Artigo Destaque dos editores

Do direito de preferência nas alienações de bens indivisíveis de propriedade comum

Exibindo página 1 de 3
Leia nesta página:

O direito de preferência pode ser exercido após a ciência pelo condômino dos termos assumidos pelo terceiro interessado na aquisição do bem.

RESUMO:O presente artigo tem como objeto analisar a natureza legal do Direito de Preferência e sua aplicabilidade em alienações de bens indivisíveis de acordo com precedentes jurisprudenciais. Buscar-se-á abordar a conceituação do instituto, previsão legal e forma de exercício pelo coproprietário.

Palavras-Chaves: Direito de Preferência; Condomínio; Propriedade;

SUMÁRIO: 1.  Da Aplicabilidade do direito de preferência na venda de bem de múltipla titularidade. 2. Da inexistência de direito de preferência na aquisição do bem por outro coproprietário.  3.  Do direito de preferência ante a indivisibilidade dos bens. 4. Do prazo para exercício do direito de preferência. 5. Da forma de comunicação para exercer o direito de preferência. 6. Da forma de manifestar a intenção de exercer o direito de preferência. 7. Da extinção do condomínio na falta de concordância quanto o destino do bem. 8. Considerações Finais. Referências Bibliográficas.


1. Da Aplicabilidade do Direito de Preferência na venda de bem de múltipla titularidade

Direito de preferência consiste em prerrogativa de uma parte obter um bem lançado ao mercado pelas mesmas condições oferecidas a terceiro. Não significa, frise-se, garantir mais vantagens negociais, mas sim de usufruir da preferência em adquirir o bem nas exatas circunstâncias ofertadas pelo terceiro (preço e forma de pagamento, por exemplo).

Tratando-se de bem de múltipla titularidade, o direito de preferência tem por finalidade obstar o ingresso de terceiro para dividir o domínio do bem “ante o potencial conflituoso inerente a essa forma anômala de propriedade” (REsp 1137176/PR, Rel. Ministro Marco Buzzi, 4ª Turma, julgado em 16/02/2016, DJe 24/02/2016).  É certo que se constata que um bem que possui mais de um proprietário tem a possibilidade de gerar conflitos sobre a sua gestão.  Assim, com a manutenção da titularidade do bem de propriedade comum por aquele que já detém parte de seu domínio, evita-se, em tese, maiores dissabores entre os donos sobre o destino do bem.

O art. 1.314 do Código Civil estabelece o direito do coproprietário alienar a respectiva parte ideal[1], o que deve ser feito observando-se o direito de preferência dos demais condôminos.  Portanto, é direito do condomínio adquirir o quinhão que cabe ao outro, nas mesmas condições ofertadas por terceiro alheio à comunhão.  


2. Da inexistência de direito de preferência na aquisição do bem por outro coproprietário

Como abordado, a previsão do direito de preferência tem por objetivo evitar situações de potencial conflito na administração do bem, na medida em que múltiplos proprietários podem discordar sobre a sua gestão, provocando animosidade e litígios. Dessa forma, o ingresso de um terceiro diferente dos proprietários originários pode ser fator maior de discórdia. 

Ocorre que, na alienação de quinhão para alguém que já seja proprietário, não há, naturalmente, a entrada de um terceiro. Dessarte, não se faz necessária a oferta do bem para os demais condôminos, conforme é destacado na seguinte ementa do STJ:   

RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO c/c ADJUDICAÇÃO DE FRAÇÃO IDEAL DE IMÓVEL - CESSÃO DE QUOTA PARTE A CONDÔMINO - ACÓRDÃO DO TRIBUNAL ESTADUAL QUE, AO REFORMAR A SENTENÇA, ADOTA ENTENDIMENTO DE QUE A PREEMPÇÃO DEVE SER OBSERVADA TANTO PARA ALIENAÇÃO A ESTRANHOS QUANTO A COMUNHEIROS - INTERPRETAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 504 DO CÓDIGO CIVIL. INSURGÊNCIA DO RÉU. DIREITO DE PREFERÊNCIA - INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA - INAPLICABILIDADE QUANDO SE TRATA DE NEGÓCIO JURÍDICO REALIZADO ENTRE CONDÔMINOS.

Hipótese: demanda visando à declaração de nulidade de alienação de fração ideal a condômino, ante o fundamento de inobservância ao direito de prelação dos demais consortes. Tribunal a quo que, ao reformar a sentença de improcedência, acolhe a pretensão veiculada na inicial, a fim de declarar nula a cessão de quota parte do imóvel objeto da demanda, assegurando aos autores o direito à aquisição do bem.

