfarb, grifo nosso).
RESPONSABILIDADE CIVIL DO ADVOGADO POR PERDA DE UMA CHANCE. PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS DE FORMA DEFEITUOSA. DEMONSTRAÇÃO. FRUSTRAÇÃO DO DIREITO DE RECORRER DO PROVIMENTO JUDICIAL PROFERIDO NA INSTÂNCIA PRIMÁRIA. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. INDENIZAÇÃO. CABIMENTO. A responsabilidade civil do advogado é contratual, decorrendo exclusivamente do mandato que lhe é confiado pelo mandante, donde só responderá pelas obrigações de meio. Insere-se nesse rol o dever de interpor o recurso desafiado pela sentença de primeiro grau contra a qual não se conformou o mandante. Descumpre esse dever o advogado que, por convicção íntima, não recorre, contrariando os interesses do cliente, e não renuncia ao mandato a tempo de salvaguardá-los, gerando o prejuízo imaterial para o cliente atinente à perda da chance de ver a sua demanda submetida ao exame do segundo grau de jurisdição, cuja expectativa girava em torno da possibilidade de reforma da sentença de primeiro grau. Indeniza-se não pelo que deixou de receber naquela demanda, mas pela frustração de não ter sido o seu pleito recursal analisado pelo Judiciário (TJDFT, Apelação cível 20070110741277 APC, Apelante: Pedro Gonçalves da Cruz, Apenado: Amaro Rosa de Moraes, Acórdão número 324.931, grifo nosso).
RESPONSABILIDADE CIVIL. Recurso Especial. DANO MORAL. PERDA DE PRAZO POR ADVOGADO. TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. DECISAO DENEGATÓRIA DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO ESPECIAL NA QUESTAO PRINCIPAL QUE ANALISOU AS PRÓPRIAS RAZÕES RECURSAIS, SUPERANDO A ALEGAÇAO DE INTEMPESTIVIDADE. DANO MORAL INEXISTENTE. 1. É difícil antever, no âmbito da responsabilidade contratual do advogado, um vínculo claro entre a alegada negligência do profissional e a diminuição patrimonial do cliente, pois o que está em jogo, no processo judicial de conhecimento, são apenas chances e incertezas que devem ser aclaradas em juízo de cognição. 2. Em caso de responsabilidade de profissionais da advocacia por condutas apontadas como negligentes, e diante do aspecto relativo à incerteza da vantagem não experimentada, as demandas que invocam a teoria da "perda de uma chance" devem ser solucionadas a partir de detida análise acerca das reais possibilidades de êxito do postulante, eventualmente perdidas em razão da desídia do causídico. Precedentes. 3. O fato de o advogado ter perdido o prazo para contestar ou interpor recurso - como no caso em apreço -, não enseja sua automática responsabilização civil com base na teoria da perda de uma chance, fazendo-se absolutamente necessária a ponderação acerca da probabilidade - que se supõe real - que a parte teria de se sagrar vitoriosa ou de ter a sua pretensão atendida. 4. No caso em julgamento, contratado o recorrido para a interposição de recurso especial na demanda anterior, verifica-se que, não obstante a perda do prazo, o agravo de instrumento intentado contra a decisão denegatória de admissibilidade do segundo recurso especial propiciou o efetivo reexame das razões que motivaram a inadmissibilidade do primeiro, consoante se dessume da decisão de fls. 130-134, corroborada pelo acórdão recorrido (fl. 235), o que tem o condão de descaracterizar a perda da possibilidade de apreciação do recurso pelo Tribunal Superior. 5. Recurso especial não provido (STJ, Recurso Especial número 993.936 RJ, Recorrente: Solange Pereira Alves, Recorrido: José Pereira de Rezende Neto, grifo nosso). |
Questão outra controvertida que pode aparecer na relação entre advogado e seu cliente, se mostra no que se refere à “cláusula de não indenizar” no contrato de honorários advocatícios, que, como a própria denominação indica, exclui prévia e totalmente a responsabilidade civil do profissional contratado no tocante aos prejuízos sofridos, por seu patrocinado, no desempenhar de sua profissão. Se utilizarmos das regras dispostas no Código Civil, verificamos que tal estipulação é válida, de acordo com a liberdade contratual que possuem as partes contratantes e com a presunção de boa-fé que se imbuem os mesmos.
