Bem de Família - Aprenda tudo o que precisa saber conforme a lei, a doutrina e a jurisprudência. Código Civil de 2002 e Lei n.º 8.009/1990.

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Por meio deste estudo são abordados os bens de família. Desmitifica-se os seus elementos introdutórios para depois haver o ingresso nos pontos mais aprofundados da matéria à luz da doutrina de referência com os ensinamentos da jurisprudência pacífica.

RESUMO

O presente trabalho científico proporciona conhecimentos sobre um tema de grande relevância social. Trata-se do instituto civil do Bem de Família, existente no ordenamento jurídico brasileiro através de dois diplomas legais: Código Civil de 2002 e a Lei Especial 8.009, de 24 de junho de 1990. O problema analisado traduz-se em três aspectos: quem pode instituir o benefício, quais bens são objetos desta proteção, e quais os entendimentos e controvérsias sobre a matéria. A seara do Direito – e subárea – envolvente do assunto é de fácil entendimento: basta localizar os dispositivos relacionados e dispostos no Novo Código Civil, que se encontram no Livro V – Direito de Família, Título II – Do Direito Patrimonial, Subtítulo IV – Do Bem de Família, o que perfeitamente denuncia o caráter familiar e patrimonialista do instituto. Nesse contexto, o presente estudo se justifica pela necessidade de esclarecimento sobre o tema, um assunto de ordem social e fundamental à cura do próprio Estado. Objetiva-se, em geral, refletir sobre a duplicidade de regimes, acima citados, bem como a abrangência do benefício. Desta busca extraem-se objetivos específicos, que perpassam pela evolução histórica, princípios constitucionais, legislações envolvidas e por fim, alguns entendimentos doutrinários e jurisprudenciais recentes. Assim, será visto o tema sob os três ângulos jurídicos: Lei, Doutrina e Jurisprudência. Leitura indispensável aos colegas estudantes.

Palavras-chave: Bem de Família. Código Civil. Lei especial. Doutrina. Efetividade. Legislação.

ABSTRACT

This study provides scientific knowledge about a great social relevance topic. This is the civil institute of Family property, which exists in the Brazilian legal system through two regulations: The 2002 Civil Code and The Special Law number 8.009, from June 24 of 1990. The analyzed problem is reflected in three aspects: who may benefit the institute, what values are objects of this protection, and what are understandings and controversies about the subject. The law area- and subarea- that involves this issue is easy to understand: it’s only necessary to find the connected and arranged devices in the New Civil Code, found in Book V- Family Law, Title II – Equity Law, Subtitle IV- Family Value, which fully exposes the family and patrimonial institute’s feature. In this context, this study is justified by the need for clarification about the subject, an issue of social order and fundamental to the State healing. The objective is, in general, to reflect about the regime duality, above mentioned, and benefit extent. From this search are extracted specific objectives that underlie the historical development, constitutional principles, laws involved and then, some recent doctrinal and jurisprudential understandings. So the issue will be watched by three angles: Law, Doctrine and Jurisprudence. Essential reading for fellow students.

Keywords: Homestead Act. Doctrine. Effectiveness. Legislation.

INTRODUÇÃO

O presente estudo proporciona uma visão geral e minuciosa sobre o instituto do Bem de Família, através das disposições presentes no Código Civil de 2002 e na Lei especial n. 8.009, de 29 de março de 1990, seus dois diplomas legais reguladores no Brasil. Existem vários entendimentos percucientes sobre a matéria com amplo acervo bibliográfico, isto devido a grande importância social do tema. Afinal, quem pode instituir o bem de família voluntário, ou beneficia-se involuntariamente? Que bens são objeto desta proteção legal e quais os entendimentos doutrinários e jurisprudenciais sobre o assunto? Visando esclarecer a estas perguntas e retestar a legislação pertinente para revisar sua utilização pátria, a presente Monografia consubstancia-se nos autores e estudiosos mais conhecidos no país, que buscam determinar a linha de pensamento para a efetividade do homestead brasileiro, seja no caráter de lei geral (Código Civil), ou mediante a lei do assunto (Lei 8.009/90). A demanda social é muito grande e necessita de esclarecimento sobre as duas modalidades de bem de família, uma que precisa da atuação do casal ou companheiros ou ainda terceiros para instituir, outra, que não precisa fazer absolutamente nada para a família estar protegida.

Todos têm direito à moradia, está na Constituição Federal, mas a forma como o bem de família incide nesta premissa é a fonte da problemática deste estudo. A maneira de interpretar a legislação sobre a matéria, relacionando-a com a supremacia da Carta Magna/1988, e por fim, praticar judicialmente o disposto em teoria é que geram as questões discutidas. Harmonizando-se então, este trabalho possui como objetivo geral refletir sobre a duplicidade de regimes do instituto no direito brasileiro, que são complementares, bem como a abrangência deste benefício. Para que o estudo se encaixe perfeitamente no panorama do problema, os objetivos específicos buscam tratar da proteção constitucional à família, analisar as normas jurídicas na lei substantiva civil geral (CC/02), examinar criticamente os dispositivos da lei especial, e então, levantar as questões controversas e as posições dos Tribunais sobre a matéria.

Quanto à organização do trabalho, sua estrutura está exposta no sumário e encontra-se divida em três capítulos, resumidamente a seguir:

O Capítulo 1 introduz o assunto no contexto histórico internacional e brasileiro. Procura também delimitar o termo bem de família, para que não origine dúvidas quanto ao sentido da palavra. Trata, ainda, da natureza jurídica do instituto.

O segundo Capítulo trata do tema no âmbito constitucional, através dos principais valores agregados ao instituto civil do bem de família.

O Capítulo 3, a priori, expõe traços característicos e certos princípios que envolvem o instituto, induzidos da legislação. Em seguida, lida com a interpretação das normas referentes ao bem de família voluntário (Código Civil de 2002), tratando individualmente de cada artigo. Busca analisar também a legislação especial (Lei nº 8.009/90) a partir da explicação de cada dispositivo. Por fim traz discussões e esclarecimentos de questões discutidas, contraditas, buscando incitar o leitor a escolher um caminho, ou conhecer o mais acatado deles.

Capítulo 1 – Escorço introdutório e a duplicidade de regimes jurídicos que regulam o Bem de Família no Brasil

1.1. Introdução às legislações brasileiras envolventes

Antes mesmo do Código Civil de 1916, em rápido retrospecto, o Regulamento 737, de 25.11.1850, já isentava de penhora alguns bens do devedor executado, no entanto, não abrangia o imóvel que lhe servia de moradia.

Houve, em 1893, a publicação de um Projeto de Código Civil Brasileiro, cuja autoria é de Coelho Rodrigues, onde, no âmbito do Direito de Família, pelos arts. 2.079 a 2.090, tratava do instituto sob a denominação “da constituição do lar de família”.

Com o propósito de acolhimento do instituto pelo direito brasileiro, foram apresentados diversos projetos à Câmara dos Deputados, destacando-se o de Leovigildo Filgueiras (Bahia), o de Luiz Domingues (Maranhão) e o de Francisco de Toledo Malta (São Paulo)[1].

Anos depois, o Instituto da Ordem dos Advogados Brasileiro organizou, na cidade do Rio de Janeiro, meados de 1900, o Congresso Jurídico Americano em comemoração ao 4º Centenário do Descobrimento do Brasil, convocando os juristas a debaterem o tema: O homestead satisfaz melhor que a enfiteuse o instituto de aproveitamento das terras públicas?

Em 1903, o deputado paulista Francisco de Toledo Malta apresentou à Câmara dos Deputados projeto contendo 15 artigos, objetivando introduzir no Direito Brasileiro o benefício homestead. Ainda chegou a ser aprovado nesta Casa, embora depois tenha sido rejeitado no Senado.

Mais tarde, o então Ministro da Justiça, Prof. Esmeraldino Bandeira, tentou introduzir o bem de família por meio do art. 867, inserido no Projeto de Código Processual Civil para o Distrito Federal, mas fora suspenso mediante Decreto 8.435/1910[2].

Foi só com o trâmite do projeto do Código Civil Brasileiro, conhecido como Projeto Beviláquia, que o instituto surgiu e foi aprovado. O Projeto sequer possuía o intuito de introduzir o bem de família no país, mas o antigo Senador pelo Maranhão, Fernando Mendes de Almeida, apresentou emenda que introduziu o instituto, durante votação do projeto do Código no Senado[3]. Houve a publicação em 5.12.1912.

Com todas as batalhas de idéias ao longo dos anos, veio a lume esse importante instituto jurídico mediante aprovação do Código Civil/1916. Surge então, de forma definitiva, através dos arts. 70 a 73, o bem de família na legislação brasileira.

Até pouco tempo, esta categoria de quase nenhum uso e tão rigorosamente disciplinada tinha sua vontade subordinada, exclusivamente, à vontade do instituidor.

Era apenas um direito subjetivo de quem destinava o imóvel residencial para o resguardado da família, compreendido esse direito na acepção mais elementar da faculdade de agir.

Para o Código Civil revogado era ato jurídico em que o casal ou um cônjuge (na falta do outro), mediante ato formal, reservava imóvel urbano ou rústico de seu patrimônio para servir de residência da família. Logo, o imóvel tornava-se impenhorável, imune à apreensão por dívida pessoal, desde que não assumida anteriormente pelo instituidor, ou débito tributário cujo fato gerador não pudesse vincular o próprio imóvel[4].

No primeiro escopo da proteção – por acidente também da sociedade, já que a família sempre foi o microorganismo imediatamente privilegiado – criou-se a impossibilidade de ser levada a casa residencial à execução em conseqüência de débitos do seu chefe, que a instituía na época que podia pagar as dívidas (solvência) e desde que posteriores os débitos ao ato de destinação.

O prédio, além de impenhorável, também era inalienável.

Ocorre que as pessoas não estavam utilizando o benefício, seja pelo procedimento burocrático para instituição, seja por motivo diverso, o que levou nossos legisladores a revisar o caráter voluntário do instituto. No início dos anos 90, então, surgiu a modalidade compulsória do bem de família. Não é preciso o ato formal de instituição, pois já está constituído pela própria lei, imposta pelo Estado, e atinge todo imóvel onde viva um grupo familiar ou residente isolado, tornando-o impenhorável, abrangendo os móveis quitados que o guarneçam. Na casa alugada apenas estão protegidos os bens móveis quitados existentes, bem como as alfaias, pertenças ou valores agregados[5], pois a casa não é própria.

Cumpre ressaltar que o bem de família foi colocado em nosso Código Civil de 1916 na Parte Geral, referente ao Livro das Pessoas. Após o Senador à época Justiniano de Serpa criticar intensamente essa colocação, foi a matéria transferida para o Livro dos Bens, também da Parte Geral.

Álvaro Villaça Azevedo[6] transcreve parte do discurso do Senador, onde na 35ª Reunião da Comissão Especial do Senado, em 7.12.1915, afirmou indignado:

Esta figura jurídica, introduzida por emenda do Senado, no corpo do projeto do Código Civil, está, evidentemente, mal colocada no capítulo das pessoas jurídicas [...] não há, realmente, um terceiro caminho. Ou o instituto entra no direito de família, como o direito de alimentos, como a tutela e todas as instituições garantidoras ou protetoras da família, ou será na forma do direito das coisas. Na parte geral, entre as pessoas jurídicas, será, no meu sentir, um desvio de classificação tão manifesto quanto o que, na gramática, denominasse sujeito um predicado, ou, em história natural, pusesse a borboleta na classe dos pássaros.

Era realmente malfeito incluir os artigos referentes ao bem de família no livro consagrado às pessoas e fez bem a Comissão em corrigir o problema apontado.

