RESUMO
O presente trabalho discute a redução da maioridade penal (PEC 171/93) proposta pelo deputado Benedito Domingos – PP/DF. Porém, com as lacunas contidas no ordenamento jurídico brasileiro – positivo – o debate estabelecido tem como intuito refletir sobre as atuais codificações, infraestruturas e estatutos e suas respectivas falhas, e também observar os anseios da sociedade que não suporta mais a impunidade penal e os altos índices de criminalidade no âmbito urbano. O artigo demonstra faces favoráveis e desfavoráveis à redução da maioridade penal no Brasil, bem como a aplicabilidade do Código penal e ECA à cerca da proposta de emenda à constituição além de, movimentos internacionais contrários à redução em seus respectivos países. A presença do Estado diante dos fatos posteriormente demonstrados deve ser de empreendimento em escolarização como aplicação do período integral, além de, alto índice de certeza do castigo – isto é – eficiência na polícia e Justiça.
Palavras-chave: ECA. Políticas Públicas. Maioridade Penal. Violência Urbana.
INTRODUÇÃO
O tema violência, em especial a urbana, está sendo colocada de forma errônea na sociedade brasileira atual. Reduzir idade penal reduz criminalidade? Países como Espanha e Alemanha já tem resposta para isso, não! Nem entrarei no argumento de cláusula pétrea pois, considerando ela esse debate nem existiria. Diversas vezes foi dito sobre o descaso e a irresponsabilidade do governo perante os direitos de todos, inclusive os que estão presos. Ocorrerá, em um futuro não muito distante, com a aprovação dessa redução, uma criança de oito anos de idade com uma arma na mão. Então estaremos aqui de novo, discutindo mais uma redução. O determinismo tomará conta, e quem sabe um inocente feto será acusado penalmente por sua mãe residir em uma favela ou periferia.
Por isso, deve-se considerar diante do assunto Maioridade Penal, a aplicação de políticas públicas que são estratégias governamentais para solucionar questões relacionadas ao sistema e atingem todas as áreas: saúde, segurança pública e educação. No presente trabalho, o foco é a educação paralela com segurança pública que requer planejamento e principalmente investimento. Infelizmente o Estado peca atualmente em sua administração e, desse modo, ocorre a precarização educacional que consequentemente leva a um falho desenvolvimento social e mental das crianças e jovens. E depois, o abandono do Governo após a atitude dele anteriormente citada, leva os menores á atos condenáveis.
Porém, não se pode pautar apenas de que todo o problema aqui trabalhado seja culpa do Estado. Por trás da PEC 171/93, mesmo com sua revogação ou homologação, há a existência de diversos problemas que coexistem com a sociedade e essa não apenas tem direitos como deveres. A participação do povo na política é deveras importante, pois, caminha ele ao conhecimento de seus direitos e, seu real papel no país, isto é, uma reflexão sobre o que é ser um cidadão.
VIOLÊNCIA URBANA, E A SUPOSTA IMPUNIDADE QUE OS MENORES INFRATORES TÊM.
Primeiramente, os dois tópicos que iniciaram tudo isso; A violência urbana, e a suposta impunidade que os menores infratores têm. É ilusório querer argumentar contra a atual realidade brasileira e seu índice de criminalidade altíssimo, o site O Globo publica em 2013: “Segundo um estudo das Nações Unidas, de 2013, o Brasil é hoje o 12º país mais violento do mundo, à frente apenas de países como Venezuela, Honduras, Colômbia e África do Sul”. Em consonância com esse dado é do conhecimento de todos que o Brasil também se destaca entre os primeiros 5 países que mais prendem no mundo. Porém, não vejo relação, muito menos proximidade de punição com educação. No caso, a reeducação. Os presídios brasileiros estão em uma situação que mais do que tirar a liberdade do indivíduo por determinado tempo para uma suposta ressocialização que o Estado diz oferecer, tira sua dignidade (art. 1º CF/1988, III). Entretanto a medida quando levado a público – midiático – a aplicabilidade, é paliativa. Enfim, a pauta aqui não são os maiores de dezoito anos, e sim as crianças e jovens. Mas paralela a essa discussão, os presídios brasileiros poderiam obter uma atenção e reflexão do porquê de seu atual estado. Talvez a reflexão deve-se iniciar neste debate sobre redução ou não da maioridade penal.
