Conclusão
O Código Tributário Nacional, norma geral sobre matéria tributária, consagrou como privilégio do crédito tributário a sua autonomia em relação aos procedimentos de cobrança coletiva. Isto significa dizer que não há participação da Fazenda Pública na discussão e aprovação dos planos de recuperação judicial, nem submissão da cobrança do crédito tributário ao juízo universal falimentar, ou seja, o processamento de execuções fiscais não sofre interferências do procedimento falimentar de recuperação judicial.
Além disso, o crédito tributário somente pode ser suspenso ou ter suas garantias dispensadas nas hipóteses taxativamente previstas no próprio Código, sendo inclusive vedada a interpretação, se não a literal, da legislação tributária que disponha sobre a suspensão do crédito tributário, na forma do art. 111, I, do CTN. Qualquer interpretação em outro sentido desprestigia a harmonia e a vigência da legislação federal.
O legislador, porém, atento à necessidade de proteção do interesse público na obtenção de suas receitas tributárias determinou que a concessão da recuperação judicial somente é possível se pagos ou regularizados os créditos tributários. Por outro lado, haja vista a importância econômico-financeira da preservação das empresas e do mercado de trabalho, a legislação previu que as Fazendas Públicas poderiam conceder parcelamento dos créditos tributários aos devedores em recuperação, o que a União o fez com a edição na Lei 13.043/2014. Aderindo ao parcelamento, o contribuinte em recuperação judicial tem suas cobranças tributárias suspensas, podendo destinar seus recursos para aumentar seu fluxo de caixa e assim se recuperar financeiramente.
Quando instado a se manifestar, o Superior Tribunal de Justiça ainda não formou uma unanimidade de entendimento quanto à questão da autonomia do executivo fiscal. Em que pese a Segunda Seção do Tribunal - especializada em matérias de Direito Público e formada pela Terceira e Quarta Turma - determine que a competência é do juízo falimentar para decidir sobre atos de constrição em execuções fiscais, posiciona-se pela não suspensão dos executivos fiscais.
Já a Segunda Turma, que integra a Primeira Seção, inaugurou recentemente posição divergente, entendendo pela suspensão da cobrança dos créditos fiscais tão somente se concedida a recuperação judicial com prova da regularidade fiscal.
Referências bibliográficas
ALEXANDRE, Ricardo, Direito Tributário Esquematizado. 8ª ed. São Paulo: Editora Método. 2014.
BRASIL. Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Diário Oficial da União, Brasília.
___. Lei 10.522, de 19 de julho de 2002. Dispõe sobre o Cadastro Informativo dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais e dá outras providências. Diário Oficial da União. Brasília, n. 139, p.1, jul 2002. Seção 1.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Conflito de Competência AgRg n. 124052/SP. Relatoria: Ministro João Otávio de Noronha, Segunda Seção, julgado em 22/10/2014, DJE 18/11/2014. Inteiro teor disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?tipoPesquisa=tipoPesquisaNumeroRegistro&termo=201201741427&totalRegistrosPorPagina=40&aplicacao=processos.ea. Acesso em: 28 mar 2016.
___. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Conflito de Competência 112646/DF. Relatoria: Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 11/05/2011, DJe 17/05/2011. Inteiro teor disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?tipoPesquisa=tipoPesquisaNumeroRegistro&termo=201001126238&totalRegistrosPorPagina=40&aplicacao=processos.ea. Acesso em: 28 mar 2016.
___. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1480559/RS. Relatoria: Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 03/02/2015, DJE 30/03/2015. Inteiro teor disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=1379219&num_registro=201402325017&data=20150330&formato=PDF. Acesso em: 28 mar 2016.
___. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1187404/MT. Relatoria: Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 19/07/2013. DJE 21/08/2013. Inteiro teor disponível em: https://ww2.stj.jus.br/processo/pesquisa/?tipoPesquisa=tipoPesquisaNumeroRegistro&termo=201000540484&totalRegistrosPorPagina=40&aplicacao=processos.ea. Acesso em: 28 mar 2016.
Notas
[1] ALEXANDRE, Ricardo, Direito Tributário Esquematizado. 8ª ed. São Paulo: Editora Método. 2014. p. 502.
[2] Ibid., p. 508
[3] ALEXANDRE, op. cit., p. 500.
[4] Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário: I - moratória; II - o depósito do seu montante integral; III - as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo; IV - a concessão de medida liminar em mandado de segurança. V – a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial; (Incluído pela Lcp nº 104, de 2001); VI – o parcelamento. (Incluído pela Lcp nº 104, de 2001). Parágrafo único. O disposto neste artigo não dispensa o cumprimento das obrigações assessórios dependentes da obrigação principal cujo crédito seja suspenso, ou dela conseqüentes. (Lei 5.172/1966 – Código Tributário Nacional).
