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Compatibilidade das astreintes na execução trabalhista à luz do princípio da subsidiariedade

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08/01/2016 às 10:23
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4 TEORIA CLÁSSICA DE RESOLUÇÃO DE ANTINOMIAS NO PROCESSO DO TRABALHO

Norberto Bobbio (1997, p. 19), em sua obra Teoria do Ordenamento Jurídico, alertou para o fato de que as normas jurídicas não se encontram isoladas no Direito, ao passo que se relacionam particularmente entre si dentro de um contexto chamado ordenamento jurídico.

Este ordenamento jurídico, considerado, portanto, como um conjunto de normas, forma uma unidade coesa na medida em que as normas que o compõe se organizam de forma hierarquizada. Nessa estrutura hierarquizada a norma fundamental tem posição superior a todas as outras, sendo o centro de toda a ordem jurídica e possuindo ligações com todas as demais normas inferiores.

Entretanto, para que este mesmo ordenamento jurídico seja considerado uma unidade sistemática, é preciso “que os entes que a constituem não estejam somente em relacionamento com o todo, mas também num relacionamento de coerência entre si”. (BOBBIO, p. 71).

Esta coerência ensejaria à aproximação entre as normas quando estas forem compatíveis entre si, e, contrariamente, à eliminação, em havendo o choque entre normas incompatíveis e contraditórias.

Nesse sentido, assevera o autor sobre a impossibilidade de existência da incompatibilidade de normas num ordenamento jurídico:

Um ordenamento jurídico constitui um sistema porque não podem coexistir nele normas incompatíveis. Aqui, “sistema” equivale à validade do princípio que exclui a incompatibilidade das normas. Se num ordenamento vêm a existir normas incompatíveis, uma das duas ou ambas devem ser eliminadas (BOBBIO, p, 80)

Portanto, na ótica do ilustre jurista, as incompatibilidades entre normas jurídicas, devem ser eliminadas do sistema jurídico, buscando a harmonia e clareza da ordem jurídica como resultando da coerência do sistema.

Para o autor é necessária uma análise acerca do conteúdo que envolve tais normas ou leis incompatíveis com o objetivo de examinar se as antinomias estão num mesmo âmbito de validade, haja vista que elas somente se verificam quando há, no mesmo ordenamento e na mesma hierarquia, o encontro de duas leis ou normas não compatíveis entre si.

Desse modo, quando se trata de conflito insolúvel entre leis, a antinomia a que se depara é denominada antinomia real e quando dos conflitos ditos solúveis, a antinomia é denominada aparente (BOBBIO, p. 92)

Para a resolução de tais antinomias o autor propõem critérios que deve o intérprete do Direito utilizar para solucionar os conflitos entre as normas, quais sejam, o critério cronológico, o critério hierárquico e o critério da especialidade.

O critério cronológico lastreia-se, como o própria nomenclatura induz, a um critério temporal. Portanto, havendo duas normas incompatíveis, sendo uma posterior à outra, prevalecerá a posterior, haja vista que não haveria justificativa na elaboração da última pelo legislador e, portanto, a tornaria sem legitimidade e finalidade. (BOBBIO, p. 92-93)1

Já o critério hierárquico é aquele em que entre duas normas em conflito, a hierarquicamente superior prevalecerá sobre a norma inferior. Versa Bobbio (1997, p. 93)1 que “a inferioridade de uma norma em relação a outra consiste na menor força de seu poder normativo”.

O último critério, que é o da especialidade, aduz que entre duas normas incompatíveis onde uma possui o conteúdo de caráter geral e outra de caráter especial, prevalecerá esta última. A necessidade de uma especialização de um dispositivo contido em uma lei mais abrangente vem atrelada com a ideia de fundamental de justiça, tendo em vista que o legislador almeja, com a elaboração de uma lei especial, os tratamentos isonômicos e a diferenciação das categorias de pessoas, para que não haja uma posterior injustiça social (BOBBIO, 1997, p.96).2

Aduz, ainda, o autor que quando dois ou mais critérios de leis contrárias possam ser aplicados na solução de um caso concreto, e um critério dê solução oposta a de outro, é necessário dar preferência a um critério em detrimento do outro, qual seja, o critério hierárquico prevalece sobre os demais. Nesse sentido, assevera o autor: (BOBBIO, p. 99) “o problema real, frente ao qual se encontra o intérprete, [...], mas sim o de qual dos sujeitos da relação jurídica é mais justo proteger, isto é, qual dos dois interesses em conflito é justo fazer prevalecer [...]”.

