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O overruling como aplicação concreta do método popperiano ao desenvolvimento de um sistema de precedentes

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24/03/2016 às 13:24
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A existência do overruling vem de encontro ao engessamento da jurisdição, ao permitir a revogação de um precedente por ora inadequado.

Resumo: O método desenvolvido por Karl Popper baseia-se na afirmação de que o conhecimento surge de problemas. Tal constatação abre um leque de possíveis soluções que, na ótica do autor, devem ser testadas. Esse teste baseia-se na possibilidade de refutação de uma solução sujeita à crítica ou de sua aceitação. E nada impede que uma solução, por ora aceita, seja refutada posteriormente. Calcado em tais premissas, Popper desenvolve ainda seu conceito de progresso científico, partindo de um critério biológico evolutivo, para se concluir que a ciência evolui a partir da eliminação dos erros e fraquezas das teorias experimentais. Cogita-se a possibilidade de aplicação do método de Popper ao sistema de precedentes de um ordenamento jurídico, em razão de uma necessária superação de um precedente, sob pena de estagnação do direito.

Palavras-chave: Método lógico dedutivo. Progresso da ciência. Sistema de precedentes. Overruling.

Sumário: 1. Introdução. 2. O método popperiano. 2.1. O problema da indução. 2.2. O método lógico dedutivo de Popper. 2.2.1. Conhecimento, ignorância e problemas. 2.2.2. Soluções, experimentação e refutação. 2.2.3. Criticismo e ciência. 3. O progresso da ciência sob a ótica popperiana. 3.1. O desenvolvimento da ciência e a descoberta científica. 3.2. O método lógico dedutivo e o progresso científico. 3.3. O progresso da ciência sob as óticas de Popper, Kuhn e Feyerabend. 4. O método popperiano e o desenvolvimento do sistema de precedentes no Direito. 4.1. Breves noções conceituais sobre os precedentes. 4.2. Prós e contras de um sistema de precedentes. 4.3. Casos de superação dos precedentes – o overruling como mecanismo primordial para revogação de um precedente. 4.4. O overruling como aplicação concreta do método popperiano ao desenvolvimento do sistema de precedentes. 5. Conclusões. Referências.


1. INTRODUÇÃO

O método desenvolvido por Karl Popper em muito contribuiu para o desenvolvimento da ciência. Por ele, Popper pôde analisar a tensão latente entre conhecimento e ignorância, para então buscar um procedimento organizado para a solução dos problemas resultantes dessa constatação.

É notório, ademais, que problemas existem em qualquer área do conhecimento. Assim, as contribuições de Popper podem ser utilizadas nas mais diversas pesquisas, a partir de um viés metodológico lógico dedutivo.

Busca-se, nessa pesquisa, utilizar-se do método popperiano, bem como de suas considerações para o desenvolvimento da ciência, para uma análise do fenômeno dos precedentes no ordenamento jurídico.

Dessa maneira, será necessário perpassar pelo método popperiano em si, discutindo as questões relativas ao conhecimento, ignorância, problemas, soluções e refutabilidade para então se adentrar nas considerações do autor no tocante ao progresso científico.

Neste ponto, far-se-á uma leitura do critério biológico e evolutivo utilizado por Popper no desenvolvimento científico, enfatizando-se, principalmente, o criticismo que levará a eliminação de erros e fraquezas das teorias experimentais, conceito que será melhor trabalhado no ponto 3 desta pesquisa.

Por fim, revela-se de suma importância o desenvolvimento de noções básicas sobre o sistema de precedentes e sua superação, para então ser possível a realização de uma correlação entre o método popperiano, progresso científico e superação de precedentes – overruling.

Passa-se, então, à análise de tais premissas, iniciando-se pelo método lógico dedutivo de Popper, conforme se segue abaixo.