Porém, como afirmado e demonstrado em parágrafos anteriores, a relação entre o advogado e seu cliente é regulada pelas regras previstas no Código de Defesa do Consumidor e que, por tal norma legal, por expressa determinação do artigo 25, é proibida qualquer estipulação contratual que venha a prejudicar direitos básicos do consumidor, excluindo-se a responsabilidade do prestador do serviço por danos provocados durante sua atividade e que venha a lesionar, minimante, a parte vulnerável desta relação, podendo, inclusive, se enquadrar como cláusula abusiva, nula de pleno direito. Nesta relação, não há igualdade entre as partes contratantes, e para se evitar um maior desequilíbrio entre esses, não se pode adotar tal mecanismo contratual, mas sim instrumentos com o intuito de se igualar as partes desta relação consumidora. Lado outro, há entendimento contrário a esse, na doutrina, podendo-se citar o que expõem os professores Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho (apud SILVA, 2.013), ao tratar do tema, afirmando-se que tal disposição contratual é válida legalmente, desde que presentes determinados pressupostos:
Para esse novo Direito Civil, mais socializado, subversivo dos antigos paradigmas, a cláusula de não indenizar, posto que não seja vedada pelo Código Civil, é condicionada a alguns parâmetros como a igualdade dos estipulantes e não-infringência de superiores preceitos de ordem pública. Não é por outro motivo que o Código de Defesa do Consumidor, a mais bela e revolucionária lei do País, em seu art. 25, veda cláusula que impossibilite, exonere ou atenue a responsabilidade civil do fornecedor. E o motivo é simples: a hipossuficiência do consumidor aconselha a intervenção estatal no domínio da autonomia privada, para considerar abusiva a cláusula que beneficie a parte economicamente mais forte. Principalmente em se tratando de contratos de adesão, em que a manifestação livre da vontade do aderente é mais reprimida.
Por fim, outro ponto que gera polêmicas na relação do advogado com o seu cliente se dá a respeito da lide temerária, ou seja, quando aquele se coliga com este no interesse de lesar dolosamente terceiro em uma lide processual, conforme definido no artigo 17 do Código de Processo Civil. Ocorrendo tal conduta, o profissional responderá de maneira solidária com o seu contratante pelos danos causados à parte contrária, de acordo com o artigo 32, § único do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (EAOAB), o que será apurado em processo autônomo daquele em que se verifica tal comportamento que fere as disposições éticas e legais vigentes às quais está obrigado a cumprir (inclusive, responsabilizando-se de maneira objetiva o profissional, já que há um abuso no seu exercício da advocacia), o que nas sábias palavras de Ricardo Duarte Cavazzani (2.007):
[...] infelizmente, muitos são os profissionais que se desvirtuam do fim precípuo da advocacia, não tendo postura nem conduta ética, resultando no desgaste da imagem e do prestígio de toda a classe de advogados, andando na contramão da importância dessa atividade, pois o advogado é indispensável à administração da justiça e, por esse motivo, deve manter-se íntegro em seu mister para ser merecedor da confiança, da credibilidade e da aceitação popular.
Assim, verificamos que diante do número crescente de advogados no Brasil, há a possibilidade da ocorrência maior de danos provocados pelos mesmos a seus clientes e terceiros, o que pode ser justificado pela precariedade da grande maioria dos cursos jurídicos ofertados em nosso país, como também aos métodos governamentais adotados para avaliação das instituições de ensino superior, privilegiando a quantidade em detrimento da qualidade, além da falta de investimento público na educação desde os seus primórdios até o ensino superior. E ocorrendo o dano provocado por esse profissional liberal, independente do motivo, advirá a responsabilidade civil ou patrimonial deste, gerando o direito à indenização ao seu cliente ou terceiro afetado por sua conduta.
