A Lei de Licitações (Lei 8.666/93) e a Petrobrás

20/10/2016 às 10:19
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A Lei de Licitações (Lei 8.666/93) e sua aplicabilidade à Petrobrás.

O Estado deve buscar a satisfação dos interesses dos cidadãos, cumprindo as suas finalidade precípuas determinadas pela Constituição Federal de 1988 (CF/88). Saúde, Educação, Segurança, Transporte, Lazer estão entre as tantas obrigações estatais.

Para alcance desses objetivos o Poder Público deve adquirir bens e contratar serviços com os particulares, pois não poderia produzir todo o necessário para consecução de suas atividades. Imagine só se o próprio Estado tivesse que produzir e beneficiar todos os produtos de que necessita? Seria necessária uma estrutura de tamanho sem igual e mantida por uma tributação sem limites. Impensável uma hipótese desse tipo.

Assim, o Estado busca os particulares para lhes fornecer os bens e serviços de que necessita. Contudo, deve utilizar-se de procedimentos específicos para garantir que todos aqueles que queiram contratar com o Poder Público tenham iguais condições de assim fazê-lo.

Desta forma, é realizada uma competição entre eles, quem vence será contratado, firmando o contrato. Esse procedimento competitivo é chamado de Licitação.

A licitação faz a ponte entre o Poder Público e o particular. Os procedimentos para sua realização estão previstos basicamente nas Leis 8.666/93 (Lei geral de Licitações e Contratos) e 10.520/2002 (Lei do Pregão).

Quanto maior o volume da contratação, mais complexo será o rito procedimental estabelecido pela legislação.

As empresas que pretendem fornecer ao Poder Público devem possuir documentação idônea, apresentando para essa comprovação, diversas certidões negativas que demonstram não haver débitos com o próprio Estado, entre outras exigências.

Os atos do procedimento devem ser publicados, resguardando todos os princípios da Administração Pública: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.

- Quem deve se submeter ao regime das Licitações?

Segundo o art. 1º da Lei 8.666/93 (lei geral de Licitações e Contratos), todos os órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela união, estados, distrito federal e municípios.

Quanto à administração direta, não restam dúvidas quanto à aplicação da Lei geral de Licitações, uma vez que segue o regime de direito público.

Em tese, conforme visto, as empresas públicas e sociedades de economia mista (estatais), como é o caso da Petrobrás, mesmo possuindo natureza de direito privado, também devem obediência ao referido dispositivo. Além disso devem prestar contas ao TCU, realizar de concurso público, observar os princípios estabelecidos no art. 37 da Constituição da República.

Já falei um pouco mais acerca das estatais no artigo “O que é privatização?

- Porque a Petrobrás não se submete ao regramento da Lei geral de Licitações e Contratos?

Desde a quebra do monopólio estatal na exploração e distribuição de petróleo ocorrida na década de 90, a Petrobrás passou a concorrer com outras empresas da iniciativa privada.

Como disse anteriormente, a licitação é um procedimento complexo e burocrático, e sua finalização em muitas vezes pode demorar bastante, em vista da possibilidade de recursos e outros meios impugnativos.

Enquanto as concorrentes estavam livres das amarras que limitam a atuação dos entes públicos, a Petrobrás se veria presa e, consequentemente, não teria condições de brigar no mercado, por conta da precariedade e burocracia dos seus instrumentos de gestão (essa foi a tese levantada à época).

Assim, foi criado um regime diferenciado e simplificado para a Petrobrás, visando dar celeridade nos procedimentos para contratação de particulares e desburocratizando o seu andamento. Na verdade, as normas de direito público foram flexibilizadas para atendimento à Petrobrás.

A Petrobrás então deixou de seguir o regramento previsto na Lei 8.666/93 e passou a se orientar pelo Decreto 2.745/98, que tem fundamento de validade no art. 67 da Lei 9.478/97, normas que estabeleceram o procedimento diferenciado e simplificado.

- O procedimento Licitatório Simplificado da Petrobrás é constitucional?

