O limite na responsabilidade na relação entre franqueado e franqueador

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Este trabalho visa analisar a relação de franquia (ou franchising) trabalhando para isso conceitos e análise da legislação, bem como utilizando-se de decisões acerca do tema.

INTRODUÇÃO

Este trabalho terá inicio abordando o tema do tópico um que são as concepções sobre o empresário. Neste tópico, além de conceitos de autores e o da própria legislação, serão abordadas características fundamentais para o empresário possa ser reconhecido como tal bem como requisitos previstos na legislação para o que o mesmo possa operar e assim constituir a sua empresa.

No segundo tópico será tratada parte da história de constituição do contrato de franquias no Brasil, bem como o conceito do mesmo, estabelecendo as características do mesmo, dentre estas destacando-se a bilateralidade do contrato, que configura obrigações e direitos para as ambas as partes constituintes do mesmo.

No terceiro tópico é discutida a extensão do vínculo de franquia no que tange a responsabilidade de atos praticados por uma das partes do contrato sendo discutido se há de falar em responsabilidade de uma das partes em relação a atos da outra.

Por fim é dada continuidade ao discutido no tópico três do trabalho, agora analisando-se um caso julgado pelo TST sobre o tema de responsabilidade, analisando se cabe responsabilizar uma das partes constituintes do contrato de franquia por atos da outra.


1. CONCEPÇÕES INICIAIS SOBRE O EMPRESÁRIO

Segundo Fábio Ulhoa Coelho (2010, pág. 64), “empresário é a pessoa que toma a iniciativa de organizar uma atividade econômica de produção ou circulação de bens e serviços”. Ele pode se apresentar tanto como pessoa física ou jurídica. Como pessoa física, se identifica através do emprego do seu capital e da organização da empresa. Como pessoa jurídica, quando nasce da união de seus integrantes.

O Código Civil Brasileiro admite apenas a forma da pessoa física, como disposto no artigo 966:

Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.

Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.

Entretanto, as atividades empresárias são praticadas, quase totalmente, por pessoas jurídicas, na forma de sociedades empresárias (COELHO, 2010, pág. 64). Para ser considerado empresário é necessário que sua atividade seja realizada de forma habitual e como uma atividade profissional, ou seja, para obtenção de lucros.

Se tratando de sociedade empresária é errôneo dizer que os sócios são os empresários, pois a pessoa jurídica – sociedade – é que configura a imagem do empresário. Os sócios são apenas integrantes da sociedade, então, eles não estão “sujeitos às normas que definem os direitos e deveres do empresário” (COELHO, 2010, pág. 65).

Dispostos no artigo 972 do Código Civil estão os requisitos para se tornar um empresário: capacidade e não impedimento. Os impedidos são agentes políticos, servidores públicos – não podem ser empresários, mas podem ser sócios de sociedades empresárias –, falidos – judicialmente declarados, estão impedidos até a reabilitação –, penalmente proibidos e os estrangeiros – tem apenas impedimento relativo.

Para um estrangeiro ser empresário, ele precisa de um visto de permanência no Brasil, por 5 anos, podendo renovar, atentando apenas aos prazos e evitando condutas ilegais. Entretanto, são feitas algumas restrições quanto a sua atividade empresária. São impedidos de realizar atividades de zona de fronteira para segurança nacional – por meio do Decreto 941/69 –, explorar jazidas e minas (artigo 176, § 1º, CF). Quanto a empresas jornalísticas e de radiodifusão sonora e de imagens, é permitida a participação em até 30% no capital, essa possibilidade foi inserida pela Emenda Complementar 36/2002.

“A pessoa legalmente impedida de exercer atividade própria de empresário, se a exercer, responderá pelas obrigações contraídas”, prevê o artigo 973 do Código Civil, ou seja, se um dos indivíduos impedidos exercerem função de empresário, as responsabilidades recairão sobre eles.

Suas obrigações são somente de registro no órgão competente antes do exercício de sua atividade (artigo 967, CC), escrituração contável periódica (contabilidade) e o balanço anual, ou demonstrativo anual de resultado, além de manter a escrituração regular de seu negócio (VENEZ, 2010).

As perdas de qualificação do empresário podem ser de quatro formas: morte, falência, desistência – é preciso dar baixa no registro na Junta Comercial – e uma revogação da autorização, quando o empresário perde sua qualificação para exercer sua função.


