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A validade do cumprimento do mandado de busca e apreensão por parte da Polícia Militar

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4.   Doutrina sobre mandado de busca e apreensão

Ao se analisar o que os doutrinadores de processo penal entendem sobre o tema, constata-se que a imensa maioria leciona que o cumprimento do mandado de busca e apreensão por parte da Polícia Militar é constitucional, válido e legal.

Por exemplo, Guilherme de Souza Nucci defende a possibilidade de a Polícia Militar realizar esse cumprimento. Aliás, o renomado processualista penal faz uma interessante comparação entre a possibilidade de a Polícia Militar realizar essa atribuição, a priori, da Polícia Civil, quando a Corporação Militar realiza diligência que caberia originariamente ao Oficial de Justiça, por exemplo, em local perigoso. Vejamos o que escreve Nucci sobre o tema:

78. Cumprimento de mandados de prisão: segundo o art. 5.º, LXI, da Constituição Federal, somente a autoridade judiciária, de modo fundamentado e por escrito, pode determinar a prisão de alguém, razão pela qual cabe à polícia judiciária cumprir o mandado expedido. Atualmente, também a Polícia Militar, em seu policiamento ostensivo, tem atribuição para cumprir mandados de prisão, ao deparar-se com alguém procurado.

[...]

44. Policiais civis ou militares: sustenta Cleunice A. Valentim Bastos Pitombo ser diligência, durante a fase investigatória, exclusiva da polícia civil, baseando-se no fato de que a esta, conforme preceitua a Constituição Federal, cabe o exercício das funções pertinentes à polícia judiciária (art. 144, § 4.º, CF). Expõe, no entanto, outras opiniões e deixa claro que a Polícia Militar tem sido autorizada a realizar, em caráter excepcional, mandados de busca e/ou apreensão (Da busca e da apreensão no processo penal, p. 177-178). A nós, parece que a função investigatória precípua, de acordo com a Constituição, de fato, cabe à Polícia Civil, embora não descartemos a possibilidade excepcional, no interesse da justiça e da busca da verdade real, de os policiais militares atuarem nesse sentido. Lógica não haveria em cercear a colheita da prova somente porque, em determinado momento, não há agentes da polícia civil disponíveis para a realização da busca, enquanto os militares estão presentes, propiciando a sua efetivação. Não deve, naturalmente, ser a regra, mas trata-se de uma exceção viável e legal. Do mesmo modo que à Polícia Militar cabe o policiamento ostensivo (art. 144, § 5.º, CF), não se desconhece que policiais civis e delegados de polícia também o fazem, quando necessário. Enfim, a separação das polícias é o principal problema enfrentado, mas tal situação, que é, sobretudo, política, não pode resvalar no direito da população de obter efetiva segurança, nem tampouco nas atividades judiciárias de fiel e escorreita colheita da prova. Do mesmo modo, embora seja função do oficial de justiça proceder às buscas determinadas pelo juiz, ao longo da instrução, nada impede que a polícia realize a diligência, especialmente se for em lugar particularmente perigoso, exigindo experiência policial para a consumação do ato. Na jurisprudência: STJ: “Quanto às apreensões feitas na residência do contador, a defesa alegou que a polícia militar não teria competência para isso. O relator, porém, lembrou que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) considera legais as buscas e apreensões efetivadas por policiais militares” (HC 131.836-RJ, 5.ª T., rel. Jorge Mussi, 04.11.2010, m.v.)

Percebe-se que Nucci justifica ainda o cumprimento do mandado de busca e apreensão sob a argumentação de que a própria Polícia Civil, quando necessário, também adentra na realização do policiamento ostensivo, atribuição exclusiva da Polícia Militar, nos termos do art. 144, § 5º, da Constituição Federal de 1988. Vejamos o que Nucci leciona sobre o assunto:

O cumprimento do mandado de busca e apreensão pela Polícia Militar

A doutrina diverge nesse aspecto. Para alguns, a diligência, durante a fase investigatória, é exclusiva da Polícia Civil, baseado no fato de que a esta, conforme preceitua a Constituição Federal, cabe o exercício das funções pertinentes à polícia judiciária (art. 144, § 4.°, CF), muito embora se admita em caráter excepcional a participação da Polícia Militar (cf. CLEUNICE A. VALENTIM BASTOS PITOMBO, Da busca e da apreensão no processo penal, p. 177-178).

