Resumo: O presente trabalho monográfico tem como objetivo apresentar a necessidade da existência de limites para a atuação do poder do Estado, por meio de suas instituições e de seus agentes públicos, a fim de garantir, não apenas o interesse público, mas também proteger as os direitos individuais tutelados na Constituição da República Federativa do Brasil. É objeto deste trabalho a análise da atuação dos Tribunal Superior de Justiça e do Supremo Tribunal Federal ao editarem súmulas, deste último vinculante, acerca da obrigatoriedade ou não da presença de advogado na defesa técnica do particular no processo administrativo disciplinar. Este trabalho se propõe, ainda, a apresentar os fundamentos que ensejaram na edição de tais súmulas, mostrando algumas correntes doutrinárias que se debruçaram sobre o tema. Para esse fim, foi utilizado como técnica para o estudo, pesquisas bibliográficas, textos de leis, revistas, periódicos, artigos, manuais e jurisprudências, com a devida utilização do método qualitativo. A proposta é apreciar o contexto político-jurídico em que a discussão sobre o tema se deu, apresentando os pontos fulcrais que questionam a atuação dos ministros do STF ao editarem a súmula que desobriga a participação do advogado nos processos administrativos disciplinares. Em seguida, busca-se, com este trabalho, apresentar os resultados das pesquisas que foram feitas, as quais servirão de subsídio para fundamentar a importância imprescindível da participação do advogado em todas as fases do processo administrativo disciplinar, na busca pela proteção da ampla defesa do processado e pela proteção contra possíveis abusos de poder por parte dos agentes públicos.
Palavras-chave: Processo Administrativo Disciplinar – Ampla Defesa – Súmula nº 343 do STJ – Súmula Vinculante nº 5 do STF – Participação do Advogado no PAD.
Sumário: INTRODUÇÃO. CAPÍTULO I – O CONTROLE NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. 1.1 Breve Análise Sobre a Soberania do Estado e seus Limites. 1.2 Controle na Administração Pública e suas classificações. 1.3 Controle Administrativo Interno ou Controle Administrativo. 1.4 Poderes Administrativos. CAPÍTULO II – PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR E A QUESTÃO DA PARIDADE DE ARMAS 2.1. Conceituação e Legislação Aplicada ao Processo Administrativo. 2.2. Conceituação, Princípios, Objetivos e Aplicação do PAD. 2.3. Equiparação do PAD ao Processo Penal. 2.4. A Paridade de Armas no Ordenamento Jurídico aplicada ao PAD. CAPÍTULO III – A ATUAÇÃO DO ADVOGADO NO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. 3.1. Súmula nº 343 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) versus Súmula Vinculante nº 5 do Supremo Tribunal Federal (STF). 3.2. Críticas à Fundamentação da Súmula Vinculante nº 5 do STF. 3.3. Abuso do Poder Disciplinar.CONCLUSÃO.. REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
Todas as normas devem, por adequação constitucional, estar de acordo com a Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), sob pena de serem consideradas inconstitucionais e, desta forma, terem seu texto revogado parcial ou totalmente. Logo, todas as normas brasileiras abaixo desta têm o status de norma infraconstitucional. O tratamento conferido à Administração Pública, por meio do Direito Administrativo, não é diferente.
O processo administrativo genérico, assim como o judicial, tem guarida plena na CRFB e, portanto, guarda consigo todas as prerrogativas inerentes ao tipo. Especificamente o processo administrativo disciplinar (PAD), espécie de processo instaurado para apurar conduta ilegal de agentes públicos – e puni-los conforme a gravidade de seu ato –, possui características bem próprias, que demanda uma atenção maior e uma melhor observância aos princípios que norteiam as garantias individuais.
No âmbito da Administração Pública federal, o PAD é umas das “ferramentas” à disposição da daquela para se apurar e punir condutas que causem danos ao patrimônio público, contudo, a atuação do Estado não é ilimitada, pois, de acordo com o princípio da legalidade, o(s) Agente(s) Público(s) processante deve(m) observância a todas as garantias constitucionais e infraconstitucionais que resguardam o processado.
É consenso que nem todo homem médio é habilitado para atuar como advogado. Para isso, se faz necessário cursar com aproveitamento uma graduação em Direito, provar sua capacidade técnica em exame de proficiência e se inscrever na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Logo, diante da complexidade do conhecimento técnico que um bacharel em Direito deve possuir, este, e somente este, terá condições de defender um agente público que esteja enfrentando um PAD pois, a menos que este processado seja também bacharel em Direito – ou que possua notório saber jurídico –, não dispõe da habilitação e conhecimento técnico necessário para exercer sua defesa plena e ampla diante de um processo de apuração com fins punitivos, tornando-se, o advogado, indispensável à manutenção da justiça.