No entanto, a reclassificação não havia satisfeito a todos os reclamos. Visto tratar-se de relação jurídica particular e especial, não devem os artigos estarem inclusos na Parte Geral do Código, pois não diz respeito a preceito geral. O ideal seria transpor à Parte Especial, onde o seu posto mais conveniente seria no Direito de Família.

Apenas no atual Código Civil de 2002 o legislador coloca, com melhor técnica, o bem de família no Livro do Direito de Família, referente aos direitos patrimoniais (arts. 1.711 a 1.722).

O novo Código Civil, Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que revogou seu antecessor CC/1916, manteve a natureza imóvel do bem de família, com poucas alterações quanto à inclusão de alguns bens móveis fundamentais à manutenção do prédio.

Na verdade, não há outro lugar no sistema legislativo, senão o Livro de Direito de Família no Título referente a direitos patrimoniais, pois se trata de conjunto normativo regulador das atividades familiares, com cuidados especiais, para que o Estado intervenha sempre e de forma categórica, por sua vontade soberana, no tratamento desta figura jurídica preservadora da própria existência dos indivíduos no seu grupo mais íntimo, que merece a cura do Direito[7].

Desde o atual Código Civil, então, o instituto incrementou-se de valores mobiliários, ganhou novas regras e posiciona-se como direito patrimonial familiar.

1.2. Conceituações etimológicas elementares

O termo Bem de Família, apesar de não ser tradução literal do termo inglês Homestead Exemption Act, traz uma inestimável contribuição para o Direito Brasileiro.

Trata-se do Instituto de Direito Civil responsável pela manutenção do imóvel de família, junto com os bens essenciais que dentro (ou fora) existam, a fim de garantir uma moradia digna a todas as famílias brasileiras que possuam dívidas não pagas.

Para se iniciar o estudo ao nobre instituto, imprescindível é delimitar as palavras e termos que o compõem, para serem sanadas dúvidas quanto às etimologias das palavras.

1.2.1. Coisa e Bem

As duas palavras possuem teor significativo similar. Embora “coisa” e “bem” não tenham sido conceituados pela legislação, a doutrina se fragmenta para esta tentativa, a fim de dispor sobre algum entendimento conclusivo. Os doutrinadores Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho[8] reproduzem o porquê da dificuldade em delinear os dois temas. Para isso invocam Whashinton de Barros Monteiro:

[...] o conceito de coisas corresponde ao de bens, mas nem sempre há perfeita sincronização entre as duas expressões. Às vezes, coisas são o gênero, e bens, a espécie; outras, estes são o gênero e aquelas a espécies; outras, finalmente, são os dois termos usados como sinônimo, havendo então entre eles coincidência de significação.

Os aludidos autores também mencionam Francisco Amaral, relatando:

[...] o conceito de bem é histórico e relativo, variando de acordo com as diversas épocas da cultura humana. ‘Com a evolução da espécie humana e o desenvolvimento da vida espiritual’, pontifica o culto Professor da UFRJ, é expresso na arte, na ciência, na religião, na cultura, enfim, surgiram novas exigências e novas utilidades, passando a noção de bem a ter sentido diverso do que tinha primitivamente’. Talvez por isso a doutrina não haja assentado, de maneira uniforme, a real extensão do conceito de bem, confundindo-o, diversas vezes, com a definição de coisa.

Álvaro Villaça Azevedo[9] analisa a etimologia da expressão bem, dizendo que significa tudo o que é bom, aquilo que é útil à existência e à conservação ou auge de alguma coisa, física ou moralmente; é vantagem, utilidade, propriedade, proveito, domínio, sendo substantivo que descende de bene (bem), advérbio latino provindo do adjetivo bônus, a, um (bom).

Para melhor se esclarecer, nota-se que o Código Civil de 2002, embora não faça distinção entre os termos, consagra a expressão bem jurídico como aquele que abrange coisas e bens imateriais[10].

Destarte as divergências, bem, na prática forense, costuma ser tudo aquilo relevante juridicamente, ou seja, importante às questões jurídicas.

1.2.2. Família

O termo família, embora encontre sua origem no vocábulo latino família, ae (ou família, as – genitivo arcaico), também é entendida como derivação de famelia ou famulus, que se originam, remotamente, da palavra dha, traduzida da língua ariana como pôr, estabelecer, que mais tarde se transformou, na passagem ao osco, em fam.

Assim, a palavra dhaman, em sânscrito, significa casa. Mais tarde houve a conversão do dh em f, nascendo, entre o dialético do Lácio, como é o caso do osco, a expressão faama. Desta surgiu famel (o servo) e famelia (conjunto de filhos, servos e demais pessoas que viviam sob a proteção do mesmo pater).

Da palavra famel criou-se famulus, mediante a criação intermediária de famul, forma primitiva de famulus, donde se derivou, provavelmente, famulia.

A terminação família indica coletividade[11].

Com relação à definição de um conceito, a palavra família, como instituição ou organismo, possui pluralidade de conceituação, pois não é apenas utilizada nos diversos ramos do Direito, como é relevante as mais diversas ciências da humanidade[12].

Para a linguagem civilista, o termo família, ou entidade familiar, é utilizado para designar o grupo de pessoas formado pelo casal, ou pelos companheiros em união estável e seus descendentes. Entende-se também pela família uniparental, aquela formada pela prole com apenas uma linha de ascendência direta (pai/mãe), ou seja, o pai/mãe e seus filhos.

Como ensina JOSÉ AFONSO DA SILVA[13]:

Não é mais só pelo casamento que se constitui a entidade familiar. Entende-se também como tal a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes e, para efeito de proteção do Estado, também, a união estável entre homem e mulher, cumprindo à lei facilitar sua conversão em casamento.

Os cônjuges, companheiros em união estável e o pai/mãe que mora sozinho(a) com os filhos (uniparental) estão aptos a receberem proteção do instituto, como será visto no Capítulo 03.

Inovação intelectual, consequência do crescente pensamento social solidário e digno, é o reconhecimento da família unipessoal, aquela formada por uma pessoa só. Trata-se do cônjuge ou companheiro sobrevivente numa entidade sem descendentes[14], ou qualquer pessoa remanescente de família não mais existente, como um filho órfão.

1.2.3. Bem de Família

Antes mesmo do início da vigência do CC/2002, Carvalho de Mendonça[15] conceituava bem de família como um conjunto de bens específicos que a lei ampara e resguarda em benefício da família, e da manutenção de um lar, estabelecendo a seu respeito impenhorabilidade limitada e inalienabilidade relativa.

Logo, trata-se de um direito que proporciona um abrigo, asilo, destinado à moradia permanente da família, onde a mesma instala domicílio inalienável e impenhorável, observados os arts. 1711-1722 do Novel Código Civil e os arts. 1º-8º da Lei 8.009/1990.

1.3.  Preâmbulo sociológico e histórico do instituto no estrangeiro

Serão tratados, no presente subcapítulo, acerca do bem de família em suas principais fontes, responsáveis pela origem da idéia e normatização do direito à moradia e pressupostos de uma estrutura familiar sólida e eficaz.

1.3.1. Disposições embrionárias no Direito Romano

Uma das formas de agrupamento social é a família. Desde quando se têm notícias de convivência familiar sabe-se a respeito da proteção e defesa do núcleo familiar mediante diversas formas:

É o Homem ser eminentemente social: tem ele a absoluta necessidade de agrupar-se, de unir-se a seus semelhantes, não só para atender aos fins que busca e deseja, mas também para satisfazer suas necessidades materiais e de cultura[16].

Não existiu no Direito Romano o bem de família propriamente dito, no sentido técnico do instituto, como ora se estuda. Entretanto, no período da República havia proibição de alienar o patrimônio da família, pois todo ele tinha caráter inalienável. Isso ocorria porque se dava grande valor aos bens deixados pelos antepassados, sendo, inclusive, considerados sagrados. Considerava-se desonra a venda de bens herdados dos maiores (antepassados)[17].

No século II, agora no Império Romano, com as sensíveis alterações ocorridas na sociedade e na família em Roma, surgiu a necessidade de defesa do patrimônio familiar. Foram editadas diversas cláusulas de inalienabilidade, criadas primeiramente em testamentos.

Por exemplo, o instituto da ad rogatio permitia a agregação de uma família ao pater famílias de outra. Comparava-se a uma incorporação; juntos eram agregados os seus dependentes e todo o patrimônio.

Álvaro Villaça Azevedo explica sobre a agregação por ad rogatio[18]:

[...] em Roma ela consistia na adoção de um cidadão livre, em virtude da qual um pater famílias, como todos os seus dependentes (parentes e escravos) e todos os bens pertencentes ao conjunto familiar, passava à autoridade de outro chefe de família, da qual ficava fazendo parte, o que convertia, por isso, a posição jurídica do ad-rogado, que, de sui iuris, passava a alieni iuris (de independente a dependente).

Percebe-se então que esta forma de agregação também possuía como finalidade preservação do culto e das coisas sagradas da família, o que demonstra a extrema preocupação romana na preservação do patrimônio familiar.

Havia no direito romano um instituto muito humano, pelo qual eram deixados a certos devedores, por causa de seu status ou parentesco, cujo passivo cobria o ativo, o mínimo de patrimônio necessário a sua subsistência, sob a condição de pagar o remanescente quando dispunha do valor.

Clóvis Beviláquia, mencionado por Álvaro Villaça[19], esclarece que não eram quaisquer devedores que se achavam em condições de merecer esse favor, mas apenas os cônjuges (não estando divorciado por sua culpa), os irmãos (se não houvessem incorrido em falta capaz de desmerecer o benefício), os consórcios (nas obrigações geradas pelo contrato de sociedade), o doador (se a doação o reduzisse a indigência) e o devedor de boa-fé (se fizesse cessão de bens, porém terceiros adquirissem os bens devidos na cessão, e por isso, fosse perseguido pelos credores cessionários).

Houve, não menos, o surgimento da figura jurídica chamada fideicomisso, que inicialmente tinha apenas valor moral entre os romanos. Ficava o fideicomissário à inteira vontade do fiduciário.

Clóvis Beviláquia[20] retratou o funcionamento do instituto e sua importância na proteção dos bens familiares.

De acordo com o autor:

Os fideicomissos aplicaram-se à perpetuação dos bens em família, lançando os alicerces da aristocracia do antigo regime; mas Justiniano, reconhecendo os inconvenientes da imobilização dos bens, assim resultante dos fideicomissos familiares, reagiu contra essa tendência, limitando as substituições fideicomissárias ao quarto grau [...].

Com fundamento em vários textos romanos, Eduard Cuq[21] explica sobre a existência e aplicação do fideicomisso familiar:

Como os legados, os fideicomissos podem ser feitos em proveito de muitas pessoas, conjunta ou sucessivamente, sendo certo que uma de suas aplicações mais originais desse último caso é o fideicomisso de família. Este faz-se em benefício dos membros da família, que o testador designou (agnados ou cognados), ou de libertos. Por sua morte o fideicomisso passa a seus filhos, se morrerem sem descendência, chamam-se as pessoas que levam o nome do defunto à época da morte. O objeto do fideicomisso de família não pode ser alienado em proveito de um estranho, nem por atos entre vivos, nem por causa mortis. Em caso de infração dessa regra, qualquer membro da família pode reclamar, concedendo-se preferência ao que for objeto à família. Os membros da família, por outro lado, podem enunciar a seu direito, participando da venda ou aprovando os que tomaram essa iniciativa.