Parece-nos que a função investigatória precípua, de acordo com a Constituição, de fato, cabe à Polícia Civil, embora não descartemos a possibilidade excepcional, no interesse da justiça e da busca da verdade real, dos policiais militares atuarem nesse sentido. Lógica não haveria em cercear a colheita da prova somente porque, em determinado momento, não há agentes da Polícia Civil disponíveis para a realização da busca, enquanto os militares estão presentes, propiciando a sua efetivação. Não deve, naturalmente, ser a regra, mas trata-se de uma exceção viável e legal. Do mesmo modo que à Polícia Militar cabe o policiamento ostensivo (art. 144, § 5.°, CF), não se desconhece que policiais civis e delegados de polícia também o fazem, quando necessário.

Enfim, a separação das polícias é o principal ponto enfrentado, mas tal situação, que é sobretudo um problema político, não pode resvalar no direito da população de obter efetiva segurança, nem tampouco nas atividades judiciárias de fiel e escorreita colheita da prova. Do mesmo modo, embora seja função do oficial de justiça proceder às buscas determinadas pelo juiz, ao longo da instrução, nada impede que a polícia realize a diligência, especialmente se for em lugar particularmente perigoso, exigindo experiência policial para a consumação do ato.

Nesse sentido, é sabido que a Constituição Federal em seu art. 114, § 4º, define as funções da Polícia Civil. Todavia, a Carta Magna não atribui exclusividade à Polícia Civil, o que permite o requerimento e o cumprimento de mandado de busca e apreensão pela Polícia Militar, que deve ser compreendido como uma diligência contida na atividade de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública, que não extrapola a sua atribuição constitucional.

A legalidade desse requerimento será fiscalizada pelo Ministério Público, fiscal da atividade policial, nos termos do art. 139, VIII, da Constituição Federal.

Dessa forma, o conceito de autoridade policial deve ser analisado à luz do art. 144 da Carta Magna, que ampliou o rol dos órgãos e instituições de segurança pública previstos na Lei Fundamental.

Outro aspecto é que outras autoridades administrativas, como Receita Federal realizam busca e apreensão no âmbito de suas competências, sem que ocorram questionamentos sobre a legalidade da execução dessas medidas restritivas de direito.

Esse entendimento é defendido por alguns autores, como Ramos e Siqueira. Vejamos:

A Constituição Federal em seu art. 114, § 4º, ao preconizar que “às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares”, define as funções da Polícia Civil. Porém, em nenhum momento estabelece qualquer cláusula de exclusividade, o que impede a feudalização de determinadas atividades quando o assunto é a solicitação de mandados de busca e apreensão por parte da Polícia Militar para a realização de diligências de natureza administrativa, entendidas como sendo aquelas que antecedem a atuação da polícia judiciária e a instauração do inquérito, pois são totalmente desprovidas do caráter investigatório exigido para a natureza informativa do inquérito policial.

Logicamente que o pedido deverá, obrigatoriamente, ser analisado pelo Ministério Público, órgão incumbido da fiscalização externa da atividade policial. Procuram entravar o sistema aqueles que argumentam no sentido de que os integrantes desta ou daquela organização policial não detêm competência e conhecimento para solicitar e cumprir mandados de busca e apreensão.