A responsabilidade civil do advogado, como visto, tem como regra ser contratual (pois advém de um mandato e/ou contrato de honorários advocatícios), subjetiva (ou seja, dependente da verificação do elemento culpa ou dolo na sua conduta) e ser de meio, devendo o profissional aplicar todas as técnicas e conhecimento na busca de um resultado positivo ao cliente, mas não se obrigando a alcançá-lo. Por tal motivo, o profissional deve ser empenhar para que a causa sob o seu patrocínio tenha um desfecho positivo, mas se, por sua culpa tenha resultado diverso, pois ocorreu desvio dos parâmetros profissionais mínimos, deverá ser responsabilizado civilmente pelo infortúnio causado ao seu cliente e/ou terceiro, inclusive, como dito anteriormente, dentre uma das penalidades, perdendo o direito aos honorários advocatícios.
E diante da diversidade de normas legais que tratam do assunto, resta sempre a dúvida qual a mais adequada para a resolução de um caso em concreto, o que justificou o presente trabalho, e que como foi demonstrado no decorrer do mesmo, não há qualquer impedimento na utilização do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil cumulado com o Código de Ética e demais disposições provindas do Conselho Federal, por critério de especialidade. Mas, o que restava dúvida maior referia-se à utilização ou não do Código de Defesa do Consumidor, matéria controvertida na doutrina e na jurisprudência, porém, como exposto no presente texto, tanto o advogado como o seu cliente se enquadram perfeitamente nas definições de prestador de serviço e consumidor, presentes nos artigos 02º e 03º da lei nacional 8.078/90, ou seja, todas as disposições presentes no CDC para os profissionais liberais e que não sejam contrárias às regras específicas do Estatuto da Advocacia, poderão ser utilizadas na solução de um caso em concreto, como, por exemplo, a inversão do ônus da prova em favor do cliente lesado.
Outro ponto também discutido no decorrer deste artigo e de suma importância, com acalorada discussão tanto na doutrina como jurisprudência, é a adoção da “teoria da perda de uma chance”, onde o advogado deverá responder civilmente toda vez que causar um dano ao seu cliente em virtude de uma omissão sua em situações em que deveria atuar, trazendo a este a perda da oportunidade de que seu interesse seja devidamente avaliado em todos os seus aspectos pela autoridade competente. Procedendo desta forma, nascerá para o lesado o direito subjetivo à indenização.
Mas para que não tenhamos, no caso em concreto, a necessidade de utilizarmos de todos os aspectos presentes e expostos no decorrer deste trabalho, podendo assim exigir respeito e obter ainda mais prestígio à classe, o advogado deverá comportar-se com probidade, honestidade, decoro, urbanidade, polidez, e diligência (mantendo-se sempre atualizado com a mais recente doutrina, jurisprudência e legislação), perante o seu cliente, magistrado, promotor de Justiça, delegado de polícia, etc., inclusive com a parte adversa ao seu patrocinado. Deve-se mudar o atual pensamento de diversos “profissionais” que, em desrespeito ao seu cliente e ao Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil e o Código de Ética, não somente cometem erros grosseiros, mas com a ideologia de se privilegiar a quantidade de causas em detrimento da qualidade do ofício prestado (acarretando uma verdadeira mercantilização da atividade advocatícia), com a exclusiva captação de clientela, ao invés de se preocupar em prestar um serviço compatível com a grandeza da advocacia, como preceitua a própria lei 8.906/94 (em seu artigo 02º) e a Constituição da República Federativa do Brasil de 1.988, tendo como características essenciais dessa atividade a indispensabilidade na administração da Justiça, a inviolabilidade, a função social e a independência, nobre labor esse que visa à liberdade de todos e protetor contra todo e qualquer tipo de lesão ao Estado Democrático de Direito.
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______. Lei nacional número 8.906, de 04 de julho de 1.994. Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Vade mecum: 2.014 com foco no exame da OAB e em concursos públicos. 05 ed. p. 988-996. Niterói: Impetus, 2.014.
______. Lei nacional número 8.078, de 11 de setembro de 1.990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Vade mecum: 2.014 com foco no exame da OAB e em concursos públicos. 05 ed. p. 689-699. Niterói: Impetus, 2.014.
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