As garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa em processo administrativo

28/04/2017 às 13:02

Resumo:


  • O princípio do devido processo legal, incluindo o contraditório e a ampla defesa, é uma garantia constitucional fundamental no âmbito do processo administrativo, conforme estabelecido no artigo 5º, LV, da Constituição Federal de 1988.

  • A Lei nº 8.112/90 e a Lei nº 9.784/99 regulamentam o processo administrativo e reforçam a necessidade de observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa, com o objetivo de proteger os direitos dos administrados e assegurar o correto cumprimento dos fins da Administração Pública.

  • A ampla defesa e o contraditório devem ser garantidos em todas as fases do processo administrativo, desde a instauração até o julgamento, permitindo que o servidor acusado ou litigante possa exercer sua defesa de forma efetiva, com o auxílio de advogado, se necessário, para assegurar a máxima efetividade dos direitos e garantias fundamentais.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Apresentar a imperiosa observância das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa no âmbito do processo administrativo, com os meios e recursos a ela inerentes, corolários do princípio constitucional do devido processo legal.

Resumo: O presente documento procura apresentar a imperiosa observância das garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa no âmbito do processo administrativo, com os meios e recursos a ela inerentes, corolários do princípio constitucional do devido processo legal. Além de breve análise do processo administrativo – conceito e seus aspectos, evidenciando, ao final, a importância dos direitos e garantias fundamentais na seara administrativa em homenagem ao Estado Democrático de Direito.

Palavras-chave: Processo administrativo, Contraditório, Ampla defesa.

1. INTRODUÇÃO

As garantias do contraditório e da ampla defesa encontram-se consagrados na Constituição da Repúbica Federativa do Brasil de 1988. Expressamente previstos, intrínsecos ao princípio do devido processo legal.

A Constituição da República de 1988 aduz em seu Inciso LV, artigo 5.º: "Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com meios e recursos a ela inerentes”.

 Ademais, a Constituição pátria trouxe expressamente declarada em seu texto à fórmula do “due process of Law” (devido processo legal), de origem anglo-saxônica, ao preceituar, no inciso LIV do artigo, que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.

Neste diapasão, o presente artigo objetiva tecer considerações acerca da atuação da Administração Pública e sua observância aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa na condução dos processos administrativos, conforme preceitua o inciso LV do art. 5º, da Constituição Federal de 1988. Resguardando o estado democrático de direito.

Referente à metodologia utilizada neste artigo, foram analisadas bibliografias, doutrinas, jurisprudência, Lei Federal nº 8.112/90 e nº 9.784/99, bem como a Constituição Federal de 1988.

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 e o devido processo legal. A Constituição pátria garante que não se priva ninguém da sua liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal e, ainda, que todos os litigantes em processo judicial ou administrativo e os acusados em geral têm assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes e a falta de defesa técnica por advogado, no âmbito do processo administrativo disciplinar, viola o princípio da ampla defesa.

Da Administração Pública e o processo administrativo. Entes públicos exercendo o controle através de medidas jurídicas e disciplinares cabíveis para o controle e regularização ao comportamento de seus administrados no âmbito de sua administração, inclusive utilizando muita das vezes do seu poder de polícia para elucidar e dirimir litígios.

O princípio do contraditório e da ampla defesa no âmbito do processo administrativo. Os princípios constitucionais são alicerces de um ordenamento jurídico que, em face da sua alta abstração e de veicularem valores, permeiam todo o sistema. A Constituição Federal de 1988, contrariamente às anteriores, prevê, de forma expressa, o princípio do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, inovando o ordenamento jurídico. Assim, não resta dúvida sobre a aplicação dos princípios nos processos administrativos em sentido amplo.

Indubitável, portanto, que sejam assegurados pela Administração Pública aos litigantes em processo administrativo e acusados em geral o contraditório e ampla defesa.

2. A CONSTITUIÇÃO DA REPÚLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 E O DEVIDO PROCESSO LEGAL

A Carta Magna de 1988, após longo período de regime autoritário traz de forma expressa em seu texto um amplo rol de direitos fundamentais, indispensáveis ao reconhecimento do estado democrático de direito.

Desta feita, para garantir a efetividade destes direitos, o próprio constituinte elencou um série de garantias, meios e instrumentos. Esta efetividade, em si, constitui um direito fundamental, posto que dela dependa a própria garantia de proteção judiciária, o que faz com que os meios de tutela devam ser adequados e hábeis para de fato pacificar os conflitos e realizar a justiça.

Cabe, assim, ao Poder Judiciário apreciar lesão ou ameaça de direito de forma definitiva, não sendo possível ao legislador infraconstitucional criar qualquer forma de restrição ao indivíduo de se dirigir ao Judiciário.

Os princípios constitucionais consagrados pela Constituição de 1988 são indispensáveis para o sistema jurídico brasileiro e, por este motivo, estes princípios precisam ser analisados e garantidos a todos. Um dos princípios mais abrangentes do ordenamento jurídico brasileiro é o que pretendemos analisar no presente artigo: o princípio do devido processo legal.

Em meio ao rol de garantias asseguradas aos cidadãos, há que se enfatizar o princípio do devido processo legal, inserido no artigo 5º, inciso, LIV, que tem como corolários o direito ao contraditório e à ampla defesa. Destaca-se do texto constitucional:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.

LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com meios e recursos a ela inerentes.[3]

Assim, Gil Ferreira de Mesquita aborda:

“No Brasil, a formalização da garantia do due process of law veio com a Constituição Federal de 1988, que em seu art. 5º, LIV, prevê que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal, sendo esta ordem complementada pelo inciso LV do mesmo artigo: aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. (MESQUITA, 2003).

Com efeito, o devido processo legal tem como consequência os princípios que regem o processo: o juízo natural, a isonomia das partes, o contraditório, a ampla defesa, a garantia da assistência judiciária, a publicidade e a imparcialidade dos julgamentos.

O Devido Processo Legal é o princípio-matriz, basilar, fundamental, gênero, núcleo, enfim, vários são os adjetivos sugeridos pela doutrina para enfatizar sua aplicação e importância visando à aplicação da justiça social.