A justificativa principal do presente estudo se dá face a discussão levantada entre o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e a Suprema Corte brasileira (STF), a qual aquele Tribunal entendeu, no ano de 2007, que a presença do advogado era obrigatória em todas as fases do processo administrativo disciplinar, homenageando, portanto, a indispensabilidade deste. Por outro lado, o STF, no ano de 2008, sumulou o entendimento de que a ausência do advogado no tipo de processo em tela, não ofendia a Constituição. É diante deste impasse entre os mais altos Tribunais brasileiros que se desenvolve o presente estudo.
Para o desenvolvimento do presente trabalho foram utilizadas pesquisas bibliográficas, análise de legislação infraconstitucional e julgados dos referidos Tribunais. A pesquisa de origem bibliográfica lastreou-se em doutrinas consagradas no meio acadêmico, artigos científicos e publicações de especialistas da área.
O presente trabalho de conclusão de curso se apresenta em três capítulos. No primeiro capítulo é abordada a estrutura do Estado e sua relação com a sociedade e o indivíduo, mostrando, portanto, os limites de atuação da Administração Pública e os mecanismos de controle que a sociedade exerce sobre ela. No segundo capítulo é apresentada a conceituação de processo administrativo, os princípios que o regem, seu objetivo e aplicação e a equiparação do PAD ao processo penal brasileiro por meio do princípio da paridade de armas. Por último, no terceiro capítulo é trazida a discussão acerca da presença do advogado no processo administrativo disciplinar, discussão essa que se pauta na obrigatoriedade da presença deste ou não, a depender do entendimento do Tribunal e as críticas apresentadas contra o posicionamento da Suprema Corte brasileira.
CAPÍTULO I – O CONTROLE NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Breve Análise Sobre a Soberania do Estado e seus Limites
Há muito tempo, no que se refere à organização de Estado entre as várias sociedades que existiram e existem no mundo, vem-se refletindo e discutindo acerca da soberania dos Governos e seus limites em face dos seus governados. O contratualista Locke já defendia que o homem em sociedade abre mão de parte de sua liberdade e confere ao Estado a responsabilidade de garantir alguns direitos naturais como a propriedade, a segurança, o conforto e a paz. Neste sentido se entende que nem mesmo o Estado poderá interferir na individualidade do sujeito, de modo a retirar-lhes estas garantias, de forma arbitrária, senão, veja-se:
[...] não deve ficar sob qualquer outro poder legislativo senão o que se estabelece por consentimento na comunidade, nem sob o domínio de qualquer vontade ou restrição de qualquer lei senão o que esse poder legislativo promulgar de acordo com o crédito que lhe concedem. [...] a liberdade dos homens sob governo importa em ter regra permanente pela qual viva, comum a todos os membros dessa sociedade e feita pelo poder legislativo nela erigido: liberdade de seguir a minha própria vontade em tudo quanto a regra não prescreve, não ficando sujeita à vontade inconstante, incerta e arbitrária de qualquer homem [...].[1]
No entanto o poder soberano, embora exercido de modo quase que ilimitado, deve sofrer limitações em suas prerrogativas, de modo que o interesse público seja buscado e alcançado sem ferir nenhuma garantia fundamental ao povo subordinado a este poder.
É sabido que até mesmo os governos absolutistas mantinham, e/ou mantém, um mínimo de limite em seus poderes, os quais deveriam ser respeitados para que seu povo não se rebelasse contra seu líder, que por sua vez poderiam ser monarcas, imperadores, faraós, papas, césares entre outros.
O historiador, poeta, pensador e escritor, reconhecido como fundador do pensamento e da ciência política moderna, nascido no século XV, Nicolau Maquiavel, com base numa metodologia de análise essencialmente empírica, traz uma definição, do que ele chama de “Governo Civil”, acerca da forma que o povo, insatisfeito com seu governo opressor e sem limites - que pode ser um monarca ou não, por não suportar mais os atos desenfreados deste líder Estatal, estabelece um novo governo elegendo um membro do próprio povo, onde o autor sugere o que é necessário para o cidadão, membro do povo, ser o novo soberano:
Para atingir tal posição, o cidadão não dependerá inteiramente do valor ou da sorte, mas da astúcia afortunada. Chega-se a ela com o apoio da opinião popular ou da aristocracia. [...], que nascem do desejo do povo de se subtrair à opressão dos poderosos, e da tendência destes últimos para dirigir e oprimir o povo.[2] (grifo nosso).
