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O fenômeno ainda não plácido da colaboração processual e sua entricheirada bipartição doutrinária

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Notas

[1] O presente artigo é uma atualização do texto “O sofisma catártico da colaboração processual: questionamentos morais e de conveniência político-criminal”, publicado no sítio Empório do Direito, em 18 de agosto de 2015: http://emporiododireito.com.br/o-sofisma-catartico-da-colaboracao-processual-questionamentos-morais-e-de-conveniencia-politico-criminal-por-fernando-gentil-gizzi-de-almeida-pedroso/

[2] Conhecida passagem onde Judas Iscariotes entrega Jesus Cristo aos sacerdotes, por intermédio de um beijo (Lc22,47), com o fito de obter exatas trinta moedas de prata (Mt 26,15; 27,3).

Com o decorrer dos anos, tantos outros casos exsurgiram, como: milhares de pessoas queimadas vivas nas fogueiras da inquisição; levadas à guilhotina para serem decapitadas depois da tomada da Bastilha; na Rússia do comunismo Stalinista e, igualmente, na Alemanha do Partido Nacional Socialista, sectário e intolerante, como as demais ditaduras, que absorveram inteiramente a personalidade humana e anularam todos os valores individuais.

No Brasil, esquadrinha-se a estória da Inconfidência Mineira, com a delação feita por Joaquim Silvério dos Reis acerca de Tiradentes.    

[3] Datada de 11 de janeiro do ano de 1603, as Ordenações Filipinas, em seu Título VI, ao definirem o crime de “Lesa Magestade” (sic), tratava da colaboração premiada no item 12.

Por sua vez, o Título CXVI, cuidava de tal tema sob a rubrica “Como se perdoará aos malfeitores que derem outros à prisão”, premiando com o perdão, inclusive, criminosos delatores de delitos alheios.   

[4] Pássaro oriundo da mitologia grega que, quando morria, entrava em autocombustão, vindo a renascer, vindouramente, das próprias cinzas.

[5] Parágrafo único, artigo 8º, da Lei 8.072, de 25-07-90; artigo 6º, da Lei 9.034, de 03-05-1995 (revogada pela Lei 12.850, de 02-08-2013); parágrafo 4º, artigo 159 do Código Penal; parágrafo 5º, artigo 1º, da Lei 9.613, de 03-03-1998; artigos 13 e 14, da Lei 9.807, de 13-07-1999; o revogado parágrafo 2°, artigo 32, da Lei 10.409, de 11-01-2002; artigo 41, da Lei 11.343, de 23-08-2006; e, artigo 87, da Lei 12.529, de 30-11-11.

[6] Importante deixar bem claro que a condenação ou a absolvição de terceiros jamais poderá constar como cláusula condicionante de eficácia de um acordo.

[7] Como ilustração, relembramos o § 4.°, art. 159, CP (extorsão mediante sequestro). Isso porque, visível a benevolência havida para aquele que realiza tal fato típico em concurso de, pelo menos, dois agentes (o delator e pelo menos um outro) e, ulteriormente “arrependido”, vem a colaborar (de forma eficaz) com a ação das autoridades, vindo a prestar informações que facilitem a libertação do sequestrado

[8] Apud RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal .7ª edição.  Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p.605.

[9] MARCÃO, Renato. Delação Premiada. Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal, agosto/setembro. Porto Alegre: LEX/Magister, 2005.

[10] Tamanha a verdade dessa nova onda organizada de ilícitos, que se pode vislumbrar a ocorrência de tal macrocriminalidade no mundo todo, como, exempli gratia, o caso das máfias italianas.

O Brasil, não estanque a esse fenômeno, também tem sofrido com tal inteligência criminosa, verbi gratia a existência de cada vez emergirem maiores e bem engendradas associações ilícitas, como o denominado Comando Vermelho (CV), no Rio de Janeiro, ou o Primeiro Comando da Capital (PCC), em São Paulo. (ver, nesse sentido: PEDROSO, Fernando Gentil Gizzi de Almeida. Direito Penal do Inumano e a nova ordem constitucional. Revista Visão Jurídica, maio de 2012, n° 72. São Paulo: Escala. pp. 70-75).