Por que os altos índices de violência urbana? Por que a ressocialização do apenado é falha? Por que cada vez mais crianças e jovens são atraídos para o crime? A resposta para todas essas perguntas tem início num berço. Não metaforicamente, mas de fato um berço. Quando uma criança nasce. De ouro ou de palha, ela acaba de adquirir personalidade civil é tem aptidão para direitos e deveres, Código Civil/2002 artigos 1º e 2º. Porém, o olhar do Estado sobre aquela criança do berço de palha é diferente dos demais. É nítida quando lhe convém, e ofuscada quando não precisa, muitas vezes até invisível o pequeno ser humano transforma-se. E se esse ser desaparece diante de nossos governantes, escolas, lazer, segurança ficam invisíveis também. Porém, o tempo é implacável, e aquela criança cresce. E como diz Max Gonzaga em sua música Classe Média: “toda tragédia só me importa quando bate em minha porta”. A invisibilidade toma corpo, o jovem – grande maioria no tema aqui discutido é de classe baixa, periferia, favelas e negros – comete um crime, e alguém acaba perdendo um familiar, algum objeto de valor ou até mesmo sua integridade e na pior das hipóteses sua vida. Depois de ficar ausente por um tempo, o Estado aparece para punir. E agora não contente com isso, querem aumentar o impacto desta punição no menor infrator.
Assim, entramos no segundo tópico, a suposta falta de impunidade argumentada muitas vezes neste debate. Gostaria de frisar que há punição para o jovem que cometer crime, o Brasil permite a privação da liberdade de adolescentes a partir dos 12 anos e 1 dia. Por que digo “jovem”?!
MENOR INFRATOR DIANTE DO ECA E CÓDIGO PENAL
Há uma grande diferença entre criança infratora, definição esta que regerá até os doze anos incompleto e jovem infrator. No primeiro caso, o menor, como diz o artigo 105 do ECA: "Ao ato infracional praticado por criança corresponderão as medidas previstas no artigo 101". Medidas essas que serão de proteção e que o infrator não poderá ser internado. Antes da exclamada: “aí, a impunidade!”:
Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses previstas no art. 98, a autoridade competente poderá determinar, dentre outras, as seguintes medidas:
I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade;
II - orientação, apoio e acompanhamento temporários;
III - matrícula e freqüência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental;
IV - inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente;
V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial;
VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;
VII - abrigo em entidade;
VIII - colocação em família substituta
Esse artigo é de grande importância pois, estipula as medidas. Já no segundo caso, estarão sujeitos aos infratores às medidas socioeducativas e não de proteção, medidas listadas no Capítulo IV do ECA artigo 102¹, entre as quais está a internação, e conforme artigo 121, § 3º, forçada (detenção física) por um período de no máximo 3 (três) anos, do referido Estatuto. Além disso há outras possíveis medidas socioeducativas nos artigos 115 – 120 do ECA.
¹Art. 102. As medidas de proteção de que trata este Capítulo serão acompanhadas da regularização do registro civil. (Vide Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
Concluindo a colocação dessa argumentação de ausência de punição no setor de “argumentos falsos/nulos, há uma diferença entre "idade penal" e "idade de responsabilidade penal juvenil". No Brasil, a primeira é dezoito anos e a segunda, doze. Em nosso país, como já foi dito, é permitido a privação da liberdade de adolescentes a partir dos doze anos, e isso caracteriza como uma postura penal rara comparada ao resto do mundo. A grande maioria dos países têm essa idade maior que a brasileira, quatorze anos ou até dezesseis ao invés de doze anos. Portanto, o Brasil não só pune, como é mais severo que grande parte mundial. Aplicações socioeducativas devem ser melhoradas não ignoradas, “[…]é exemplo concreto de que o ECA precisa ser aplicado, e não modificado. Para multiplicá-la pelo país, basta vontade política de governantes, pois recursos financeiros não faltam -o interno da “Febem”, por exemplo, custa quatro a cinco vezes mais que um jovem atendido pelo NAI”.²
CONCEITO DE IMPUTABILIDADE, INIMPUTABILIDADE E SEMI-IMPUTABILIDADE
No âmbito jurídico a imputabilidade é a capacidade que tem a pessoa que praticou certo ato de caráter ilícito e da compreensão de tal, estabelecendo nexo entre a ação e seu agente. A imputabilidade penal em sua codificação tem como tópicos Inimputáveis, Redução de pena, Menores de dezoito anos, Emoção e paixão e Embriaguez fundamentados nos Artigos 26 a 28, todos do Código Penal brasileiro de 1940. Diante disso, a conceituação de Inimputabilidade é dada por alguma anomalia mental que, coloque a pessoa incapaz de responder por si judicialmente. Também são considerados inimputáveis os menores de dezoito anos, como previsto no artigo 104 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA – Lei nº 8.069/1990):
Artigo 104: “São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos,
sujeitos às medidas previstas nesta Lei.