Outro pensador que também adotava a metodologia de análise empírica, fundada na observação dos governos de sua contemporaneidade[3], e que também desenvolveu pensamentos importantíssimos para que melhor se compreendesse os conceitos de poder, povo, soberano (detentor do poder) e seus limites, foi Montesquieu. Sistematizador da teoria da Tripartição de Poderes – divisão dos poderes do Estado em três órgãos distintos (legislativo, executivo e judiciário), em uma de suas obras, Montesquieu defende que ao homem se faz necessária a imposição de limites, mesmo num Estado Democrático de Direito, pois se assim não o for, este detentor do poder tende a abusar do poder, excedendo-o até encontrar limites:
A democracia e a aristocracia não são Estados livres por natureza. A liberdade política só se encontra nos governos moderados. Mas elas nem sempre existe nos Estados moderados; mas trata-se de uma experiência eterna que todo homem que possui poder é levado a dele abusar; ele vai até onde encontra limites.[4] (grifo nosso).
Ainda sobre a temática do homem detentor do poder soberano no âmbito interno de atuação, isto é, dentro do seu próprio território, e a necessária submissão do Estado aos princípios naturais que regem a humanidade, Sahid Maluf, afirma que:
Limitam a soberania os princípios de direito natural, porque o Estado é apenas instrumento de coordenação do direito, e porque o direito positivo que do Estado emana só encontra legitimidade quando se conforma com as leis eternas e imutáveis da natureza. Como afirmou São Tomás de Aquino, uma lei humana não é verdadeiramente lei senão enquanto deriva da lei natural; se, em certo ponto, se afasta da lei natural, não é mais lei e sim uma violação da lei. E acrescenta que nem mesmo Deus pode alterar a lei natural sem alterar a matéria – Neque ipse Deus dispensare poteste alege naturali, nisi mutandomateriam. Ergo lex naturalis est immutabillis seu proprio mutari omnino non potest. (grifo do autor)[5]
Por conseguinte, ainda na perspectiva da importância de se estabelecer limites ao soberano, detentor do poder de governar, o teórico contratualista Jean-Jacques Rousseau afirma que, uma vez que o povo abriu mão de parte de sua liberdade e de seus bens, “contraindo com o Estado um pacto denominado ‘Contrato Social’ ” – depositando nas mãos do Estado o dever de satisfazer às necessidades e desejos do povo com os recursos oferecidos pelo próprio povo, o Estado tem por obrigação de atender tais exigências de modo a não se exceder na aplicação do seu poder ora pactuado. E para isso, Rousseau defende que há a “necessidade da existência da lei oriunda da vontade geral como mecanismo essencial para limitar as liberdades dos indivíduos e, assim criar-lhes obrigações.[6]”.
Rousseau preleciona que:
Vê-se por aí que o poder soberano, todo absoluto, todo sagrado, todo inviolável que é, não passa nem pode passar além dos limites das convenções gerais, e que todo homem pode dispor plenamente da parte de seus bens e da liberdade que lhe foi deixada por essas convenções; de sorte que o soberano jamais possui o direito de sobrecarregar um vassalo mais que outro, porque então, tornando-se o negócio particular, deixa o seu poder de ser competente.[7]
O que se vê surgir com o que foi exposto, mesmo que de maneira incipientemente, é a ideia da legalidade da atuação do Estado, isto é, nada poderá o Estado fazer senão for previamente pactuado com os seus concidadãos, por meio de leis anteriormente aprovadas através de mecanismos democráticos, de modo que os direitos e as liberdades naturais do povo sejam garantidos e que o Estado, com seu poder soberano, não cometa excessos.
Que o Estado está sujeito ao seu próprio Direito positivo, disto não se tem qualquer dúvida. Neste sentido Jorge Miranda aduz que:
[...] o Estado não é chamado ao poder de legislar senão porque promete, e não pode deixar de prometer, sujeitar-se às leis que ele próprio faz; esta sujeição é a condição para ele poder ser chamado a legislar. E, assim, pode também se dizer que os dois preceitos jurídicos de direito natural – o que estabelece o poder legislativo todo governante e o que estabelece a sujeição desse mesmo governante às suas próprias leis – se acham indissoluvelmente ligados um ao outro.[8]
Contudo apenas a criação de leis não garante o cumprimento por parte do Estado, embora este também guarde uma relação de obediência, se submetendo aos limites impostos por elas. Como consequência natural, se são criados limites ao Estado, para que se evite o abuso do poder e que se faça cumprir o que prescreve a lei, faz-se necessário também a criação de mecanismos que garantam o cumprimento dos limites impostos por ela. Neste contexto surge a figura do controle da atuação estatal.