O Direito Romano contribuiu, sem dúvida, para o aperfeiçoamento da figura do bem de família atual, através dos embrionários surgimentos do instituto naquela época, como a proteção do devedor insolvente e o fideicomisso em família, que visavam, ambos, proteger o núcleo familiar e seus antepassados da perdição de bens perante terceiros.

1.3.2. O Homestead Exemption Act no Direito Americano

O antecedente histórico mais significativo, que serviu de base para a elaboração das normas relativas ao bem de família no Brasil, surgiu com tratamento jurídico específico nos Estados Unidos da América, mais acertadamente na República do Texas, com a denominação homestead, em uma lei texana - anterior à própria incorporação dos EUA (1845) - datada de 25 de janeiro de 1839[22].

O termo, em alusão, significa local do lar (home = lar; stead = local), e nasceu para proteger a pequena propriedade. O jurista americano Rufus Waples conceitua-o como a residência de família, possuída, ocupada, consagrada, limitada, impenhorável e, por diversas formas, inalienável, conforme o estatuído na lei[23].

Deixados de ser colônia da Inglaterra, os Estados Unidos eram um território pobre, uma vasta área esperando a civilização. O trabalho árduo de seu povo logo trouxe vertiginoso desenvolvimento às terras fértil do solo americano. Bancos e casas de crédito da Europa se instalaram na região e prestaram serviços inestimáveis aos agricultores, comerciantes e industriários, trazendo desenvolvimento cada vez maior a antiga colônia.

Explica Leonis Lopes[24]que após sua independência, os Estados unidos favoreceram a imigração estrangeira, facilitando as suas fertilíssimas terras para exploração agrícola. A agricultura desenvolveu-se prodigiosamente e o comércio tomou grande incremento.

No entanto, tão grande desenvolvimento precisa de freios, para que não se instale uma crise econômica no país. Foi o que, infelizmente, passou a ocorrer.

Por volta de 1830, mediante desmesurados pedidos de empréstimos de grandes capitais e com o descontrole de emissão de dinheiro pelas instituições financeiras, o povo americano ultrapassou os limites da realidade e adentrou numa crise econômica sem precedentes, entre os anos de 1837-1839. Paulo Bureau[25] figura esse panorama sombrio:

[...] os papéis bancários deixaram de circular ao par e perderam de 10 a 20, e mesmo 80% de seu valor, conforme a solvabilidade do estabelecimento emissor, tendo o câmbio chegado a 22% sobre o da França e da Inglaterra. Os metais desapareceram de circulação e os preços de todas as mercadorias, sobretudo do algodão, aviltaram-se. Para se fazer uma idéia da extensão do desastre: 959 bancos fecharam as portas, somente no ano de 1839, e, durante a crise, entre os anos de 1837 e 1839, ocorreram 33 mil falências e uma perda de 440 milhões de dólares, ou seja, perto de dois bilhões e 300 milhões de francos, à época.

Neste amargo momento os credores realizavam penhoras maciças nos bens dos devedores, expropriando cada patrimônio composto por terra, animais e instrumentos agrícolas.

Estudos comprovam que a população do Texas, em 1836, não ultrapassava 70 mil habitantes e, em 1840, ela foi a 250 mil, provavelmente com o incentivo da Lei do Homestead, promulgada em 26.1.1939. que ocasionou o rápido crescimento populacional na antiga república. Assim dizia o teor da lei[26]:

De e após a passagem desta lei, será reservado a todo cidadão ou chefe de uma família, nesta República, livre e independente do poder de um mandado de fieri facias ou outra execução, emitido de qualquer Corte de jurisdição competente, 50 acres de terra, ou um terreno na cidade, incluindo o bem de família dele ou dela, e melhorias que não excedam a 500 dólares, em valor, todo mobiliário e utensílios domésticos, provendo para que não excedam o valor de 200 dólares, todos os instrumentos (utensílios, ferramentas) de lavoura (providenciando para que não excedam a 50 dólares), todas as ferramentas, aparatos e livros pertencentes ao comércio ou profissão de qualquer cidadão, cinco vacas de leite, uma junta de bois para o trabalho ou um cavalo, 20 porcos e provisões para um ano [...].

A Lei, cujo nome original é Homestead Exemption Act, estendeu a impenhorabilidade dos bens domésticos móveis também para certos imóveis. Nesta última característica, é que reside o objeto central de sua proteção.

Esse diploma legislativo teve a finalidade de fixar o homem a terra, objetivando o seu desenvolvimento e, portanto, o desenvolvimento de uma civilização com o mínimo necessário a vida decente e humana[27].

A idéia gerada pela referida lei, deu surgimento a outras normas, principalmente após a unificação dos EUA em 1845, quando foram editadas, no citado país, outras normas tratantes da finalidade em tela, como a lei federal de 20.5.1862 (Homestead Act), que dispunha de artigos que visavam, protegiam e incentivavam a colonização e povoamento do território americano.

A visão de tamanha importância trazida pela supracitada lei, proveniente da República texana em 1939, ensejou em tantos outros países edições de legislações similares, com o objetivo de tutelar os bens essenciais a vida de qualquer pessoa, entendidos estes conforme a situação histórica, sociológica e econômica de cada nação à época do surgimento das respectivas leis.

Segue a data de surgimento do bem de família em outros países: no Canadá, inicialmente, em 1867; na Inglaterra, em 1736; na Alemanha, em 1874; na Áustria, em 1811 (anteriormente ao EUA); na Suíça, em 1882; na França, em 1909; na Itália, em 1942; na Espanha, em 1911 (entretanto, há resquícios, em 1250, na Lei 10ª editada durante o reinado de Afonso VIII, de previsão de inalienabilidade de alguns imóveis); em Portugal, no ano de 1920; no México, em 1928; na Venezuela, em 1904; na Argentina, em 1954.

1.4. Natureza Jurídica do Bem de Família

Os nossos doutrinadores, na resposta a esta indagação, assumem posições diversas. Alguns se abstêm de qualquer pronunciamento, como senão houvesse a questão. Outros debatem o tema e, entre estes, as opiniões divergem.

“Quanto à natureza jurídica, o bem de família é um modo especial, um caso singular de impenhorabilidade”[28], apontando em várias direções.

A instituição do Bem de Família, segundo Carlos Roberto Gonçalves, invocando Caio Mário da Silva Pereira[29], é uma forma de afetação de bens a um destino especial que é ser residência da família e, enquanto for, é impenhorável por dívidas posteriores a sua constituição, salvo as provenientes de impostos devidos pelo próprio prédio.

Afetação significa o estabelecimento de uma maneira de utilizar ou de dar determinada destinação a um imóvel ou móvel.

E o conceito em análise ajusta-se a esta moldura, tendo como primeiro aspecto o direito ou poder à não-excussão do imóvel onde reside a família[30].

Além de ser beneficiado com a afetação, pois destina o imóvel ao uso da família, e por isso, não poderá sofrer penhora (poder à não excussão), ao mesmo tempo é clara restrição ao direito de propriedade (segunda característica desta afetação especial).

O instituidor não poderá dispor do domínio do bem o oferecendo em contratos de empréstimos. Poderá aliená-lo, hipotecá-lo, ou mesmo prestar fiança em contrato de locação, mas não lhe será possível erigi-lo em outros atos negociais.

Em terceira característica, o bem de família é exceção ao princípio obrigacional que o patrimônio do devedor responde, sempre, por suas dívidas perante os credores, traduzido pelo art. 391 do Código Civil, que explicita o disposto (pelo inadimplemento das obrigações respondem todos os bens do devedor). Logo, o homestead brasileiro é ressalva à excutibilidade de bens[31].

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Cristiano Chaves de Farias[32] explica que tal entendimento domina entre os pensadores do tema e visa assegurar a dignidade humana dos integrantes da residência familiar.

Interessante se faz transcrever os dizeres de Silvio de Salvo Venosa[33]:

No tocante à natureza jurídica, entendem alguns que há transmissão da propriedade na instituição do bem, em que o adquirente é a família, como personalidade coletiva, sendo transmitente o instituidor, como chefe de família. Como a família não tem personalidade jurídica, não pode ser aceita essa posição.

Marques dos Reis[34] é um dos que enxergam no nosso homestead uma transmissão de domínio, em que o instituidor é o alienante e a família, como ente coletivo, o adquirente.

Serpa Lopes[35] entende que o bem de família é um condomínio sui generis, onde nenhum dos coautores possui cota individual. Ocorre a transformação do domínio pessoal do instituído em um singular condomínio, mas sem qualquer dos cotitulares possuir quota pro indiviso.

Caio Mário[36], discordando destes pensamentos e adotando a corrente majoritária que declara ser a natureza jurídica de afetação especial, esclarece não se verificar uma transmissão (salvo constituição por terceiro) porque a coisa não sai da propriedade do instituidor, e não ocorre criação de um condomínio, pela razão de nenhum dos membros do grupo familiar ter uma quota ideal do imóvel.

Capítulo 2 – Da hodierna proteção constitucional à família

Por se tratar de instituto civilista, os preceitos constitucionais o vinculam como a qualquer outra espécie jurídica, visto possuir o estado de norma infraconstitucional e, por isso, dever obediência aos princípios e normas estabelecidas pela Constituição.

Analisar-se-á, a partir de agora, as principais fronteiras que ligam a Constituição Federal de 1988 com o bem de família.

2.1. Os princípios percucientes aos artigos 226 e 227 da CF/88

A Carta Magna de nossos tempos contempla a família especificadamente em dois artigos, 226 e 227, estabelecendo parâmetros através de princípios. Um dos princípios trazidos pelo art. 226 da CF/88, é o contido no §5º: A igualdade entre os cônjuges. Significa que está extinto no Direito Brasileiro a figura do chefe de família, pois, tanto o homem quanto a mulher casada recebem os mesmos direitos e deveres na qualidade de cônjuge. O Código Civil de 2002 e a lei específica que tratam o bem de família estão em conformidade com este preceito supralegal, visto que qualquer um deles tem a força de manter o benefício na forma voluntária, através das medidas processuais cabíveis.

Contribui para este raciocínio Mariana Ribeiro Santiago[37]:

E como a sociedade sustenta o próprio Estado, este tem o dever de conferir proteção especial à família, dever esse que está consagrado na própria Constituição federal de 1988, art. 226, caput. No âmbito dessa proteção especial é que são editadas as normas de proteção à família, entre elas, as que se referem especificadamente ao bem de família.

O casamento religioso, desde 1988, tem efeitos civis se cumprido alguns requisitos legais (art. 226, §2 da CF). Está lei é, na verdade, o Código Civil de 2002 e facilita a conversão em casamento. Percebe-se que constituir família está mais condizente com a situação social brasileira.

Outro princípio que instiga a importância do instituto civil em estudo é o do reconhecimento da união estável como entidade familiar (art. 226, §3 da CF). Com isto, os companheiros que vivem sob união estável foram elevados à condição de família e, portanto, capazes de instituir ou receber a isenção de penhora, inerente ao imóvel residencial, para si e seus filhos.

Nos dizeres de José Afonso da Silva[38]:

Não é mais só pelo casamento que se constitui a entidade familiar. Entende-se também como tal a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes e, para efeito de proteção do Estado, também, a união estável entre homem e mulher, cumprindo a lei facilitar sua conversão em casamento [...].

O ilustre autor também mencionou família uniparental, conceituada por nós no Capítulo I, e tratada no §4º do art. 226 da CF/88. É aquela formada por um dos pais e seus descendentes, logo, possui apenas uma linha de ascendência.