Retornando para o Código Penal, é de extrema importância a compreensão do artigo 26 pois, a confusão entre inimputáveis e semi-imputáveis pode ocorrer. No primeiro é a isenção de pena do agente por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, ao tempo da ação ou omissão, incapaz de compreender o ato ilícito praticado. Já o segundo, inserido no Parágrafo único depois do artigo 26 seria como uma atenuante diante da inimputabilidade. Assim, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços, se o agente em virtude de discernimento mental incompleto que não era capaz de entender o fato ilícito.
ALTOS ÍNDICES DE CRIMINALIDADE NO ÂMBITO URBANO
O Brasil a cada ano que passa só aumenta sua taxa de criminalidade nas cidades. A atuação do Poder Público é fraca, e isso deixa espaço para a propagação do crime. ² NETO, Newton Lima. LIMA, Agnaldo Soares. ECA: cumprir antes de modificar.
São os chamados espaços segregados, áreas urbanas em que a infra-estrutura urbana de equipamentos e serviços é precária ou insuficiente. Além do crescimento do tráfico de drogas e disseminação das armas de fogo que elevam os números de homicídios. Segundo o Mapa da Violência 2013: “Brasil mantém taxa de 20,4 homicídios por 100 mil habitantes”. O Jornal o Globo cita ainda que de acordo com mapa:
“O estudo confirma ainda a "nacionalização" dos homicídios e duas diferentes tendências da violência. O número de assassinatos a tiros tem aumentado em áreas tradicionalmente hospitaleiras do Norte e do Nordeste e diminuído no Sudeste, a partir de avanços registrados em São Paulo e no Rio de Janeiro. Dos cinco estados mais violentos do país em 2010, três estão na região Nordeste: Alagoas, Bahia e Paraíba. Quatro das cinco cidades com os dados estão no litoral da região: Maceió, João Pessoa, Salvador e Recife.”
Entretanto, Júlio Jacobo Waiselfisz, coordenador do Mapa da Violência 2013 ressalta que, não se pode dizer que há uma nordestinização da violência no país pois, tem crescido também em Regiões do Sul como, Paraná e Santa Catarina e também em Brasília.
Desta forma, o Brasil mantém seu índice de violência vinculado a faltas de ações governamentais públicas próprias. Ocasionando por exemplo, o lançamento do projeto de lei 3722/2012, que acaba com o Estatuto do Desarmamento. Que devastador para o setor social.
Portanto, crimes urbanos são efeitos de causas da incompletude burocrática. Os jovens, cujo índice de crime é muito pequeno diante dos cometidos pelos adultos, são alvos de exclamações públicas por punições imediatas, severas e sem sensatez. Esta alta taxa de criminalidade urbana não tem como principal agente o menor, e sim a distância do Poder com a real sociedade. Na qual a proporcionalidade da violência é linear com exclusão social.
ALTO ÍNDICE DE CERTEZA DO CASTIGO E EFICIÊNCIA NA POLÍCIA E JUSTIÇA
Muitos se colocam a favor do projeto de lei 3722/2012, que acaba com o Estatuto do Desarmamento, alegando que esse Estatuto dá maior ação aos “marginais”. Porém, isso é apenas fruto de uma carência na segurança pública. A falta de confiança no Poder e em suas competências resulta em posições contrárias até para projetos como este que, na teoria colocariam o País em uma situação de harmonia e distanciamento da violência. Mas, ocorre um certo efeito paradoxal diante disto, pois, uma ação como a de desarmamento, que deveria afastar adultos e jovens das armas e consequentemente de crimes, acaba aproximando a sociedade para um estado de infrações penais aumentadas.