A própria Tripartição dos Poderes, teoria de Rousseau citada anteriormente, traz essa ideia de controle, onde cada poder – legislativo, executivo e judiciário – exerce, além de sua função típica, a de controle dos demais poderes. Traz-se à tona a função precípua exercida pelo judiciário, conforme preleciona Floriano de Azevedo Marques Neto:
A relação é direta com a própria noção de Estado de Direito. Este Estado, em contraposição ao EstadoPolícia característico do absolutismo, não apenas impõe normas jurídicas aos indivíduos. A lei subordina também a própria atuação do Estado, pois seus agentes a ela devem obediência. Quando a vontade individual dos governantes é substituída pela autoridade da norma geral, e o Estado passa a se submeter à ordem jurídica, o poder estatal passa a ser limitado e pode então ser controlado pelos seus destinatários.[9]
Odete Medauar menciona, como prova da pertinência do estudo e da discussão acerca do tema aqui proposto, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, pontuando ainda o significado do controle que incide sobre a Administração Pública:
A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, já continha, no art. 15, o seguinte preceito: “A sociedade tem o direito de pedir conta, a todo agente público, quanto à sua administração”. Aí está o significado do controle incidente sobre as atividades da Administração Pública.[10]
Além do que trazem estes teóricos, bem atual se tem o que preceitua a Carta Magna brasileira em seu artigo 2º, onde determina: “São Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.[11]” Logo, fica claro que o que já prescrevia o teórico Montesquieu, em relação aos limites do Estado, de sua época até então, ainda é amplamente discutido, refletido e aplicado.
O Estado contemporâneo, baseado no Estado Democrático de Direito, tem evoluído constantemente, especialmente no que diz respeito às necessidades de criação de mecanismos de autocontrole, colocando o Estado no patamar de sujeito passivo de obrigações, também subordinados ao conjunto de estruturas de controle exercido tanto pelo poder judiciário, pelo poder legislativo e pela sociedade. E é no sentido de melhor discorrer sobre controle das atividades do Estado que o próximo tópico será abordado precipuamente o instituto do Controle na Administração Pública.
Controle na Administração Pública e suas classificações
Para iniciar o estudo que este tópico se dispõe a realizar, faz-se necessário, para uma melhor compreensão da estrutura política do Brasil enquanto Estado soberano, definir o que preceitua a Constituição da República Federativa do Brasil, denominada a partir de agora como CF/88. Em seu texto constitucional, no art. 1º, a CF/88 expõe o seguinte:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania
III - a dignidade da pessoa humana;
IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.[12] (grifos nossos).
Para o termo Estado Democrático de Direito, Evandro Martins Guerra[13], de maneira simplificada, apresenta a seguinte definição: “Estado de direito, sinteticamente, é aquele juridicamente organizado e obediente às suas próprias leis, onde impera o princípio da legalidade, servindo de garantia contra os arbítrios do Poder Público.”. Pode-se extrair desta definição que o Estado com bases democráticas de Direito, especificamente o Brasil, está sujeito às próprias leis.
Em relação à participação popular e o exercício do poder de forma democrática, Marçal Justen Filho aduz que:
O controle da atividade administrativa depende de instrumentos jurídicos adequados e satisfatórios. Mas nenhum instituto jurídico formal será satisfatório sem a participação popular. A democracia é a solução mais eficiente para o controle do exercício do poder. A omissão individual em participar dos processos de controle do poder político acarreta a ampliação do arbítrio governamental.[14] (grifos nossos).
Há também que se falar, ao se referir à Estado Democrático de Direito, em democracia participativa. Di Pietro afirma que:
É inerente ao conceito de Estado Democrático de Direito a ideia de participação do cidadão na gestão e no controle da Administração Pública, no processo político, econômico, social e cultural; essa ideia está incorporada na Constituição não só pela introdução da fórmula do Estado Democrático de Direito – permitindo falar em democracia participativa -, como também pela previsão de vários instrumentos de participação, podendo-se mencionar, exemplificativamente, o direito à informação (art. 5º, XXXIII) , o direito de denunciar irregularidades perante o Tribunal de Contas (art. 74, § 2º) , a gestão democrática da seguridade social (art. 1 94, VII) , da saúde (art. 1 98, III) , do ensino público (art. 206, VI) , sem falar em inúmeras normas contidas na legislação ordinária prevendo também essa participação, como ocorre na Lei Geral de Telecomunicações, na Lei de Licitações e Contratos, na Lei de Processo Administrativo.[15] (grifo do autor).
Ainda se extrai que, conforme Silva:
No Estado Social e Democrático de Direito houve o estabelecimento de um Estado plural, transparente e participativo, evoluindo para um processo de crescente aproximação e coordenação democrática dos dois polos, no sentido de serem juntadas as forças do Estado e da sociedade para, mediante esforços comuns, serem superadas as desigualdades sociais, econômicas e políticas, para o estabelecimento de um regime de democracia participativa que realize a justiça social, com garantias formais e materiais do princípio da igualdade, consoante a garantia de realização dos direitos fundamentais da cidadania.[16]
Em alusão ao que os teóricos acima prelecionam observa-se que, uma vez que o Brasil é uma República Federativa, que tem seus pilares firmados na independência dos poderes, na democracia e na gestão participativa da coisa pública, apreende-se que têm como agentes de controle os próprios poderes Executivo, Legislativo, Judiciário e a sociedade.
