Tripartição dos poderes.

O necessário exame de consciência Institucional do STF

21/04/2016 às 11:47
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Usurpação - A flagrante interferência do Poder Judiciário no Poder Legislativo.

Em tempos de tantos acontecimentos históricos no Brasil, alguns fatos isolados perpetuarão na história jurídica do país de maneira negativa, pois em um futuro próximo quando os professores de Direito Constitucional e Teoria geral do Estado forem ensinar seus alunos nos bancos das faculdades sobre a Separação dos Poderes, sem dúvidas serão necessárias duas explanações, a primeira, consubstanciada na Constituição de 1988 em seu art. 2º, já a segunda explanação, será com base nas decisões e posicionamentos recentes do Supremo Tribunal Federal.

No caso da Separação de Poderes determinada na Magna Carta, são Poderes da União: o Legislativo, Executivo e o Judiciário, que devem ser harmônicos, por esta harmonia se extrai que nenhum Poder pode usurpar a função do outro, ou seja, o Poder Judiciário não pode tomar para si uma função que constitucionalmente é do Poder Legislativo.

Isto posto. Em recente julgado, o STF avocou para si a função exclusiva do Poder Legislativo, contrariando o disposto nos art. 51 e 52 da Constituição Federal, que é taxativo em depositar no Congresso Nacional, a responsabilidade de instaurar processo contra o Presidente e Vice-Presidente da República, bem como processá-los e julgá-los.

Neste julgamento, o Supremo Tribunal Federal interferiu diretamente no rito do processo de impedimento contra a Presidente da República, ditando como seriam as comissões, os políticos que poderiam se candidatar, os votos, dentre outros.

Com isso, o Supremo usurpou uma função que constitucionalmente não lhe pertence, pois, o Poder Legislativo em nenhum momento usurpou alguma função do Poder Executivo para que se assim fosse, o STF seria legitimado a agir mediante provocação. O Poder Judiciário não pode determinar o funcionamento da casa Legislativa, ainda mais em rito que lhe foi conferido pela própria Carta Política.

Neste sentido, não houve por parte do Supremo Tribunal Federal um ativismo judicial, quando outro Poder deixa de cumprir sua função, isso legitima o Supremo a agir, mas neste caso, isso não ocorreu, haja vista que o Poder Legislativo não estava deixado de cumprir sua função, mas foi submetido aos ditames de outro Poder de como deveria proceder em uma função constitucionalmente atribuída ao Legislativo.

Isso caracterizou uma judicialização da política, uma vez que, a decisão do Supremo Tribunal Federal não se sustenta juridicamente e não pode ser fundamentada no art. 5º XXXV (Principio da Inafastabilidade de Jurisdição – lesão ou ameaça a direito), isso só seria possível se no curso do rito impeditivo (impeachment), a Constituição e/ou Lei Federal não estivesse sendo cumprida, mas nunca antes de se iniciar uma função que a Constituição conferiu ao Congresso.

Apesar da nova visão do Estado contemporâneo, onde deve haver uma “colaboração de poderes”, e que as divisões de funções entre os órgãos do poder não são absolutas, não existe harmonia quando há usurpação, pois também não se sustenta a tese de que pode ter havido o acionamento do sistema de “freios e contrapesos” em busca do equilíbrio para o bem da coletividade, neste caso, a interferência antes do fato concreto, onde deve ser aplicado a lei, não ocorreu, restando claro um protagonismo desnecessário em uma função que não pertence ao Supremo Tribunal Federal.

Prova disso, é a usurpação do Poder Legislativo em outra decisão da Suprema Corte Brasileira, ou seja, a determinação de abertura de processo de impedimento contra o Vice-Presidente da República, do ponto de vista jurídico e acadêmico, somente isso, a decisão é totalmente equivocada, pois cabe ao Congresso aceitar ou rejeitar qualquer processo de impedimento nos caso em que a Constituição lhe delega este Poder, do contrário, os processos de impedimento (impeachment), seriam apresentados diretamente ao Supremo Tribunal Federal ou a outro Tribunal dependendo do Cargo Público, novamente se observa a judicialização da política no Estado Brasileiro.