Colocar o sujeito idôneo que quer ter uma arma para exercer o seu direito de autodefesa é afirmar que o país desconstitui de leis, aplicações jurídicas e limites, esse último provocando o ferimento do outro com a tal autodefesa. O cidadão acaba sendo penalizado com a violência urbana, pela perda da sua liberdade, porém, ele mesmo desconhece de tal efeito a ponto de apoiar a redução da maioridade penal.
PERFIL DO MENOR INFRATOR
O perfil do menor infrator é caracterizado por ter em sua maioria jovens de 17 e 18 anos, da raça negra, sexo masculino e residirem com a mãe. Com base nisso, é observado a exclusão social perante o assunto Maioridade Penal. A insustentabilidade proporcionada pelo Estado por falta de políticas públicas não só resulta na exclusão como na aproximação do menor com o crime. “Atos infracionais análogos a roubo, homicídio, tentativa de homicídio e tráfico de drogas” diz o Correio Brasiliense.
É evidente que há menores infratores de várias classes e raças. Mas, seguindo o dado a acima caracterizando-os, fica claro que falta de educação, a segregação que ocorre nas cidades pela capitalização do espaço e descaso governamental designa um grupo de infratores específico á punições e outro de isenções. A classe baixa do país sofre uma espécie de preconceito social que, a coloca em posição delituosa. É posta a situação financeira/social da pessoa como produto de sua própria incompetência. A pobreza, dificilmente definir sua origem, é tratada com observância por Amelia Gonzalez quando diz: “Foi quando o homem se deixou ser dominado por outro homem, em nome de segurança e por medo da morte, que surgiu a figura do pobre”.
Sendo assim, o menor infrator não deve sofrer duras medidas como a Redução da Maioridade Penal, já que este é levado a atos penais desde que nasce. A supremacia da socialização de povos deve atingir em grande escala o território do Brasil mais que ações públicas irracionais para acertar o efeito e não de fato a causa. Hélio Pellegrino entende a criminalidade como questão social, “o crime está para a criminalidade assim como a doença isolada está para a epidemia”.
O PAPEL DO ESTADO PERANTE O PROBLEMA
Não é novidade que o Brasil tem em suas raízes um certo descaso com o povo, principalmente aquele mais humilde. E na atualidade, esse descaso tem aumentado pela elevada desvirtuação do Estado. O papel do Poder Público além de como dissertado anteriormente em Alto índice de certeza do castigo eficiência na polícia e Justiça, tem o dever da efetividade na educação, saúde, lazer, etc. A abaixo um diagrama exemplificativo disponibilizado no GUIA TEÓRICO E PRÁTICO DE MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS:
Essas deveriam ser na prática as ações do Governo. Porém, a administração aplicada é fraca e se não efetuada em um setor acaba por estagnar os outros. Em teoria, a máquina estatal existe para beneficiar o cidadão; na prática, essa relação muitas vezes se inverte. E não há como o jovem, no caso, cumprir de forma incisiva atos constitucionais se esses nem regularizações – programas socioeducativos – são oferecidos.
A Constituição Federal traz a perfeição e lapso ao mesmo tempo. Assim como o “Estatuto da Criança e do Adolescente que segue a postura ideológica da Carta da República no que toca à doutrina da proteção integral” diz Evaldo Dantas Segundo. Portanto, se de fato reduzida a maioridade penal de 18 para 16 anos, mudanças constitucionais futuras deverão ser feitas. Pois, a perfeição já está disposta e regulamentada, o lapso é efeito de um mundo fora da sociedade moldada por esta Constituição. O menor deve ser amparado pelo Estado e não o contrário. Antes que os resultados puníveis ocorram.