A plena observância de tal princípio é vital para assegurar ao cidadão um processo justo e livre de qualquer espécie de nulidade. Como ensina José Henrique Mouta Araujo:

“Destarte, o devido processo legal é princípio basilar da atuação estatal no campo processual, assegurando e mesmo salvaguardando a proteção judicial para todos aqueles que lamentam pretensões em juízo através de um processo adequado e justo.” (ARAUJO, 2008).

Por fim, vejamos algumas decisões do STF:

DUE PROCESS OF LAW E PRINCÍPIO DA LEGALIDADE.

- A garantia do devido processo legal exerce-se em conformidade com o que dispõe a lei, de tal modo que eventual desvio do ato decisório configurará, quando muito, situação tipificadora de conflito de mera legalidade, apto a desautorizar a utilização do recurso extraordinário. Precedentes.”(RTJ 189/336-337, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

“– Alegação de ofensa ao devido processo legal: C.F., art. 5º, LV: se ofensa tivesse havido, seria ela indireta, reflexa, dado que a ofensa direta seria a normas processuais. E a ofensa a preceito constitucional que autoriza a admissão do recurso extraordinário é a ofensa direta, frontal.”(AI 427.186-AgR/DF, Rel. Min. CARLOS VELLOSO)

Inviável o processamento do extraordinário para debater matéria infraconstitucional, sob o argumento de violação ao disposto nos incisos LIV e LV do artigo 5º da Constituição.Agravo regimental improvido.”(AI 447.774-AgR/CE, Rel. Min. ELLEN GRACIE) (grifei).

Assim, o devido processo legal é um instrumento apto para efetivar as garantias constitucionais de todos nós, cidadãos. Haja vista, que sua aplicação ao caso concreto visa inibir a arbitrariedade que se consubstancia na violação das já mencionadas garantias e ainda, o devido processo legal é garantia constitucional que ilumina todas as funções estatais, isto é, a função jurisdicional, legislativa e, administrativa.

3. DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E O PROCESSO ADMINISTRATIVO

3.1 . A importância do processo na Adimistração Pública

No Brasil, inobstante a implantação da Disciplina de Direito Administrativo ter ocorrido em 1851, até bem pouco tempo não se falava em processo administrativo, surgindo, muito tempo após, em 29 de janeiro de 1999, a Lei 9.784, Lei do Processo Administrativo no âmbito federal, como marco no estudo da processualidade administrativa brasileira. Sua gênese tem embasamento no artigo 5º, inciso LIV, CF/88, que trata do devido processo legal, bem como no inciso LV, que trata dos princípios do contraditório e da ampla defesa.

Existem vários procedimentos administrativos nos quais a Administração Pública figura em uma extremidade e o administrado, como parte, na outra. Nestes casos o administrado irá exercer o direito subjetivo na defesa de interesses exclusivamente privados, havendo o interesse público de um lado de ser resistido pelo interesse privado do outro. Exemplos destes procedimentos são os processos de desapropriação, imposições de multas e processos disciplinares contra servidores públicos.

A idéia de processo administrativo é, antes de tudo, uma decorrência dos princípios constitucionais da legalidade e do devido processo legal. A Constituição de 1988 consignou (artigo 5º, LV) que aos litigantes em processo judicial ou administrativo deverá ser assegurado o contraditório e a ampla defesa, com todos os meios e recursos a ela inerentes. Houve quem criticasse a locução constitucional sustentando que, nos processos internos à Administração, não haveria a noção de litígio, inexistindo pois, litigante. Porém, a garantia constitucional já predicava a necessidade de maiores contornos processuais ao agir da Administração Pública.

Por sua vez, de suma importância ressaltar que os Poderes Legislativo e Judiciário da União, no exercício de função administrativa, também, devem obediência as regras situadas na lei nº 9.784/99. O princípio da separação dos poderes, previsto no art. 2º da Constituição Federal, cláusula pétrea – não pode ser abolido do texto constitucional – não separou as funções estatais de forma absoluta, de modo que ao lado das funções típicas, encontram-se as funções atípicas. Assim, atipicamente, o Legislativo e o Judiciário exercem função administrativa e se submetem as regras da lei federal 9.784/99, quando, por exemplo, instauram processos administrativos no âmbito das respectivas repartições.

Anteriormente foi afirmado que as regras da lei nº 9.784/99 não se aplicam no âmbito estadual/distrital/municipal, pois se trata de norma de natureza federal. Ressalta-se que a regra comporta exceção conforme entendimento massificado dos tribunais superiores. Assim, é possível a aplicação da referida lei de forma subsidiária no âmbito dos demais Estados-Membros, se ausente lei própria regulando o processo administrativo no âmbito local (STJ; REsp 1148460 PR 2009/0030518-0). Tal entendimento estende-se ao nível municipal e distrital.

Seguem julgados do Superior Tribunal de Justiça:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO APOSENTADO. REVISÃO DE PROVENTOS PELA ADMINISTRAÇÃO.DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA. TERMO INICIAL DO PRAZO DECADENCIAL.EDIÇÃO DE LEI ESPECÍFICA SOBRE O TEMA. EXISTÊNCIA DA LEI FEDERAL Nº 9.784/99. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA AOS ESTADOS E MUNICÍPIOS.SUPERVENIÊNCIA DA LEI DISTRITAL Nº 2.834/2001. FATO QUE NÃOINTERROMPE A CONTAGEM DO PRAZO JÁ INICIADO. DECADÊNCIA CONFIGURADA.

