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Quem você salvaria primeiro: policial ou traficante?

A enquete de Fátima Bernardes

Resumo:


  • Fátima Bernardes propôs uma enquete sobre quem deveria ser socorrido primeiro, um policial levemente ferido ou um traficante gravemente ferido, e a maioria escolheu o traficante em estado mais crítico, alinhando-se ao juramento de Hipócrates que preconiza a igualdade no atendimento médico.

  • A enquete gerou controvérsia e foi criticada pelo presidente Jair Bolsonaro, que defendeu a priorização do atendimento aos policiais e criticou a abordagem dos direitos humanos na mídia.

  • O debate levantou questões sobre liberdade de expressão, direitos humanos e a importância de tratar todos igualmente, independentemente de seu status social ou legal, destacando a necessidade de reflexão sobre valores e preconceitos na sociedade.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O problema dos direitos humanos no Brasil está nos conservadorismos ("bandido bom é bandido morto", na ideia de "criminoso nato"...), que nada contribuem para diminuir as causas reais da criminalidade.

A apresentadora Fátima Bernardes fez enquete [utilitarismo] sobre preferência aos primeiros socorros: traficante ou policial. A maioria dos convidados escolheu [utilitarismo] salvar, primeiramente, o traficante.

Contudo, que fique claro, a apresentadora fez a seguinte pergunta:

"Quem você salvaria primeiro, um policial levemente ferido ou um traficante em estado grave?"

Ou seja, o policial não corre perigo de vida, enquanto o traficante está em perigo de vida.

Entre os convidados, a apresentadora pede que o médico Bernardes possa participar. O médico — honrando o juramento de Hipócrates — asseverou que durante atendimento não há discriminação, pois todos são seres humanos. Ou seja, não importa a condição socioeconômica, étnica, religiosa, sexual, se criminoso ou não, se político ou não. Eis o primado do juramento de Hipócrates: a vida.


REPERCUSSÃO

Jair Bolsonaro se manifestou contra a enquete e a favor dos policiais:

"Uma mídia completamente parcial. Haja vista a questão que aconteceu agora, de Fátima Bernardes, que prefere conduzir o seu programa dando mais atenção a traficante ferido do que um policial, um herói, a serviço nosso nas ruas"

"Uma política completamente equivocada sobre os Direitos Humanos, onde só a bandidagem encontra guarita contra esses também marginais defensores dos Direitos Humanos"

"Vamos cada um de nós fazer a nossa parte, combater o politicamente correto. Botar um fim nos Direitos Humanos, revogar o fim da audiência de custódia, buscar maneira de a mídia valorizar esses verdadeiros heróis, que arriscam as suas vidas 24 h por dia em defesa da população de bem. Revogar também o Estatuto do Desarmamento entre outras medidas"


A LIBERDADE DE EXPRESSÃO

Nenhuma democracia sobrevive sem a liberdade de expressão. A liberdade de expressão, um desdobramento da liberdade de expressão, permite que os cidadãos possam pensar por si mesmo. O cerceamento à liberdade de imprensa é típico de Estado Déspota. Enquetes sempre são necessárias para tirar da zona de conforto os seres humanos, os quais, por condição natural, sempre procuram um porto seguro. Mudanças causam medos, pois mudar exige o inquirir pessoal e coragem para mudar. Auscultar os próprios pensamentos, estes formados pela junção de valores familiares e culturais, é enfrentar dogmas, tabus, noções de civismo. Ora, no início do século XIX o "bom cidadão" era quem escravizava, quem batia em mulher em nome da honra — ou a mulher que perseguiam mulheres que desafiam os "bons costumes"; neste aspecto interessante a teoria do criminoso nato de Cesare Lombroso sobre "mulher prostituta": a mulher que não obedecia, cegamente, ao homem, era uma criminosa nata prostituta.

Fátima exerceu o direito de liberdade de expressão. Isso é democracia. Além disso, ela criou um situação de prioridade no atendimento médico.