REFUTANDO DISCURSOS PALIATIVOS FAVORÁVEIS À REDUÇÃO
Diversas vezes nos deparamos diante de debates com ideias contrárias, que aliás, fundamenta-se no fenômeno dialético. Este método que consiste na arte de debater, leva consigo argumentos consolidados em fatos e não em verdade, pois, toda verdade é relativa estando essa sujeita às perspectivas humanas. Na presente temática trabalhada, os argumentos favoráveis concentram-se na incompletude dos discursos. Foram escolhidos cincos³ dos principais pronunciamentos dispostos por partes favoráveis a redução da maioridade penal no Brasil, de modo que, posteriormente cristalizo os verdadeiros fatos diante das alegações paliativas e por vezes falsas.
CRIME
“A maioria das pessoas já estão cansadas de saber que são os delinquentes juvenis são os maiores causadores de roubos e pequenos furtos no nosso país, sendo eles presos e logo soltos para voltar para o crime. Como resultado desse sistema, pessoas passam a ter medo de andar na rua. Muitas são as pessoas que sofrem doenças psicológicas em função do pânico que já passaram na mão desses fascínoras, sendo obrigadas a gastar fortunas em tratamentos médicos e psiquiátricos. Muitas são as lojas assaltadas por esses menores que se veem obrigadas a terem que contratarem seguranças e repassar esse investimento para seus consumidores. Logo, toda a nossa sociedade paga caro com a tolerância a esses deliquentes.”
A afirmação do autor é sensacionalista e incompleta. Apresenta dados dispostos em seu argumento que colocam a percepção criminalística frente ao jovem apenas como infrator, e não como vítima. Em entrevista concedida à revista Carta Capital em junho de 2015, a coordenadora do programa de proteção à criança do Unicef, Casimira Benge relata: “[...] os adolescentes são muito mais vítimas de violência do que autores. Dos 21 milhões de brasileiros entre 12 e 18 anos incompletos, apenas 0,013% cometeram crimes contra a vida. Mas a cada hora um adolescente é assassinado. Neste quesito, o Brasil só perde para a Nigéria.”
IMPUNIDADE
“O adolescente, em conflito com a lei, ao saber que não receberá as mesmas penas de um adulto, não se inibe ao cometer mais atos infracionais. Isso alimenta a sensação de impunidade e gera crimes que jamais poderiam acontecer. Um menor de idade sabe que, em função de sua idade, poderá cometer quantos delitos puder, sabendo que terá uma pena branda.”
A sensação de impunidade existente hoje na população se dá por diversos fatores, seja por falhas na efetividade do papel dos três poderes (Legislativo, Judiciário e Executivo) do país, por falácias exageradas divulgadas por mídias ou por conflitos políticos que buscam propor seus ideais sejam eles fundamentados ou não, como o projeto aqui proposto por Benedito Domingos do Partido Progressista. Mário Volpi trabalha em suas obras como O adolescente e o ato infracional, O adolescente e a lei e Sem Liberdade, Sem Direitos, a existência de três mitos em relação ao menor com a Lei. São eles: do hiperdimensionamento do problema, da periculosidade do adolescente e da impunidade. Joao Batista Costa Saraiva, já citado no presente artigo, trabalha o terceiro mito de Volpi, da impunidade.
Dizer que: “O adolescente, em conflito com a lei, ao saber que não receberá as mesmas penas de um adulto, não se inibe ao cometer mais atos infracionais”, é de teor especulativo e preconceituoso. Lançar uma informação dessas na mídia obviamente alimentará a sensação de impunidade. E citações como: “Um menor de idade sabe que, em função de sua idade, poderá cometer quantos delitos puder”, dispõe o autor total desconhecimento não só da realidade, como a própria Lei. É dissimulação tratar atos infracionais com ilimitabilidade, o Estatuto da Criança e do Adolescente estipula de forma clara em sua lei as penas aplicadas sob os menores.
³ Redução da maioridade penal,10 motivos para ser a favor, 10 motivos para ser contra. Disponível em: https://acidblacknerd.wordpress.com/2013/04/25/euvi-reducao-da-maiorida-penal10-motivos-para-ser-a-favor-10-motivos-para-ser-contra/
MÃO-DE-OBRA
”Graças a essa impunidade, muitos criminosos recrutam menores de idade (buchas) para executar suas atividades criminosas. O menor é arrancado de sua infância com a promessa de uma vida de ostentação, cometendo crimes que muitas vezes adultos teriam receio de cometer por causa da altas penas. Devido a esse sistema cruel, a demanda por mão-de-obra menor de idade nunca é mitigada no mundo do crime.”