Marçal Justen Filho[17] atribui à expressão controle o seguinte significado: “O controle é um processo de redução do poder, entendida essa expressão no sentido da imposição da vontade do interesse de um sujeito sobre outrem”.
José Carvalho dos Santos Filho, de maneira antecipada, advoga que o controle, especificamente na Administração Pública indireta, é considerado um princípio:
Controle é o conjunto de meios através dos quais pode ser exercida função de natureza fiscalizatória sobre determinado órgão ou pessoa administrativa. Dizer-se que órgão ou entidade estão sujeitos a controle significa constatar que só podem eles atuar dentro de determinados parâmetros, ou seja, nunca podem agir com liberdade integral.[18]
Maria Sylva Zanella Di Pietro[19], ao conceituar o controle da Administração Pública, leciona que “no exercício de suas funções, a Administração Pública sujeita-se a controle por parte dos Poderes Legislativo e Judiciário, além de exercer, ela mesma, o controle sobre os próprios atos”. Em complemento, a autora afirma que:
[...] pode-se definir o controle da Administração Pública como o poder de fiscalização e correção que sobre ela exercem os órgãos dos Poderes Judiciário, Legislativo e Executivo, com o objetivo de garantir a conformidade de sua atuação com os princípios que lhe são impostos pelo ordenamento jurídico.[20]
José Carvalho dos Santos Filho[21] afirma que o controle da Administração Pública tem seu exercício materializado em duas formas distintas de atuação: controle político e controle administrativo, ao que se traduz, aparentemente, já na divisão entre controle externo e interno. Para este autor, o controle político tem sua base firmada no equilíbrio dos três poderes do Estado República – Executivo, Legislativo e Judiciário, ensejando, desta forma, no sistema de pesos e contrapesos dos Poderes políticos. Já no controle administrativo:
Não se procede a nenhuma medida para estabilizar poderes políticos, mas, ao contrário, se pretende alvejar os órgãos incumbidos de exercer uma das funções do Estado – a função administrativa. Enquanto o controle político se relaciona com as instituições políticas, o controle administrativo é direcionado às instituições administrativas.[22]
Já os autores Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo apresentam um conceito mais amplo que o anterior acerca do que é controle administrativo, trazendo em sua definição a legitimidade também dos administrados em exercer o tal controle:
[...] conjunto de instrumentos que o ordenamento jurídico estabelece a fim de que a própria administração pública, os Poderes Judiciário e Legislativo, e ainda o povo, diretamente ou por meio de órgãos especializados, possam exercer o poder de fiscalização, orientação e revisão da atuação administrativa de todos os órgãos, entidades e agentes públicos, em todos os Poderes e níveis da Federação.[23]
Diversas são as formas e critérios com que os doutrinadores brasileiros classificam o controle da Administração Pública.
O controle da Administração Pública pode ser classificado quanto ao órgão que exerce o controle (administrativo, legislativo ou judicial), quanto ao momento (prévio, concomitante ou posterior), quanto ao aspecto controlado, se é de legalidade ou de mérito, e ainda se é um controle interno ou externo.[24]
Além das classificações já citadas, há ainda a forma de controle trazida por Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo que é quanto à amplitude, que se subdivide em controle hierárquico, que “decorre do escalonamento vertical de órgãos da administração direta ou do escalonamento vertical de órgãos integrantes de cada entidade da administração indireta”[25]; e o controle finalístico, aquele que é “exercido pela administração direta sobre as pessoas jurídicas integrantes da administração indireta. ”[26].
Buscando primar pela clareza e objetividade acerca do tema controle da Administração Pública, uma vez que este não é o tema central deste estudo, mas apenas especificamente o controle interno, convém adotar uma classificação que se afigura a mais adequada, a qual utiliza como critério o agente que exerce o controle. Nesta perspectiva, Odete Medauar utiliza o critério quanto ao agente controlador para diferenciar as espécies de controle exercidos sobre a Administração Pública. Para tanto a autora explica que:
Quando o agente controlador integra a própria Administração, se está diante de um controle interno, exercido pela própria Administração sobre seus órgãos e suas entidades da Administração indireta. Se o controle é efetuado por órgãos, ente ou instituição exterior à estrutura da Administração, qualifica-se como controle externo, situando-se nesta espécie o controle realizado por instituições políticas, por instituições técnicas e por instituições precipuamente jurídicas.[27]
Enfim, apresentadas as classificações para a incidência do controle sobre a Administração Pública, e delimitando este estudo precipuamente ao que se refere ao controle interno, sem desprezar a importância do controle externo (controle exercido pelo Ministério Público, Tribunais de Contas, pelo Poder Judiciário entre outros), mas por questão de maior aprofundamento no cerne do estudo, não serão abordadas minúcias relativas à tal espécie de controle.
