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Abono de permanência: suporte fáctico, preceito e a impossibilidade de conversão em abono de afastamento

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6. Conclusões

À guisa de conclusão, pode-se dizer que:

O suporte fáctico do abono de permanência prevê dois elementos: a) completar as exigências para a aposentadoria voluntária e; b) optar por permanecer em atividade, sendo que este segundo elemento se subdivide em dois: optar + permanecer em atividade, sob pena de se violar a finalidade constitucionalmente buscada pelo instituto - retardar a necessidade de contratação de novos servidores, pelo fato de servidores que já podem se aposentar voluntariamente decidirem postergar o seu efetivo desligamento da ativa -, e como forma de evitar o triunfo do venire contra factum proprium.

Consequência dessa descrição dogmática que enxerga a “permanência em atividade” como elemento do suporte fáctico do abono de permanência é o fato do servidor só fazer jus ao benefício enquanto “permanecer em atividade”, pois no momento em que ele se afasta da ativa (exceto situações de repouso semanal, férias, licenças, e eventualmente outras desse jaez) deixa de satisfazer um dos requisitos constitucionais previstos no suporte fáctico da norma, que passa a ser “insuficiente”, deixando de incidir e, por consequência, de produzir efeitos.

Quanto ao preceito do abono de permanência, a regra diz ser este equivalente ao valor da contribuição previdenciária, ele não significa uma isenção, mas sim um adicional pago ao servidor que toma por base de cálculo o valor da contribuição previdenciária.

Existe uma norma tributária que prevê a cobrança da contribuição previdenciária incidente sobre a remuneração do servidor. E existe uma outra norma, de natureza administrativa, cujo preceito (consequência) institui um adicional, chamado abono de permanência, que tem como base de cálculo o valor da contribuição previdenciária devida.

Feita a descrição e à luz dos contornos do modelo teórico apresentado, desde logo se pode analisar duas questões práticas de grande relevo:

Primeiro, a efetiva permanência na ativa é o elemento a ser levado em conta para demarcação do marco temporal de cessação do adicional em tela, a menos que se queira defender a criação, por via interpretativa, de um suposto abono de afastamento, com suporte fáctico diferente do abono de permanência, não previsto na Constituição e ofensivo ao princípio da isonomia.

Segundo, se o servidor público recebe, quando já se encontrava em gozo do abono de permanência, por meio de precatório judicial, determinadas verbas remuneratórias não pagas no tempo devido, nesta situação deve incidir contribuição previdenciária sobre estas verbas, pois o preceito do adicional em comento não tem natureza jurídica de uma isenção tributária.


Referências.

ADEODATO, João Maurício. Ética e Retórica: para uma teoria da dogmática jurídica. São Paulo: Saraiva, 2002.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1583122/PI, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 25.05.2016.

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 196590/AL, Primeira Turma, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 14.11.1996, p. 44492.

BRASIL. Tribunal de Justiça de Goiás, Mandado de Segurança nº 335536-22.2013.8.09.0000, 3ª Câmara Cível, Rel. Des. Beatriz Figueiredo Franco, julgado em 25/11/2014, DJe 1682 de 02/12/2014.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 34ª ed., São Paulo: Malheiros Editores, 2008.

MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade, 3ª ed., 12ª tir, São Paulo: Malheiros, 2004.

MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do Fato Jurídico – Plano da Existência. 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2003.

MELO, Angelo Braga Netto Rodrigues de. Substituição Tributária Progressiva no ICMS: Teoria e Prática, Porto Alegre: Núria Fabris Editora, 2008.

MICHAELIS. Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php>. Acesso em: 16 jul. 2016.

PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1974, t. 1.

VASCONCELOS, Pedro Pais de. Teoria Geral do Direito Civil. 8ª ed., Coimbra: Almedina, 2015, p. 242.


Notas

[1] Referida advertência também foi lançada em estudo anterior: MELO, Angelo Braga Netto Rodrigues de. Substituição Tributária Progressiva no ICMS: Teoria e Prática, Porto Alegre: Núria Fabris Editora, 2008, p. 24.

[2] ADEODATO, João Maurício. Ética e Retórica: para uma teoria da dogmática jurídica. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 31-33.

[3] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1974, t. 1, p. 5.

[4] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. 4 ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1974, t. 1, p. 25 e ss.

 [5] MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do Fato Jurídico: plano da existência. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 40 e ss.