Entretanto, observamos que à luz dos novos contornos da jurisdição no Estado constitucional moderno, o diploma processual comum sofreu diversas reformas que ensejam discussões e dúvidas nos intérpretes do Direito no tocante à aplicação das novas ferramentas voltadas para a efetividade processual no Processo do Trabalho.

Nesse sentido, é considerável a possibilidade de existência de antinomias em um sistema jurídico cada dia mais complexo como o pós-moderno. Tal possibilidade é ainda mais patente se considerarmos que, na seara do Processo do Trabalho, o legislador da Consolidação das Leis do Trabalho, de nove de agosto de 1943, ciente, já à época, que não poderia esgotar todos os instrumentos e procedimentos que poderiam permear as lides trabalhistas, se valeu do mecanismo do uso subsidiário das fontes.

Nesse sentido, se faz necessário atentar para o fato de que os métodos clássicos de soluções de antinomia seriam insuficientes, atualmente, para se efetivar plenamente os direitos tutelados.

Nesse mister, a leitura da problemática, evidentemente, deverá pairar sob à luz dos novos contornos e princípios que regem a jurisdição do estado constitucional moderno, conforme se verá adiante.


5 PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE NO PROCESSO DO TRABALHO CONTEMPORÂNEO

O Direito Material do Trabalho tem natureza peculiar em relação aos outros ramos do Direito. Com efeito, reconhecendo-se a hipossuficiência do empregado, a este é conferida uma superioridade jurídica visando à redução das desigualdades fáticas, socioeconômicas, à melhoria da qualidade de vida dos trabalhadores e de seus dependentes e a uma distribuição mais equânime da riqueza e do poder na sociedade, essenciais ao regime democrático.

Sobre o tema, já asseverou o grande jus-filósofo alemão Gustav Radbruch (2004, p. 124-127) que “a imagem que um sistema jurídico faz de pessoa, a proteção e a tutela que assegura às pessoas, caracteriza sistema jurídico.”

Este sistema jurídico trabalhista, portanto, é caracterizado por um sistema de princípios que assegura um núcleo central protetivo ao obreiro.

Sobre o tema, o Professor José Augusto Rodrigues Pinto ( 2007, p. 86) assevera que:

Tendo-se em mente a unidade do Direito e a necessidade de seu desdobramento em ramos de atuação especializada, os princípios devem ser considerados tanto pelo núcleo central, abrangente de todos os ramos, quanto pelos núcleos setoriais, exclusivos de cada ramo. Esses núcleos setoriais de princípios são, aliais, o ponto de partida do processo de autonomia.

Nesse sentido, percebe-se que a autonomia conferida ao Processo do Trabalho legitima-se da própria “necessidade de se implementar um sistema de acesso à Justiça do Trabalho que fosse a um só tempo simples, rápido e de baixo custo para os seus atores sociais” (LEITE, 2008, p. 104) Logo, para prestar uma tutela eficaz, o Processo do Trabalho deve lastrear-se nos mesmos vetores principiológicos dos direitos que nele se controvertem.

Portanto, em face do princípio da proteção e da natural imprescindibilidade do crédito trabalhista, o processo do trabalho necessita de uma maior eficiência e celeridade para possibilitar uma tutela jurisdicional realmente efetiva.

Entretanto, observamos que dos 922 artigos da CLT, tão somente 17 foram dedicados à execução. Bruno Freire e Silva (2008, p. 36)1 aduz que “a filosofia de celeridade e concentração dos atos processuais desse diploma legal acabou por ensejar uma escassez de regras para o tratamento da matéria.”

Em face da apontada escassez de normas o Processo do Trabalho, e mais especificamente na execução trabalhista, verifica-se a recorrente presença de lacunas que devem ser colmatadas de modo a se prestar uma tutela adequada dos direitos controvertidos na seara laboral. Dessa forma, ciente da impossibilidade de esgotamento de todos os instrumentos e procedimentos que poderiam permear as lides trabalhistas, o legislador da CLT, de 17 de dezembro de 1938, optou pelo mecanismo do uso subsidiário das fontes.

Dessa forma, por meio do art. 769 da CLT, criou-se o princípio da subsidiariedade e se expressou da seguinte forma:

Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.

Ressalte-se que a necessidade de uso subsidiário do diploma processual comum, atualmente, é ampliada em face do advento da Emenda Constitucional nº 45, que trouxe à justiça do trabalho a possibilidade de apreciação de matérias estranhas à relação de emprego.