Lançar um argumento desses em apoio à redução é anular a própria efetividade do projeto. Pois, tratando ele como aprovado, a mão-de-obra não deixaria de existir, apenas se estenderia para menores de dezesseis anos como instrumentos desta ação criminosa. O que é explanado no conjunto de soluções para a violência urbana, é o aumento da pena para o adulto que utilizar o menor.
IMPOSTOS
“Pois quase 90% da população brasileira agoniza em favor da redução da maioridade penal. O brasileiro está cansado de pagar impostos para que a sua segurança seja cada dia mais mitigada. Vivemos numa democracia e a verdadeira vontade do povo é colocar esses criminosos atrás das grades. Todos estamos cansados de pagar impostos para o governo criar essas instituições que só aparecem na hora que ocorre uma grande rebelião. Se 90% dos brasileiros clama por isso é porque essa situação a muito já saiu do controle.”
Mais uma vez é dado o remédio temporário e não a cura. A redução da maioridade penal foi pautada como se fosse solução para a violência urbana. Isso fez a população brasileira acreditar que de fato é o que acontecerá. Porém, como já foi diversas vezes dito, não é o caso. Esta falsa democracia, da qual obtém-se direitos fundamentais a partir de impostos, gera a individualidade no inconsciente.
A porcentagem de jovens que sofrem violência – seja ela psicológica ou física – hoje é maior do que aqueles que cometem crimes. E dentre estes crimes o ato infracional mais comum é o furto. Em contraste com este dado, crimes hediondos são os com menos ocorrência, menos de 3%. Foi publicado no dia 22 de junho de 2015 na revista Carta Capital a notícia de que havia sido encontrado cassetetes com “Direitos Humanos” e “ECA” grifados nas ferramentas no Centro Educacional de Jovens (CEJ) em João Pessoa, Paraíba. Segundo o Ministério Público Federal eles eram utilizados para torturar os menores. Portanto, o clamor da população, que tem sim seu direito de exigir mais segurança, pela redução é simplesmente de teor punitivo. Uma injusta punição que mais de 90% de menores infratores terão que sofrer – se aprovada a PEC 171/1993 – por causa da falta de flexibilidade, humanismo e conhecimento dos reais fatos.
COITADISMO
“Já que os outros 10% não conseguem ganhar no voto, apelam para o bom-mocismo e para o coitadismo, dizendo que o menor é uma vítima do sistema. Se esquecem que nem todos os menores de idade que moram em regiões dominada.”
Primeiramente, o dado “10%” é referente a população que, sim coloca-se a favor, cerca de 90% – segundo algumas pesquisas de mídias – e mesmo que para menos ou mais esta porcentagem ainda na realidade é maior diante da face contrária à redução. Porém, são opiniões da população, que obviamente não devem ser ignoradas, mas que, não pesquisam os fatos, tampouco as legislações.