1. A Corte Especial deste Tribunal Superior consagrou o entendimento de que até a edição da Lei Federal nº 9.784/99 a Administração Pública poderia rever os seus atos a qualquer tempo, quando eivados de vícios e ilegalidades, conforme os enunciados das Súmulas nos 346e 473 do STF e o disposto no art. 114 da Lei Federal nº 8.112/90.Ficou estabelecido também que a lei que definisse prazo para que a Administração Pública pudesse revogar seus atos teria incidência somente a partir de sua vigência, não podendo retroagir. 2.No âmbito estadual ou municipal, ausente lei específica, a Lei Federal nº 9.784/99 pode ser aplicada de forma subsidiária, haja vista tratar-se de norma que deve nortear toda a Administração Pública, servindo de diretriz aos seus órgãos.Destarte, editada lei local posteriormente, essa incidirá apenas a partir dos atos administrativos praticados após sua vigência, não interrompendo a contagem do prazo decadencial já iniciado com a publicação da norma federal. 3. Com efeito, "a superveniência da Lei Distrital 2.834/01 não interrompe a contagem do prazo decadencial iniciado com a publicação da Lei 9.784/99, uma vez que sua única finalidade é aplicar, no âmbito do Distrito Federal, as regras previstas na referida lei federal" (REsp nº 852.493/DF, Relator o Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJe de 25/8/2008).4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1092202 DF 2008/0212281-9)

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSUALCIVIL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. AVERBAÇÃO DETEMPO DE SERVIÇO. REVISÃO DO ATO PELA ADMINISTRAÇÃO. LIMITES. DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA. DECISÃO EXTRA OU ULTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA. TERMO INICIAL DO PRAZO DECADENCIAL. EDIÇÃO DE LEI ESPECÍFICA SOBRE O TEMA. EXISTÊNCIA DA LEI FEDERAL Nº 9.784/99. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA AOS ESTADOS E MUNICÍPIOS. DECADÊNCIACONFIGURADA.1.Se a matéria foi devidamente suscitada nas razões recursais, a sua apreciação nos limites da devolução (princípio do tantum devolutum quantum appelatum) descaracteriza a alegação de julgamento extra ou ultra petita. Ademais, é cediço que o pedido emana de interpretação lógico-sistemática da petição inicial ou recursal, não podendo ser restringido somente ao capítulo que contenha a denominação "dos pedidos". Logo, devem ser levados em consideração todos os requerimentos formulados ao longo da peça processual, ainda que implícitos. 2. A Corte Especial deste Tribunal Superior consagrou o entendimento de que até a edição da Lei Federal nº 9.784/99, a Administração Pública poderia rever os seus atos a qualquer tempo, quando eivados de vícios e ilegalidades, conforme os enunciados das Súmulas nos 346 e 473 do STF e o disposto no art. 114 da Lei Federal nº 8.112/90. Ficou estabelecido também que a lei que definisse prazo para que a Administração Pública pudesse revogar seus atos teria incidência somente a partir de sua vigência, não podendo retroagir. 3. 9.784Destarte, editada lei local posteriormente, esta incidirá apenas a partir dos atos administrativos praticados após sua vigência, não interrompendo a contagem do prazo decadencial já iniciado com a publicação da norma federal. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.

 

Como se vê, ao estabelecer normas básicas sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Federal direta e indireta, o diploma em estudo preceitua que o seu primordial objetivo é de oferecer proteção dos direitos dos administrados e o melhor cumprimento dos fins da Administração. Essa norma contém a previsão de seu aproveitamento, também, no domínio dos Poderes Legislativo e Judiciário da União, quando estes venham a desempenhar a função administrativa.

3.2 . Dos princípios no âmbito do processo administrativo

A doutrina existente até há pouco tempo sobre processo administrativo e administração pública enumerava, com ligeiras mutações, os seguintes princípios que lhes são aplicáveis: legalidade, informalidade, moralidade, publicidade e eficiência, além dos princípios da ampla defesa e contraditório . A Lei 9.784/1999 adicionou ao rol já conhecido outros princípios, a saber: finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

3.3. Principio da Legalidade

O art. 37, caput, da Constituição pátria, preceitua que um dos princípios norteadores da Administração é o da Legalidade, sob pena de o administrador público ser responsabilizado por esta violação. A eficácia de todo desempenho da administração pública tem dependência da Lei, não há liberdade ou vontade pessoal do administrador o que importa é a obediência aos ditames e regras previstas no direito positivo, por isso que, referir-se ao princípio da legalidade é mencionar o total condicionamento do administrador à pretensão da Lei.

O insigne mestre administrativista HELY LOPES MEIRELLES , ao discorrer sobre o que significa o princípio da legalidade, leciona que "o administrador público está, em toda a sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei, e às exigências do bem-comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se à responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso". A força de toda atividade administrativa, assim, estaria dependente ao atendimento da lei, não possuindo, como se disse, nenhuma liberdade nem vontade pessoal do administrador público, posto ser de ordem pública a lei administrativa.

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A Lei Geral do Processo Administrativo determina que o administrador aja conforme a Lei e o Direito, devendo a interpretação da norma administrativa ser da forma que garanta o atendimento ao cidadão, como se observa do preceituado no seu art. 2º, parágrafo único, I e XIII.

3.4. Princípio da Finalidade

A finalidade do ato é seu intento finalístico. Todo ato administrativo procura obter uma finalidade de interesse da administração pública. Tem-se que o princípio da finalidade exige que o ato seja praticado sempre com finalidade pública. O administrador fica impedido de procurar outro fim ou de praticá-lo em seu próprio interesse ou em interesse de terceiros. Este princípio, o da finalidade, proíbe que o ato administrativo venha a ser praticado sem interesse público ou conveniência para a administração, mirando exclusivamente a atender interesses privados, por favoritismo ou acossamento dos agentes da administração pública. O administrador, ao agir contra este princípio, estará revelando o seu desvio de conduta, o que virá a constituir-se numa das modalidades de abuso de poder.

3.5. Princípio da Motivação

O art. 93, IX da CF/88 prevê que todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade. Na lei sob exame, esse mesmo princípio é consagrado ao estabelecer ela, no seu art. 2o, VII, bem como no seu capítulo XII, que a decisão do administrador deverá ter a indicação dos pressupostos de fato e de direito que a determinarem, bem como os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, em qualquer uma das hipóteses do seu art. 50, I-VII.

Pela apreciação da motivação dos atos emanados da administração pública é que se tem o controle de legalidade para averiguar se o ato do administrador foi praticado ressaltando-se os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, a partir da avaliação do nexo de causalidade entre os motivos e o resultado do ato respectivo.