Contudo, o contra-argumento solidifica-se com a participação do Ministério Público no processo e o conhecimento público e notório de que todos os integrantes dos órgãos policiais elencados no art. 144 da Constituição Federal recebem formação nas áreas do direito que lhes competem, relevando-se que os Oficiais das Polícias Militares, quando participam dos Conselhos de Justiça Militar no processo e julgamento de crimes militares, atuam stricto sensu, como juízes desempenhando a mesma atribuição dos juízes de direito (togados) do juízo militar.

É lógico, em razão da atividade, que os mandados de busca e apreensão necessários para a atividade investigativa são sempre solicitados e cumpridos pela Polícia Civil ou Federal. Mas, legal e juridicamente, nada impede que, nas diligências administrativas que antecedem a investigação criminal, os órgãos encarregados da segurança pública solicitem a expedição de mandados de busca e apreensão. Assim, amplia-se o conceito de autoridade policial e permite-se que toda e qualquer polícia, elencada no art. 144 da CF/88, cujos integrantes são autoridades policiais para esse fim específico, possam legal e licitamente solicitar a expedição de mandados de busca a apreensão junto ao Judiciário, obviamente com a legítima participação do Ministério Público.

[...]

De passagem, há que se mencionar as inúmeras diligências de busca e apreensão realizadas pelas Receitas Federal e Estadual no âmbito de sua competência, bem como os mandados de busca e apreensão solicitados e cumpridos pela Polícia de Meio Ambiente. Nesse contexto, a atuação desta merece relevo. É de pleno conhecimento que essa atividade de policiamento, exercida pelas Polícias Militares dos Estados requerem, no desempenho da sua atividade, mandados de busca e apreensão junto ao Poder Judiciário com o escopo de reprimir o desmate com armazenamento de madeiras, locais de produção ilegal de carvão vegetal, armazenamento de caça abatida, aprisionamento ilegal de pássaros, rinhas de canários e galos e outras tantas irregularidades e crimes previstos na legislação ambiental.

[...]

Conclui-se que, após a vigência da Constituição de 1988, em face da dicotomia estabelecida, a polícia judiciária exerce a sua atividade após a prática do ilícito penal, e, mesmo assim, após a repressão imediata por parte da polícia ostensiva, seja Militar Estadual, Rodoviária ou Ferroviária Federal, diante da infração penal que não pode evitar, “tomando todas as providências elencadas no ordenamento processual para o tipo penal que, pelo menos em tese, tenha ocorrido”. (LAZZARINI, 1992b, p. 286).

[...]

O ordenamento jurídico pátrio, em nenhum momento, concede exclusividade para o cumprimento de mandados de busca e apreensão.

[...]

Há de se concluir que a diligência está compreendida na atividade de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública, um dos vários motivos e objetivos de existência dos órgãos policiais.

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Realmente o legislador constituinte reservou para determinados órgãos policiais algumas atividades específicas, mas em nenhum momento retirou dos órgãos encarregados do exercício da polícia preventiva ou administrativa a competência ou capacidade para requerer ou cumprir mandados de busca e apreensão.

Aliás, o conceito de autoridade policial é controvertido na doutrina. Alguns defendem que a autoridade policial se refere apenas ao Delegado de Polícia.

Entretanto, é cediço que um dos princípios gerais do direito é de que a interpretação restritiva deve ser expressa.

Dessa forma, caso fosse a intenção do legislador em restringir o conceito, teria a lei apresentado o conceito legal de autoridade policial.

Como se optou pela não conceituação, a interpretação deve ser ampla e exemplificativa, com o conceito de autoridade policial devendo ser encarado como gênero, que se divide em autoridade policial civil e militar (FOUREAX).

Denilson Feitoza Pacheco defende que a busca e apreensão não é exclusividade da Polícia Civil, podendo inclusive a Corporação Militar requerer a medida diretamente ao juiz. Vejamos:

“[...] não é instrumento exclusivo da polícia investigativa (‘polícia judiciária’). [...] a Polícia Militar, mesmo na sua função específica de polícia ostensiva e de preservação da ordem pública, pode requerer a expedição de mandado de busca e apreensão, para cumprimento de seu dever de prender quem esteja em flagrante delito (com fundamento no art. 240, § 1º, alínea a, c/c art. 243, § 1º, e art. 301, todos do CPP, e art. 144, § 5º, CR), sem significar uma investigação criminal.”

