No dia 24.05.2015 os goianienses acordaram atônitos com o reajuste repentino e sorrateiro dos preços dos combustíveis, que chegou a 50% no valor do litro do etanol e de 22% no da gasolina, cabendo destacar que referido reajuste ocorreu de forma simultânea na maioria dos postos da capital goiana.
O Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do Estado de Goiás (Sindiposto) informou desconhecer o motivo dos reajustes, ou seja, não houve motivo justificável para o reajuste dos preços.
Ocorre que o aumento, além da indignação, trouxe à baila uma questão bastante controversa acerca da questão do reajuste simultâneo dos preços: a conduta dos proprietários dos postos de combustíveis caracteriza o cartel ou decorre do princípio da livre concorrência preceituado no Art. 170, IV da Constituição Federal?
Ora, diferente do que afirmado por muitos que, no anseio de defender o reajuste, informaram que se tratava de conduta amparada pela "livre concorrência", não se pode confundir o princípio da livre concorrência com a prática de conduta anticompetitiva, que é a que se abstrai do reajuste repentino dos preços dos combustíveis ocorridos recentemente que demonstram, num primeiro momento, a intenção de aumentar arbitrariamente os lucros dos proprietários dos postos de combustíveis.
A vedação ao aumento abusivo dos lucros é de tamanha importância que mereceu atenção do constituinte ao fazer constar no corpo da Constituição o artigo 173, que informa que a exploração direta da atividade econômica se dará através da iniciativa privada, determina expressamente que a lei reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros (parágrafo 4°), responsabilizando tanto os dirigentes da pessoa jurídica quanto esta pelos atos contrários à ordem econômica, financeira e contra a economia popular
Importante destacar que a Agência Nacional do Petróleo não regula os preços de combustíveis, pois, de acordo com a legislação brasileira, desde 2002 vigora o regime de liberdade de preços para os combustíveis, não havendo qualquer tipo de tabelamento de preços ne fixação de valores máximos e mínimos ou exigência de autorização oficial prévia para o reajuste de preços dos combustíveis.
Entretanto, no caso em tela, o reajuste simultâneo do preço dos combustíveis pode caracterizar infração à ordem econômica, uma vez restar preceituado no Art. 36 da Lei nº 12.529/2011 o seguinte:
´´Art. 36. Constituem infração da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados, que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam alcançados:
(...)
III - III - aumentar arbitrariamente os lucros´´
A referida lei ainda dispõe:
´´§ 3o As seguintes condutas, além de outras, na medida em que configurem hipótese prevista no caput deste artigo e seus incisos, caracterizam infração da ordem econômica:
I - acordar, combinar, manipular ou ajustar com concorrente, sob qualquer forma:
a) os preços de bens ou serviços ofertados individualmente; ´´
Assim, o reajuste simultâneo dos preços dos combustíveis não decorre do princípio da livre concorrência, mas ao contrário, atenta contra o referido princípio e demonstra ter havido ajuste entre os concorrentes para a majoração dos preços dos combustíveis, conduta essa que caracteriza de forma nítida a infração à ordem econômica prevista no Art. 36 da Lei nº 12.529/2011.
No caso da infração à ordem econômica, há a necessidade de instauração de inquérito administrativo pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica que pode culminar com a pena de, no caso de empresa, multa de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do valor do faturamento bruto da empresa, grupo ou conglomerado obtido, no último exercício anterior à instauração do processo administrativo, no ramo de atividade empresarial em que ocorreu a infração, a qual nunca será inferior à vantagem auferida, quando for possível sua estimação.
Um ponto importante que merece destaque é o fato de que cada prejudicado pode ajuizar ação para fins de coibir a prática de infração da ordem econômica e, ainda, buscar o ressarcimento pelas perdas e danos sofridos em decorrência do aumento arbitrários dos lucros dos donos de postos de combustíveis.
Impende destacar que é incabível o argumento dos empresários de que os preços haviam sido reajustados pelo fato de terem sido fixados em caráter de promoção, uma vez que houve homogeneidade no aumento dos preços, o que atrai a aplicação da legislação pertinente para impedir que os consumidores sejam prejudicados em decorrência da cartelização que se vislumbra na conduta dos donos dos postos de combustíveis.
É extremamente necessário que a Delegacia de Defesa do Consumidor, PROCON, Ministério Público, CADE e o Poder Judiciário interfiram na conduta adotada pelos empresários, cada qual de acordo com a competência que a legislação lhe conferiu.
Ademais, o consumidor tem o dever de sair de sua condição de passividade e acionar os órgãos competentes, pois somente com a materialização da indignação é que os órgãos competentes passarão a dar uma maior importância para a conduta adotada pelos proprietários dos postos de combustíveis em plena recessão econômica.