[11] JESUS, Damásio Evangelista de. Boletim IBCCrim n.5, p.1 (apud GOMES, Luiz Flávio. Delação premiada e aspectos processuais penais. Material da 3ª aula da disciplina criminalidade econômica e organizada, ministrada no curso de especialização televirtual em ciências penais da Universidade Anhanguera – Uniderp/Rede LFG. p.23).

[12] CERVANTES, Miguel de. Dom Quixote. Parte primeira. Cap. XXXIX.

[13] MOREIRA, Rômulo de Andrade. A mais nova previsão de delação premiada no Direito Brasileiro. DVD Magister n°47, Porto Alegre: LEX/Magister.

[14] Tal teoria professa que: ao mesmo tempo que a realidade fática (mundo do ser) fundamenta o direito escrito (mundo do deve-ser), este é apto a alterar aquele.

Similar elucubrar vemos na advertência perpetrada pelo pranteado poeta Dante Alighieri, que, como bem relembrou Miguel Reale, nos trouxe a ideia de que o “Direito é uma proporção real e pessoal, de homem para homem, que, conservada, conserva a sociedade, corrompida, corrompe-a” (REALE, Miguel. Lições preliminares de Direito. 19ª. edição. São Paulo: Saraiva, 1991. p.60).

[15] Um exemplo, recente, foi a morte nefasta de Sérgio Sales (primo do ex-goleiro do Clube de Regatas Flamengo: Bruno Fernandes de Souza), que havia auxiliado a esclarecer o funesto exício perpetrado contra Eliza Silva Samudio.  

Triste, por demais, a outra faceta desse mesmo prisma. Na prática, como rememora Renato Marcão, tal instituto vem “sendo usado largamente, e muitas vezes com pouco ou nenhum critério técnico, tanto que se tem notícia de vários casos em que houve a delação premiada, porém nada ficou documentado ‘visando a segurança do delator’, e exatamente por isso nada foi comunicado nos autos do processo criminal a que se vê submetido, apesar do êxito das investigações realizadas a partir da delação.

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Em consequência, muitos delatores acabam colaborando com as investigações e depois não recebem os benefícios inicialmente apresentados na barganha que envolve a pretensão punitiva, a revelar, mais uma vez, condenável violação ética patrocinada pelo Estado. “ (ob.cit.)   

[16] Note a semelhança com o funesto brocardo confessio est regina probationum.

[17] Requisito exigido pela Lei n° 12.850, de 02 de agosto de 2013, no caput do artigo 4°. Diga-se en passant, fora com tal Lei que exsurgiu uma regulamentação detalhada acerca do assunto.

[18] A citação é de Virgílio, Eneida, VI, 566-7: “Aí tem seus domínios o cretense Radamanto,
e castiga e examina crimes e obriga à confissão” Apud BADARÓ, Gustavo. Quem está preso pode delatar?. Disponível em: < http://jota.uol.com.br/quem-esta-preso-pode-delatar>. Acesso em: 23 de junho de 2015

[19] SHAKESPEARE, William. “A tragédia de Hamlet, príncipe da Dinamarca”. Ato III, cena I.

[20] LOPES JÚNIOR, Aury; ROSA, Alexandre Morais da.  Delação Premiada: com a faca, o queijo e o dinheiro nas mãos. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2016-mar-25/limite-penal-delacao-premiada-faca-queijo-dinheiro-maos>. Acesso em: 25 de março de 2016.

[21] Idem, ibidem.

[22] Seja em razão do artigo 26 da Convenção de Palermo, internalizada por meio do Decreto n.5015/2004; ou seja em razão do artigo 37 da Convenção de Mérida, internalizada por meio do Decreto n.5687/2006

[23] Vislumbre que no processo penal inglês a valoração probatória é matéria reservada aos jurados. Não por outra razão, imprescindível a necessidade de adverti-los (warning) do desastroso risco de uma condenação criminal sob o pálio de informações prestadas pelo colaborador, tão-somente. 