Controle Administrativo Interno ou Controle Administrativo
Conforme já tratado anteriormente, o controle da Administração Pública pode ter várias espécies de classificações. Objeto deste tópico, o controle administrativo (ou controle administrativo interno), que tem sua classificação quanto à natureza do órgão controlador e é considerado um tipo de controle interno.
Dentre as várias tentativas de se conceituar o que é controle administrativo, percebe-se que os teóricos divergem em suas definições ao longo do tempo. Alguns trazem uma definição mais completa em determinado sentido, porém deixa a desejar noutro. A seguir serão apresentadas algumas definições de controle administrativo e serão pontuadas suas diferenciações para melhor adequar ao tema proposto e às necessidades da Administração Pública.
Hely Lopes Meirelles elaborou uma definição mais abrangente. Para este autor, controle administrativo é:
[...] todo aquele que o Executivo e os órgãos de administração dos demais Poderes exercem sobre suas próprias atividades, visando a mantê-las dentro da lei, segundo as necessidades do serviço e as exigências técnicas e econômicas de sua realização, pelo quê é um controle de legalidade e de mérito. Sob ambos esses aspectos pode e deve operar-se o controle administrativo para que a atividade pública em geral se realize com legitimidade e eficiência, atingindo sua finalidade plena, que é a satisfação das necessidades coletivas e atendimento dos direitos individuais dos administrados.[28]
Para Maria Sylva Zanella Di Pietro[29], o “controle administrativo é o poder de fiscalização e correção que a Administração Pública (em sentido amplo) exerce sobre sua própria atuação, sob os aspectos de legalidade e mérito, por iniciativa própria ou mediante provocação.”. Segundo a autora, o controle administrativo deriva do poder-dever de autotutela que a Administração Pública tem sobre seus próprios atos e agentes, possibilitando que esta, em acordo com os princípios da conveniência, oportunidade e legalidade, anule, altere ou revogue estes atos.
Um outro conceito trazido pela doutrina é o de Marçal Justen Filho:
O controle interno da atividade administrativa é o dever-poder imposto ao próprio Poder de promover a verificação permanente e contínua da legalidade e da oportunidade da atuação administrativa própria, visando a prevenir ou eliminar defeitos ou a aperfeiçoar a atividade administrativa, promovendo as medidas necessárias a tanto. [30]
Afirma ainda, este autor, que:
O controle administrativo interno desenvolve-se no âmbito do próprio Poder. Não é sinônimo de controle realizado pelo Poder Executivo, visto que existe controle interno no âmbito do Judiciário, do Legislativo, do Tribunal de Contas e do Ministério Público. Ou seja, todos os Poderes estatais têm o dever de promover o controle dos atos administrativos que produzem os seus próprios órgãos e autoridades. Assim se passa porque todos os Poderes desempenham atividades administrativas.[31]
Por fim, Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo trazem uma definição semelhante aos autores anteriores. Em sua definição os autores defendem que:
[...] controle administrativo é o controle interno, fundado no poder de autotutela, exercido pelo Poder Executivo e pelos órgãos administrativos dos Poderes Legislativo e Judiciário sobre sua própria atuação administrativa, tendo em vista aspectos de legalidade e de mérito administrativo (conveniência e oportunidade administrativas).[32]
Visto todos estes conceitos, chega-se à conclusão que o controle administrativo interno ou controle administrativo, que também foi definido em dado momento como um princípio da Administração Pública indireta, é regido, amparado e guarda subordinação a outros princípios do Direito Administrativo. Além dos princípios explícitos na Carta Maior[33] brasileira (legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência), mantém relação também, entre outros, com os princípios trazidos no art. 2º da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999[34], denominada lei do processo administrativo federal, princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
Poderes Administrativos
Indissociável é a relação de controle administrativo e os poderes administrativos. Tais poderes são necessários à Administração Pública para a efetivação das atribuições à ela atribuídas, instrumentalizando a efetiva atuação do Estado em interesse da coletividade em detrimento do interesse individual.
Para Hely Lopes Meirelles[35], “a Administração é dotada de poderes administrativos –distintos dos poderes políticos – consentâneos e proporcionais aos encargos que lhe são atribuídos. Tais poderes são verdadeiros instrumentos de trabalho, adequados à realização das tarefas administrativas.”.
Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo afirmam que o ordenamento jurídico que circunda a atividade da Administração está precipuamente firmado em dois princípios basilares: supremacia do interesse público sobre o privado e indisponibilidade do interesse público. Acrescentam ainda que, do princípio da supremacia do interesse público sobre o privado derivam:
[...] todas as prerrogativas especiais de que dispõe a administração pública, as quais a ela são conferidas tão somente na estrita medida em que necessárias à satisfação dos fins públicos cuja persecução o mesmo ordenamento jurídico lhe impõe. Tais prerrogativas consubstanciam os chamados poderes administrativos.[36]
Maria Sylva Zanella Di Pietro[37] esclarece que “tais poderes são inerentes à Administração Pública pois, sem eles, ela não conseguiria fazer sobrepor-se a vontade da lei à vontade individual, o interesse público ao interesse privado”. Em seguida, a autora explica que “embora o vocábulo poder dê a impressão de que se trata de faculdade da Administração, na realidade trata-se de poder-dever, já que reconhecido ao poder público para que o exerça em benefício da coletividade; os poderes são, pois, irrenunciáveis”. (grifos do autor).
De acordo com Rafael Carvalho Rezende Oliveira são espécies de poderes administrativos o poder hierárquico[38], que decorre da “relação de subordinação administrativa entre agentes públicos que pressupõe a distribuição e o escalonamento vertical de funções no interior da organização administrativa”; e o poder disciplinar[39], sendo “a prerrogativa reconhecida à Administração para investigar e punir, após o contraditório e a ampla defesa, os agentes públicos, na hipótese de infração funcional. E os demais administrados sujeitos à disciplina especial administrativa”.
Vale ainda acrescentar o poder discricionário aqui postulado por Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo, que “é aquele em que o agente administrativo dispõe de uma razoável liberdade de atuação, podendo valorar a oportunidade e conveniência da prática do ato, quanto ao seu motivo, e, sendo o caso, escolher, dentro dos limites legais, o seu conteúdo (objeto).”.
Adiante, para efeitos deste trabalho, serão abordados apenas os poderes hierárquico e disciplinar.
O poder hierárquico, como sendo um dos instrumentos que a Administração Pública dispõe para exercer suas atividades administrativas, não se aparta da função que esta tem para exercer o controle administrativo interno, sob a prerrogativa da subordinação entre os agentes públicos. Este controle se dá ex officio pela própria Administração Pública, sendo desnecessária qualquer provocação externa.[40]
Para tanto, Hely Lopes Meirelles[41] define que “Poder hierárquico é o que dispõe o Executivo para distribuir e escalonar as funções de seus órgãos, ordenar e rever a atuação de seus agentes, estabelecendo a relação de subordinação entre os servidores do seu quadro de pessoal.”.
Duguit[42] advoga que “o princípio do poder hierárquico domina todo o Direito Administrativo e deveria ser aplicado, ainda mesmo que nenhum texto legal o consagrasse”.
Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo, ao definirem hierarquia, explicam que:
Hierarquia caracteriza-se pela existência de níveis de subordinação entre órgãos e agentes públicos, sempre no âmbito de uma mesma pessoa jurídica. Deve-se frisar que subordinação só existe no âmbito de uma mesma pessoa jurídica, é estabelecida entre agentes e órgãos de uma mesma entidade, verticalmente escalonados, como decorrência do poder hierárquico.[43]
Mostrando a importância da existência da hierarquia na Administração Pública, bem como a relação entre esta, o Direito positivo e todos os agentes públicos, Maria Sylva Zanella Di Pietro defende que:
A organização administrativa é baseada em dois pressupostos fundamentais: a distribuição de competências e a hierarquia. O direito positivo define as atribuições dos vários órgãos administrativos, cargos e funções e, para que haja harmonia e unidade de direção, ainda estabelece uma relação de coordenação e subordinação entre os vários órgãos que integram a Administração Pública, ou seja, estabelece a hierarquia.[44]
Por fim, Hely Lopes Meirelles apresenta o objetivo que o poder hierárquico persegue ao conferir a alguns agentes públicos tal poder:
O poder hierárquico tem por objetivo ordenar, coordenar, controlar e corrigir as atividades administrativas, no âmbito interno da Administração Pública. Ordena as atividades da Administração, repartindo e escalonando as funções entre os agentes do Poder, de modo que cada um possa exercer eficientemente seu encargo; coordena, entrosando as funções no sentido de obter o funcionamento harmônico de todos os serviços a cargo do mesmo órgão; controla, velando pelo cumprimento da lei e das instruções e acompanhando a conduta e o rendimento de cada servidor; corrige os erros administrativos, pela ação revisora dos superiores sobre os atos dos inferiores.[45] (grifo do autor).
Hely Lopes Meirelles[46] acrescenta, ainda, que este poder confere ao superior hierárquico a prerrogativa de se dar ordens legais e fiscalizar os subalternos, bem como delegar e avocar atribuições, e obriga os subordinados à cumprirem tais ordens sobe pena de sanções disciplinares. No entanto estas ordens não devem ser cumpridas sempre que forem manifestamente ilegais, ou seja, o poder que emana dos cargos e funções públicas de chefia não autorizam os agentes públicos que exercem chefia a obrigarem, através de ordens, seus subordinados a cumprirem tais ordens de modo a ferir qualquer dispositivo legal, principiológico, ou normativo.
