Sérgio Moro: juiz geral do Brasil

04/04/2016 às 09:05
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Chegamos na fase em que a tragédia da Lava Jato se transformou numa pantomima burlesca, ponto em que o principal herói da "telenovela judiciária" só consegue arrancar risos da platéia antes de ser inevitavelmente abatido pelo destino.

Com ajuda da Rede Globo, Estadão, Folha de São Paulo, Veja e Istoé, para não citar outros veículos de comunicação comprometidos com o golpe de estado, Sérgio Moro se tornou o Juiz Geral do Brasil. Ele se alçou ao posto de única autoridade competente para julgar tudo que diga respeito ao PT, a Lula, Dilma Rousseff e à corrupção na Petrobras. Após ser desancado pelo STF, ele resolveu recomeçar a investigação da morte de Celso Daniel porque a mesma está supostamente ligada à Lava Jato.

Curiosamente, ele sequer cogitou investigar a morte do jornalista Paulo Francis durante o governo FHC. Paulo Francis morreu logo após enunciar publicamente pela primeira vez que havia uma vasta rede de corrupção na Petrobras https://www.youtube.com/watch?v=Q_nuXnu9ftk.

Há outros casos de corrupção que mereciam ser investigados por Sérgio Moro. Abaixo listarei alguns.

Corrupção na VASP:

“A descoberta da existência de uma conta secreta da VASP em uma agência do BANESPA em Grand Cayman – protetorado inglês, parte das Índias Ocidentais Britânicas – e a respectiva denúncia feita por nós na Assembléia Legislativa do Estado acenderam o estopim de um dos maiores escândalos ocorridos em São Paulo e um dos que mais impacto causou na opinião pública do País. Isto determinou a formação de uma Comissão Especial de Inquérito, com o propósito de apurar a real situação da empresa, através do exame de documentos e tomada de depoimentos dos responsáveis pela companhia. Pouco a pouco, apesar das pressões de toda ordem, vieram à baile toda sorte de desmandos, incompetência, favoritismos e corrupção, denunciados em relatório final. Isto não impediu, porém, que os culpados permanecessem impunes, pois se encontram abrigados nas asas protetoras do Governo do Estado.” (Uma lufada que abalou São Paulo, de José Yunes com apresentação de Lourenço Diaféria, Paz e Terra, 1982, p. 35).

Entre os fatos apurados na época, constatou-se que 2,6 milhões de litros de querosene de aviação haviam desaparecido (p. 55). Antes do último reajuste dos combustíveis, o galão de 3,785 litros de querosene de aviação era vendido a 5 dólares. (http://www.agenciaabear.com.br/agenda-2020/estadao-destaca-alto-preco-do...). O dólar está cotado em R$ 2,81. Portanto, cada litro de combustível de aviação custa mais ou menos R$ 3,71 o livro. Nos dias de hoje o escândalo do combustível desviado da VASP (que era uma empresa pública) equivaleria a mais ou menos 9,64 milhões de reais.

Roubalheira na FEPASA:

“Um pavoroso desastre de trens, com o triste saldo de duzentas e noventa e dois feridos, ocorrido em fins de 1980, assim como a notícia da venda de trinta trens franceses dessa ferrovia paulista à Rede Ferroviária Federal lançaram as luzes da curiosidade pública sobre os estranhos negócios realizados pela Empresa. Um deles, a venda de um imóvel com 14.220 m2 de propriedade da FEPASA, ao então Diretor da VASP, pela quantia de 152 mil cruzeiros, quando o valor venal estava estipulado em 908 mil e 100 cruzeiros.” (Uma lufada que abalou São Paulo, de José Yunes com apresentação de Lourenço Diaféria, Paz e Terra, 1982, p. 57).

Se a diferença entre o valor venal e o valor de venda do imóvel for atualizado pelo INPC da época (abril/1980) até janeiro/2015 e acrescido de 0,5% de juros ao mês o golpe na FEPASA equivaleria hoje a R$ 361.235,00. Entretanto, o valor de mercado de um imóvel é normalmente 10 vezes maior que o valor venal do mesmo. Assim, podemos dizer que a FEPASA foi lesada em mais ou menos 3,6 milhões de reais em valores atuais.

Desvio de dinheiro público na CONESP:

“Em maio de 1982, os jornais denunciavam terem sido descobertos manobras de contratos firmados pela CONESP com quarenta empreiteiras num valor total de CR$ 8 bilhões, pelos quais os preços fixados para a construção de obras eram superestimados em até 10% - do qual resultariam prejuízos da ordem de CR$ 800 milhões para o erário público. No mesmo dia da denuncia, o Chefe da Casa Civil do Governo do Estado, o Sr. Calin Eid, confirmou ter constatado essa diferença de preço nos contratos, mas, segundo ele, não pôde explicar sua origem, tendo o promotor Ronaldo Marzagão solicitado seu depoimento no inquérito que vem sendo conduzido pelo DEOPS.” (Uma lufada que abalou São Paulo, de José Yunes com apresentação de Lourenço Diaféria, Paz e Terra, 1982, p. 61)

Se os 800 milhões de cruzeiros referidos acima forem atualizados de maio/1982 até janeiro/2015 pelo INPC e acrescidos de 0,5% de juros ao mês temos um prejuízo atual da ordem de R$ 87.561.003,90.