2. O MÉTODO POPPERIANO

Como já fora dito alhures, o método popperiano traz consigo diversas contribuições para o desenvolvimento do conhecimento científico. Contudo, antes de adentrar no método desenvolvido por Popper, propõe-se trazer uma noção superficial2 do conceito de método científico e suas implicações para o desenvolvimento da ciência.

Segundo o dicionário Aurélio da língua portuguesa, método consiste num procedimento organizado para se chegar a um determinado fim3. Note-se que tal conceito não difere muito daquele trazido por Antônio Carlos Gil, que define método como sendo o caminho para se chegar a um determinado fim4.

Já o método científico, ainda nas palavras de Gil, revela-se como o conjunto de procedimentos intelectuais e técnicos adotados para se atingir o conhecimento5. Assim, o método científico pode ser visto como um conjunto de procedimentos lógicos utilizados para se chegar a um conhecimento. Na visão de Popper, no entanto, o método científico não é capaz de determinar um conhecimento absoluto, somente provisório que pode ser refutado6. Esta é a premissa básica do método popperiano.

E é a partir de tal constatação que Popper defende que a ignorância é sóbria e ilimitada, percebendo que, a cada problema que é resolvido, descobrem-se outros problemas ainda não solucionados7.

Igualmente, descobre-se que o conhecimento não começa com percepções ou observações, muito menos de coleção de fatos ou números. O conhecimento, à luz dos ensinamentos de Popper, começa com os problemas, o que significa que o conhecimento começa da tensão entre o conhecido e o ignorado, na medida em que não há nenhum conhecimento sem problemas e vice versa8.

O autor defende, assim, que o método das ciências sociais seja dedutivo, ou seja, que parta da concepção de que uma hipótese só admite prova empírica após ter sido formulada9. Destarte, ocorrerá uma experimentação das possíveis soluções para os problemas por ora apresentados, experimentações estas que estarão sujeitas a refutação.

O método sustentado por Popper opõe-se diretamente à indução, conhecida pela inferência de enunciados universais obtidos através da experiência, por enunciados singulares. E é esse ponto que será agora abordado.

2.1. O PROBLEMA DA INDUÇÃO

Popper opõe-se ao método indutivo, característico das ciências empíricas. Mas no que consiste a indução? Francis Bacon, defensor do método indutivo, afirma que só há e só pode haver duas vias para a investigação e para a descoberta da verdade.

Para o autor, uma via consiste em saltar-se das sensações e das coisas particulares aos axiomas mais gerais e, a seguir, descobrir-se os axiomas intermediários a partir desses princípios e de sua inamovível verdade10. A outra recolhe os axiomas dos dados dos sentidos e particulares, ascendendo contínua e gradualmente até alcançar, em último lugar, os princípios de máxima generalidade. Este é o caminho correto, na visão de Bacon, caminho este que reflete a essência do método indutivo11.

Assim, o método indutivo consiste na inferência de, a partir de enunciados singulares ou particulares, se chegar a enunciados universais, chamados por Bacon de princípios de máxima generalidade. Tal caminho perpassa por observações ou experimentos concretos e singulares, de onde podem se inferir de enunciados singulares proposições com o mais alto nível de generalidade.

Na visão de Bacon, este é o único método capaz de levar os homens ao conhecimento da verdade, afinal os homens passam a enxergar os próprios fatos particulares, suas séries e ordens, a fim de que, por si mesmos, se sintam obrigados a renunciar às suas noções e comecem a habituar-se ao trato direto das coisas e possam chegar à conclusão, através delas, de enunciados universais12.

O método indutivo, no entanto, não justifica uma lógica capaz de admitir que a inferência de enunciados singulares, ainda que numerosos, gere enunciados universais sempre verdadeiros, sem considerar que as conclusões obtidas por este meio podem revelar-se falsas.

Essa é a principal crítica de Popper acerca da indução. O autor utiliza o exemplo dos cisnes brancos e negros para justificar sua desconfiança no tocante à lógica indutiva. Para ele, a observação de diversos cisnes brancos não nos leva a concluir que só existem cisnes brancos. E os cisnes negros13?