2. AS CARACTERÍSTICAS LEGAIS DA RELAÇÃO DE FRANQUIA

Uma vez caracterizada a figura do empresário, para continuarmos o desenvolvimento deste trabalho é preciso agora conceituar e estabelecer as regras que compõem o contrato de franquia (ou franchising) entre empresários.

Segundo a Lei de Franquias Nº 8.955, de 15 de Dezembro de 1994, franquia

é o sistema pelo qual um franqueador cede ao franqueado o direito de uso de marca ou patente, associado ao direito de distribuição exclusiva ou semi-exclusiva de produtos ou serviços e, eventualmente, também ao direito de uso de tecnologia de implantação e administração de negócio ou sistema operacional desenvolvidos ou detidos pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta, sem que, no entanto, fique caracterizado vínculo empregatício.

Ou seja, o contrato de franquia concede certos direitos ao franqueador antes apenas garantidos ao franqueado, para que este primeiro possa a vir a estabelecer seus negócios conforme o contrato entre os dois prevê, torna-se necessário a vigência de um contrato de franquia entre ambos uma vez que o franqueador não poderia utilizar-se da marca e direitos que acompanham a utilização e distribuição desta se não houvesse este dispositivo que assegura a relação entre eles.

Sobre isso é importante comentar uma vez que esta lei foi pioneira no Brasil, pois, antes desta não havia no país nenhuma legislação específica que viesse a regulamentar a relação de franquias, o que tornava este tipo de negócio uma aventura a empresários que se arriscavam em estabelecer contratos sem a devida proteção legal necessária, criando assim certo caos uma vez que empresários poderiam não estabelecerem-se de forma padronizada e utilizando-se de contratos com cláusulas absurdas.

Uma consideração a ser feita é que essa forma de contrato surgiu no exterior e antes da implementação da Lei Nº 8.955/94 empresas estrangeiras operavam no país sem estar ligadas a nenhuma legislação diretamente relacionadas a sua forma de operar quando escolhiam os contratos de franquia para trabalhar com empresários brasileiros o que criava uma situação de insegurança entre as partes.

Dito isto, é preciso então caracterizar o contrato de franquias, e como primeira característica do mesmo podemos ressaltar a tipicidade do mesmo: uma vez que este se encontra tipificado na legislação brasileira através da Lei 8.955/94 que em seu Artigo 6º atribui ainda outra característica ao mesmo que é a formalidade já que solicita a presença de duas testemunhas para a celebração do mesmo, inclusive considerando-o inválido caso não seja respeitada esta determinação (CASTRO, 2008).

Outra característica do mesmo é que ele é bilateral por gerar obrigações que devem ser respeitadas por ambas as partes, como por exemplo, a obrigação de uso limitado da marca submetido às especificações estabelecidas em contrato pelo franqueador. É também oneroso por natureza, sendo sempre exigida a remuneração seja esta de forma direta ou ainda indireta. Aleatório já que os resultados que serão obtidos com o contrato não podem ser especificados com precisão na hora da constituição do contrato, há apenas a possibilidade de expectativas quanto a certos efeitos do mesmo, como por exemplo, o de sucesso da franquia estabelecida. É marcado pela execução futura já que execução do mesmo se dá de maneira posterior ao de celebração do contrato. É ainda individual tratando de ligar apenas os responsáveis pelo mesmo, que são franqueador e franqueado. E por fim é negociável já que tudo aquilo não exigido em lei pode ser estabelecido e alterado com a utilização de cláusulas no contrato a fim de torná-lo condizente com os anseios de ambas as partes (CASTRO, 2008).


3. LIMITES DO VÍNCULO DE FRANQUIA ENTRE AS PARTES

Dando continuidade ao trabalho, discorreremos agora sobre o enfoque principal deste trabalho que é até onde vai a responsabilidade de cada uma das partes uma vez que o contrato de franquia entre elas é estabelecido. Como já foi apresentado, uma das características deste tipo de contrato é a bilateralidade do mesmo, o que proporciona que as partes do contrato tenham entre si direitos e deveres uma para com as outras, o que dá inicio a essa discussão da extensão do vínculo existente entre elas.