OS DIREITOS HUMANOS

Os direitos humanos, em analogia, seguem o pensamento de Hipócrates: todos são iguais e merecem o mesmo tratamento: quem está uma condição desigual, merece o amparo necessário para igualar ao igual. Na enquete de Fátima, o traficante, que também é ser humano, não está com os sinais vitais iguais ao do policial; este se encontra em situação de menor potencial de perigo de vida.

O problema dos direitos humanos no Brasil está nos conservadorismos "Bandido bom é bandido morto" e "Criminoso nato". Ora, como já explanei várias vezes, os conservadores não se perguntam sobre suas posturas de bons cidadãos, como "Costela de Adão" [homem é sempre superior à mulher], "Patriotismo ou ponta de baioneta" [bom exemplo é quanto às ações de policiais, no início do século XIX, os quais combatiam os desordeiros "sambistas" e "capoeiristas"; ou qualquer ação estatal contra movimentos sociais, como os que ocorreram a partir de 2013]. Desafiei os conservadores — seletividade penal — quanto ao tipo de criminoso nato. Seriam os ladrões de energia elétrica e água potável, os cidadãos que sonegam o Imposto de Renda, os condutores que cometem crimes de trânsito, os indivíduos que cometem violência doméstica, os perseguidores dos LGBTIs, a prática de corrupção (passiva e ativa) para "abafar" o ato infracional na condução de automotor, os pais que ensinam a "supremacia branca", os professores que se sentem "deuses" nas salas de aulas, o cidadão que vende seu voto para candidato em época de eleição, o cidadão que vende seu voto para conseguir furar fila no SUS, o médico que vende atestado médico, o engenheiro civil que coloca fiação incompatível com a carga elétrica, o dono de padaria ou supermercado que vendem alimentos com datas vencidas, os operadores de Direito que rasgam o Código de Ética?

Eis o problema dos direitos humanos, não somente no Brasil, mas nos países democráticos. A vitória de Donald Trump foi possível com o aspergir de promessas conservadoras, e a maioria dos que votaram nele eram conservadores. São os cidadãos que querem o retorno da "supremacia branca", do antigay, antifeminismo, antiestrangeiro e tantos outros "anti".

Quando os direitos humanos começaram a ser aplicados com força total na década de 1990, o Estado do Bem-Estar Social, conservadores foram contrários. Nas redes sociais não faltaram repúdios aos programas sociais, que começaram pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Depois vieram Lula e Dilma. Dilma fora atacada também por ser mulher, como o decalque colado na entrada do tanque de combustível, sendo a imagem da presidente de pernas abertas — alguém já viu algum decalque de homem (político) de quatro na entrada da tubulação do tanque de combustível?

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De 1891 até 1988, o que realmente se fez para diminuir as desigualdades sociais? A partir de 1990, avanços, significativos se fizerem, e os relatórios da ONU atestam os avanços conseguidos nas últimas décadas. No Portal Brasil, notícia de que o “Brasil apresenta avanços em nutrição durante encontro mundial”. O problema desses avanços aos direitos humanos está na revolta dos conservadores (utilitaristas) em ter seus parâmetros de vida modificados. A zona de conforto quando é modificada, bruscamente, como tem sido pelos direitos humanos — Guerra da Secessão, nos EUA, Revolução Francesa, Revolução Russa de 1917, Guerra dos Marimbondos (Brasil), Revolta da Chibata (Brasil), Ministério Público e chute na imagem de Nossa Senhora; os direitos civis nos EUA, na década de 1960; a Revolução pela Paz, de Mahatma Gandhi — criam revoltas nos conservadores, os quais como náufragos se agarram, desesperadamente, as suas ideologias.

Existem seres humanos, indiferentemente de etnia, religião, sexualidade, morfologia, os quais querem o caso, pois pelo caos se lucra. Alguns apenas promovem o caos pelo desejo de se vingar contra tudo e todos, mas a vingança nada mais é do que lança de projeção dos próprios tormentos internos. Como se pode exigir justiça se há irreal justiça? Abuso de autoridade, corrupção começando pelos próprios administrados, e se propagando pela máquina estatal. Se aplicarmos "bandido bom é bandido morto" pelo ângulo da cidadania (civismo), quantos cidadãos brasileiros estarão fora dos presídios? Os países Escandinavos têm qualidade de vida, assim como Japão, pois aplicam a generalidade dos direitos humanos. Países com extremas desigualdades sociais tendem a ter aumento de presídios, seletividade penal, alto consumo de drogas, lícitas ou ilícitas etc.