O princípio da motivação é um direito implícito do cidadão e dimana da democratização dos valores regulados pela Constituição Federal. Ato administrativo, sem motivação, afronta o poder discricionário, enveredando nas raias do arbítrio.

3.6. Princípio da Razoabilidade e Proporcionalidade

A despeito de não constar no caput do Art. 37 da Constituição Federal, o princípio da razoabilidade ou da proporcionalidade possui registro na Constituição Federal , merecendo rica doutrina sobre o assunto e robusta jurisprudência.

Os princípios constitucionais da Administração Pública não poderiam ficar encapsulados apenas no Art. 37 do Texto Fundamental, porque a atual Carta de 1988 trouxe à tona numerosos dispositivos que resguardam a sociedade em múltiplos capítulos e artigos, incumbindo ao intérprete investigar o abarcamento de determinado conceito, conjuminando-os entre si, para não permanecer reprimido em uma mera leitura de um artigo avulso, sem descobrir a ampla aspiração constitucional.

O princípio da razoabilidade exprime a relação de congruidade entre o fato e desempenho concreto da administração pública. O princípio da razoabilidade é encontrado na Constituição Federal, precisamente no seu art. 1º, m que é preceituado que a República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito elenca a nação como Estado Democrático de Direito.

3.7. Princípio da Moralidade.

O princípio da moralidade administrativa está implantada na Carta Magna como um princípio fundamental a ser acatado pela Administração Pública. São desmesurados os desdobramentos da moralidade administrativa por atingir de modo central o aspecto axiológico das ações concretas desenvolvidas pelos agentes públicos.

No art. 5º, LXXIII, da Constituição pátria vigente , há a previsão de anulação de todo e qualquer ato administrativo que tenha sido praticado sob o vício da imoralidade, por intermédio de ação popular.

Não se deve olvidar, também, de ressaltar o pensamento do conspícuo magistrado JOSÉ AUGUSTO DELGADO, para quem? o princípio da moralidade administrativa não deve acolher posicionamentos doutrinários que limitem a sua extensão.

Assim, imoral é o ato administrativo que não respeita o conjunto de solenidades indispensáveis para a sua exteriorização; quando foge da oportunidade ou da conveniência de natureza pública; quando abusa no seu proceder e fere direitos subjetivos públicos ou privados.

4. DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA NO PROCESSO ADMINISTRATIVO

4.1 . Princípio do Contraditório no Processo Administrativo Disciplinar

O princípio constitucional do contraditório possui dupla fundamentação: lógica e política.

 Pela primeira, afirma-se o dever de se franquear às partes em litígio a necessária ciência bilateral sobre todos os atos e termos de natureza procedimental.

Já, pela segunda, há o sentido comum de que ninguém poderá ser ‘julgado’ sem ser ouvido, premissas que autorizam a apresentar o princípio do contraditório como sinonímia do chamado ‘amplo debate’.

Vale considerar, desde logo, os ensinamentos de Irene Patrícia Nohara (2009, p. 63) sobre o processo administrativo disciplinar, afirmando que se trata de meio de apuração de ilícito administrativo, o qual é obrigatório na aplicação de penalidades que impliquem a perda do cargo de funcionário estável.

No largo contexto do devido processo legal, emerge também o princípio da ampla defesa, que traduz a liberdade inerente ao indivíduo de, no âmbito de um Estado democrático como o nosso, alegar fatos e propor provas em defesa de seus interesses.

A ampla defesa, por sua própria expressão, abre espaço para que o interessa do litigante exerça, sem qualquer restrição, o seu direito de defesa, prerrogativa que não constitui mera liberalidade, mas verdadeiro interesse público, essencial a todo regime que se intitula democrático, devendo ser garantido em qualquer espécie de processo que envolva o poder decisório do Estado sobre pessoas físicas e jurídicas.

4.1 . Fase de constituição do Processo Administrativo Disciplinar

A primeira exigência do contraditório consiste na informação por meio dos atos de comunicação processual: a citação e a intimação. O processo sem citação é processo nulo; a citação irregular corresponde à citação inexistente e as intimações são indispensáveis a todo momento. Diante do princípio da instrumentalidade das formas fica afastada a anulação do processo quando por outro meio a parte tome conhecimento de uma prova ou da própria demanda.

O contraditório exige citação adequada e oportuna, ou seja, adequada a colocar o servidor acusado/litigante a par do motivo do processo administrativo disciplinar instaurado e oportuna em relação ao momento posterior à acusação.

4.1.1. Motivação suficiente do ato de instauração do processo administrativo disciplinar

A primeira exigência do contraditório reside na motivação do ato de instauração do processo administrativo disciplinar. A autoridade não pode instaurar processo disciplinar, sindicância, procedimento de avaliação periódica de desempenho, processo para apuração de descumprimento às exigências do estágio probatório ou processo de exoneração do servidor estável por excesso de quadros sem externar os motivos de sua decisão.

A Lei nº 8.112/90 não exige, expressamente, motivação do ato de instauração do processo administrativo disciplinar. Entretanto, é possível a aplicação subsidiária do artigo 26, caput, e § 1º, da Lei nº 9.784/991, regra inerente ao princípio do contraditório.

Realmente, a própria Lei nº 8.112/90 deixa claro: quando a administração “instaura” “processo disciplinar” está pressupondo a existência de responsabilidade administrativa a ser apurada, conforme configura o artigo 148 da citada lei. Em outras palavras, tal afirmação corresponde a uma acusação. Em razão da regra da obrigatória motivação deste ato administrativo, a Administração terá de descrever, no mínimo, o fato punível a um específico servidor e sua aplicação, o seu enquadramento legal.

4.1.2. Citação oportuna

A citação oportuna é aquela imediatamente posterior à formalização da acusação, exsurgindo desse ato a relação jurídica processual. Esta é o ato administrativo pelo qual se leva ao conhecimento do indiciado a instauração do processo e se faz sua convocação para apresentação de defesa.

Como o contraditório está presente em todas as fases do processo, a validade dos atos processuais depende da formação da relação jurídica processual, propiciada pela citação, tornando completa e eficaz a relação processual.