Primeiramente, há de se analisar a figura do franqueador, que é o detentor original da marca a ser negociada no contrato de franquia. Sobre este contrato é preciso lembrar o previsto na Lei Nº 8.955/94 em seu Art. 3º que contém uma série de incisos destacando pré requisitos que o legislador julgou necessários para implementação do contrato de franquias. Esse dispositivo tem importância ressaltada com o Art. 4. da mesma lei que diz que poderá ser nulo o contrato caso o modelo contendo o previsto no Art. 3º não seja entregue em no mínimo dez dias úteis, mostrando que o franqueado precisar estar cientes de todas as cláusulas existentes a fim de prosseguir com o estabelecimento do contrato.

Por consequência óbvia, uma vez estabelecido o contrato, este (franqueador) fica agora obrigado a realizar o empréstimo de sua marca registrada para o franqueado para que este possa vir a operar fazendo uso da mesma, bem como fica impedido de fazer quaisquer cobranças extras pelo uso da mesma (marca) que não estejam previstas previamente no contrato estabelecido entre eles. Além dos deveres do franqueador, este possui ainda os direitos na relação contratual, que é o de receber o valor combinado em contrato por ceder sua marca ao franqueado, bem como o direito de ter as cláusulas contratuais que o beneficiem e são obrigações do franqueado respeitadas.

Já o franqueado tem obrigações para com o franqueador na medida em que o contrato entre eles exigir, o que pode variar, mas em geral seguem determinadas regras como, por exemplo, a de não adulteração da marca, do logotipo, o respeito à padronização do local – no que tange a cores, objetos, etc. – onde a franquia será instalada dentre outros.

Mas até onde o franqueador responde pelos atos do franqueado? Será possível falar de um pagando por ações do outro? A resposta é: não. Apesar de, aparentemente, o franqueador estar acima hierarquicamente em relação ao franqueado, este último opera de certa forma independente.

O contrato de franquia da forma com que é utilizado atualmente, dá certos direitos a ambos de operarem sem que haja total ciência do que ambas as partes estão fazendo – embora haja sim, fiscalizações por parte dos franqueadores em suas franquias, estas ocorrem meramente para assegurar que o contrato está sendo cumprido e de maneira alguma liga necessariamente as ações de um empresário ao outro. Ora, seria inviável falar de responsabilidade do franqueador sobre atos das franquias uma vez que empresas como McDonald’s possuem milhares de estabelecimentos espalhados no mundo funcionando sob contratos de franquias e tomar responsabilidade pelos atos de cada um destes estabelecimentos para si apenas desencorajaria que este tipo de contrato fosse implementado.

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Logo é preciso ver franqueador e franqueado, embora ligados pelo contrato, de forma independente quando se diz respeito a atos cometidos que não dizem respeito ao pactuado em contratos. E funciona de ambos os lados, não só apenas o franqueador não responde pelo franqueado, como este último não responde pelos atos do franqueador. No próximo tópico, será tratado o que a jurisdição tem a dizer sobre estes conflitos.


4. A JURISDIÇÃO E SUAS DECISÕES A RESPEITO DAS OBRIGAÇÕES ENTRE FRANQUEADO E FRANQUEADOR

O Tribunal Superior do Trabalho, através da figura do Ministro Alberto Bresciani, entende que franqueador não responde pelas obrigações da franquia. Ao acolher o caso da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, entendeu que ela não tinha responsabilidades pelas obrigações adquirias por sua franquia.

O caso em questão envolveu Rhannyffer Bazar e Papelaria e os Correios. Um auxiliar de expedição, contratado pela papelaria em questão, através de um instrumento particular de prestação de serviços, buscava o reconhecimento da relação de emprego, assinatura na carteira de trabalho e direitos relacionados a esse vínculo.

Segundo o auxiliar, a papelaria era “uma verdadeira agência dos Correios, onde se vendem selos, se expedem cartas e encomendas e se realizam todos os demais serviços afetos àquela empresa”, mesmo não havendo formalização nesse processo de “franquia”.

A primeira instância, ao analisar o caso, entende que, apesar de ser irregular essa relação entre os Correios e a Empresa, as duas deveriam responder pelas responsabilidades de forma solidária. Entretanto o Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, local que ocorreu o caso, entende que a responsabilidade não deve ser tratada de forma solidária, mas sim subsidiária para os Correios, ou seja, os Correios apenas atuariam caso a papelaria não fosse capaz de arcar com o débito sozinho.