Portanto, segundo a doutrina clássica, a aplicabilidade das normas do Código de Processo Civil no Processo do Trabalho estaria autorizada apenas em caso da existência de lacuna, e diante da compatibilidade da norma a ser aplicada com os seus fundamentos principiológicos. Nas palavras de Valentin Carrion (2011, p. 649):

Ao processo laboral se aplicam as normas, institutos e estudos da doutrina do processo geral ( que é o processo civil), desde que: a) não esteja aqui regulado de outro modo (“casos omissos”, “subsidiariamente”); b) não ofendam os princípios do processo laboral (“incompatível”); c) se adapte aos mesmos princípios a às peculiaridades deste procedimento; d) não haja impossibilidade material de aplicação (institutos estranhos à relação deduzida no juízo trabalhista); a aplicação de institutos não previstos não deve ser motivo para maior eternização das demandas e tem de adaptá-la às peculiaridades próprias.

Sobre o tema, o professor Mauro Schiavi (2008, P. 37), com suporte em Maria Helena Diniz, aduz que as lacunas da legislação processual podem ser:

a) normativas: quando a lei não contém previsão para o caso concreto. Vale dizer: não há regulamentação de lei sobre determinado instituto processual;

b) ontológicas: quando a norma não mais está compatível com os fatos sociais, ou seja, está desatualizada. Aqui a norma regulamenta determinado instituto processual, mas ela não encontra mais ressonância, ou seja, não há efetividade da norma processual existênte;

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c) axiológicas: quando as normas processuais levam a uma solução injusta ou insatisfatória. Existe a norma, mas sua aplicação leva a uma solução incompatível com os valores de justiça e equidade exigíveis para a eficácia da norma processual.

Ainda na esteira de Mauro Schiavi (2008, P. 38), existem duas vertentes de interpretação sobre a existência de lacunas no Processo do Trabalho e a consequente necessidade de aplicabilidade de instrumentos advindos do Processo Civil, são elas:

a) restritiva: somente é permitida a aplicação subsidiária das normas do Processo Civil, na execução, quando houver omissão, tanto da CLT como da Lei n. 6.830/80. Desse modo, somente se admite a aplicação do CPC, quando houver a chamada lacuna normativa. Essa vertente de entendimento sustenta a observância do princípio do devido processo legal, no sentido de não surpreender o jurisdicionado com outras regras processuais, bem como na necessidade de preservação do princípio da segurança jurídica.

b) evolutiva (também denominada sistemática ou ampliativa): permite a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil ao Processo do Trabalho quando houver as lacunas ontológicas e axiológicas da legislação processual trabalhista que regulamenta a execução. Além disso, defende a aplicação da legislação processual civil ao processo do trabalho quando houver maior efetividade da jurisdição trabalhista. Essa vertente tem suporte nos princípios constitucionais da efetividade, instrumentalidade das formas, duração razoável do processo e acesso real e efetivo do trabalhador à Justiça do Trabalho.

A partir dessas classificações percebemos que a doutrina e jurisprudência laboral têm adotado uma postura restritiva no que tange ao reconhecimento de lacunas ontológicas e axiológicas no Processo do Trabalho.

Essa postura conservadora, adotando uma concepção restritiva da aplicabilidade dos institutos advindos do Processo Civil, pode ser percebida no julgamento do E-RR-38300-47.2005.5.01.0052 pela SDI-1 do TST em 07 de junho de 2010.

A matéria em discussão versava acerca da possibilidade de aplicação ao processo trabalhista da multa de dez por cento sobre o valor da condenação em caso de não pagamento pelo devedor no prazo de quinze dias, conforme estabelece o artigo 475-J do Código de Processo Civil.

Depois de muitas discussões na última Seção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, venceu a tese do relator dos embargos, ministro João Batista Brito Pereira, no sentido da incompatibilidade da norma. Como explicou o relator, o artigo 769 da CLT só permitiria a aplicação subsidiária da norma processual civil no processo do trabalho quando houvesse omissão da legislação sobre o tema e compatibilidade das normas. Assim, na medida em que a CLT tem dispositivos específicos para tratar de liquidação e execução de sentença (artigos 876 a 892), a aplicação do artigo 475-J, nessas situações, afrontaria o comando do artigo celetista.