[24] Antolha-se! Tal fenômeno recebe a tipologia de corréu vestida. CUERDA-ARNAU, Maria Luisa. Atenuación y remisión de la pena en los delitos de terrorismo. Madrid: Ministerio de Justicia e Interior, Centro de Publicaciones, 1995. p.223 (apud PEREIRA, Frederico Valdez. Valor probatório da colaboração processual. Revista dos Tribunais. São Paulo: RT, ano 98, v.879. jan.09, p.481). Em idêntico cipoal: RIVA, Carlo Ruga. Il premio per la collaborazione processuale. Milano: Giuffrè, 2002. p.13-15.

[25] Exempli gratia, no caso em testilha, a) a importância dada aos valores; b) o caráter normativo atribuído aos axiomas; e, precipuamente, c) o respeito dos direitos fundamentais – com inconfutável promoção da dignidade da pessoa humana.

[26] Tanto em sua acepção formal (participação), quanto em sua acepção substancial (poder de influência nas deliberações do pretor).

Vide, verbi gratia, que se o colaborador vier a ser ouvido durante o processo, os advogados dos acusados delatados terão direito de fazer reperguntas (STF HC 90.830).

[27] Princípio relacionado ao agente do fato.

[28] Tal fenômeno, igualmente denominado de contaminação virótica da constituição, traduz uma leitura da ordem jurídica sob o prisma constitucional.

[29] Nesse sentido: STF HC 84.517.

[30] FISCHER, Douglas. Colaboração Premiada: instituto legítimo, legal e essencial ao processo penal brasileiro.

Disponível em: <https://medium.com/@esmpu/colabora%C3%A7%C3%A3o-premiada-instituto-leg%C3%ADtimo-legal-e-essencial-ao-processo-penal-brasileiro-eb03b691567e#.jtd17ismh >. Acesso em: 30 de março de 2016.

[31] Como bem professa Hugo Nigro Mazzilli: “enquanto a sociedade e os governantes acreditarem que, com mera mudança de terminologia fazem-se progressos, trocaremos nomes de ‘menores’ para ‘crianças e adolescentes’, mas os problemas continuarão os mesmos” (MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. 24ª Edição. São Paulo: Saraiva, 2011. P685).

[32] Habeas Corpus n. 126.292-SP, STF, Plenário, DJ de 17.2.2016.

[33] FISCHER, Douglas. Colaboração Premiada: instituto legítimo, legal e essencial ao processo penal brasileiro. Ob. Cit.

[34] Idem, ibidem.

[35] Fato este que necessita ser revisto.

[36] Desde que com o aprimoramento das estruturas normativas – vindo a evitar, tanto quanto possível, resultados danosos à eficácia da justiça e, noutra mão, como em um instituto cadenciado, trazendo benefícios reais à sociedade.

[37] FISCHER, Douglas. Colaboração Premiada: instituto legítimo, legal e essencial ao processo penal brasileiro. Ob. Cit.

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Sobre o autor
Fernando Gentil Gizzi de Almeida Pedroso

Advogado. Presidente da Comissão de Cultura da 18ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil – São Paulo (2013/2015; 2016/2018). Professor no Departamento de Ciências Jurídicas da Universidade de Taubaté. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual Penal (IBRASPP), do Instituto Brasileiro de Direitos Humanos (IBDH), da Fundación Internacional de Ciencias Penales (FICP – Madrid) e investigador no “International Center of Economic Penal Studies” (ICEPS – New York)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEDROSO, Fernando Gentil Gizzi Almeida. O fenômeno ainda não plácido da colaboração processual e sua entricheirada bipartição doutrinária. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4726, 9 jun. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/48069. Acesso em: 23 abr. 2024.

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