1. O direito legal de preferência atribuído aos condôminos de bem indivisível (ou não dividido), nos termos do artigo 504 do Código Civil, tem por escopo precípuo o de impedir o ingresso de terceiros estranhos à comunhão, ante o potencial conflituoso inerente a essa forma anômala de propriedade.

2. A alienação/cessão de frações ideais entre condôminos refoge à finalidade intrínseca ao direito de preferência, uma vez que não se trata de hipótese de ingresso de terceiro/estranho à comunhão, mas de manutenção dos consortes (à exceção daquele que alienou integralmente a sua parcela), apenas com alterações no percentual da parte ideal daquele que adquiriu a parte de outrem.

3. Inaplicabilidade dos artigos 1.322 do Código Civil e 1.118 do Código de Processo Civil, visto que não instituem qualquer direito de prelação, mas, tão-somente, os critérios a serem adotados em caso de extinção do condomínio pela alienação da coisa comum. Ademais, tratando-se de restrição à liberdade de contratar, o instituto em comento - direito de preferência - deve ser interpretado de forma restritiva. Assim, se a lei de regência - artigo 504 - apenas o institui em relação às alienações a estranhos, não cabe ao intérprete, extensivamente, aplicar tal norma aos casos de compra e venda entre consortes.

4. RECURSO ESPECIAL PROVIDO, a fim de julgar improcedentes os pedidos veiculados na inicial, restabelecendo-se a sentença.

(REsp 1137176/PR, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 16/02/2016, DJe 24/02/2016)


3.  Do direito de preferência ante a indivisibilidade dos bens

O Código Civil, ao dispor sobre Compra e Venda, determina que seja respeitado o direito de preferência do condômino na alienação de bem comum indivisível (art. 504 do CC[2]).

Na classificação do Código Civil, os bens podem ser divisíveis ou indivisíveis. Assim, “bens divisíveis são os que se podem fracionar sem alteração na sua substância, diminuição considerável de valor, ou prejuízo do uso a que se destinam” (art. 87).

O Código não define os bens indivisíveis, sendo assim conceituados os que não se enquadram nos moldes trazidos no art. 87.  Dessa forma, pode-se dizer que “são indivisíveis os bens que não admitem divisão cômoda sem desvalorização ou dano, a exemplo de um cavalo de corrida”[3].  Em outros termos, um bem é considerado indivisível, quando, por suas características, “percebe-se não existir a possibilidade de divisão igualitária que mantivesse a substância e utilidade do referido bem, conforme disciplina o art. 87 do Código Civil[4]” (TJPE, Apelação Cível nº 313.102-0, Relator Desembargador Eduardo Sertório Canto, 3ª Câmara Cível, data do julgamento: 18/06/2014, data da publicação: 11/07/2014[5]).

Os bens poderão ser indivisíveis por: 1) determinação legal (caso do módulo rural); 2) por convenção das partes; 3) por sua própria natureza (como um animal).  Em comparação ao Código anterior de 1916, “o Novo Código Civil consagrou definição semelhante, acentuando uma preocupação econômica”[6]

A diferenciação entre bens divisíveis e indivisíveis importa no Direito das Obrigações:

A distinção entre bens divisíveis e indivisíveis aplica-se às obrigações e aos direitos. A regra dominante para as obrigações é que, mesmo quando a prestação é divisível, o credor não pode ser compelido a receber por partes, se assim não convencionou. Se a prestação for indivisível e houver pluralidade de devedores, cada qual será obrigado pela dívida toda.[7]     

Ressalte-se que a jurisprudência reconhece que “muitas vezes, na prática, mostra-se extremamente difícil a prova da indivisibilidade”. Precedentes: REsp 9.934/SP, Rel. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma e REsp 1207129/MG, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 16/06/2015, DJe 26/06/2015. Isso porque a “diminuição considerável de valor” pode obstar a divisão na prática (art. 87 do CC).

Tratando-se de uma copropriedade sobre unidade de apartamento de edifício edilício (art. 1.331 e seguintes do Código Civil), as suas características indicam indivisibilidade:

Caracteriza-se o condomínio edilício pela apresentação de uma propriedade comum ao lado de uma propriedade privativa . Cada condomínio é titular, com exclusividade, da unidade autônoma (apartamento, escritório, sala, loja, sobreloja, garagem) e titular de partes ideais das áreas comuns (terreno, estrutura do prédio, telhado, rede geral de distribuição de água, esgoto e gás e eletricidade, calefação e refrigeração centrais, corredores de acesso às unidades autônomas e ao logradouro público etc.) (CC, art. 1.331)[8]

No caso de unidades autônomas de um condomínio, cada proprietário tem direitos exclusivos sobre seus bens. Não há, na hipótese, o direito de preferência na alienação, justamente por tratar-se de bens divisíveis.   