Seguindo-se a lógica indutiva, a observação de diversos cisnes brancos levaria à conclusão de que só existem cisnes brancos, afinal partir-se-ia de enunciados singulares, quer seja existem cisnes brancos, para um enunciado geral e universal, onde todos os cisnes são brancos. No entanto, tal conclusão revela-se errônea pela existência de cisnes negros. Tal premissa funda o raciocínio de Popper acerca dos problemas da indução.

O problema do método indutivo ainda pode ser visto a partir de uma perspectiva acerca da validade ou verdade de enunciados universais que encontrem base na experiência. Popper afirma que muitos acreditam que a verdade de enunciados universais é conhecida através da experiência. Entretanto, não percebem que a descrição de uma experiência só pode ser vista como um enunciado singular14.

Este problema visualizado por Popper havia sido trabalhado, ainda que de forma mais tímida, por David Hume. O autor, no tópico referente às dúvidas céticas sobre as operações do entendimento, chega à conclusão de que o raciocínio feito no tocante aos experimentos e semelhanças não possui uma lógica e não pode levar aos mesmos resultados, como um enunciado universal. Para ele:

Não há nada mais semelhante do que os ovos; todavia, ninguém espera, por causa desta aparente semelhança, idêntico gosto e sabor em todos os ovos. E é somente depois de uma longa série de experimentos uniformes, sobre qualquer gênero dado, que nos tornamos confiantes e seguros em relação a um evento particular. Ora, onde está o processo de raciocínio que, de um único caso, tira uma conclusão tão diferente daquele que infere de cem casos que não são de modo algum diferentes do primeiro? Proponho este problema visando, ao mesmo tempo, obter informação e suscitar dificuldades. Não consigo localizar, não consigo imaginar tal raciocínio15.

A fim de tentar justificar as inferências indutivas, Popper traz a baila o chamado princípio de indução. Segundo ele, tal princípio seria um enunciado capaz de auxiliar a ordenar as inferências indutivas em forma logicamente aceitável16.

Todavia, incoerências podem surgir com o uso de tal princípio. O princípio da indução tem que ser, para Popper, um enunciado universal. E considerar que sua verdade decorre da experiência, traz consigo outros problemas no tocante à formulação desse princípio da indução. Buscando justificá-lo, recorre-se a inferências indutivas e, para justificar estas, deve-se admitir um princípio indutivo de ordem elevada, e assim por diante. O que se nota é que admitir um princípio de indução pautado em experiências levaria a uma regressão ad eterno17.

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Em razão de tais celeumas com o uso da indução, pode-se considerar, em breves linhas, que esta se demonstra insatisfatória para se chegar a um conhecimento sobre determinado fato, afinal nem sempre a observação de enunciados singulares irá resultar num enunciado universal que seja totalmente verdadeiro.

Faz-se a opção pelo uso da dedução para se chegar a um resultado para o problema apresentado, utilizando-se dos pensamentos de Popper. É a aplicação do chamado método lógico dedutivo.

2.2. O MÉTODO LÓGICO DEDUTIVO DE POPPER

Popper inicia seus trabalhos propondo uma relação entre conhecimento e ignorância, conforme já fora explicitado, ainda que de maneira tímida, linhas atrás. Tal relação baseia-se numa aparente contradição entre os institutos por ora mencionados. Mas como isso se dá? É o que se verá agora

2.2.1. Conhecimento, Ignorância e problemas

Primeiramente, Popper afirma que o homem conhece muito. Tal afirmação parte do pressuposto de que o ser humano tem acesso às mais diversas fontes de informação, detalhe hoje ainda mais evidenciado com o avanço tecnológico. Percebe-se que não se conhece apenas detalhes de cunho intelectual – ainda que estes, como mesmo ressalta o autor, possam ser de cunho duvidoso – mas também coisas que possuem significação prática18.