Tratam de forma esclarecedora Luiz David de Araújo e Vidal Serrano Nunes[39]:

[...] portanto, ainda que inexista, por qualquer motivo, uma formalização da entidade familiar (marido e mulher), o texto constitucional preserva a situação do grupo, deferindo ‘status’ de entidade familiar ao grupo familiar, independentemente da existência do casal. Basta, portanto, um dos seus descendentes para que se admita a existência de uma entidade familiar e seja-lhe concedida proteção especial [...].

Dando continuidade, o art. 226, §7º esclarece que a família está protegida pelos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável. Entretanto a CF restringe tais preceitos ao planejamento familiar, que é livre decisão do casal, devendo ocorrer interpretação extensiva para abarcar outros casos que não do planejamento.

O princípio da paternidade responsável implica, como a terminologia ensina, que os pais são responsáveis pelos seus filhos menores, e eventualmente, pelos maiores também. Para melhor entendimento remetemo-nos ao art. 229 da CF/88, ao explicitar que os pais devem assistir, criar e educar os filhos enquanto menores. Nitidamente, é aconselhável uma moradia digna para o cumprimento de tamanhas responsabilidades, momento em que a matéria é remetida ao instituto do bem de família.

Por fim, o caput do art. 227, recentemente modificado pela EC nº 65, de 2010, menciona ser dever do Estado, da sociedade e da família assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem a convivência familiar.

José Afonso da Silva, em sua obra mais conhecida[40], reforça que:

A família é uma comunidade natural composta, em regra, de pais e filhos, aos quais a Constituição, agora, imputa direitos e deveres recíprocos, nos termos do art. 229, pelo qual os pais tem o dever de assistir e educar os filhos menores, havidos ou não da relação do casamento (art. 227, §6º), ao passo que os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência e enfermidade.

Quanto ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, este possui carga mais intensa de principiologia se comparado aos demais de sua classe. Primeiro, porque a doutrina o considera como o maior dentre todos, devido a sua abrangência e importância. Segundo, por ter sido declarado expressamente como fundamento da República Federativa do Brasil, pelo art. 1º, III da Constituição Federal. Estudaremos ele, a seguir, em comparação com o instituto brasileiro do homestead.

2.2. Do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

Não só provido dos conhecidos atributos inerentes a todo princípio, que visam nortear a sistemática jurídico-constitucional, o PDPH é também, como dito anteriormente, um dos fundamentos da República do Brasil. Nesta condição, este se torna o princípio-chave e infere que toda norma constitucional e de hierarquia inferior deverá obedecê-lo sob qualquer prima.

Logo, a proteção ao núcleo familiar deverá está atrelada, necessariamente, à tutela da pessoa humana, por todos os fins e direções imagináveis, através dos (democráticos) princípios gerais da Magna Carta[41].

Como descreve Ricardo Arcoverde Credie[42]:

Muito além da simples compreensão do que exprime o texto legal, para mais do que a mera interpretação literal, tanto as regras do Código Civil sobre o bem de família quanto as da Lei n. 8.009/90 hão de ser interpretadas na consonância do seu escopo, ou seja, de que sua finalidade, assegurada constitucionalmente, que é dar a cada família, entidade familiar ou residente único, o próprio teto e, como consequência, sua existência digna.

Significa que a dignidade da pessoa humana gera a necessidade de respeito às liberdades e direitos, de modo a permitir o resguardo e a promoção dos bens indispensáveis ao desenvolvimento da personalidade humana[43].

Simples, destarte, é afirmar a evolução da ideia família-instituição para família-instrumento de desenvolvimento da pessoa humana. Na primeira existia proteção ao grupo familiar considerado como um todo, importando, às vezes, violação dos interesses do indivíduo considerado individualmente. Com o advento e disseminação da importância do desenvolvimento da pessoa humana, a família ganhou mais benesses, ficando protegida não só a comunidade familiar em geral, mas cada um de seus membros, mediante a isonomia substancial e solidariedade entre eles (arts. 1º e 3º da CF/88). O autor assim esclarece[44]:

A milenar proteção da família como instituição, unidade de produção e reprodução dos valores culturais, éticos, religiosos e econômicos, dá lugar à tutela essencialmente funcionalizada à dignidade de seus membros, em particular no que concerne ao desenvolvimento da personalidade dos filhos.

O ser humano nasce inserto no seio familiar – estrutura básica social – de onde se inicia a moldagem de suas potencialidades com o propósito de convivência em sociedade e da busca de sua realização pessoal.

A residência familiar não é apenas o lugar onde ocorrem atividades de cunho natural e biológico. É nesse terreno fecundo que o ser humano realiza escolhas culturais e atividades profissionais e afetivas, além da vivência dos problemas, fracassos e sucessos[45].

Por isso, a casa servente de moradia à família sem dúvida integra esse conjunto de bens indispensáveis a vida digna, por servir de teto ao que é considerado, unissonamente, a

base de qualquer Estado. Ou seja, a família é a célula mínima que compõe uma Nação.

Atualmente, a dignidade da pessoa humana atua no sentido de assegurar o pleno desenvolvimento de cada pessoa que integra a entidade familiar.

Se observarmos as pessoas sem lugar para morar, tais quais os sem-tetos e moradores de rua, percebe-se maculação à dignidade ao mínimo existencial. A finalidade das normas referentes ao bem de família é proporcionar esta moradia digna, inerente a todo ser humano.

Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald[46] explicam que a matéria envolve a teoria do patrimônio mínimo da pessoa humana – direito ao mínimo existencial:

Através da teoria do reconhecimento do direito a um patrimônio mínimo, instituídos antes vocacionados, exclusivamente, à garantia do crédito são renovados, rejuvenescidos, e utilizados na proteção da pessoa humana, como um aspecto essencial para o reconhecimento de sua dignidade.

Relacionando a garantia do mínimo patrimonial à dignidade da pessoa humana, percebe-se o objetivo almejado pela Constituição da República, no art. 3º, III, concernente à erradicação da pobreza, da marginalização e a redução das desigualdades sociais. Funciona o patrimônio como um verdadeiro instrumento de cidadania. Com a tutela de parte essencial de bens, considerados básicos para atender às necessidades elementares da pessoa humana, está se contribuindo para se alcançar o mínimo de existência com dignidade.

Paulo Ramon da Silva Saolla[47], ao invocar Paulo Lobo, adverte que a teoria do mínimo existencial busca garantir a independência de todos os cidadãos, porque lhes concede os meios indispensáveis a uma vida digna. Para o alcance deste mínimo essencial, vital ao ser humano, é necessário “separar” uma parcela de bens (patrimônio) e proteger das adversidades da sociedade capitalista. Inicia-se, então, o estudo do patrimônio mínimo.

O aludido autor[48] informa que a perspectiva de um patrimônio mínimo compreende-se como baluarte da dignidade humana. É o espaço das coisas que, embora possam se prestar ao uso, jamais poderão ser alienadas, porque fundamentais aos imperativos de uma vida digna da pessoa no seio social.

Conceituando-se patrimônio mínimo, entende-se este como a criação que visa tutelar um espectro essencial de substrato material – conjunto de bens – capaz de dar condições para uma vida humana digna[49].

Trazendo para este estudo, significa que o instituto do bem de família visa proteger o imóvel residencial familiar, e alguns móveis referentes, mediante impenhorabilidade e, às vezes, inalienabilidade, pois integram esta parcela de bens necessários à dignidade do homem, que entende-se necessitar de uma estrutura material mínima para o desenvolvimento individual e convivência familiar.

A importância da proteção do bem que serve de abrigo, de lar à pessoa humana, é incontroversa. Sob o prisma psicológico e cultural é legítimo e natural o anseio das pessoas em obter a casa própria, visto que desperta a segurança psicológica da certeza do abrigo, além de refletir maior proteção patrimonial.

Poderá surgir, da interpretação das normas, contradição entre o Princípio da Dignidade Humana e a aplicação do bem de família, quando se busca proteger este desmerecendo aquele.

Ocorre, por exemplo, no caso em que o magistrado julga improcedente a manutenção do bem de família, porque na residência mora apenas a avó com seu neto. Se o juiz interpretar não haver uma entidade familiar nessa situação, poderá declarar penhorável o imóvel, motivando que as legislações pertinentes apenas referem-se às famílias ou entidades familiares.

Os referidos autores supracitados[50] afirmam que desnivelar a proteção da pessoa humana, sob o argumento de proteger a instituição familiar, é cometer gravíssima subversão hermenêutica, violando frontalmente o comando constitucional.

Pedro Lenza[51] relembra como importante consequência da dimensão objetiva dos direitos fundamentais, a decorrência da “eficácia irradiante” (de Daniel Sarmento), seja para o legislativo ao elaborar a lei, como para a administração pública ao governar, ou para o judiciário ao resolver eventuais conflitos. Os direitos fundamentais devem ser observados por todos os operadores da lei, nos variados prismas de atuação, por isso a nomeclatura para tal eficácia.

A proteção ao núcleo familiar tem como ponto de partida e de chegada a tutela da própria pessoa humana, sendo descabida (e inconstitucional) toda e qualquer forma de violação da Dignidade Humana, sob o pretexto de resguardo do bem de família.

2.3. Do Princípio da Isonomia

O sabido art. 5º da Constituição Federal/1988 dispõe que todos são iguais perante a Lei, sem distinção de qualquer natureza.

Como qualquer outra legislação infraconstitucional, o instituto do bem de família precisa estar em harmonia com os dizeres da Carta Magna. Isto ocorre devido à pirâmide de hierarquia das normas: o que é inferior respeita o superior, embora tenham ambos a mesma importância e cada qual tenha sua abrangência na aplicabilidade.

O Princípio da Isonomia ou da Igualdade, a priori, impõe tratamento jurídico idêntico a todos que se encontrem em situação idêntica ou similar[52]. É o direito que todos têm de serem tratados igualmente na medida em que se igualem e desigualmente na medida em que se diferenciem, seja perante a ordem jurídica (igualdade formal), seja perante a oportunidade de alcance aos bens da vida (igualdade material), pois todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos[53].

Como nota-se, a Isonomia possui cunho formal e material. O primeiro dirige-se ao legislador, que edita as normas mediante o processo legislativo previsto constitucionalmente. Também é voltado aos aplicadores da lei, que devem interpretar com o fim de melhor expressar a igualdade.

Esta formalidade isonômica está presente no caput do art. 5º, CF/88, e pugna pela igualdade de todos perante a lei, ou seja, a legislação brasileira não poderá diferenciar qualquer pessoa de outra, se ambas estão, perante a lei, na mesma situação.

Embora a teoria expresse o dever-ser do direito, esta isonomia não pode impedir que ocorram as desigualdades de fato, provenientes da diferença das aptidões e oportunidades que o meio social e econômico permite a cada um. É neste ponto, que se dá início ao estudo da isonomia material.

O Princípio da Isonomia efetivado, ou seja, o que de fato ocorre, o que existe na prática, é que denota seu aspecto material, Esta igualdade material, que busca proporcionar tratamento uniforme a todos os homens perante a vida com dignidade é quase utópico, visto que nenhum Estado logrou êxito em alcançá-la. É disponibilizar o máximo de oportunidades, vantagens, opções e tratamento as pessoas em mesma situação de vida.

Logo, para compatibilizar a isonomia formal à material, poder-se-ia entender que o magistrado, diante de um caso desta natureza, quando julgasse não haver razoabilidade para a discriminação, deveria estender o tratamento mais benéfico àquele caso injustamente não normativamente alcançado[54].

Todavia, nossa jurisprudência capitaneada pelo STF não admite tal atuação por parte do Poder Judiciário, pois entende que ao admitir-se este poder, estar-se-ia convertendo o magistrado em verdadeiro legislador positivo, já que ele estaria, efetivamente, criando direito novo, instituindo nova regra jurídica, em ilegítima usurpação das atribuições constitucionais do Poder Legislativo[55].