O registro da alienação de unidades autônomas (e.g., lote, apartamento) independe do consentimento dos condôminos, mas o assento da alienação ou transferência de direitos sobre a unidade exige apresentação da prova documental de quitação das obrigações do alienante para com o condomínio. Simples declaração feita pelo alienante para com o condomínio. Simples declaração feita pelo alienante ou por seu procurador, sob as penas da lei, de que está em dia com as obrigações do condomínio serve como prova de quitação para fins do registro e deve ser expressamente consignada nos instrumentos de alienação ou de transferência de direitos. [9]     

Diversamente, se houver mais de um proprietário para a mesma unidade de apartamento de condomínio edilício, passa a ter a natureza indivisível porque construir adaptações para torná-lo divisível (v.g., colocar um muro interno), além de oneroso, poderia comprometer sua substância, diminuir-lhe consideravelmente o valor ou ainda prejudicar-lhe o uso. Sobre o assunto, há os seguintes precedentes: TJPE, Apelação Cível nº 313.102-0, Relator Desembargador Eduardo Sertório Canto, 3ª Câmara Cível, data do julgamento: 18/06/2014, data da publicação: 11/07/2014; TJPE, Apelação Cível nº 0134302-6, Relator Desembargador Eduardo Augusto Paurá Peres; e STJ, REsp 1207129/MG, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 16/06/2015, DJe 26/06/2015.

Por sua vez, diferente é a hipótese de imóvel com vários apartamentos e área comum não configurado na forma de condomínio edilício, sendo vários os proprietários de todo o imóvel. Nele, há indivisibilidade fática, pois existe um único registro para todo o bem (o qual pode discriminar apartamentos, mas esses não possuem matrículas próprias). Todavia, embora seja indivisível por sua conjuntura, é passível de divisão no caso concreto (ex: transformando-o em um edifício edilício, por exemplo). Nesse caso, havendo a divisão e oferta a terceiros, poderia determinar a aplicação do art. 504 do Código Civil referente ao Direito de Preferência (conforme REsp 1207129/MG, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 16/06/2015, DJe 26/06/2015 e REsp nº489.860/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 27/10/2004, DJ 13/12/2004).

Desse modo, tratando-se de bem indivisível passível de divisão com maior cuidado, é necessário que seja observado o direito de preferência do coproprietário, nos termos do art.  504 do Código Civil. Nesse sentido segue o aresto do STJ:

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

DIREITO CIVIL. CONDOMÍNIO. ART. 504 DO CÓDIGO CIVIL. DIREITO DE PREFERÊNCIA DOS DEMAIS CONDÔMINOS NA VENDA DE COISA INDIVISÍVEL. IMÓVEL EM ESTADO DE INDIVISÃO, MAS PASSÍVEL DE DIVISÃO. MANUTENÇÃO DO ENTENDIMENTO EXARADO PELA SEGUNDA SEÇÃO TOMADO À LUZ DO ART. 1.139 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916.

1. O condômino que desejar alhear a fração ideal de bem em estado de indivisão, seja ele divisível ou indivisível, deverá dar preferência ao comunheiro da sua aquisição. Interpretação do art. 504 do CC/2002 em consonância com o precedente da Segunda Seção do STJ (REsp n. 489.860/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi), exarado ainda sob a égide do CC/1916. .

2. De fato, a comparação do art. 504 do CC/2002 com o antigo art. 1.139 do CC/1916 permite esclarecer que a única alteração substancial foi a relativa ao prazo decadencial, que - de seis meses - passou a ser de cento e oitenta dias e, como sabido, a contagem em meses e em dias ocorre de forma diversa; sendo que o STJ, como Corte responsável pela uniformização da interpretação da lei federal, um vez definida tese sobre determinada matéria, deve prestigiá-la, mantendo sua coesão.

3. Ademais, ao conceder o direito de preferência aos demais condôminos, pretendeu o legislador conciliar os objetivos particulares do vendedor com o intuito da comunidade de coproprietários. Certamente, a função social recomenda ser mais cômodo manter a propriedade entre os titulares originários, evitando desentendimento com a entrada de um estranho no grupo.

4. Deve-se levar em conta, ainda, o sistema jurídico como um todo, notadamente o parágrafo único do art. 1.314 do CC/2002, que veda ao condômino, sem prévia aquiescência dos outros, dar posse, uso ou gozo da propriedade a estranhos (que são um minus em relação à transferência de propriedade), somado ao art. 504 do mesmo diploma, que proíbe que o condômino em coisa indivisível venda a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto.

5. Não se pode olvidar que, muitas vezes, na prática, mostra-se extremamente difícil a prova da indivisibilidade. Precedente: REsp 9.934/SP, Rel. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma.