A importância da regra faz-se presente na instrução: a citação tem de ser posterior à instauração, porque deve ser anterior à instrução.

O servidor, como sujeito processual, tem o direito de participar da formação da prova. Na mesma linha de raciocínio, é importante a análise do artigo 156 e do § 1º do artigo 161, ambos da Lei nº 8.112/902. Os atos processuais descritos no art. 156 estão ligados à fase de instrução do “processo disciplinar”.

O chamamento do servidor ocorre com a devida antecedência a fim de garantir a participação na instrução. Já os atos do art. 161 estão ligados à fase posterior em que a Comissão Processante tem até a oportunidade de reformular a acusação, “intimando” o servidor para defender-se.

No regime do Estatuto atual (art. 156), o servidor é chamado para participar diretamente da fase instrutória. Podemos dizer que o contraditório assegurado na fase de constituição segue em todo o curso do processo até decisão final. O “chamamento” do servidor anteriormente à instrução, além de representar a concretização do núcleo mínimo irradiado pelo contraditório no sistema jurídico, deve ser interpretado como ato de citação por meio do qual a Administração convoca o servidor para integrar a relação jurídica processual e não simplesmente para “acompanhar o processo”.

Não há citação posterior à instrução.Instrução sem contraditório não tem validade processual. A citação é ato essencial, integrante da fase constitutiva do processo. A própria existência do art. 161 confirma a tese.

4.1.3. Citação adequada

A citação deve propiciar ao servidor acusado ou litigante o inteiro conhecimento da ação e dos autos do processo, assim como delimitar o prazo de manifestação a respeito da acusação.

O ato de citação deve não somente chamá-lo ao processo, mas informá-lo dos fatos a ele imputados, da devida fundamentação e da sanção aplicável. Exige-se, por consequência, motivação explícita, clara e congruente. Assim, estará o servidor capacitado a participar da fase instrutória.

 O servidor tem o direito de “acompanhar o processo pessoalmente ou intermédio de procurador” (aludido no art. 156 da Lei nº 8.112/90). Silencia-se, porém, quanto à citação do servidor logo após a acusação. Em uma interpretação lógica já levaria a tal consequência, pois, se o servidor tem o direito de “acompanhar” todo o processo, terá de ser chamado logo após a sua instauração. Não deixa expressa também a oportunidade de manifestação sobre a acusação, sendo tida como implícita.

O princípio constitucional fala quando a lei se cala. Se ao defensor não for oferecida a chance real e consistente de se pronunciar, de forma genérica e ampla, sobre a acusação, antes da instrução, ter-se-á uma instrução dirigida unilateralmente para comprovação do deduzido na acusação.

Depois da citação do ato de instauração do processo disciplinar e antes da abertura da fase instrutória, a Administração deve conceder prazo de 10 (dez) dias para que se apresente defesa escrita, por aplicação analógica do art. 161, § 1º, da Lei nº 8.112/90.

O thema probandum é o que em cada processo deve ser matéria da atividade probatória, consistindo na afirmação dos fatos, objetos de debate. Se a defesa não puder manifestar-se sobre a acusação antes da instrução, não participará da fixação do thema probandum. Onde não há controvérsia sobre os fatos alegados, a questão reduz-se à mera aplicação do direito. Afinal, como o diálogo contraditório pressupõe a colocação do problema – demarcando e circunscrevendo o objeto da controvérsia –, se a instauração tiver início sem que a questão fática esteja questionada, sem que a causa processual esteja delimitada, não se estará diante de uma instrução pautada pelo princípio do contraditório.

4.2. Fase de instrução

Vista a premissa de incidência do contraditório na fase de constituição do processo administrativo disciplinar, é observado que seu alcance implica que deva ser dado conhecimento da ação e de todos os atos do processo às partes, bem como a possibilidade de responderem e, de produzirem provas próprias, adequadas e pertinentes à demonstração do direito que alegam.

Em virtude do contraditório, o processo caracteriza-se como aquele em que é assegurado às partes interessadas o direito de contestar a pretensão que lhes for contrária, de modo que nenhum elemento novo pode nele ser introduzido sem prévio conhecimento delas. Observa-se como regras da instrução contraditória: a garantia da imparcialidade administrativa dos agentes administrativos e a de que ninguém pode ser condenado sem ser ouvido. Tais ponderações demonstram a exata dimensão da fase de instrução na qual se pretende garantir a audiência do acusado, a publicidade do conteúdo dos autos, o direito à produção de prova e a possibilidade de apresentação de alegações.

A instrução designa, sob o prisma processual, a preparação para o provimento final que se dá através da atividade probatória e das alegações feitas no processo, existindo em vários níveis, na prova e fora da prova.

4.2.1. Fase probatória

A fase probatória não se confunde com a fase de instrução do processo disciplinar, regulada pela Lei nº 8.112/90.

O momento da admissão e produção das provas ou, a chamada fase de instrução, constitui a primeira fase do inquérito administrativo. Diante do exame do conjunto probatório, a Comissão formula novo juízo de acusação “tipificando a infração disciplinar” e “formulando a indicação do servidor” (art. 161).

A determinação prévia dos servidores que poderão compor a Comissão de inquérito administrativo garante a imparcialidade do processamento do feito, bem como a independência do juízo em relação às partes envolvidas, para se alcançar um julgamento objetivo e sem qualquer prejulgamento. Ao tratar do princípio do juiz natural, Romeu Felipe Bacellar Filho (2005, p. 88) ensina que a comissão deve ser permanente, para evitar que o administrador, ao seu talante, selecione os membros integrantes com o intuito preconcebido de absolver ou punir.

Por isso, abre-se a fase de defesa, momento em que se propicia a contestação da acusação anteriormente formulada. Contudo, se a acusação for alterada, dependendo da análise dos fatos nela contida, será necessária a reabertura da fase probatória.

A análise da fase probatória pressupõe o conhecimento do sentido de prova no sistema processual contraditório. A prova visa à descoberta da premissa normativa do caso administrativo e não há prova sem contraditório.

