3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Verifica-se que o conflito então existente entre a Lei nº 9.455/1997 (Lei de tortura) e o artigo 125, § 4º, da Constituição da República (julgamento por tribunal competente da Justiça Militar Estadual), no que tange à demissão do militar condenado pelo crime de tortura, foi pacificado no seguinte sentido:
1. O crime de tortura, previsto na Lei nº 9.455/1997, devido à sua especialidade, trata-se de crime comum, não cabendo julgamento perante a Justiça Militar, conforme doutrina e a jurisprudência dominante nos Tribunais Superiores.
2. A demissão em virtude de sentença penal condenatória no crime de tortura passou a ter efeito automático, conforme entendimento majoritário da doutrina e do Supremo Tribunal Federal.
3. O Conselho de Justificação, que julga a perda do posto, patente e graduação dos militares, embora realizado pela Justiça Militar, passou a ser entendido, pelo Supremo Tribunal Federal, como detentor de natureza administrativa e não jurisdicional. Logo, não cabe a esse conselho rediscutir o mérito da sentença de condenação de tortura, proferida pelo juiz da Justiça Comum.
4. O Supremo Tribunal Federal deu uma interpretação restritiva ao artigo 125, § 4º, da Constituição Federal, no sentido de que o julgamento por tribunal competente, de natureza administrativa, para decretar a perda do posto, patente e graduação dos militares, somente deve ocorrer em caso de crimes militares, pois no caso de tortura a própria decisão já tem efeito automático para demitir o militar.
Conforme o acima exposto cabe ao Juízo Comum decretar a demissão do militar estadual condenado pelo crime de tortura, em sentença transitada em julgado, vez que se trata de crime comum e não militar. E a sentença tem efeito automático, consoante entendimento já pacificado pelo Supremo Tribunal Federal.
Assim sendo, independente do quantum da pena e da modalidade de tortura praticada, o servidor militar estadual terá como efeito automático da sentença sua demissão do serviço público estadual, cabendo à instituição militar estadual responsável apenas cumprir a decisão judicial e proceder à efetiva demissão.
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