[5] Art. 205. A lei poderá exigir que a prova da quitação de determinado tributo, quando exigível, seja feita por certidão negativa, expedida à vista de requerimento do interessado, que contenha todas as informações necessárias à identificação de sua pessoa, domicílio fiscal e ramo de negócio ou atividade e indique o período a que se refere o pedido. Art. 206. Tem os mesmos efeitos previstos no artigo anterior a certidão de que conste a existência de créditos não vencidos, em curso de cobrança executiva em que tenha sido efetivada a penhora, ou cuja exigibilidade esteja suspensa. (Lei 5.172/1966 – Código Tributário Nacional).
[6] ALEXANDRE, op. cit., p. 501.
[7] Ibid., p. 402.
[8] Ibid., p. 383.
[9] No âmbito da União, é entendimento sólido da doutrina e jurisprudência de que o parcelamento trazido pelo art. 10 da Lei 10.522/2002 é a autorização de parcelamento geral de créditos tributários federais, ao dispor que os débitos de qualquer natureza com a Fazenda Nacional poderão ser parcelados em até sessenta meses, a critério exclusivo da autoridade fazendária.
[10] Art. 10-A. O empresário ou a sociedade empresária que pleitear ou tiver deferido o processamento da recuperação judicial, nos termos dos arts. 51, 52 e 70 da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, poderão parcelar seus débitos com a Fazenda Nacional, em 84 (oitenta e quatro) parcelas mensais e consecutivas, calculadas observando-se os seguintes percentuais mínimos, aplicados sobre o valor da dívida consolidada: (Incluído pela Lei nº 13.043, de 2014) I - da 1a à 12a prestação: 0,666% (seiscentos e sessenta e seis milésimos por cento); (Incluído pela Lei nº 13.043, de 2014) II - da 13a à 24a prestação: 1% (um por cento); (Incluído pela Lei nº 13.043, de 2014) III - da 25a à 83a prestação: 1,333% (um inteiro e trezentos e trinta e três milésimos por cento); e (Incluído pela Lei nº 13.043, de 2014) IV - 84a prestação: saldo devedor remanescente. (Incluído pela Lei nº 13.043, de 2014)
§ 1º O disposto neste artigo aplica-se à totalidade dos débitos do empresário ou da sociedade empresária constituídos ou não, inscritos ou não em Dívida Ativa da União, mesmo que discutidos judicialmente em ação proposta pelo sujeito passivo ou em fase de execução fiscal já ajuizada, ressalvados exclusivamente os débitos incluídos em parcelamentos regidos por outras leis. (Incluído pela Lei nº 13.043, de 2014)
§ 2º No caso dos débitos que se encontrarem sob discussão administrativa ou judicial, submetidos ou não à causa legal de suspensão de exigibilidade, o sujeito passivo deverá comprovar que desistiu expressamente e de forma irrevogável da impugnação ou do recurso interposto, ou da ação judicial, e, cumulativamente, renunciou a quaisquer alegações de direito sobre as quais se fundem a ação judicial e o recurso administrativo. (Incluído pela Lei nº 13.043, de 2014)
§ 3 º O empresário ou a sociedade empresária poderá, a seu critério, desistir dos parcelamentos em curso, independentemente da modalidade, e solicitar que eles sejam parcelados nos termos deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.043, de 2014)
§ 4º Além das hipóteses previstas no art. 14-B, é causa de rescisão do parcelamento a não concessão da recuperação judicial de que trata o art. 58 da Lei no 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, bem como a decretação da falência da pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.043, de 2014).
§ 5º O empresário ou a sociedade empresária poderá ter apenas um parcelamento de que trata o caput, cujos débitos constituídos, inscritos ou não em Dívida Ativa da União, poderão ser incluídos até a data do pedido de parcelamento. (Incluído pela Lei nº 13.043, de 2014)
§ 6º A concessão do parcelamento não implica a liberação dos bens e direitos do devedor ou de seus responsáveis que tenham sido constituídos em garantia dos respectivos créditos. (Incluído pela Lei nº 13.043, de 2014)
§ 7º O parcelamento referido no caput observará as demais condições previstas nesta Lei, ressalvado o disposto no § 1o do art. 11, no inciso II do § 1o do art. 12, nos incisos I, II e VIII do art. 14 e no §2o do art. 14-A. (Incluído pela Lei nº 13.043, de 2014).
[11] Recurso Especial nº 1.187.404/MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 19/07/2013. DJE 21/08/2013.
[12] AgRg no CC 124052/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Segunda Seção, julgado em 22/10/2014, DJE 18/11/2014.
[13] AgRg no CC 112.646/DF, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 11/05/2011, DJe 17/05/2011.
[14] Recurso Especial 1.480.559/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 03/02/2015, DJE 30/03/2015.