Esta leitura clássica do princípio da subsidiariedade, utilizada pelo Egrégio Tribunal no julgamento acima aludido, apresentava, a época da elaboração do texto da Consolidação das Leis Trabalhistas, fundamentos bastante convincentes. Veja-se que o CPC de 1973 nas palavra do mestre Carlos Henrique Bezerra Leite (2008, p. 105),

Além de moroso, paternalista (para o devedor) e custoso (para o autor), sempre se preocupou mais com as tutelas protetivas do patrimônio do que com as dos direitos sociais, gerando assim, um clima generalizado de desrespeito aos direitos humanos, especialmente em relação às pessoas mais pobres que não conseguem suportar a morosidade do processo sem prejuízo do sustento próprio e dos respectivos familiares.

Portanto, a chamada “ordinarização” do processo trabalhista, isto é, a aplicação subsidiária do processo civil de forma excessiva, o qual, sendo mais formalista e tratando os litigantes como se sempre fossem iguais, acabava por tornar o procedimento laboral, via de regra, mais lento. Daí nota-se a necessidade de aplicação da chamada “clausula de contenção” das normas do processo civil, evitando a chamada “contaminação”.

Sobre o tema, assevera Sônia das Dores Dionísio (2009, p. 83):

Sob a perspectiva da interpretação histórica e teleológica, a restrição foi imposta para evitar que o uso de procedimentos estranhos à CLT delongasse e retardasse as demandas trabalhistas, cuja tônica célere e simples se confrontava não só com o então CPC contemporâneo à sua edição (1939), como também com o que lhe sucedeu, ou seja, o de 1973.

Nesse sentido, já ressaltava Carrion (2011, p. 649) ao asseverar que:

Perante novos dispositivos do processo comum, o intérprete necessita fazer uma primeira indagação: se, não havendo incompatibilidade, permitir-se-ão a celeridade e a simplificação, que sempre foram almejadas. Nada de novos recursos, novas formalidades inúteis e atravancadoras.

Portanto, nas palavras de Bruno Freire e Silva (p. 34), pode-se concluir que “a autonomia conferida ao Processo do Trabalho somente é justificada pela possibilidade de se instituir um processo mais dinâmico, célere e efetivo do que o previsto para reger as relações do direito comum.”

A mesma interpretação teleológica, quanto a subsidiariedade na execução trabalhista, pode-se verificar da remissão feita pelo art. 889 da CLT[3]. Percebe-se que “o fato que levou o legislador a equiparar o crédito do trabalho à dívida ativa da Fazenda Pública da União não foi somente o seu significado social, mas, também, razões de ordem histórica.” (SILVA, p. 37).

Nas palavras de José Augusto Rodrigues Pinto (p. 37)1,

Na época da promulgação da Consolidação das Leis do Trabalho, o Decreto-lei n. 960, de 17 de dezembro de 1938, era um texto de concepção bastante avançada, em comparação aos Códigos de Processo estaduais. Daí a remissão ser feita a essa lei especial e não ao processo comum.

Entretanto, com as reformas do Código de Processo Civil, inegavelmente percebe-se um movimento rumo à promoção do direito fundamental à efetividade processual. Essa conclusão “implica, em certa medida, o reconhecimento da relativização do dogma da autonomia do processo do trabalho nos casos que o art. 769 da CLT representar, na prática, descompromisso com a efetividade.” (LEITE, 2008, p. 107)

Nas palavras de Sônia das Dores Dionísio (2009, p. 83)

O Direito Processual do Trabalho, que a meu ver reclama há muito uma codificação, vem sendo negligenciado pelo legislador. Com isso, assistimos ao Direito Processual Civil em movimento de influxo, buscando inspiração na “Velha Senhora CLT”, adotando os princípios mais pungentes do nosso direito instrumental, como é o caso, por exemplo, da celeridade e da simplicidade, que vem se expressando desde a reforma de 1992, através da adoção, por exemplo, da citação e intimação postal, do automatismo dos atos de rotina, da obrigatoriedade da conciliação, disponibilidade da prova pericial (art. 427, caput), dentre outros. Entretanto, com o passar do tempo, o movimento não ficou limitado a essas meras inspirações. Seu avanço chegou a tal ponto que ultrapassou o modelo inspirador, pois o Direito Processual do Trabalho perdeu seu papel de condutor da locomotiva para o de mero papel de passageiro.

Dessa forma, hodiernamente, o Princípio da Subsidiariedade carece de uma interpretação atual e constitucional, de modo a superar os dogmas clássicos que permeiam a execução trabalhista. Para tanto, devemos lançar nossos olhares para o futuro, buscando respostas para uma aplicação mais efetiva da jurisdição laboral, efetivando o direito fundamental à tutela célere e efetiva.