Os Direitos Sociais, inclusos nos Títulos II e VIII da Constituição Federal/1988, tais qual o direito à moradia, são fundamentos do Princípio da Igualdade em conjunto com o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Todos têm direito à uma moradia digna, devendo a lei proporcionar meios.

Ricardo Cunha Chimenti e sua equipe de colaboradores[56] dissertaram que:

A igualdade, fundamento dos direitos sociais, impulsionou a noção de universalidade dos direitos fundamentais. A condição de ser humano passou a conferir direitos. Ao indivíduo não bastava ter garantida apenas a liberdade individual. A dignidade do homem dentro da comunidade precisava ser preservada, o que só seria possível com a garantia de direitos também de natureza econômica e cultural.

Baseado nesse pensamento, o bem de família foi trazido do direito estrangeiro para o Brasil a fim de se preservar aqui o imóvel residencial das famílias insolventes, tendo em vista o caráter fundamental do direito à moradia.

Os direitos sociais previstos na constituição são normas de ordem pública, portanto, com caráter de imperatividade e inviolabilidade que independem das vontades[57]. Pertencem indistintamente a todos[58]. Ninguém, do povo brasileiro, pode submetê-los à renúncia.

Capítulo 3 – O Bem de Família na modalidade voluntária, involuntária e os pertinentes entendimentos doutrinários e jurisprudenciais acerca da matéria.

3.1. Caracteres e outros princípios essenciais ao entendimento do Bem de Família

Para o entendimento das normas jurídicas relativas ao instituto, é válido primeiro se esclarecer sobre alguns pontos delineadores, tais quais características e outros princípios, informados pela doutrina e jurisprudência.

O bem de família é caracterizado pela unicidade ou indivisibilidade, tendo em vista que a proteção (impenhorabilidade, em regra) é atribuída ao imóvel como um todo. Apenas ocorre divisão preditícia, para tornar parte do mesmo penhorável, quando lhe for cômoda.

Ricardo Arcoverde Credie[59] esclarece ser reconhecida, na maioria dos casos, a indivisibilidade do imóvel residencial, pois geralmente o mesmo não comporta desmembramento sem ocorrer sua desfiguração (leia-se, perda de sua essência).

O Código Civil, no art. 87, estabelece que os bens divisíveis “são os que podem fracionar sem alteração na sua substância, diminuição considerável do valor, ou prejuízo do uso a que se destinam. Assim, atribui-se ao bem de família, como regra, a unicidade ou indivisibilidade do imóvel residencial familiar, devido à alteração na essência do bem, caso sobrevenha divisão (denominada incômoda).

O supracitado autor[60], no entanto, lembra que existem exceções. Apenas os imóveis urbanos com grande extensão de terreno podem sofrer desmembramentos da parte da área não construída. De mesmo modo, o imóvel rural poderá ter a residência e o espaço adjacente desta separados da área destinada ao plantio e industrialização.

Visto tais características, cabe-se tratar do princípio da vedação de fraude contra credores. Este será percebido inúmeras vezes no decurso de aprendizagem e aplicação do instituto, haja vista resguardar direitos de intenso cunho patrimonial. Nas claras palavras de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho[61], a fraude contra credores, também considerada vício social, consiste no ato de alienação ou oneração de bens, assim como de remissão de dívida, praticado pelo devedor insolvente, ou à beira da insolvência, com o propósito de prejudicar credor preexistente, em virtude da diminuição sofrida em seu patrimônio.

De conceituação mais simples e não menos importante, segundo o Prof. Tavares Paes, citado pelos autores supracitados[62], consiste a fraude em ato realizado com o fim de prejudicar direitos ou interesses.

Surgem então hipóteses alarmantes, como a prevista no art. 4º da lei n.º 8.009/90, que expressamente visa proteger o credor de eventual fraude. Devedor insolvente, beneficiário da lei, não poderá adquirir imóvel mais valioso desfazendo-se ou não da antiga casa para ter o benefício no novo imóvel. Se não possui condições econômicas de pagar pelo novo bem, implicará em manobra maliciosa contra o credor, tendo em vista a impenhorabilidade da nova residência que restaria protegida contra apreensão judicial. O artigo, assim, fornece soluções que vedam a fraude, permitindo ao juiz cancelar a compra/venda do novo imóvel, ou transferir a impenhorabilidade ao prédio anterior, reconhecendo a penhorabilidade da nova residência mais expensiva.

Serão vistos no decorrer do trabalho outras circunstâncias que podem gerar fraude contra credores e, por isso, repelidas pelo instituto, seja na forma voluntária ou legal.

Nota-se no bem de família, também, efeitos do princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, de cunho administrativo, ao se despojar, por exemplo, quanto à exceção prevista no art. 3º, IV, da Lei 8.009/90 e no art. 1.715, CC/02: o recolhimento de valores tributários relativos ao prédio sobrepõe-se à finalidade da lei de manter o imóvel da família impenhorável, pois o primeiro é voltado à consecução do interesse público.                                                                                                                               

Visto essas considerações, passa-se ao estudo positivado do tema.

3.2. Análise das normas do Código Civil de 2002 reguladoras do Instituto

Finalmente tratar-se-á sobre as regras do instituto: suas legislações, seus artigos, doutrina e jurisprudência. A começar pelo novo Código Civil, vigente desde janeiro de 2003, que abarca sobre o instituto nos arts. 1711-1722. É o chamando bem de família voluntário. Será analisado em particular cada artigo a seguir.

Segundo o art. 1.711 e parágrafo único, a instituição de família cabe aos cônjuges, à entidade familiar ou terceiros. O artigo está em conformidade com o art. 226 da CF/88, pois atualmente o homem e a mulher estão em pé de igualdade em direitos e deveres e confere à união estável e a família uniparental o status de entidade familiar, equiparada à família tradicional[63].

A instituição deverá constar de instrumento público, leia-se escritura pública, ou testamento. Para a instituição por escritura, nos basearemos na Lei nº 6.015/73 (LRP). Um dos cônjuges, que será o instituidor, declarará que determinado prédio servirá de moradia a sua família, e portanto, ficará isento de execução por dívida. De posse da escritura pública, o instituidor apresentá-la-á ao oficial do Cartório de Imóveis, para que mande publicá-la na imprensa local, e à falta, na Capital do Estado ou Território (art. 206).

A publicação feita em forma de edital, avisará que, se alguém se julgar prejudicado, poderá reclamar por escrito e perante o oficial, no prazo de 30 (trinta) dias, contados da publicação[64].

Se for apresentada reclamação o oficial fornecerá cópia autenticada ao instituidor e lhe restituirá a escritura, com a declaração de haver sido suspenso o registro, cancelando a prenotação[65].

O ilustre autor Whashington de Barros Monteiro[66] esclarece minuciosamente:

O instituidor poderá requerer ao juiz que ordene o registro, sem embargo da reclamação (art. 264, §1º, da lei n. 6.015/73). Ordenado o registro, ressalvará ao reclamante o direito de recorrer à ação competente para anular a instituição ou de fazer execução sobre o prédio instituído (§2º). O despacho do juiz será irrecorrível e, se deferir o pedido, será transcrito integralmente, juntamente com o instrumento (§3º).

Pelo art. 1.712 do CC/02, é possível que seja objeto de bem de família tanto imóvel urbano quanto rural, e também valores mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no sustento da família. Deve-se entender como valores imobiliários, por exemplo, as ações e outros investimentos que proporcionem rendimentos periódicos a serem utilizados com o fim previsto na lei.

Conforme preza o art. 1.713, tais valores devem constar especificadamente individualizados no instrumento público de instituição do bem de família (§1º) e não poderão exceder o valor do prédio à época que instituído (caput). Sendo títulos nominativos, a sua instituição como bem de família deverá constar nos respectivos livros de registros (§2º). O instituidor poderá ainda determinar que a administração dos valores mobiliários seja confiada a instituição financeira, bem como disciplinar a forma de pagamento da respectiva renda aos beneficiários, caso em que a responsabilidade dos administradores obedecerá às regras do contrato de depósito (§3º).

Em obediência à Lei de Registros Públicos (lei nº 6.015 – LRP), como já vimos, o art. 1.714 dita que o bem de família, quer instituído pelos cônjuges ou por terceiros (causa mortis), constitui-se pelo registro de seu título no Cartório de Registro de Imóveis (cujo procedimento foi visto – p. 21).

O art. 1.715 do CC/02 esclarece que o bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo as que provierem de tributos relativos, ou de despesas de condomínio. Este dispositivo obedece ao princípio da negação de fraude contra credores. Se o bem instituído se isentasse das dívidas já existentes à sua época, estar-se-ia inibindo o credor de garantir o seu crédito. Por isso, só é instituído o bem de família quando o instituidor é solvente no momento do ato, podendo quitar suas obrigações através de outros meios ou bens. Também está sendo aceito a inscrição do bem de família gravado com cláusula hipotecária, pois sua afetação não prejudicará a hipoteca antes firmada, podendo o bem ser vendido para este fim.

A duração do benefício, qual seja, da impenhorabilidade, é transcrita pelo art. 1.716 e existirá enquanto viver um dos cônjuges, ou, na falta destes, até que os filhos completem a maioridade. Se algum filho for incapaz, mesmo atingido 18 (dezoito) anos de idade, a proteção se estenderá até a cessação da incapacidade. Exemplifica Maria Helena Diniz[67] que “Se os filhos estiverem sujeitos à curatela, a cláusula não será eliminada, até que seja superada a causa de incapacidade ou enquanto viverem. O bem de família, nesta hipótese, será administrado pelo curador dos beneficiários incapazes”.

Se o prédio deixar de servir como residência da família, poderá haver a extinção do benefício, por requerimento de qualquer interessado.

O credor também poderá requerer o cancelamento do vínculo,em duas ocasiões. Primeiramente, se sua obrigação é anterior à inscrição do bem de família e o instituidor declara-se insolvente à data da instituição. Ocorre, exemplificando, se a dívida é descoberta ou “lembrada” por uma das partes após ter realizado a instituição do homestead. Segundo, se conseguir provar que o imóvel já não serve para o domicílio da família, destinação obrigatória por força do art. 1.712 do CC/02. Há de se entender, contudo, que nesses casos não há necessidade do credor promover o cancelamento do vínculo, mas que simplesmente o juiz “desconsidere” sua existência em eventual execução ou penhora.

Menciona o art. 1.717 sobre a finalidade e a inalienabilidade do instituto. Antes, deve-se frisar que os bens legalmente inalienáveis compõem o acervo de bens fora do comércio, tais quais os insuscetíveis de apropriação[68]. O prédio e os valores mobiliários, constituídos como bem de família, não podem ter destino diverso do previsto do art. 1.712 ou serem alienados sem o consentimento dos interessados seus representantes legais, ouvido o Ministério Público. Com isso o Código Civil procurou efetivar a salva-guarda da família, apenas podendo ser alienado o imóvel com a aceitação de todos os interessados.

Caio Mário da Silva Pereira[69] aduz que:

Alexandre Guedes Alcorado Assunção [...] considera defeituosa a redação do art. 1.717, cujo objetivo deveria ser, tão-somente, de impedir o desvirtuamento do instituto. Sua parte final induz ao entendimento equivocado de que a alienação pode ser realizada sem autorização (grifo meu).

Embora a lei não expresse, da interpretação sistemática induz-se ser necessária a autorização judicial, porque o procedimento de oitiva dos interessados e do parquet ocorre em âmbito judicial, o que torna necessária a palavra final do magistrado.