O direito à prova é corolário do princípio do contraditório. De nada adianta a participação sem a possibilidade do uso dos meios necessários à demonstração das alegações. Dessa forma, o direito à prova é resultado da necessidade de ser garantir à parte a adequada participação no processo. O procedimento da prova não é senão uma manifestação particular do contraditório.

Não é por outra razão que Romeu Felipe Bacellar Filho (2005, p. 242) afirma que o equilíbrio do contraditório, no processo administrativo disciplinar, exigirá que o servidor acusado ou litigante possua, no mínimo, instrumentos para contrapor-se à competência da autoridade administrativa prescrita em lei.

A garantia do contraditório liga-se com o direito à prova. Nesse pensamento, garante-se a igual oportunidade de se pleitear a produção de provas, a equivalente possibilidade de participar dos atos probatórios e manifestar-se sobre seus resultados.

A fase pode ser observada a partir de dois pontos de vista. No primeiro sentido, configura juízo de averiguação e comprovação. No segundo, a prova auxilia na convicção do magistrado. A prova possui função instrumental em relação ao papel desempenhado pelos sujeitos processuais, ligada à técnica da razão dialética e da verdade provável, construída com relação à problemática do processo.

4.2.2. Fase de defesa

A fase de defesa constitui o segundo momento do inquérito administrativo do processo disciplinar.

Tal qual disciplinada pela Lei nº 8.112/90, no § 1º do artigo 161, tal fase transmite a falsa ideia de tratar-se da primeira defesa do servidor no processo. Isso, porque a defesa deve ser ensejada antes mesmo da fase probatória e logo depois da instauração do processo. A intimação do servidor para manifestar-se sobre a indicação formulada pela Comissão não corresponde à citação porque ele já deve ter sido chamado para integrar a relação processual; a designação de defensor dativo faz-se necessária já na fase constitutiva do processo quando o acusado, regularmente citado por Portaria de Instauração, não apresenta defesa.

A inserção do contraditório impede que o exercício do direito de dessa seja subtraído de alguma fase do processo administrativo disciplinar. O contraditório, mesmo não determinando exatamente o momento da oportunidade de defesa, veda o seu diferimento integral a uma fase processual posterior.

4.2.3. Fase do relatório ou das alegações finais

No regime da Lei nº 8.112/90, o relatório marca a última fase do inquérito administrativo. A comissão de inquérito conclui pela inocência ou responsabilidade do servidor (§ 1º do art. 165 da Lei nº 8.112/90) e, no segundo caso, indica o dispositivo legal ou regulamentar transgredido, bem como as circunstâncias agravantes ou atenuantes conforme preceitua o § 2º do art. 165 da lei supracitada. O relatório é objeto fundamental do “processo disciplinar”: a autoridade julgadora somente poderá dele divergir se contrário à prova dos autos (art. 168 da Lei nº 8.112/90).

O relatório constitui as alegações finais do órgão instrutor e acusador e, justamente pelo seu alto grau de vinculação à fase decisória, segue rígidas exigências legais de motivação. Do contraditório, faz-se necessário que as alegações finais do Estado-acusador sejam devidamente motivadas, a fim de possibilitar a resposta da defesa.

O contraditório é instrumentado pela motivação das alegações finais da comissão. Não somente porque serve de orientação ao órgão julgador, mas principalmente porque fornece subsídios para as alegações finais da defesa. O princípio do contraditório apresenta-se com dinamismo em ouvir a acusação, ouvir a defesa, em todos os momentos processuais importantes para a formação do convencimento do juiz administrativo.

De fato, às alegações finais da acusação devem seguir-se as da defesa, sob pena de quebra do liame contraditório entre os sujeitos processuais. A instrução só é realmente encerrada com o Relatório do órgão de instrução. Oportunamente, o contraditório vai além da oportunidade de ser ouvido antes da decisão final, para constituir-se na oportunidade de influir na formação do convencimento do julgador.

4.3. Fase de julgamento

O julgador não pode decidir uma questão quando ela não tiver sido, de algum modo, debatida pelas partes. É regra geral, aplicável a todos os processos, que a autoridade competente para o provimento final deve levar em conta o resultado do contraditório, a decisão deve corresponder à síntese da contraposição entre tese e antítese. As garantias constitucionais de defesa implicam o direito à consideração das razões deduzidas em juízo, compreendido na pretensão à tutela jurídica.

4.3.1. Garantias para o controle da realização da finalidade do contraditório

Na fase de julgamento a atenção deve ser ressaltada, pois constitui o momento decisivo da verificação do atingimento da finalidade do método processual contraditório. A motivação e a comunicação do ato decisório com as mesmas garantias da citação são regras instrumentais colocadas pelo sistema para garantir a realização do contraditório.

Assim como o contraditório é essencial tanto à fase de constituição do processo como à de instrução, é também essencial na fase decisória, pois o julgador deve levar em consideração o resultado da atividade das partes, dando continuidade ao diálogo iniciado. A portaria está diretamente vinculada ao momento da decisão. O motivo da punição está ligado ao motivo do processo nela expresso, de modo que o servidor somente poderá ser punido pelas irregularidades ali arguidas. Na decisão o órgão julgador está limitado pelos fatos debatidos pelos sujeitos processuais, esta não pode exceder os limites da conclusão, assim como devem ser levados em conta os elementos probatórios produzidos.

Sempre que a decisão final resultar da interação das atividades de mais de um órgão, a rigidez da motivação e da comunicação processual estende-se a ambos. Nessa acepção, aplica-se, em sede de processo administrativo disciplinar, o § 1º do art. 38 da Lei nº 9.784/99: “os elementos probatórios deverão ser considerados na motivação do relatório e da decisão”. Em virtude do princípio da legalidade e da tipicidade, compete à lei definir qual conduta configura ilícito administrativo e a sua correspondente sanção.

A punição sem justificativa nos elementos do processo é nula, porque deixa de ser ato disciplinar legítimo para se converter em ato arbitrário. Neste sentido, sanção administrativa, segundo Daniel Ferreira (2001, p. 34), consiste na direta e imediata consequência jurídica, restritiva de direitos, de caráter repressivo, a ser imposta no exercício da função administrativa, em virtude de um comportamento juridicamente proibido, comissivo ou omissivo.