Em relação ao poder disciplinar, inaugura-se este estudo com o que José dos Santos Carvalho Filho chama de disciplina funcional. Segundo este autor:
A disciplina funcional resulta do sistema hierárquico. Com efeito, se aos agentes superiores é dado o poder de fiscalizar as atividades dos de nível inferior, deflui daí o efeito de poderem eles exigir que a conduta destes seja adequada aos mandamentos legais, sob pena de, se tal não ocorrer, serem os infratores sujeitos às respectivas sanções.[47]
Sob essa perspectiva de que o poder disciplinar decorre do poder hierárquico, mas não se confundem, Hely Lopes Meirelles define este poder como sendo:
[...] a faculdade de punir internamente as infrações funcionais dos servidores e demais pessoas sujeitas à disciplina dos órgãos e serviços da Administração. É uma supremacia especial que o Estado exerce sobre todos aqueles que se vinculam à Administração por relações de qualquer natureza, subordinando-se às normas de funcionamento do serviço ou do estabelecimento que passam a integrar definitiva ou transitoriamente.[48]
É necessário esclarecer a diferença que há no poder disciplinar da Administração e no poder punitivo do Estado. Para Hely Lopes Meirelles[49], o poder disciplinar se instala na faculdade que a Administração tem para punir seus agentes internamente, alcançando nada além do que diz respeito aos seus serviços; enquanto o poder punitivo do Estado visa reprimir crimes contravenções, com finalidade social, sendo este o motivo central com que o Poder judiciário é quem detém este dever-poder.
Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo afirmam que, a rigor, este poder é um dever, e que outorga duas possibilidades punitivas à Administração Pública:
a) punir internamente as infrações funcionais de seus servidores; e b) punir infrações administrativas cometidas por particulares a ela ligados mediante algum vínculo jurídico específico (por exemplo, a punição pela administração de um particular que com ela tenha celebrado um contrato administrativo e descumpra as obrigações contratuais que assumiu).[50] (grifo do autor).
O que se deve ficar claro é justamente onde repousa esta discricionariedade que a Administração tem em relação ao poder disciplinar.
A Administração não tem liberdade de escolha entre punir e não punir, pois, tendo conhecimento de falta praticada por servidor, tem necessariamente que instaurar o procedimento adequado para sua apuração e, se for o caso, aplicar a pena cabível. Não o fazendo, incide em crime de condescendência criminosa, previsto no artigo 320 do Código Penal e em improbidade administrativa, conforme artigo 11, inciso II, da Lei nº 8.429, de 2-6-92.[51]
Logo, Maria Sylva Zanella Di Pietro acrescenta que a discricionariedade do poder disciplinar se limita aos procedimentos previstos para apuração da falta. Segundo a autora, há também discricionariedade:
[...] com relação a certas infrações que a lei não define; é o caso do "procedimento irregular" e da "ineficiência no serviço", puníveis com pena de demissão, e da "falta grave", punível com suspensão; são expressões imprecisas, de modo que a lei deixou à Administração a possibilidade de enquadrar os casos concretos em urna ou outra dessas infrações.[52]
Em oposição ao Direito Penal brasileiro, as infrações administrativas não são, necessariamente, tipificadas, restando então uma margem de discricionariedade ao agente público disciplinador, em decorrência do poder hierárquico, para que este, dosando a infração devidamente apurada e processada, possa escolher aquela sanção que melhor se adequar à infração. Deverá para tanto, segundo Rafael Carvalho Rezende Oliveira:
[...] levar em consideração a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço público, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais, mencionando sempre o fundamento legal e a causa da sanção disciplinar.[53]
Para materializar este poder de disciplinar, que entende-se como poder-dever, que a Administração detém, têm-se entre outros, o Processo Administrativo Disciplinar (PAD), objeto de estudo do próximo capítulo, como sendo “o principal instrumento jurídico que formaliza a investigação e a punição dos agentes públicos e demais administrados, sujeitos à disciplina especial administrativa, que cometeram infrações à ordem jurídica. ”[54].
É com fundamento no poder do Estado, em apurar e punir os ilícitos praticados por seus administrados no âmbito da Administração Pública, e nos mecanismos constitucionais que buscam garantir a ampla defesa e o contraditório, que se inicia o estudo do próximo capítulo, observando sempre os princípios basilares do devido processo legal, da dignidade da pessoa humana, da razoabilidade, proporcionalidade, legalidade e demais princípios pertinentes ao tema em tela.