É de fácil diapasão que o art. 1.718, CC/02, busca garantir a administração dos valores mobiliários por uma entidade financeira, em respeito ao art. 1.713, §3º e aos fins de destinação de tais bens. Se ocorrer qualquer forma de liquidação da instituição financeira guarnecida pelos bens de família móveis, não serão prejudicados tais valores, ordenando o juiz a transferência para outra instituição semelhante, obedecendo-se, no caso de falência, ao disposto sobre pedido de restituição.

Polêmico é o art. 1.719, que trata sobre a impossibilidade de manutenção do bem de família. Se os interessados, a requerimento, comprovarem que não mais tem condições para mantê-lo, poderá o juiz extingui-lo ou autorizar a sub-rogação dos referidos bens em outros, após ser ouvido o instituidor e o Ministério Público.

Percebe-se que nem sempre é possível gerir uma residência, arcar com as despesas de moradia, o que leva a insuficiência para a manutenção do lar de família. Logo, é possível desconstituir o bem familiar voluntário para que sirva de penhora, objeto de alienação, ou facilite ao núcleo familiar encontrar maneiras de sobreviver. Pode-se ainda trocar os bens de família atuais por outros, na chamada sub-rogação, tendo em vista, por exemplo, o menor custo de manutenção de uma casa de varanda, ao invés de uma luxuosa mansão.

O art. 1.720 do Código Civil dispõe que a administração dos bens compete a ambos os cônjuges, salvo disposição em contrário do ato constitutivo. É fruto da equiparação constitucional do homem e da mulher, seja quanto aos direitos e deveres no casamento (art. 226, §5º), seja em latu senso (art. 5º, caput). Antes da CF/88, subsistia o antigo regime patriarcal (chefe de família) que vigorava através do Código Civil de 1916.

O parágrafo único do aludido artigo esclarece que, ocorrendo o falecimento de ambos cônjuges, a administração passará ao filho mais velho, se for maior, do contrário, ao seu tutor.

Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona[70] explicam em rápida acepção. Segundo eles:

A administração do bem de família competirá a ambos os cônjuges (casamento), aos companheiros (união estável) ou ao pai ou mãe, cabeça da prole (família monoparental). Seguindo a ordem legal, na falta de quaisquer destes, a administração tocará ao filho mais velho, se for maior e, se não for, ao tutor [...].

Com visão no instituto da curatela (arts. 1.767 a 1.783 do CC/02), pode ainda um curador administrar o bem de família, se o filho for maior de idade, porém, incapaz.

O art. 1.721 do Código Civil trata que a dissolução da sociedade conjugal não extingue o bem de família. Implica dizer que a morte, a nulidade ou anulação do casamento, ou ainda o divórcio, nos termos do art. 1.571, não ocasionam o fim do bem de família. Quanto à primeira hipótese, o Código outorga ao(a) viúvo(a) pedir a extinção do bem de família se for o único bem do casal, o que importa reconhecer que, contrario sensu, a viuvez não importa extinção automática do instituto (parágrafo único do art. 1.721, CC/02).

Carlos Roberto Gonçalves[71], na célebre obra de Direito Civil, observa a possibilidade do Judiciário não cumprir o disposto neste artigo:

Não é certo, assim, que se deva admitir possa o cônjuge sobrevivente provocar a extinção do bem de família, quando for este o único bem do casal, pois restarão seriamente prejudicados os filhos menores. De qualquer sorte esta previsão legal não é autônoma. O juiz, verificando a possibilidade de prejuízo aos menores, deverá indeferir a extinção da proteção.

O art. 1.722, encerra o regramento civil do bem de família voluntário no Brasil, trazendo mais uma forma de extinção mesmo, já trabalhada neste estudo: quando os cônjuges falecem e os filhos atingem a maioridade civil, sem que algum esteja sob curatela. Estando algum curatelado, a cessação da inexcutibilidade condiciona-se ao fim da incapacitação. Não havendo fim, por ser vitalício o problema, o benefício também o é.

Com importância frisa-se que, em qualquer hipótese – atenção nos arts. 1.717 e 1.719, CC/02 – a falta de intimação do órgão do Ministério Público para que se manifeste (livremente) sobre o pedido relacionado ao bem de família conduz à nulidade do processo, como reza o art. 246 do Código Processual Civil[72]. O Ministério Público intervém em todos os processos cíveis incursos no art. 82 do CPC, onde se enquadra o bem de família no inciso II, e havendo incapazes, soma-se ao inciso I.

3.3. Comentários aos dispositivos normativos da Lei n. 8.009/90

A Lei n. 8.009/90, de 29 de março de 1990, criou entre nós, a modalidade legal do bem de família legal, também conhecido como compulsório ou involuntário. Visa ampliar o conceito do instituto, que não mais depende da inscrição voluntária para existir, pois a própria lei impõe o benefício independente de vontade.

 Com o intuito de preservar o patrimônio familiar, estabelece a impenhorabilidade não só do único imóvel rural ou urbano da família, destinado para moradia permanente, como também dos equipamentos de uso profissional e móveis que guarnecem a casa, desde que quitados[73].

É o que reza o art. 1º da lei, e seu parágrafo único, ao proclamar que o imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei, e compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos de uso profissional e móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.

Nessa trilha convém ressaltar que eventuais bens ou equipamentos que não guarneçam a residência familiar não estarão abarcados no espectro protetivo, não devendo se estender o manto sagrado da lei para tutelar bens destinados à exploração econômica – conquanto possam estar assegurados por outro dispositivo legal[74].

Vê-se, pois, um alargamento do objeto de proteção, em relação ao bem de família convencional.

Pelo art. 2º entende-se que não estão abrangidos pela lei, sendo portanto exceção à impenhorabilidade, os veículos automotores, obras de arte e adornos suntuosos.

Os automóveis são exceções porque dificilmente o transporte de coisas ou pessoas está destinado ao uso residencial.

É difícil o discernimento sobre a conceituação de suntuosidade, porém, julgando sobre a matéria, entendeu o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em 1991, que a Lei 8.009/90 é taxativa quanto às hipóteses de exclusão, não sendo penhoráveis, com isso, os aparelhos eletrodomésticos.  Entretanto, o Tribunal de Alçada do Estado do Rio Grande do Sul, em 1991, considerou penhoráveis alguns aparelhos elétricos e eletrônicos sofisticados, pois mais se aproximam da suntuosidade do que da necessidade de possuir[75].

O art. 3º trata de oponibilidade, ou seja, da prevalência do benefício frente a outras questões jurídicas. A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, trabalhista, previdenciária ou de outra natureza, no entanto, comporta 07 (sete) exceções:

I – em razão dos créditos de trabalhadores da própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias. Havendo dívidas trabalhistas com a empregada doméstica cozinheira, ou com o jardineiro, por exemplo, é preciso estar solvente para efetuar tais pagamentos. Comprovando-se a insolvência em eventual processo judicial, a residência não estará livre de sofrer penhora.

II – pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato. Trata-se de mais uma obediência ao princípio de vedação à fraude contra credores. Os recursos econômicos utilizados para se conseguir o bem de família, não são abarcados pela proteção. Se assim fosse, poder-se-ia adquirir, ou construir o imóvel, sem a preocupação em pagar pelo bem, o que geraria frustração creditícia.

III – pelo credor de pensão alimentícia. Nem mesmo o homestead brasileiro tem prioridade sobre a Vida, bem jurídico mais valioso. A efetiva prestação alimentar garante que a soma de pecúnia alcance os parentes necessitados e os ajude a viver com o mínimo de dignidade, ou até mesmo, sobreviver. O alimento é, por lei, propulsor da garantia do mínimo existencial.

IV – para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar.

Assim como a proteção não acoberta os recursos econômicos para a construção ou o adquirir do bem de família, também não serve para as cobranças tributárias relativas ao imóvel. Fácil entender que a inexcutibilidade não pode significar isenção tributária quando o fato gerador guardar relação com o imóvel-residência da família. Os impostos, as taxas, e as contribuições de melhoria que recaiam sobre o prédio assim habitado hão de ser pagos, devido a seus valores sociais, pois a Administração Pública precisa da receita para a consecução de seus objetivos[76].

V – para a execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal e pela entidade familiar.

Aqui persiste a escolha, ou vontade das partes. Se a família beneficiária resolve inscrever o bem com gravame de hipoteca, induz-se haver vontade de dispor do bem perante a insolvência, mesmo que prejudique a moradia familiar. Logo, a execução do bem de família gravado de hipoteca é exceção à regra da impenhorabilidade. Há controvérsias de valores principiológicos, sobre este inciso, que serão discutidas no sub-capítulo seguinte.

VI – por ter sido adquirido como produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimentos de bens.

A ninguém é conferido beneficiar-se da própria torpeza[77]. A impenhorabilidade legal do bem de família exige um conteúdo ético, inerente a qualquer legislação brasileira. Obter o bem objeto da proteção, através da feitura de crime, é, ao menos, repulsivo. Não se deve diminuir o direito ao crédito dos credores por conduta penal negativa, ainda que culposa.

Caso seja extinto a punibilidade do autor, p. ex., pela prescrição da pretensão punitiva, ainda não se falará em impenhorabilidade de sua residência familiar, pois aquela apenas impede o criminoso de cumprir pena pelo crime, não o libertando da autoria delitiva. Continua enquadrado na exceção à inexcutibilidade predial.

VII – por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

A nova Lei do Inquilinato restringiu o alcance do regime de impenhorabilidade consagrado pela Lei 8.009/90. Como se trata de norma eminentemente de caráter processual, incide de imediato, salvo o disposto no art. 76, quanto aos processos em curso[78].

Esta situação gerou conflito que foi dirimido pelo STF: deve prevalecer a liberdade individual e constitucional de alguém ser fiador e arcar com a responsabilidade, ou o direito à moradia, previsto no art. 6º da Constituição, deve subsistir? Isso implica dizer se a exceção à inexcutibilidade da moradia do fiador é dispositivo inconstitucional ou não. O motivo de existir essa exceção é a Lei n. 8.245, de 1991 – que dispõe sobre a locação de imóveis urbanos – e imperou no art. 82 a modificação legal na Lei n. 8.009/90, acrescentando o inc. VII no art. 3º, tornando, assim, penhorável o imóvel do fiador, em caso de inadimplência do locatário.

O Ministro Cezar Peluso, no julgamento de precedente normativo do STF, julgado em 2006, sobre a validade da penhora do bem de família, aduziu que o cidadão tem liberdade de escolher se deve ou não avalizar um contrato de aluguel, e consequentemente, arcar com os prejuízos que a condição de fiador implica[79].

O aludido Ministro não vê incompatibilidade entre o dispositivo da lei e a Emenda Constitucional 26/2000 que introduziu a moradia no rol dos direitos sociais. Para ele, existe harmonização entre a liberdade constitucional de realizar vontade, em detrimento do relativo direito ao bem de família[80].

Art. 4º da Lei 8.009/90 preza pela boa-fé do beneficiário – não se trata de instituidor, no que tange ao bem de família involuntário, posto não necessitar de qualquer instituição ou disposição de vontade – que não poderá adquirir bem imóvel mais expensivo, sabendo ser insolvente, para ampará-lo com a proteção legal, desfazendo-se ou não da moradia anterior. Isto caracteriza fraude contra credores, tão repudiada pela lei como foi visto ao longo dos artigos.

O §1º procedimenta a solução, pois nesse caso, poderá o juiz, na respectiva ação do credor, anular-lhe a venda, ou transferir a impenhorabilidade de volta ao imóvel anterior, liberando o prédio mais valioso para execução.