Tais considerações ressaltam a visão de mundo que o homem tem a partir do conhecimento. Contudo, embora conheça muito, o homem não conhece tudo. Popper, inclusive, concorda com Sócrates no que tange à consideração de que o homem não sabe tudo e de que a única certeza que o ser humano pode possuir é de sua ignorância19.

Pautado nessa premissa, o autor afirma que a ignorância humana é sóbria e ilimitada. Descobrem-se a cada dia mais problemas para um determinado assunto e, quando se crê que tais problemas encontram-se solucionados, descobrem-se novos problemas. E finalmente, quando se acredita ter encontrado uma solução firme e segura, observa-se que a mesma pode ser refutada e modificada.20

Destarte, poder-se-ia pensar que tais conceitos encontram-se em contradição, afinal a dualidade entre conhecer muito e ignorar ilimitadamente dá margem às mais diversas conjecturas. No entanto, Popper não enxerga o mencionado dualismo como uma contradição. O autor afirma que tal aparência se dá ao fato de que as palavras conhecimento e ignorância não são usadas como perfeitos antônimos em seu método21.

Em verdade, Popper insere a ideia de que a lógica do conhecimento deve discutir esta tensão entre conhecimento e ignorância e, para tanto, deve ser capaz de visualizar as fontes do conhecimento.

O conhecimento não é a busca pela certeza, mas sim a busca pela verdade22. Por isso, deve-se diferenciar certeza e verdade, afinal errar é característica humana. Nas palavras de Popper: “Afirmar que errar é humano significa que devemos lutar permanentemente contra o erro, e também que não podemos nunca ter a certeza de que, mesmo assim, não cometemos nenhum erro”23.

Assim, combater o erro24 é tarefa da atividade científica que, a partir do reconhecimento de que homens são falíveis, percebe que se deve buscar a verdade e não a certeza, uma vez que esta é inatingível.

O conhecimento científico, então, será sempre hipotético, ou seja, um saber por conjecturas25. Só que Popper analisa que este conhecimento não nasce de percepções ou observações, mas sim de problemas, problemas estes gerados pela tensão entre conhecimento e ignorância26. Note-se que tal relação de tensão está propensa a gerar erros, que devem ser eliminados para se alcançar uma verdade.

Conhecimento, então, depende da existência de problemas, problemas estes que existem em razão da existência do conhecimento, mas também em razão da existência da ignorância. Dessa maneira:

Cada problema surge da descoberta de que algo não está em ordem com o nosso suposto conhecimento; ou, examinando logicamente, da descoberta de uma contradição interna entre nosso suposto conhecimento e os fatos; ou, declarado talvez mais corretamente, da descoberta de uma contradição aparente entre nosso suposto conhecimento e os supostos fatos27.

Em suma, Popper afirma que a origem do conhecimento pode ser vislumbrada a partir da existência de problemas. Problemas28, por sua vez, são resultado da existência de erros gerados na percepção humana acerca das questões do conhecimento e da ignorância.

A existência dos problemas revela-se como ponto crucial para o desenrolar do método lógico dedutivo, afinal é a partir destes que soluções serão postas, criticadas e refutadas ou aceitas temporariamente, como se desenvolverá a seguir.

2.2.2. Soluções, experimentação e refutação

Partindo da noção de que problemas existem, faz-se necessário desenvolver o método popperiano. O autor defende que seu método consiste em experimentação de possíveis soluções para problemas delimitados ao início da investigação científica ou mesmo daqueles que possam vir a surgir no curso da mesma29.

Para tanto, é de suma importância que tais possíveis soluções estejam abertas às críticas que lhes possam ser feitas. Neste ponto, alude-se ao chamado criticismo popperiano, que consiste na possibilidade de submissão de qualquer solução a críticas pertinentes. Desta forma, no momento da experimentação da solução por ora apresentada, faz-se necessário um processo crítico de investigação da cientificidade desta, a fim de excluí-la, ainda que de maneira temporária, ou não das propostas até então sugeridas.