O crime de colarinho branco, este protegido pela cleptocracia (oligarquia e aristocracia), já lesou e matou muito mais do que os crimes cometidos com arma de fogo. Os assaltos nas vias públicas são visíveis, enquanto os crimes de colarinho e os crimes cometidos dentro dos lares (cifras criminais) não chegam ao conhecimento da sociedade — apesar de que a própria sociedade tem conhecimento de tais crimes: misoginia; homofobia; gayfobia; ateufobia; idosofobia; bullying; e tantas outras neuroses típicas da civilização.

O Brasil foi construído sob pilares discriminatórios, ideologias de "superioridade". O crime é cultural, como já expus alhures. É um mal, mas este mal é relativizado. A seletividade penal é condição de se manter arcaicas e perversas ideologias da Arquitetura da Discriminação.

Para finalizar, faço desafios aos que são contrários aos direitos humanos:

  1. Se o estuprador deve ser castrado, quem defende "mulher que anda quase pelada merece ser estuprada" também deve ser castrado?

  2. "Bandido bom é bandido morto", quem será? A começar pelos que furtam energia elétrica, principalmente durante o Carnaval? Pelo uso do preço psicológico, por exemplo, de R$ 1,99 (um real e noventa e nove centavos) para, por saber, o fornecedor, que moeda de R$ 00,01 (um centavo) está escassa, subtrair o dinheiro do consumidor e fraudar o Imposto de Renda?

  3. O Estado Máximo Penal em punir qualquer cidadão que não aja com civismo (aplicação das filosofias antes do século XXI) Será punido: os que não batem em mulher; os que não escravizam; os que não cometem abuso de autoridade; os professores que não batem em seus alunos os quais não aprendem suas matérias; as mães que não expulsam de seus lares as filhas que tiveram gravidez antes do casamento; os pais (homens) que não dão uma surra por dia no filho "efeminado"; o servidor público que não participar da norma interna "comparecer, mas não trabalhar".


REFERÊNCIAS

Noronha, E. Magalhães. Direito penal, volume 1: introdução e parte geral/ E. Magalhães Noronha. — 38 ed. Rev. E atual., por Adalberto José Q. T. De Camargo Aranha. São Paulo: Saraiva, 2004.

PENTEADO FILHO, Nestor Sampaio. Manual esquemático de criminologia / Nestor

Sampaio Penteado Filho. – 2ª. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012.

SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 5. Ed. Rev. E atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007.

WILKINSON, Richard; PICKETT, Kate. O Espírito da Igualdade – Por que razão sociedades mais igualitárias funcionam quase sempre melhor. Coleção: Sociedade Global. Nº na Coleção: 40. Data 1ª Edição: 20/04/2010. Nº de Edição: 1ª. Editora Presença.

Youtube. Enquete de Fátima Bernardes. Disponível em: https://youtu.be/bo5VkYJHgwo

Youtube. Jair Bolsonaro contra a enquete de Fátima. Disponível em:https://youtu.be/O6CasLdje0Y

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Sobre o autor
Sérgio Henrique da Silva Pereira

Articulista/colunista nos sites: Academia Brasileira de Direito (ABDIR), Âmbito Jurídico, Conteúdo Jurídico, Editora JC, Governet Editora [Revista Governet – A Revista do Administrador Público], JusBrasil, JusNavigandi, JurisWay, Portal Educação, Revista do Portal Jurídico Investidura. Participação na Rádio Justiça. Podcast SHSPJORNAL

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HENRIQUE, Sérgio Silva Pereira. Quem você salvaria primeiro: policial ou traficante?: A enquete de Fátima Bernardes. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4895, 25 nov. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/54064. Acesso em: 22 dez. 2024.

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