Promove o §2º a impenhorabilidade familiar de imóveis rurais. O aludido dispositivo melhor estaria alocado na legislação na figura de um artigo, e não parágrafo, visto não enquadrar-se no círculo lógico do caput, sendo disposição complementar da lei, e não do art. 4º.

Ademais, proclama o mesmo ser o bem de família legal rural restringido à sede de moradia, com seus respectivos bens móveis internos. No caso da pequena propriedade rural de subsistência da família, conhecida como bem de família constitucional, impenhorável por força do previsto no art. 5º, inc. XXVI da CF/88, a proteção é limitada à área definida como pequena propriedade rural.

Como afirma Araken de Assis[81]:

O art. 1º, caput e parágrafo único, c/c o art. 5º, caput, da lei 8.009/90 exibem sentido unívoco: a residência familiar é um imóvel urbano ou rural – neste último caso, a pequena propriedade (art. 4º, §2º, parte final); nas grandes propriedades rurais, consoante o art. 4º, §2º, da Lei 8.009/90, a impenhorabilidade limita-se à ‘sede de moradia’. Ora, o art. 79 do CC-02 define o imóvel como o solo e tudo ‘quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente’. Desse, a residência familiar constitui a acessão física artificial, resultante do trabalho humano, permanente e materialmente unida ao solo – enfim, o prédio.

Consoante o art. 5º, para a impenhorabilidade de que trata essa lei, considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal (ou entidade familiar) para moradia permanente. Havendo vários, a proteção legal recairá sobre o de menor valor, salvo eventual instituição, no Registro de Imóveis, de imóvel diverso (parágrafo único).

Surgem algumas considerações. A maioria das famílias brasileiras, refletindo a atual situação sócio-econômica, possuem apenas um imóvel, e nele domiciliam todos os dias. Não encontram, então, problema com esse dispositivo. Contrario sensu, existem aqueles que locam o prédio para constituir renda, nesses casos, existe decisão da 3ª Turma do STJ admitindo a impenhorabilidade do imóvel locado que não serve de moradia ao devedor-locador, porque o alugou para idêntico fim.[82] No julgamento do REsp. 31597-9/RJ, o Colendo Tribunal também decidiu favorável, afirmando que o devedor, mesmo não residindo no único imóvel que lhe pertence, utiliza o valor obtido com a locação desse bem como complemento da renda familiar. O bem não perde sua destinação que é o de garantir a moradia familiar ou a subsistência da família[83].

Quanto ao locatário, cujo imóvel familiar é o bem locado, apenas tem a proteção legal nos bens móveis guarnecedores da casa, visto que o imóvel a outrem pertence.

O dizer do parágrafo único permite a remissão ao bem de família voluntário, disposto no Código Civil. Se a impenhorabilidade da lei, compulsória como vimos, recai sobre o imóvel residencial de menor valor, quando existem vários, cabe a um dos cônjuges instituir outro prédio a sua escolha. Basta preencher comprovadamente os requisitos legais, arts. 1.711-1.722 do CC/02, e realizar o procedimento previsto na LRP (Lei 6.015, de 1973).

Explica Carlos Roberto Gonçalves[84]: “Deve ser utilizado, portanto, como residência efetiva do grupo familiar, ou seja, com ânimo de permanência”. Contudo, discordo, em vista do Código Civil atual desprezar esse entendimento no art. 70, afirmando que o animus morandi permanente implica domicílio, e não residência; bem como em face da própria lei do homestead brasileiro, que no parágrafo único deste artigo, induz a aceitação de existirem vários imóveis – leia-se, residências – capazes de gerarem o benefício.

O Art. 6º da Lei cancela as execuções suspensas pela Medida Provisória nº 143, de 08 de março de 1990. Esta foi convertida na lei estudada (nº 8.009/90) e suspendia no art. 6º as execuções em andamento quando de sua vigência. Com o advento da lei, as mesmas foram canceladas, ou seja, pôs-se fim às execuções em andamento. Surgiu então grande polêmica: São canceladas as penhoras consumadas antes da vigência da lei 8.009/90, ou esta serviu apenas às penhoras incompletas? Será visto as divergências de opiniões no próximo subcapítulo, a partir de agora.

Antes de adentrar-se no seio conflituoso da efetivação temática, permito-me refletir:

Notou-se, com veemência, que apenas as famílias (por casamento, união estável, monoparental e unipessoal) possuem a proteção do bem de família, leia-se, o objeto de seu direito à moradia impenhorável. Desde logo, então, permeio no solo acadêmico e profissional a necessidade de lei que estenda o manto impenhorável a quaisquer residências, independentemente do fator qualitativo família. De tal modo o devedor solitário (geralmente o solteiro) terá seu imóvel domiciliar inexcutível como regra. Trata-se de necessidade social íntima da condição humana, cuja inerência não se limita ao membro familiar.

3.4. A efetiva aplicação do Bem de Família: controvérsias doutrinárias e entendimentos jurisprudenciais relevantes

José Eduardo[85] esclarece bem que do ponto de vista prático, o tema é de relevância extraordinária para os profissionais do direito: uma enorme séries de questões hoje discutidas nos Tribunais, nos órgãos legislativos e na administração pública lidam com direitos sociais.

Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona Filho, quanto à possibilidade de cancelar penhoras realizadas anteriores à Lei especial 8.009/90, esclarecem que existe entendimento sumulado sobre a matéria. A Súmula 205 do STJ afirma que a lei aplica-se à penhora realizada antes de sua vigência. Logo, o devedor poderá invocar a proteção legal, mesmo se a penhora de seu imóvel residencial houver sido ordenada antes de 29 de março de 1990[86]. Prevalece então o entendimento que prioriza a finalidade social da norma e o reconhecimento da penhora como ato preparatório, não autônomo, ato-meio de outro complexo que é a expropriação do bem, sendo este o ato-fim[87].

Quanto aos beneficiários do bem de família compulsório, o art. 1º menciona que apenas o imóvel próprio do casal ou da entidade familiar servirá como bem de família. O STJ em concordância, por sua 4ª Turma, no ano de 2005, decidiu que a Lei n. 8.009/90 destina-se a proteger não o devedor, mas sua família. Atinge o devedor que forme uma família, estando de fora o devedor solteiro que resida sozinho. Pablo Stolze e Rodolfo, discordando, invocam o pensamento do de Fontes de Alencar:

Quanto ao fundamento do acórdão de que ela é solteira e, em consequência, não atingida pela benesse da Lei n. 8.009/90, afasto-o, porque senão chegaríamos à suprema injustiça. Se o cidadão fosse casado, ainda que mal casado, faria jus ao benefício; se fosse viúvo, sofrendo a dor da viuvez, não teria direito ao benefício.

Aliás, à luz da regra de ouro do art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil – LICC, na aplicação da lei, o juiz atenderá os fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum. Portanto não se pode aceitar que o direito à moradia trazido pela Lei 8.009/90 seja restringido ao devedor em família, negando o benefício aos componentes remanescentes de uma família, que por infelicidade ou força maior, acabou se desfazendo ao longo dos anos.

Para reafirmar o entendimento, posta-se a seguinte jurisprudência[88]:

Agravo de Instrumento. Ação de execução. Penhora. Bens que guarnecem a casa do devedor e que mora sozinho. Inviabilidade. A Lei 8.009/90, além de proteger a família do devedor, destina-se, também, a resguardar a dignidade da moradia deste (TJ/PR. Ac.unân. 2ª Câm. Especial Cívil. Ag.Instr. 70002064293, rel. Desa. Lúcia de Castro Boller. J. 28/06/01).

Questão também a ser solucionada é sobre a abrangência do benefício em relação aos bens. Para Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona[89] têm sido considerados impenhoráveis, por força da Lei 8.009/90, os seguintes bens: a garagem do apartamento residencial, a geladeira, o freezer, máquinas de lavar e secar roupas, o teclado musical, o computador, o televisor, o videocassete, o ar-condicionado e a antena parabólica.

O Superior Tribunal de Justiça, em acórdão deste ano, tornou possível a penhora de parte do bem que não compõe o bem de família, quando, levando-se em conta as peculiaridades do caso, tal constrição não prejudica a área residencial protegida (p. ex., o andar inferior do imóvel ocupado por duas lojas, ficando restrita a moradia da família ao andar superior)[90].

O TRT da 2ª Região, inovando, considerou os créditos trabalhistas em geral como exceção à impenhorabilidade legal, pois se sobrepõem à moradia, com base nos arts. 1º e 170, CF/88; 186, CTN e 449, CLT[91].

Havendo na casa mais de um desses objetos, cairá a impenhorabilidade sobre apenas um, podendo o outro ser levado à penhora, por não ser necessário ao lar.

Nessa trilha, também não estão protegidos de execução os bens destinados à exploração econômica e aqueles que não guarneçam a residência, pois não são abarcados pelo manto protetivo da Lei nº 8.009/90, conforme preceitua Cristiano Chaves de Farias[92].

As regras, seja do Código Civil de 2002 ou da Lei nº 8.009/90, tendo em vista a finalidade de proteção à família, referem-se apenas à pessoa física. Consectário natural deste raciocínio é que a pessoa jurídica, ainda que destinada à moradia de seus sócios não está protegida pelo manto do bem de família, eis que não se amolda nos limites legais[93].

Logo, as lides envolventes do tema mostram-se dirimir-se com o balanceamento dos valores-base, já vistos, quais sejam: dignidade humana, isonomia, proporcionalidade/razoabilidade e vedação de fraude contra credores. Em resumo, o imóvel residencial cujos ocupantes sejam familiares, independentemente do grau de parentesco ou situação civil, mantém-se protegido contra a excutibilidade por causa da dupla finalidade da LBF (Lei 8.009/90): manutenção do prédio familiar e/ou sustento da família.

CONCLUSÕES

Como visto, o Bem de Família, instituto do direito civil brasileiro, coexiste em duas modalidades: voluntária e involuntária.

Seu perfil histórico pertence aos tempos antigos, Roma, quando surgiam os característicos mais arcaicos do instituto, sob a égide de se proteger os bens provenientes dos ascendentes, que possuíam forte cunho familiar e nobre. Tanto que na época da república romana, os bens da família eram considerados inalienáveis, para se dar maior proteção aos bens herdados dos antepassados.

Mais recentemente, no século XIX, surgia a base sólida do bem de família que, posteriormente, viria a ser adotada em todo o mundo. O Homestead Exemption Act, como foi editado originalmente na república do Texas, antes mesmo da unificação dos EUA, imunizava contra penhoras o pequeno pedaço de terra para instigar a imigração na região e ascender a economia local, baseado em inovada proteção do teto familiar.

Não se deve afastar qualquer interpretação de lei da Constituição Federal. O bem familiar guarda íntima relação com os princípios da dignidade humana e da isonomia. Enquanto aquele garantia uma existência mínima a todos, sem exceção, onde se inclui a moradia do núcleo familiar, a isonomia garante a extensão do benefício legal a todos que se enquadrem na concepção “família”, tais quais os casados e formadores de entidade familiar, como os companheiros e a mãe/pai cabeça da prole. Ambos os princípios vão mais além, possibilitando a batalha do devedor solitário pelo direito à moradia com base no instituto, cuja fundamentação já modifica posições de Tribunais.

O bem de família voluntário encontra-se nos arts. 1.711-1.722 do Código Civil e possui como eventuais instituidores os cônjuges, a entidade familiar e terceiros, conforme o caso. Os bens objeto desta proteção repousam no art. 1.712, e junto ao 1.711, dispõe valores-limites para estes.