Em seu livro, José Yunes (Uma lufada que abalou São Paulo, Paz e Terra, 1982), José Yunes relata ainda vários outros casos de corrupção que poderiam ser investigados por Sérgio Moro (CIAC, SABESP, BANESP, NOSSA CAIXA, etc...). O Juiz Geral do Brasil deveria prestar uma atenção especial ao caso que cativou a atenção da população na época e que ocupa um dos capítulos mais emblemáticos do livro citado. Estou me referindo aqui ao caso da PAULIPETRO.

“Em três anos, as despesas da PAULIPETRO situar-se-ão na cada dos 400 milhões de dólares ou 60 bilhões de cruzeiros.” (Uma lufada que abalou São Paulo, de José Yunes com apresentação de Lourenço Diaféria, Paz e Terra, 1982, p. 125)

“O consórcio PAULIPETRO recebeu do Orçamento de 1982 a incrível soma de Cr$ 8.298.330.000,00, quantia maior que a destinada a áreas como Transporte Urbano, Habitação e Urbanismo. Tudo em vão. Tratou-se de mais uma aventura de mais uma irresponsabilidade do senhor Paulo Salim Maluf, que se notabilizou unicamente por usar e abusar dos recursos públicos. Até agora, todos sabemos, o Consórcio PAULIPETRO descobriu apenas gás, que não pode ser aproveitado comercialmente, e água, que nem ao menos conhecemos sua qualidade mineral.” (Uma lufada que abalou São Paulo, de José Yunes com apresentação de Lourenço Diaféria, Paz e Terra, 1982, p. 129)

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Se o valor total da lambança da PAULIPETRO (60 bilhões de cruzeiros), for atualizada pelo INPC de janeiro/82 até janeiro/2015 e acrescido de 0,5% de juros ao mês, o montante total deste escândalo em valores atuais foi de R$ 8.360.507.812, 24.

Somando apenas estes casos de corrupção que ocorreram no Estado de São Paulo durante um curto período da longa Ditadura Militar pode-se dizer que os paulistas foram lesados em R$ 8.461.308.816,00 (oito bilhões, quatrocentos e sessenta e um milhões, trezentos e oito mil e oitocentos e dezesseis reais. Esta quantia estonteante impressiona ainda mais se for comparada ao escândalo da Petrobras. O MPF estima que o rombo na Petrobrás é da ordem de 2,1 bilhões de reais http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2015-01/desvios-na-petrobras-chegaram-r-21-bilhoes-estima-mpf.

Portanto, a corrupção na petrolífera é 6,26 bilhões de reais  menor que o escândalo da PAULIPETRO e 6,36 bilhões menor do que o total atualizado de alguns dos casos de desmando que foram narrados por José Yunes. Como nada disto foi investigado e punido pela Justiça de São Paulo, Sérgio Moro deveria avocar todos os processos e reiniciar as investigações no Paraná.

E já que Sérgio Moro é o Juiz Geral do Brasil, creio que ele poderia voltar ainda mais no tempo para ajustar as contas com os corruptos e seus descendentes desde o descobrimento do Brasil.

“Escrevendo em 1584, Gabriel Soares de Sousa calculou em 400 mil cruzados (ou 160 milhões de reais) a quantia investida por D. João III na expedição de Tomé de Sousa. Frei Luiz de Sousa afirmou, em 1580, que outros 300 mil cruzados (ou 120 milhões de reais) foram gastos na primeira armada de socorro enviada a Salvador em 1550 sob o comando do fidalgo Simão da Gama e Andrade. Investigadores modernos, baseados em fontes documentais e em suposições verossímeis, calculam em cerca de 1 milhão de cruzados (ou 400 milhões de reais) o custo da construção da cidade do Salvador - o equivalente a um terço das receitas da Coroa.

Onde foi parar tanto dinheiro? Parte foi gasta, parte desviada.” (A Coroa, a Cruz e a Espada, Eduardo Bueno, editora Objetiva, Rio de Janeiro, 2006, p. 124/125).

Se seguir os passos dinheiro neste caso de corrupção e os caminhos do mesmo em outros escandalos semelhantes que ocorreram na Colônia, no Império e nas diversas Repúblicas, Sérgio Moro certamente descobrirá quem são os atuais herdeiros dos picaretas brancos e bem nascidos que roubaram dinheiro público desde a construção de Salvador no século XVI. Seria realmente interessante ver o Juiz Geral do Brasil  passar a limpo toda a nossa história colonial, imperial e republicana. Se fizer isto, Sérgio Moro provavelmente encontrará algum antepassado dele e da esposa dele entre os beneficiários da corrupção brasileira. Então ele poderá expedir um mandado de busca e apreensão do patrimônio ilegalmente constituído que chegou até a casa dele por herança.

Não é justo, de qualquer maneira, que Sérgio Moro concentre seus esforços apenas em investigar petistas. Fica parecendo que ele é tendencioso e partidário, duas qualidades boas num política, mas terríveis num Juiz. Afinal, a Lei exige dos Juízes que mantenham sempre isenção e equidistancia em relação às partes, tratando todas da mesma forma ao aplicar com rigor a mesma Lei. Corrompe a legislação o Juiz que escolhe perseguir apenas um partido político. Não seria o caso do Juiz Geral do Brasil investigar com a mesma dedicação e publicidade jornalística a morte de Celso Daniel e a de Paulo Francis?

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Sobre o autor
Fábio de Oliveira Ribeiro

Advogado em Osasco (SP)

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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