[6] Art. 2º Observado o disposto no art. 4º da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, é assegurado o direito de opção pela aposentadoria voluntária com proventos calculados de acordo com o art. 40, §§ 3º e 17, da Constituição Federal, àquele que tenha ingressado regularmente em cargo efetivo na Administração Pública direta, autárquica e fundacional, até a data de publicação daquela Emenda, quando o servidor, cumulativamente:

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  I - tiver cinquenta e três anos de idade, se homem, e quarenta e oito anos de idade, se mulher;

  II - tiver cinco anos de efetivo exercício no cargo em que se der a aposentadoria;

  III - contar tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de:

  a) trinta e cinco anos, se homem, e trinta anos, se mulher; e

  b) um período adicional de contribuição equivalente a vinte por cento do tempo que, na data de publicação daquela Emenda, faltaria para atingir o limite de tempo constante da alínea a deste inciso.

  [...]

  § 5º O servidor de que trata este artigo, que tenha completado as exigências para aposentadoria voluntária estabelecidas no caput, e que opte por permanecer em atividade, fará jus a um abono de permanência equivalente ao valor da sua contribuição previdenciária até completar as exigências para aposentadoria compulsória contidas no art. 40, § 1º, II, da Constituição Federal.

[7] Art. 40. [...]

  § 19. O servidor de que trata este artigo que tenha completado as exigências para aposentadoria voluntária estabelecidas no § 1º, III, a, e que opte por permanecer em atividade fará jus a um abono de permanência equivalente ao valor da sua contribuição previdenciária até completar as exigências para aposentadoria compulsória contidas no § 1º, II. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003)

[8] Art. 3º É assegurada a concessão, a qualquer tempo, de aposentadoria aos servidores públicos, bem como pensão aos seus dependentes, que, até a data de publicação desta Emenda, tenham cumprido todos os requisitos para obtenção desses benefícios, com base nos critérios da legislação então vigente.

§ 1º O servidor de que trata este artigo que opte por permanecer em atividade tendo completado as exigências para aposentadoria voluntária e que conte com, no mínimo, vinte e cinco anos de contribuição, se mulher, ou trinta anos de contribuição, se homem, fará jus a um abono de permanência equivalente ao valor da sua contribuição previdenciária até completar as exigências para aposentadoria compulsória contidas no art. 40, § 1º, II, da Constituição Federal.

[9]MICHAELIS. Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php>. Acesso em: 16 jul. 2016.

[10] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. 4ª ed., Ed. Revista dos Tribunais: São Paulo, Tomo I, p. 80.

[11] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. 4ª ed., Ed. Revista dos Tribunais: São Paulo, Tomo I, p. 81.

[12] Sobre o assunto, vide MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do Fato Jurídico – Plano da Existência. 12ª ed., São Paulo: Saraiva, 2003, p. 141 ss.

[13] VASCONCELOS, Pedro Pais de. Teoria Geral do Direito Civil. 8ª ed., Coimbra: Almedina, 2015, p. 242.

[14] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 34ª ed., São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 496.

[15] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1583122/PI, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 25.05.2016.

[16] Art. 7o O servidor ocupante de cargo efetivo que tenha completado as exigências para  aposentadoria voluntária estabelecidas na alínea a do inciso III do § 1o do art. 40 da Constituição Federal, no § 5o do art. 2o ou no § 1o do art. 3o da Emenda Constitucional no 41, de 19 de  dezembro de 2003, e que opte por permanecer em atividade fará jus a abono de permanência equivalente ao valor da sua contribuição previdenciária até completar as exigências para aposentadoria compulsória contidas no inciso II do § 1o do art. 40 da Constituição Federal.

[17] Diga-se de passagem, ainda que fosse não seria possível desjuridicizar a pseudonorma isentiva da contribuição previdenciária no abono de permanência, uma vez que esta seria restrita às verbas mensais e não poderia ser ampliada a verbas anteriores, sob pena de violação ao art. 111 do CTN.

[18] BRASIL. Tribunal de Justiça de Goiás, Mandado de Segurança nº 335536-22.2013.8.09.0000, 3ª Câmara Cível, Rel. Des. Beatriz Figueiredo Franco, julgado em 25/11/2014, DJe 1682 de 02/12/2014.

[19] Para uma visão mais profunda das premissas teóricas aqui sucintamente utilizadas, confira-se: MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade, 3ª ed., 12ª tir, São Paulo: Malheiros, 2004.

[20] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 196590/AL, Primeira Turma, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 14.11.1996, p. 44492.

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Sobre o autor
Angelo Braga Netto Rodrigues de Melo

Especialista e Mestre em Direito pela UFAL. Professor de Direito Civil, Administrativo e Tributário dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação de diversas instituições de Ensino Superior. Autor do livro "Substituição Tributária Progessiva no ICMS - Teoria e Prática". Procurador de Estado. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MELO, Angelo Braga Netto Rodrigues. Abono de permanência: suporte fáctico, preceito e a impossibilidade de conversão em abono de afastamento. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 4944, 13 jan. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/55015. Acesso em: 26 abr. 2024.

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