Se a autoridade julgadora divergir do relatório para agravar a situação do acusado, em caso de surgimento de novos fatos, será imprescindível ter que apontar essa intenção antes de proferir sua decisão, cientificando previamente o acusado para que possa defender-se, incluindo a possibilidade de reabertura da fase instrutória.

Tendo em vista o estudo em análise, é possível afirmar algumas regras básicas para a motivação dos julgamentos administrativos, em sede do processo administrativo disciplinar, quais sejam:

1. O dever da autoridade julgadora de fazer referência aos argumentos expostos pelo servidor que serve tanto à comissão de inquérito/sindicância no relatório quanto para a autoridade julgadora, acrescentando-se neste último caso a exigência da exposição dos argumentos da comissão de inquérito/sindicância;

2. O dever da autoridade julgadora de decidir com base nos elementos constantes dos autos e não em sua ciência pessoal, devendo tanto a comissão de inquérito/sindicância quanto a autoridade julgadora expor os fundamentos de fato, com base no resultado da atividade instrutória do processo administrativo (§ 1º do art.38 da Lei nº 9.784/99);

3. A necessidade de colocação do texto completo da decisão, impossibilitando-se a remessa da decisão à releitura de outro documento processual; e 4. O enunciamento público das razões justificadoras da decisão prolatada, em coerência com o resumo dos principais acontecimentos processuais e a fundamentação fática e jurídica do dispositivo adotado.

4. O enunciamento público das razões justificadoras da decisão prolatada, em coerência com o resumo dos principais acontecimentos processuais e a fundamentação fática e jurídica do dispositivo adotado.

4.3.2 Direito de audiência do servidor acusado: garantia do contraditório.

Além dos instrumentos técnicos de garantia do contraditório, desenvolvimento inolvidável do princípio consiste no de audiência e presença física do acusado diante do órgão julgador. A interação subjetiva do servidor com seu julgador funciona como instrumento imprescindível para a adequada formação do convencimento deste, dando a mais ampla possibilidade de tomar posição, a todo momento, sobre o material que possa ser feito valer processualmente contra si.

No caso do processo administrativo e da sindicância, há dois órgãos decisórios: a comissão de inquérito/sindicância decide a instrução e a autoridade julgadora, determinada de acordo com o grau hierárquico tendo em vista a penalidade proposta, decide a causa ao final. No primeiro caso, a Lei nº 8.112/90 cumpre o princípio do contraditório ao prever o interrogatório do acusado perante a comissão. Já para o segundo, nada estabelece, justamente na situação em que o contato direito da audiência é ainda mais imprescindível, pois constituirá o único contato direto da autoridade julgadora com o processo, dada sua total incompetência para a realização de qualquer ato probatório (art. 169). O direito de audiência comportaria realização prática mediante a garantia de sustentação oral perante a autoridade julgadora.

Não resta dúvida de que o direito de audiência ou o direito de ser ouvido perante o órgão julgador constitui recurso inerente à ampla defesa inserido no julgamento contraditório.

4.4. Princípio da Ampla Defesa: direito à autodefesa e à defesa técnica

A Constituição de 1988 consagra o princípio da ampla defesa no artigo 5º, LV, como garantia fundamental do processo judicial e administrativo e o artigo 41, em seus incisos II e III, § 1º e artigo 247 acolhem tal princípio como garantia a ser obrigatoriamente observada em processo administrativo que possa resultar em perda do cargo de servidor estável. Afirmou-se explicitamente o status constitucional dessa garantia como princípio norteador de todo processo administrativo disciplinar, irrelevante a categoria do servidor – detentor de cargo, emprego ou função – ou mesmo a categoria de sanção a ser regulada pela lei.

É relevante frisar que a garantia do processo para a aplicação de penalidade disciplinar não significa estender a estabilidade a servidores que não a possuem. Igualmente, garante que a competência disciplinar deve manifestar-se como processo. Por exemplo, tratando-se de cargo em comissão, a Constituição permite a “livre” exoneração.

O termo “livre” permite ao Estado exonerar o servidor mesmo quando este não tenha praticado nenhuma conduta punível. A exoneração não é sanção administrativa, mas um ato administrativo através do qual o Estado afirma que não precisa mais do servidor.

Entretanto, quando o servidor comissionado pratica ilícito administrativo, a Administração tem o dever de ativar sua competência disciplinar através do processo. Moraes (2012, p. 111-112) consolida a ideia de ampla defesa, enfatizando que é de se dar ao réu condições que lhe possibilitem trazer para o processo todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade ou mesmo de omitir-se ou calar-se, se entender necessário e ainda, que enquanto o contraditório é a própria exteriorização da ampla defesa, implicando na condução dialética do processo, pois a todo ato produzido pela acusação caberá igual direito da defesa de opor-lhe a versão que melhor apresente, ou de promover uma interpretação jurídica diversa daquela feita pelo autor.

O princípio da ampla defesa é visto nas constituições ocidentais, embora receba em cada uma delas menor ou maior abrangência. A sua origem, segundo muitos autores, seria divina porque até Deus, em toda sua onipotência, deu a Adão a oportunidade de ser ouvido e defender-se antes de ser expulso do paraíso. O direito constitucional brasileiro, desde a Constituição de 1934, situa o direito de defesa como inerente ao processo administrativo para demissão de servidor estável.

No entanto, o Supremo Tribunal Federal frente à literalidade da regra constitucional, passou a decidir que a proteção estendia-se aos servidores concursados, embora não estáveis, vedando a prática de anulação de concurso após a nomeação dos candidatos, entendimento consolidado nas Súmulas 20 e 21. No âmbito do direito administrativo brasileiro, a garantia de defesa no processo disciplinar foi o ponto de partida para a compreensão de que, num Estado Democrático de Direito, o regime das sanções administrativas deve ser processual. Tal regime garante não somente que a Administração seguirá um procedimento, mas que este será informado pelo contraditório e pela ampla defesa.