Acatando-se pela exclusão de uma solução que não pode ser enfaticamente criticada, passa-se à análise de uma nova solução que possa ser submetida a este processo de criticismo pertinente.

Se a solução tentada está aberta a críticas pertinentes, inicia-se o processo de refutação desta proposta, afinal toda crítica consiste em tentativas de refutação. Popper então afirma que se tal solução tentada é refutada através do criticismo, deve-se iniciar um novo processo visando estabelecer uma nova tentativa de solucionar o problema apresentado30. É por conta deste processo de tentativas e refutações de soluções que Popper conceitua seu método como sendo um método de experimentação.

Quando se realiza uma nova experimentação de uma solução apresentada e esta resiste à crítica, deve-se aceitar a mesma temporariamente. Isso não impede que a solução por ora acatada venha a ser rediscutida em momento posterior, afinal a mesma continuará sujeita ao criticismo31.

Em suma, ainda que uma teoria venha a ser aceita num dado momento, nada impede que a mesma venha a ser refutada posteriormente, iniciando um novo processo de experimentação e criticismo, com possibilidade de refutação.

Por conta desta característica, o método popperiano é visto como um desenvolvimento crítico do método do ensaio e erro. Constitui um ensaio, pois soluções são submetidas aos problemas dados. É ainda crítico, pois tais soluções são passíveis de refutação. E baseia-se na possibilidade de erro, de sorte que uma solução escolhida pode vir a ser refutada posteriormente caso se perceba que a eleição da mesma pode estar sujeita ao criticismo e refutação.

2.2.3. Criticismo e ciência

O método popperiano, como foi dito alhures, prestigia o criticismo. O autor, partindo de tal premissa, observa que uma discussão crítica pode levantar questões relacionadas à verdade de uma asserção, relevância e significação desta, relação e relevância com os problemas levantados e sua significação para os problemas extra-científicos. Popper ilustra problemas extra-científicos como aqueles relacionados ao bem estar humano, com riqueza pessoal, com defesa e política nacional, dentre outros32.

Tal reflexão mostra-se importante no tocante à influência desses interesses extra-científicos na pesquisa científica. Concorda-se com o autor quando se afirma ser impossível se livrar destes durante uma pesquisa, bem como com a constatação de que não consiste questão primordial a tentativa de eliminação de interesses extra-científicos durante a atividade de pesquisa33. O que verdadeiramente deve ser levado em consideração é a possível diferenciação e separação daquilo que é interesse extra-científico, daquilo que é interesse científico trazido com a discussão crítica.

Faz-se necessário, contudo, uma advertência. Não é a verdade valor único científico. Interesses, relevância, significância também são considerados por Popper valores científicos de primeira linha. E assim, é possível distinguir valores científicos, que devem ser considerados primordialmente numa pesquisa, de valores extra-científicos34.

É uma tarefa do criticismo fazer tal separação, a fim poder distinguir valores científicos primordiais para lhes dar a ênfase merecida. Repise-se que o criticismo possui relevância primordial no método lógico dedutivo não só por permitir a refutação ou aceitação temporária de soluções para os problemas apresentados, mas também por ser capaz de possibilitar a extração dos valores científicos mais relevantes para uma pesquisa científica.

Note-se que, ao longo do desenvolvimento do método lógico dedutivo, firma-se a existência de um sistema lógico de críticas.

Popper, ao tratar da lógica dedutiva, afirma que sua função primordial é o desenvolvimento deste sistema de críticas. Para ele, a lógica dedutiva é a teoria da validade das deduções lógicas35. Busca-se a validade de uma premissa utilizando-se de uma lógica dedutiva, pautada na constatação de que se as premissas de uma dedução válida são verdadeiras, então a conclusão também deve ser verdadeira.