Há posicionamentos nos dois sentidos (pela constitucionalidade e pela inconstitucionalidade):

- Pela Constitucionalidade:

                . A Petrobrás é exploradora de atividade econômica e exerce suas atividades em regime de concorrência com os entes da iniciativa privada, adequando-se ao que determina o art.  119 da Lei geral de Licitações e Contratos;

                . A Petrobrás, empresa integrante da Administração Indireta, está submetida ao princípio da legalidade e, portanto, deve cumprir o art. 67 da Lei n° 9.478/97 e o Decreto n°

2.745/98, que permanecem vigentes, e determinam que os contratos celebrados por ela, para aquisição de bens e serviços, serão precedidos de procedimento licitatório simplificado, afastando a aplicação da Lei n° 8.666/93;

- Pela Inconstitucionalidade:

. O art. 37 da CF/88 não exclui as estatais da obediência aos princípios da Administração Pública;

. As estatais administram recursos públicos e, portanto, devem se submeter aos regramentos de controle e procedimentos inerentes ao Poder Público.

. As estatais não tem no lucro o seu objetivo fundamental e, portanto, perfeitamente possível a submissão aos ditames regentes da Administração Pública.

. O art. 173 da CF/88 determina que lei ordinária discipline o regime de licitações no âmbito das estatais que exercem atividade econômica, o que até o presente momento não ocorreu. Devendo permanecer como regra a aplicação da Lei 8.666/93, excepcionando-se a sua aplicação apenas em casos que possam inviabilizar o andamento de suas atividades.

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O Tribunal de Contas da União já manifestou-se em mais de uma oportunidade pela inconstitucionalidade da regime licitatório simplificado na forma como está. Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal (STF) nas hipóteses em que foi chamado a decidir acerca dessa situação (em sede de controle concreto), deliberou pela sua constitucionalidade, em análise liminar de vários mandados de segurança.

- O regime Licitatório Simplificado foi o responsável pelos desvios e corrupções na Petrobrás, descobertas pela operação Lava Jato?

É claro que não. Logicamente a fragilidade nos procedimentos previstos no decreto 2.745/98 facilitam a atuação de pessoas que não tenham compromisso com o interesse público. Assim, entendo que o regime licitatório simplificado da Petrobrás colaborou para a ocorrência dos desvios, conforme temos acompanhado pelos meios de comunicação.

Só para exemplificar o procedimento previsto para a Petrobrás prevê que na hipótese em que exista apenas uma empresa cadastrada em determinado segmento, não haveria necessidade de competição, basta contratar diretamente.

A concorrência entre as empresas é que faz com que o Poder Público obtenha a proposta mais vantajosa, em preço e qualidade. Na lei 8.666/93, a contratação direta somente é possível em situações excepcionais. Esta previsão do decreto 2.745/98 não possui afinidade com nenhum dos dispositivos da lei geral de licitações.

Claro que o decreto sozinho não seria capaz de gerar enriquecimento ilícito e prejuízos ao Estado. Agentes públicos de má índole, sem compromisso com o interesse público, pelo contrário, que atuam levados apenas pelos seus egoístas e mesquinhos interesses, trataram de aproveitar-se das tantas brechas normativas. E ainda empregaram outros artifícios para obtenção ilícita de dinheiro público.

- Apenas a Petrobrás possui esse regime diferenciado?

Não. Já tive oportunidade de escrever acerca dos entes que compõem o chamado sistema “S”, os serviços autônomos. São as entidades como o SESC, SEST, SENAT, SESI entre outras. Elas também não se submetem à lei geral de licitações e contratos, apesar de gerirem recursos públicos.

- A atual Lei de Licitações e Contratos é adequada para fazer frente a esse universo de corrupção enfrentada pelo país?

Logo logo escreverei artigo explicando melhor sobre a lei de licitações, onde poderei demonstrar mais claramente os seus aspectos. Mas já adianto que a referida norma está ultrapassada e necessita urgentemente de reformas para adequá-la à evolução tecnológica e equipá-la com mais instrumentos para o controle da corrupção.

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Sobre o autor
Edmar Oliveira da Silva

Advogado e Professor Advogado especialista em Direito Público, consultor em Licitações e Contratos Administrativos, Mestre em Gestão Social; Professor e Coordenador do Curso de Direito do UNEC Nanuque. Acesse o nosso Blog: www.direitonarede.com

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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