 A questão do direito à defesa pessoal ou técnica é recorrente na doutrina quando se trata de ampla defesa. O direito à defesa significa, do ponto de vista funcional e técnico, a assistência de um defensor, sem excluir a possibilidade da defesa pessoal. A autodefesa constitui a possibilidade de o sujeito pessoalmente realizar as condutas e providências para preservar-se de prejuízos ou sanções. Envolve o direito de presença e o direito de audiência.

O direito de presença configura faculdade de assistir pessoalmente a realização de provas e contraditá-las, incluindo o direito de inquirir ou fazer inquirir testemunhas. O direito de audiência, em sentido estrito, consiste no direito de pronunciar-se oralmente ou dar explicações. A compreensão da defesa como direito de presença e direito de audiência vincula-se com o status processual ativo do servidor, graças à junção das garantias do contraditório e da ampla defesa. Quem se defende é um sujeito processual apto a participar do conjunto de atos processuais capazes de influenciar o convencimento do julgador.

O direito de audiência garante ao servidor acusado o contato direto com o órgão julgador, seja com a comissão de inquérito/sindicância, seja com a autoridade encarregada da decisão final.

O direito de presença vai além da autodefesa, relacionando-se com a defesa técnica. Para Figueiredo Dias, “essencial à consistência e eficácia da função de defesa é, evidentemente, a garantia do direito de presença do defensor às diligências de prova de que sejam passíveis quaisquer participantes processuais”.

Dessa forma, a regra do artigo 156 da Lei nº 8.112/90 representa concretização do direito de presença do servidor e de seu defensor4. A defesa técnica, por sua vez, é aquela realizada pelo procurador do interessado, o advogado, profissional dotado de capacidade técnica para a elaboração de uma defesa adequada. Esta constitui elemento indispensável da ampla defesa, sendo indiferente a gravidade da pena que possa resultar do processo.

A Constituição Federal, no art. 5º, LV, não assegura uma defesa qualquer, mas uma defesa ampla. Isso significa que a defesa não deve ser mais ou menos robusta conforme a intensidade da sanção que puder advir da decisão proferida no bojo do processo administrativo disciplinar: a mera possibilidade de o processo culminar em restrição à esfera jurídica individual do servidor reclama a maximização dos mecanismos de defesa.

4.4. Considerações Finais

 

Considerando que o inciso LV do artigo 5º da Carta Magna equiparou os processos judiciais e os administrativos, o princípio do devido processo legal, ou devido processo constitucional, tem aplicação em ambos, sem qualquer distinção.

O princípio do devido processo legal possui dimensão extensa, merecendo destaque, a garantia individual fundamental à ampla defesa e à instrução contraditória, com os meios e recursos a ela inerentes.

Sendo o processo administrativo, meio de possibilitar a regulação do exercício da competência e age como instrumento de proteção do indivíduo perante a ação daquela competência. Na ação entre Administração e cidadãos, técnicas processuais tutelam competências para aquela e direitos e liberdades para estes.

Assim, a ampla defesa apresenta-se sendo uma garantia fundamental, não basta garanti-la apenas formalmente. É necessário, num Estado Democrático de Direito, que se criem condições para que o acusado defenda-se de forma ampla, com todos os meios e recursos permitidos pelo ordenamento jurídico, o que só é possível com uma defesa técnica por advogado.

A discussão sobre a obrigatoriedade de advogado para promover defesa técnica no âmbito do processo administrativo disciplinar é polêmica.

Com efeito, garantir, ao servidor processado administrativamente, o direito de informação, de manifestação e de ver os seus argumentos considerados, sem que esteja sendo defendido tecnicamente por advogado, é garantir apenas formalmente o direito à ampla defesa com os meios e recursos a ela inerentes, o que viola o devido processo legal em sentido formal.

A defesa deve ser a mais ampla possível, devem-se utilizar todos os meios e recursos a ela inerentes, conforme a vontade do Poder Constituinte Originário. Assim, não há que se falar em amplíssima defesa ou defesa transbordante, não existe no sistema jurídico pátrio o excesso de defesa; o que o ordenamento jurídico repulsa, é a defesa insuficiente, há que se garantir a máxima efetividade dos direitos e garantias fundamentais.

Destarte, conclui-se que a Constituição da República de 1988 ao garantir que não se priva ninguém da sua liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal e, ainda, que todos os litigantes em processo judicial ou administrativo, bem como os acusados em geral, têm assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, a falta de defesa técnica por advogado, no âmbito do processo administrativo disciplinar viola o princípio da ampla defesa e, por conseguinte, o devido processo legal e ainda, o processo administrativo disciplinar obedece aos mesmos princípios da Administração Pública e, mais especificamente, aos princípios do devido processo legal, abarcando o contraditório e ampla defesa.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Livros:

BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Princípios Constitucionais do Processo Administrativo Disciplinar. São Paulo: Max Limonad, 1998.

Direito Administrativo Brasileiro. 37. ed. São Paulo: Malheiros, 2011.

 Capítulos de Livros:

MESQUITA, Gil Ferreira. Princípios do contraditório e da ampla defesa no processo civil brasileiro. 1. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003.

MITIDIERO, Nei Pires. Comentários ao código de trânsito brasileiro: (direito de trânsito e direito administrativo de trânsito). Rio de Janeiro: Forense, 2005.

Periódicos:

Curso de Direito Administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2009. .

Direito Administrativo Brasileiro. 37. ed. São Paulo: Malheiros, 2011.

Artigos de periódicos:

CHAVEIRO, Joneval Junio. O princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa..2015.

Internet:

Citação de referências e documentos eletrônicos. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/menuSumario.asp?sumula=1199

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação direta de inconstitucionalidade n.º 1.231-2/DF. Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e Presidente da República e Congresso Nacional. Relator Ministro Carlos Velloso. 15 de dezembro de 2005. Disponível em: <http://www.stf.gov.br/jurisprudencia.

[3]Constituição Federal da República de 1988.

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Allan Cardel

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Exercício de aprendizagem apresentado ao Curso de Direito, do Centro Universitário UNIC, como parte dos requisitos de avaliação (Avaliação Parcial 01) da Disciplina Processo Administrativo, sob a orientação do Professor Me. Thiago Augusto de O. M. Ferreira.

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