Não obstante, Popper constata que, se todas as premissas são verdadeiras, a dedução é válida, mas se estas levam a uma conclusão falsa, então não é possível que todas as premissas sejam verdadeiras. Nas palavras do autor:

Este resultado trivial porém decisivamente importante pode também ser expresso da seguinte maneira: a lógica dedutiva é não só a teoria da transmissão da verdade das premissas à conclusão, mas é, também, ao mesmo tempo, a teoria da retransmissão da falsidade da conclusão até, ao menos, uma das premissas36.

Conclui-se, a partir de tal constatação, que premissas verdadeiras geram um resultado verdadeiro e, caso haja alguma falsidade nas premissas utilizadas, estas refletirão a falsidade da conclusão a que se chegará.

Por conta do que fora dito anteriormente, questão da verdade é importante para a abordagem crítica desenvolvida por Popper. O autor denomina verdadeira uma proposição se esta corresponde aos fatos, ou se as coisas são como as descritas pela proposição, utilizando-se de um conceito absoluto de verdade reformulado pela lógica moderna37.

Enfatizou-se ao longo do desenvolvimento do método lógico dedutivo que a solução apresentada, que resistiu às críticas e pôde ser levada em consideração naquele momento, somente poderia refletir uma solução temporária ao problema. Reiteradamente, o problema poderia ser discutido e criticado mais além. Mas como conciliar tal afirmação com o conceito de verdade exposto por Popper? Existiria uma solução verdadeira para um denominado problema?

Mais uma vez, não se pode confundir certeza com verdade. É impossível se ter certeza acerca de uma solução para um determinado problema. Tanto é assim que este pode ser criticado e refutado, ainda que anteriormente tenha sido tido como plausível. E também não se pode confundir o conceito de verdade de um enunciado lógico com a verdade da solução testada, afinal o enunciado lógico encontra-se pautado num sistema de críticas, sistema lógico que não se confunde com a própria solução experimentada para um dado problema.

Concorda-se ainda com a afirmação de Popper acerca da relatividade da verdade. O conceito de verdade deve ser visto sob um prisma relativo, afinal, embora um enunciado seja verdadeiro ou falso, pode representar uma melhor aproximação da verdade do que outro enunciado38.

Por fim, vale ressaltar que o método popperiano lógico dedutivo traz implicações para os mais diversos tipos de problemas, podendo ser vislumbrado, inclusive, no progresso da ciência defendido pelo autor. Tratar-se-á disso agora.

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Sobre a autora
Adriana Wyzykowski

Atualmente é mestre em Relações Sociais e Novos Direitos, estando vinculada ao grupo Relações de Trabalho na Contemporaneidade da Universidade Federal da Bahia - UFBA. É especialista em Direito e Processo do Trabalho pelo Instituto Excelência - Juspodivm. É professora da Universidade do Estado da Bahia - UNEB, aprovada em concurso público para as cadeiras de Direito do Trabalho, Processo do Trabalho e Prática Trabalhista. É professora da Faculdade Baiana de Direito, ministrando aulas acerca das disciplinas Direito do Trabalho I e Direito do Trabalho II. É professora da Universidade Salvador - Unifacs, ministrando aulas acerca das disciplinas Processo do Trabalho e Direito do Trabalho. Foi professora substituta da Universidade Federal da Bahia - UFBA, ministrando a disciplina Legislação Social e Direito do Trabalho. É professora nos cursos de Pós Graduação do Juspodivm, Faculdade Baiana de Direito, Universidade Católica do Salvador - UCSAL, Universidade Salvador - UNIFACS, Instituto Mentoring e outros. Aprovada em concurso para professor assistente da Universidade Federal da Bahia para a cadeira de Legislação Social e Direito do Trabalho. Atua e pesquisa na área de Direito, com enfoque para pesquisa nas disciplinas Direitos Humanos e Fundamentais, Direitos Sociais, Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

WYZYKOWSKI, Adriana. O overruling como aplicação concreta do método popperiano ao desenvolvimento de um sistema de precedentes. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4649, 24 mar. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/47413. Acesso em: 21 nov. 2024.

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