Não obstante, denota-se que nossa Suprema Corte necessita de um exame de consciência Institucional urgente, uma vez que, em recente declaração o Ministro Marco Aurélio Mello do Supremo Tribunal Federal afirmou que, ainda que haja uma decisão incluído as duas Casas do Congresso Nacional e isso ocasione no impeachment da Presidente da República, a Chefe do Estado Brasileiro tem o direito de recorrer e a palavra final será da Suprema Corte Brasileira.

Novamente equivoca-se a Supremo Tribunal Federal, ao querer protagonizar uma situação que constitucionalmente pertence a outro Poder da União, ou seja, o Legislativo e ainda, declaração de fatos que ainda não existem no mundo jurídico, o que agrava ainda mais a situação de usurpação de poder e pode ocasionar um conflito histórico entre os Poderes e agravar ainda mais a crise jurídico-política em que o Estado se encontra.

Neste sentido, de maneira totalmente contraria aos preceitos constitucionais, o “Guardião” da Carta Política, afirma de maneira futurista que mesmo após uma decisão soberana do Congresso Nacional, a qual constitucionalmente deverá ser presidida pelo próprio Presidente do STF, a autoridade impedida poderá recorrer aquela Corte e, a palavra final será do Plenário do Supremo Tribunal Federal.

Tal afirmação, em tempos sombrios que vivemos, sem dúvidas abala a harmonia entre os poderes, pois as declarações ainda que futuristas, tem um peso muito grande no presente momento ainda mais que já houve demonstrações de usurpação de poder, isso em nada contribui para a atual situação que vive o país, pelo contrário, abala o princípio basilar da Ordem Jurídica do Estado Democrático de Direito, que é a separação dos poderes.

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Vale aqui uma volta ao passado para se medir os atos do futuro, a teoria tripartite adotada pelo Brasil, que teve origem em tempos diferentes nas ideias dos seus precursores, tais como Aristóteles, Locke, Platão, Montesquieu, onde a teoria deste último por seus contornos perfeitos dentro de uma visão especifica e determinada, traduzido na sua obra “O Espirito das Leis” deixa evidenciado que a tripartição de poderes tem o condão de três poderes totalmente independentes, para que seja possível exercer suas funções com igualdade e autonomia respeitando cada um à sua competência e dando sustentabilidade ao Estado Democrático de Direito.

Neste diapasão, a tese de “colaboração dos poderes” defendida por parte da doutrina não se sustenta, pois vai em desencontro com a teoria tripartite adotada pelo Estado Brasileiro e promulgada na Constituição de 1988, a usurpação de poder está camuflada na teoria da “colaboração dos poderes”, prova disso é as decisões citadas e a declaração da Suprema Corte, que ao tentar dar legalidade a um processo que já nasceu legal, pois deriva da própria Constituição, protagoniza uma situação que viola a Carta Magna e a independência  e igualdade dos Poderes da União, caracterizando somente a judicialização da política brasileira.

Não há justificativa no mundo jurídico para as decisões e declaração em comento, haja vista que o Supremo Tribunal Federal constitucionalmente não tem legitimidade para tanto, o Supremo Tribunal Federal é o Guardião da Constituição, e deve zelar por seu fiel cumprimento, mas, jamais pode interferir diretamente em outro Poder e ainda, aplicando a Constituição de maneira modificada, sem o devido processo legislativo do Poder que está legitimado para fazê-lo.

Se há uma separação de poderes determinada pela Carta Política, essa deve ser respeitada e o judiciário só deve intervir quando um dos outros Poderes deixar de cumprir o que determina a Constituição.  Aliás, alguns dos Filósofos citados acima eram seguidores de Sócrates que sabiamente defendia que a verdade plena é aquela que não pode variar, se existe uma verdade vital para todos os homens, essa deve sem dúvidas valer para todas as pessoas.

Dr. Rodrigo Eduardo Mariano é cientista jurídico e advogado militante no Brasil, Especialista em Direito Público, Penal e Processual Penal e Ciência Política. Sócio-fundador do Escritório R Mariano Advogados. e-mail: [email protected] - www.rmariano.adv.br

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Sobre o autor
Rodrigo Eduardo Mariano

Cientista Jurídico e Advogado militante no Brasil, Especialista em Direito Público, Penal e Processual Penal e Ciência Política - Sócio Fundador do Escritório R Mariano Advogados

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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