6 CONCLUSÃO
Podemos concluir, em síntese, que o direito de superfície é um direito real autônomo; e que, indiscutivelmente, por tratar-se de um instrumento novo, se corretamente utilizado, pode trazer importantes mudanças no relacionamento entre os proprietários de terrenos urbanos ou rurais e aqueles que deles pretendem se utilizar, ocorrendo apenas a transmissão da posse temporária da superfície, continuando a propriedade do solo pertencendo ao fundeiro ou cessionário.
Observam-se divergências entre os dois diplomas legais, o Estatuto da Cidade e o Código Civil, sob diversos ângulos, como localização, aspecto temporal do contrato, abrangência do objeto da concessão, causas de extinção, entre outras. No entanto, apesar das discrepâncias não se mostrarem tão acentuadas a ponto de incompatibilizar a aplicação das duas legislações concomitantemente, suas particularidades são suficientes para que sejam suscitadas dúvidas sobre sua aplicação. Portanto, em sua essência, o direito de superfície é análogo, no que concerne a sua filosofia e estrutura e conflitante em seu aspecto físico e temporal, cabendo, pois, ao aplicador do direito buscar harmonia e integração dos dois textos legais, visto que há detalhes que não se identificam.
É possível abstrair que as duas leis coexistem com aplicação subsidiária do Código Civil em relação ao Estatuto da Cidade.
Quanto ao objeto, a doutrina majoritária se posiciona no sentido de que o direito de superfície somente pode ser constituído tendo como objeto um terreno, pois este termo é claramente explicitado pelo legislador.
No que se refere ao aspecto tributário por ocasião da introdução do direito de superfície no nosso ordenamento jurídico, surgiu a questão sobre a necessidade de leis tributárias específicas para a cobrança dos impostos sobre a sua transmissão, uma vez que, quando da promulgação da Constituição Federal e das leis municipais que lhe seguiram, não existia esse direito. São recomendáveis, portanto, leis e regulamentos que estabeleçam critérios necessários para a cobrança dos impostos, em especial, os relativos à definição do sujeito passivo e à apuração da base de cálculo.
A passos crescentes têm aumentado as discussões judiciais no âmbito tributário. Tratando-se, como visto, de direito real passível de ser transmitido, a concessão de direito de superfície se enquadra no fato eleito pela Constituição Federal como possível de ser objeto de norma de incidência tributária de competência dos Municípios ou dos Estados conforme o previsto em seus artigos 155 e 156 respectivamente.
Não se objetivou aqui, tampouco seria possível, o esgotamento do tema, procurou-se o enfoque da compreensão de pontos de vistas conflitantes na esfera das duas legislações e a cobrança dos tributos incidentes. Destarte, diante desta problematização e diante da omissão do legislador em indicar expressamente o sujeito passivo decorrente do contrato do direito de superfície bem como a sua real base de cálculo, não paira dúvidas de que, ainda será matéria de grandes discussões jurisprudenciais, posto que, fica evidente a lacuna sobre elementos de sua hipótese de incidência, a correta composição da base de cálculo imponível, bem como a discussão sobre a necessidade de lei específica.
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Nota
[1] As Jornadas de Direito Civil são uma realização do Conselho da Justiça Federal (CJF) e do Centro de Estudos Jurídicos (CEJ). Nessas jornadas, compostas por especialistas e convidados do mais notório saber jurídico, são elaborados enunciados de direito civil, baseados sempre no Novo Código Civil, que buscam uma melhor interpretação de seus dispositivos.