Assim, é possível o requerimento do mandado de busca e apreensão e sua execução por parte da Polícia Militar por não ser diligência exclusiva da Polícia Civil, conforme defende Enoni Erlacher. Vejamos:

Desta forma, verifica-se que somente as alíneas "e", "f" e "h", do § 1º, art. 240, do CPP, não poderiam a princípio servir de fundamento para embasar o pedido de mandado de busca e apreensão pela polícia militar, uma vez que é típico instrumento de polícia investigativa (“polícia judiciária”) ou do próprio Ministério Público.

Nos demais casos, é perfeitamente possível à solicitação e o cumprimento de mandado de busca e apreensão pela polícia militar, uma vez que não é função exclusiva da autoridade policial civil, podendo ser requerido a qualquer tempo, desde que presente os requisitos que a autorizem, doutrinariamente conhecidos por fumus boni iuris e periculum in mora.

Desta forma, percebe-se que o requerimento de busca e apreensão tem como finalidade não só a obtenção de provas, a fim de evitar o perecimento das mesmas, como também, o combate à criminalidade, não necessitando para tal, a prévia instauração de inquérito ou processo criminal.

O processualista Marcellus Polastri Lima defende que é possível a busca e apreensão para fins de policiamento preventivo. Vejamos:

Não será também cautelar a busca e apreensão para fins de policiamento preventivo, uma vez que, de acordo com Garcez Ramos, (...) não é cautelar por falta de referibilidade à pretensão condenatória de um determinado processo criminal, a busca e apreensão utilizada como medida de policiamento preventivo. Essa hipótese ocorre, por exemplo, quando a autoridade – policial ou judiciária – vale-se da medida para prender criminosos, para apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos, para apreender pessoas vítimas de crimes ou, ainda, para apreender instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados ou contrafeitos, quando qualquer desses objetos ou pessoas não estejam diretamente relacionados com a infração penal que seja objeto da pesquisa da autoridade. Nesta hipótese, segundo Lopes da Costa, tais medidas seriam, meramente, preventivas.

Dessa forma, constata-se que grande parte da doutrina defende a validade e a legalidade do cumprimento do mandado de busca e apreensão por parte da Polícia Militar, entendimento corroborado pela jurisprudência pátria, conforme já relatado.

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Sobre o autor
Robledo Moraes Peres de Almeida

Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Piauí. Foi Oficial da Polícia Militar do Espírito Santo (PMES) por 15 anos, ocupando atualmente o Posto de Capitão PM da Reserva Não Remunerada. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Graduado pela Escola de Formação de Oficiais da PMES. Pós-graduado em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera Uniderp/Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes (LFG). Pós-graduado em Direito Público pela Universidade Anhanguera Uniderp/Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes (LFG). Pós-graduado em Gestão, Educação e Segurança de Trânsito pela Faculdade Cândido Mendes. Membro Titular da Associação Colombiana de Direito Processual Constitucional. Finalista da categoria Obra Técnica do X Prêmio Denatran de Educação no Trânsito, promovido pelo Departamento Nacional de Trânsito (DENATRAN) no ano 2010. Aprovado no Exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Aprovado nos concursos públicos para os cargos de: a) Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Piauí; b) Promotor de Justiça do Ministério Público do Tocantins; c) Defensor Público da Defensoria Pública do Espírito Santo; d) Oficial de Justiça Avaliador Federal do Tribunal Regional Federal da Segunda Região (TRF-2)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Robledo Moraes Peres. A validade do cumprimento do mandado de busca e apreensão por parte da Polícia Militar. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4783, 5 ago. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/51157. Acesso em: 22 dez. 2024.

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