A Lei 8.009/90 traz a hipótese compulsória de bem de família (involuntário), onde não existem instituidores, apenas beneficiados (casal, ou entidade familiar). O objeto protegido é o imóvel residencial próprio do casal ou da entidade familiar com suas construções, plantações, benfeitorias, equipamentos e móveis que guarnecem a casa. (art. 1º, LBF).

O acervo jurisprudencial e o entendimento doutrinário buscam dirimir os conflitos interpretativos e abranger a conceituação do instituto. Há Tribunais garantindo o bem de família a devedor que more sozinho, sem família. Também existem decisões em favor do locatário e locador, mesmo que aquele não tenha o imóvel como próprio, embora resida nele, e este não resida, embora o tenha como seu. Móveis que guarnecem a casa, contrapondo-se ao p.u. do art. 1º da lei 8.009/90, estão sendo considerados penhoráveis, desde que existentes dois repetitivos, caso em que um deles cederá ao pagamento creditício.

Em síntese, tem-se como principal resultado obtido que os experimentos de julgados, exposto neste trabalho, relevam a importância de observar cada situação em concreto. É preciso medir entre os valores constitucionais, legais e o direito ao crédito, para se estipular a inexcutibilidade do bem servindo de moradia familiar. A legislação, sobredita temática, infere as disposições basilares e diretivas para se efetivar a garantia do bem de família, inclusive trazendo conceitos de fácil entendimento – vide artigos –, mas, como qualquer interpretação e aplicação legal, exige-se a medição simétrica entre o direito das partes envolvidas, missão imposta sempre aos operadores jurídicos.

O presente estudo contribui para o conhecimento (e reconhecimento) do tema, cuja ciência é imprescindível às famílias brasileiras. É composição jurídica de alto valor axiológico, referente à dignidade da pessoa humana e estruturação familiar. É, em suma, a base do direito brasileiro, no sentido de garantir moradia à peça unitária simples de um Estado, o núcleo familiar. Sem uma casa, não há como falar do exercício da maioria dos direitos, seja constitucional ou infra, visto que para sua realização vigora a premissa de ter o ser humano preparo psicossocial, originado no seio da família, debaixo de um teto exclusivo desta, onde todos se amam e vivem.

Podemos sugerir como tema para um trabalho futuro a impenhorabilidade da moradia das pessoas consideradas em lato sensu. Não se harmoniza com a Justiça sensata e igualitária que apenas as famílias tenham seu imóvel residencial imunizado. A legislação brasileira, mormente a situação sócio-econômica crescente do país, não deve restringir, como de fato restringe, os valores constitucionais da moradia à apenas determinado grupo social – como a família. É preciso garantir a casa de qualquer pessoa, efetivando de forma máxima o direito social à moradia, conforme idealiza a Constituição atual da República.

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[1] AZEVEDO, Álvaro Villaça. Bem de Família: com comentários à Lei 8.009/90. 6 ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 66.

[2] AZEVEDO. Op. Cit., p. 67.

[3]AZEVEDO. Op. Cit., p. 67.

[4] CREDIE, Ricardo Arcoverde. Bem de Família: Teoria e Prática. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 23.

[5] CREDIE. Op. Cit., p. 23.

[6] AZEVEDO. Op. Cit., p. 68.

[7] AZEVEDO. Op. Cit., p. 71.

[8] GANGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de Direito Civil: Parte Geral. Vol. 1. 10 ed. – revista e atualizada. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 256.

[9] AZEVEDO. Op. Cit., p. 80.

[10] STOLZE; PAMPLONA FILHO. Op. Cit., p. 256.

[11] AZEVEDO. Op. Cit., p. 5.

[12] GAMA, Guilherme Calmo Nogueira da. Princípios Constitucionais de Direito de Família: Guarda Compartilhada à Luz da Lei n.º 11.698/08: Família, Criança, Adolescente e Idoso. São Paulo: Atlas, 2008, p. 6.

[13] SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 26 ed. – rev. e atual. São Paulo: Editora Malheiros, 2006, p. 848.

[14] DONALDO, J. Felippe. Dicionário jurídico de bolso: Terminologia Jurídica: termos e expressões latinas de uso forense. 18 ed. São Paulo: Millenium, 2007, p. 136.

[15] AZEVEDO. Op. Cit., p. 80.

[16] BRUNO NETO, Prof. Francisco. Curso Acadêmico de Direito Constitucional. São Paulo: Editora de Direito, 1999, p. 37.

[17] AZEVEDO. Op. Cit., p. 6.

[18] AZEVEDO. Op. Cit., p. 7.

[19] AZEVEDO. Op.Cit., p. 8.

[20] AZEVEDO. Op.Cit., p. 9.

[21] AZEVEDO. Op.Cit., p. 9.

[22] STOLZE; PAMPLONA FILHO. Op. Cit., p. 276.

[23] AZEVEDO. Op. Cit., p. 11.

[24] OLIVEIRA, J. M. Leonis Lopes de. Direito Civil: Teoria Geral do Direito Civil. Vol. 2. 2 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000, p. 463.

[25] AZEVEDO. Op. Cit., p. 13.

[26] AZEVEDO. Op.Cit., p. 14.

[27] AZEVEDO. Op. Cit., p. 15.

[28] Cf. VELOSO, Zeno. Código Civil comentado: direito de família, alimentos, bem de família, união estável, tutela e curatela: arts: 1.694 a 1.783. Vol. 17. São Paulo: Atlas, 2003, p. 81.

[29] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro: Direito de Família. Vol. 6. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 509.

[30] CREDIE. Op. Cit., p. 05.

[31] CREDIE. Op. Cit., p. 06.

[32] FARIAS, Cristiano Chaves de. Direito Civil: Teoria Geral. 2 ed. Rio de Janeiro: Lumens Juris, 2005, p. 375.

[33] VENOSA, Silvo de Salvo. Direito Civil: Teoria Geral: introdução ao direito romano. 5 ed. São Paulo: Atlas, 1999, p. 231.

[34] PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: Direito de Família. Vol. 5. 15 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 557.

[35] VENOSA. Op. Cit., p. 231.

[36] PEREIRA. Op. Cit., p. 558.

[37] SANTIAGO, Mariana Ribeiro. Bem de Família. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/ doutrina/texto.asp?id=5428>. ISSN 1518-4862. Acesso em: 04 mar. 2010.

[38] SILVA. Op. Cit., p. 848.

[39] ARAÚJO, Luiz David de; NUNES JUNIOR, Vidal Serrano. Curso de direito constitucional. 9 ed. – rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 497.

[40] SILVA. Op. Cit., pp. 848-849.

[41] FARIAS. Op. Cit., p. 373.

[42] CREDIE. Op. Cit., p. 24.

[43] GAMA. Op. Cit., p. 71.

[44] FARIAS. Op. Cit., p. 373.

[45] FARIAS. Op. Cit., p. 373

[46] FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito Civil: Teoria Geral. 8 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 454.

[47] SOLLA, Paulo Ramon da Silva. Mínimo existencial e patrimônio mínimo: o equívoco da pré-constituciona-lidade. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/revista/texto/14508>. ISSN 1518-4862 Acesso em: 24 jan. 2011.

[48] SOLLA. Op. Cit.

[49] SOLLA. Op. Cit..

[50] FARIAS; ROSENVALD. Op. Cit., p. 457.

[51] LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 11 ed. – rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Método, 2007, p. 699.

[52] MOTTA, Sylvio; BARCHET, Gustavo. Curso de Direito Constitucional. 2 ed. atual. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009, p. 103.

[53] CUNHA JUNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. Vol. 1. 4 ed.  Bahia: Editora Jus Podium, 2010, p. 660.

[54] MOTTA; BARCHET. Op. Cit., p. 104.

[55] MOTTA; BARCHET. Op. Cit., p. 104.

[56] CHIMENTI, Ricardo cunha; et al. Curso de direito constitucional. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 113.

[57] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 26 ed. – rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2010, p. 198.

[58] TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 8 ed. – rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2010,  p. 493.

[59] CREDIE. Op. Cit., p. 42.

[60] CREDIE. Op. Cit., p. 43.

[61] STOLZE; PAMPLONA FILHO. Op. Cit., p. 375.

[62] STOLZE; PAMPLONA FILHO. Op. Cit., p. 375.

[63] SANTIAGO. Op. Cit.

[64] MONTEIRO, Whashington de Barros; SILVA, Regina Beatriz Tavares da. Curso de Direito Civil: Direito de Família. 40 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, pp. 606-607.

[65] MONTEIRO; SILVA, Op. Cit., p. 607.

[66] MONTEIRO; SILVA, Op. Cit., p. 607.

[67] DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Vol. 3. 20 ed. – rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 224.

[68] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Vol. 1. 2 ed. – rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 273.

[69] PEREIRA. Op. Cit., p. 562.

[70] GAGLIANO; PAMPLONA FILHO. Op. Cit., p. 279.

[71] GONÇALVES. Op. Cit., p. 517.

[72] FARIAS. Op. Cit., p. 381.

[73] DINIZ. Op. Cit., p. 217-218.

[74] STOLZE; PAMPLONA FILHO. Op. Cit., p. 385.

[75] AZEVEDO. Op. Cit., p. 200.

[76] CREDIE. Op. Cit., p. 102.

[77] CREDIE. Op. Cit., p. 105.

[78] NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil anotado e Legislação Extravagante. 2 ed. – revisada e ampliada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 757.

[79] GUIMARÃES, Janaína Rosa. Bem de Família: a validade da penhora da garantia oferecida pelo próprio devedor. Jus Navigandi, Teresina, ano 15, n. 2611, 25 ago. 2010. Disponível em: <http://jus.uol.com.br/ revista/texto/17260>. ISSN 1518-4862. Acesso em: 04 out. 2010.

[80] Cf. GUIMARÃES. Op. Cit.

[81] ASSIS, Araken de. Manual da Execução. 13 ed. – rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010,  p. 276.

[82] ASSIS. Op. Cit., p. 278.

[83] FARIAS. Op. Cit., p. 394.

[84] GONÇALVES. Op. Cit., p. 515.

[85] FARIA, José Eduardo (Org.). Direitos Humanos, Direitos Sociais e Justiça. 1 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1998.

[86] STOLZE; PAMPLONA FILHO. Op. Cit., p. 290.

[87] SANTIAGO. Op. Cit.

[88] FARIAS. Op. Cit., p. 402.

[89] STOLZE; PAMPLONA FILHO. Op. Cit., pág. 281.

[90] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Embargos do devedor. Inépcia da Inicial. Não caracterização. Bem de Família. Penhora de parte comercial do imóvel. Possibilidade. REsp 1018102/MG, Recurso Especial 2007/0306174-0. Relator: Ministro Sidnei Beneti. DJ, 23 ago. 2010. Disponível em: <http://www.stj.jus.br>. Acesso em: 28 nov. 2010.

[91] BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região. Bem de Família e o Crédito Trabalhista. Acórdão 20090116440, Agravo de Petição em Embargos de Terceiros – 71 VT/SP. Idalina Ferreira da Silva e José Nascimento de Jesus. Relator: Francisco Ferreira Jorge Neto. DJ, 17 mar. 2009. Disponível em: <http://www.trtsp.jus.br>. Acesso em: 28 nov. 2010.

[92] FARIAS. Op. Cit., pág. 385.

[93] FARIAS. Op. Cit., pág. 399.

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Sobre o autor
Hermes Lima Gonçalves de Oliveira

Advogado. Bacharel em Direito pela Universidade Estácio de Sá em Alagoas (2011); Pós graduado em Direito Constitucional e Direito Administrativo pelo Centro Universitário Cesmac (2013); Consultor jurídico. Funcionário do Tribunal de Justiça de Alagoas. Contato pelo email: [email protected]

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