O Tribunal entendeu que papelaria realizava parte essencial da atividade dos Correios, e nesse caso, aplicaria a Súmula 331 do TST, que dispõe da legalidade de contratos, mesmo quando não formais, devido a prestação de serviços, prevendo a responsabilidade subsidiária quando o empregador não é capaz de cumprir suas obrigações.

Entretanto, os Correios julgam não ser aplicável a Súmula graças a ausência de contrato de franquia empresarial com a parte. A isenção de vínculos com os empregados da franqueada está regulamentada pela Lei 8955/94 (CASTRO, 2008)

De acordo com as definições de franquia, há a cessão de direitos de uso da marca ou patente, possibilitando a distribuição de serviços e garantindo direitos à empresa franqueadora. Entretanto, não é possível observar essa relação entre a papelaria e os Correios, portanto, não há relação do possível franqueador com o empregado.

Em uma posição contrária, está a Seção Especializada em Dissídios Individuais (SDI-II) que entendem que os Correios se responsabilizariam pelos atos praticados por uma franqueada da estatal. Então a 63ª Vara do Trabalho de São Paulo reconheceu a relação trabalhista e condenou os Correios subsidiariamente na quitação dos direitos do empregado, sob o fundamento de que houve “intermediação de mão-de-obra”.

Os Correios recorreram ao Tribunal Regional do Trabalho afirmando seu contrato de franquia com a 2 Mil Post Office – então empresa responsável pelo empregado terceirizado a papelaria –, mas não reconhecendo o benefício – direto ou indireto – do empregado.

De acordo com a juíza do TRT, Jane Granzoto Torres da Silva, a empresa dos Correios “não é a beneficiária dos serviços prestados pelos empregados contratados pela reclamada 2 Mil Post Office, mas somente se beneficia do resultado final da exploração de sua marca”, não deve haver responsabilidade dos Correios, “impondo-se a extinção do processo sem julgamento do mérito”. (CASTRO, 2008)

Desse modo, está exemplificada a, ainda, divergência jurisprudencial acerca do tema proposto. Apesar de ser uma forma de contrato muito utilizada hoje, ainda há casos excepcionais não regularizados e que não possuem homogeneidade em sua análise. As responsabilidades adquiridas desse tipo de contrato ainda geram desacordo entre as doutrinas.

De fato, as responsabilidades são compartilhadas, mas os limites devem ser respeitados, os termos dos contratos devem ser claros, e principalmente, seguir a lei que os regula.


CONCLUSÃO

A figura do empresário pode se apresentar por meio de pessoa física ou jurídica – sociedade empresária – e se constituir de diversas maneiras. Para realizar sua atividade, o empresário pode recorrer ao uso de franquias – cessão de direitos de patente ou marca para realização de atividade, distribuição de serviços, e direito ao uso de tecnologia de implantação e administração exclusiva do franqueador.

Apesar de bem delimitadas as obrigações e responsabilidades de cada parte, os limites ainda são um pouco indetermináveis quando aplicados ao caso concreto, como visto no trabalho apresentado. E, apesar das divergências, fica clara a necessidade de clareza na elaboração dos contratos de franquia.

A fim de evitar problemas na limitação dos direitos do franqueado e do franqueador, é necessário que ambos respeitem a legislação que trata sobre, além de estabelecer um acordo conciso. As responsabilidades, sendo negociáveis, devem ser tratadas no contrato para prevenir possíveis complicações posteriores.


REFERÊNCIAS

CASTRO, G. T. de. Responsabilidade Do Franqueador Sobre O Passivo Trabalhista Do Franqueado. 2008. Disponível em <https://superclickmonografias.com/blog/?p=137>. Acesso em 31 de outubro de 2012.

COELHO, Fábio Ulha. Curso de Direito Comercial: direito de empresa. 14º edição: São Paulo. Saravia. 2010.

VENEZ, Hilma da Silva Costa. Obrigações Gerais do Empresário. 2010. Disponível em: <https://www.ebah.com.br/content/ABAAAAq18AA/obrigacoes-gerais-empresario >. Acesso em: 2 novembro de 2012.

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Sobre os autores
Matthews Barbosa Martins

Graduando em Direito, pela Unidade de Ensino Superior Dom Bosco.

Yarah Marla Saraiva Rolim

Graduanda em Direito, pela Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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