Diversas vezes este argumento é utilizado por parte da delegação representativa em prol da aprovação do presente projeto de redução, colocando o posicionamento contrário à redução como “pessoas querendo salvar os jovens”. Não se pode esquecer que está em debate os direitos humanos, tanto de quem sofre o crime como quem o comete. É fato que o menor pode vir se tonar uma vítima do sistema, como estes que tratamos na diminuição da idade penal. E se jovens não merecem um tratamento digno, mesmo sofrendo punição, quem merecerá? Os adultos? Nas penitenciárias brasileiras eles são em sua grande maioria negros ou pardos e pobres e 44,76% possuem o ensino fundamental incompleto, quanto maior a formação acadêmica menor essa porcentagem. E os tratamentos nestes sistemas são os mais indignos que um ser humano pode receber. A resposta do Estado para isto é fazer cortes em investimentos na Cidade, Saúde e Educação. Nem mesmo um investimento nas carcerárias é ocorrido.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Segundo o jornal Gazeta do Povo, uma pesquisa nacional feita naquele ano (2013) cerca de 90% da população apoiava a redução da idade penal. Em 2015 não houve grandes mudanças nessa estatística. Porém, a representatividade desta face é minoria em debates. A questão lançada é; se é maioria no país a aprovação da redução, por que poucos pronunciam-se nas discussões? O regime democrático atualmente adotado pelo Brasil é a democracia, e ela clama por troca de ideias, pois a partir disso chega-se a uma decisão racional. Muitas vezes as ideias ou argumentos podem não ser sólidos o suficiente e acabam por cair nas refutações. Mesmo assim, não deve haver a dispersão pelo simples fato da maioria se colocar à favor de uma ideia abstrata. Exemplo de mudanças, amparadas pela clareza nas disposições argumentativas e dos fatos é o Movimento no Uruguai, “No a la baja” (Não à redução), que fez uma expansiva campanha nacional para mudar a opinião dos uruguaios em relação a diminuição da idade penal de 18 anos para 16 anos. Em 2011, o país contava com cerca de 68% da população á favor e 25% contra. Com a campanha ouve no decorrer dos anos variações nestes dados, até que em outubro de 2014 a medida de redução foi rejeita em consulta pública com 53% contra e 47% à favor. Portanto, devido a complexidade do tema Responsabilidade Penal que abrange diversos setores de nossa sociedade, desde cultura até a segurança, deve-se entender a segregação de classes que ocorre no país, e o impacto – sempre negativo – de sua presença.
Referências
BRASIL. Constituição Federal (1988). Vade mecum. 19. ed. São Paulo: RT, 2014
BRASIL. Código Penal (1940). Vade mecum. 19. ed. São Paulo: RT, 2014
BRASIL. Código Civil (2002). Vade mecum. 19. ed. São Paulo: RT, 2014
CALCAGNO, Luiz. Mais da metade dos menores infratores não tem a presença do pai na família. Correio Braziliense. Disponível em: <http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/cidades/2014/03/25/interna_cidadesdf,419282/mais-da-metade-dos-menores-infratores-nao-tem-a-presenca-do-pai-na-familia.shtml>
Carta Capital. Porrete 'Direitos Humanos' é apreendido em centro socioeducativo na Paraíba. Disponível em: <http://www.cartacapital.com.br/blogs/parlatorio/porrete-direitos-humanos-e-apreendido-em-centro-socioeducativo-na-paraiba-4166.html>
CARVALHO, Jailton. Mapa da Violência 2013: Brasil mantém taxa de 20,4 homicídios por 100 mil habitantes. Disponível em: <http://oglobo.globo.com/brasil/mapa-da-violencia-2013-brasil-mantem-taxa-de-204-homicidios-por-100-mil-habitantes-7755783#ixzz3acrMdh3n
GONZALEZ, Amelia. Afinal, por que existe pobreza? Alguém se arrisca a responder? Disponível em: <http://g1.globo.com/nova-etica-social/platb/2013/12/04/afinal-por-que-existe-pobreza-alguem-se-arrisca-a-responder/>
LAMPARINA. ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente. Rio de Janeiro: Editora Lamparina, 2009
SARAIVA, João Batista Costa. Desconstruindo o Mito da Impunidade. Brasília: Um Ensaio de Direito (Penal) Juvenil, 2002
SEGUNDO, Everaldo Dantas. Redução da idade penal em face da Constituição Federal.
SILVA, Vanessa Cristina da. Criminalidade no divã. Disponível em: <http://psiquecienciaevida.uol.com.br/ESPS/Edicoes/45/artigo156045-1.asp>
SOUZA, André de. Movimento ‘No a la baja’ definiu plebiscito feito no Uruguai sobre maioridade penal. Disponível em: <http://oglobo.globo.com/brasil/movimento-no-la-baja-definiu-plebiscito-feito-no-uruguai-sobre-maioridade-penal-16317387>
UNICEF. Guia Teórico e prático de medidas socioeducativas. Disponível em: <http://www.conselhodacrianca.al.gov.br/sala-de-imprensa/publicacoes/Guia-MedidasSocioeducativas.pdf>.
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¹Artigo desenvolvido para a disciplina de Leitura e Escrita, na Universidade de Caxias do Sul
²Acadêmica do Curso de Direito, na Universidade de Caxias do Sul