Entretanto, percebe-se que para solucionar os possíveis conflitos surgidos pela aplicação subsidiária das reformas processuais sofridas pelo CPC, recorrentemente verificamos a jurisprudência laboral adotar o critério clássico de Bobbio da especialidade. A CLT prevaleceria em casos de conflitos, pois as relações cuidadas por este diploma normativo são de caráter especial (específico).

Esta postura foi evidenciada na supracitada discussão pelo TST acerca da aplicabilidade da regra do art. 475-J do CPC. A Corte, na oportunidade, em face de algumas supostas antinomias existentes entre a aludida multa e a disciplina da execução no processo trabalhista, optou pela sua exclusão em face da ausência de lacuna normativa e da própria especialidade da CLT para a matéria.

Em nome de uma concepção clássica e vetusta, optou-se por não aplicar uma ferramenta advinda da recente reforma processual do CPC que se volta, inequivocamente, no sentido de se evitar a procrastinação da satisfação do crédito pelo devedor.

É evidente no caso em tela a ocorrência de uma lacuna ontológica face a ausência de atualização da CLT, principalmente no que tange à execução trabalhista. Seu reduzido número de dispositivos legais não consegue se adequar com as exigências da jurisdição do Estado Constitucional moderno.

Entretanto, em nome de critérios tradicionais lastreados na autonomia do processo do trabalho e segurança jurídica, a SDI-1 do TST optou, no julgamento do supra citado E-RR-38300-47.2005.5.01.0052, pela inaplicabilidade de uma inovação processual que tem suporte nos princípios constitucionais da efetividade, instrumentalidade das formas e duração razoável do processo.

Percebe-se que a adoção dos critérios clássicos de solução de antinomias, e a manutenção dos vetustos conceitos de lacuna e de aplicação subsidiária das inovações processuais no Processo do Trabalho, não se mostram suficientes para se efetivar plenamente a tutela jurisdicional adequada no processo trabalhista do estado constitucional de direito.

Nesse sentido, deve o aplicador da lei buscar soluções mais modernas e flexíveis, pois a tendência atual não é mais a eliminação das normas incompatíveis, mas sim a busca da harmonização dessas normas, a partir de uma interpretação constitucional, de modo a se buscar a efetividade dos direitos e a tão esperada celeridade processual.

O professor Carlos Henrique Bezerra Leite (2008, p. 40) já ponderou sobre o tema, aludindo para uma necessidade de diálogo entre as fontes normativas:

A heterointegração pressupõe, portanto, existência não apenas das tradicionais lacunas normativas, mas também das lacunas ontológicas e axiológicas. Dito de outro modo, a heterointegração dos dois subsistemas (processo civil e trabalhista) pressupõe a interpretação evolutiva do art. 769 da CLT, para permitir a aplicação subsidiária do CPC não somente na hipótese (tradicional) de lacuna normativa ao processo laboral, mas também quando a norma do processo trabalhista apresenta manifesto envelhecimento que, na prática, impede ou dificulta a prestação jurisdicional justa e efetiva deste processo especializado (...) De outro lado, é imperioso romper com o formalismo jurídico e estabelecer o diálogo das fontes normativas infraconstitucionais do CPC e da CLT, visando à concretização do princípio da máxima efetividade das normas (princípios e regras) constitucionais de direito processual, especialmente o novel princípio da 'duração razoável do processo com os meios que garantam a celeridade de sua tramitação' (EC n. 45/2004, art. 5º, LXXVIII)”

(grifos nossos)

A resposta para essa necessidade de adequação do Processo do Trabalho às novas necessidades advindas do Estado Contemporâneo pode encontra-se na moderna Teoria do Diálogo das Fontes. Teoria esta de grande aplicação do Direito do Consumidor, cujas balizas se assemelham muito ao Direito do Trabalho, visto que ambos pautam-se na prestação jurisdicional a um jurisdicionado vulnerável e em posição de desigualdade, como são os consumidores e os trabalhadores. Desse modo, analisaremos a seguir os contornos da aludida teoria e a sua aplicabilidade no Processo do Trabalho.

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Sobre o autor
Wendel N. Piton Barreto

Pós-graduado em Direito de Estado. Bacharel em Direito pela Universidade Federal da Bahia. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PITON BARRETO, Wendel N.. Compatibilidade das astreintes na execução trabalhista à luz do princípio da subsidiariedade . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4573, 8 jan. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/45646. Acesso em: 23 abr. 2024.

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