6. Na hipótese, como o próprio acórdão reconhece que o imóvel sub judice se encontra em estado de indivisão, apesar de ser ele divisível, há de se reconhecer o direito de preferência do condômino que pretenda adquirir o quinhão do comunheiro, uma vez preenchidos os demais requisitos legais.

7. Recurso especial provido.

(REsp 1207129/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 16/06/2015, DJe 26/06/2015)

Para se operacionalizar o exercício do direito de preferência, o condômino deve ser notificado sobre a intenção do coproprietário de alhear fração ideal do bem indivisível antes que seja, de fato, transferida para terceiro.  Impende frisar que, tratando-se de bens imóveis, a propriedade apenas é transferida com o respectivo registro em cartório, consoante o art. 1.245 do Código Civil[10].

Assim, o direito de preferência permite que o já proprietário opte por adquirir outra parcela do bem (pelo valor e demais condições ajustadas com esse terceiro), conforme os termos do Informativo nº 564 do STJ, no qual foi abordado o REsp 1207129/MG de ementa acima transcrita:

O condômino que desejar alienar a fração ideal de bem imóvel divisível em estado de indivisão deverá dar preferência na aquisição ao comunheiro. O art. 504 do CC estabelece que: "Não pode um condômino em coisa indivisível vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. O condômino, a quem não se der conhecimento da venda, poderá, depositando o preço, haver para si a parte vendida a estranhos, se o requerer no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de decadência". Da comparação desse dispositivo com o art. 1.139 do CC/1916, conclui-se que a única alteração substancial está relacionada com o prazo decadencial, que - de seis meses - passou a ser de cento e oitenta dias. Nessa linha de intelecção, apesar de existir divergência doutrinária, não se vislumbra motivo para alterar o entendimento conferido pela Segunda Seção do STJ, adotado sob a égide do CC/1916, no sentido de que: "Na hipótese de o bem se encontrar em estado de indivisão, seja ele divisível ou indivisível, o condômino que desejar alienar sua fração ideal do condomínio deve obrigatoriamente notificar os demais condôminos para que possam exercer o direito de preferência na aquisição, nos termos do art. 1.139 do CC/1916" (REsp 489.860-SP, DJ 13/12/2004). Primeiro, porque, como o STJ é responsável pela uniformização da interpretação da lei federal, uma vez definida tese sobre determinada matéria, ele deve prestigiá-la, a fim de manter a coesão. Segundo, porquanto realmente parece ser, em uma interpretação teleológica, o posicionamento mais consentâneo com o melhor direito. Deveras, ao conceder o direito de preferência aos demais condôminos, pretendeu o legislador, conforme entendimento doutrinário, "conciliar os objetivos particulares do vendedor com o intuito da comunidade de coproprietários. Certamente, a função social recomenda ser mais cômodo manter a propriedade entre os titulares originários, evitando desentendimento com a entrada de um estranho no grupo". Terceiro, porque deve ser levado em conta todo o sistema jurídico, notadamente o parágrafo único do art. 1.314 do CC/2002, que veda ao condômino, sem prévia aquiescência dos outros, dar posse, uso ou gozo da propriedade a estranhos (o que é um minus em relação à transferência de propriedade), somado ao art. 504, que proíbe o condômino em coisa indivisível de vender a sua parte a estranhos, se outro consorte a quiser, tanto por tanto. Por fim, nesse mesmo viés de entendimento, há julgado mais recente da Quarta Turma que, ao manter a posição de outrora quanto à incidência do art. 1.139 do CC/1916, estendeu aos coerdeiros - na cessão de direitos hereditários - o direito de preferência concedido aos condôminos, agora com base no art. 504 do CC/2002 (REsp 550.940-MG, DJe 8/9/2009). Portanto, se o imóvel encontra-se em estado de indivisão, apesar de ser ele divisível, deve se reconhecer o direito de preferência do condômino que pretenda adquirir o quinhão do comunheiro, desde que preenchidos os demais requisitos legais. REsp 1.207.129-MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 16/6/2015, DJe 26/6/2015.

Vale dizer que a lei não determina que se ofereça o quinhão aos demais condôminos antes de lançá-lo no mercado (embora tal conduta possa ser realizada por uma questão prática, mas que não tem relação propriamente com o cômputo do prazo para optar pela preferência). Ou seja: em tese, pode-se colocar à venda o bem indiviso de propriedade, mas antes de fechado o negócio, deve ser concedido prazo para o exercício da preferência.

Todavia, se for feita a alienação sem prévia e regular notificação ao condômino, há o prazo de 180 dias para que o condômino possa exercer judicialmente o direito de preferência sobre o bem (conforme redação da parte final do art. 504 do Código Civil), mediante Ação Anulatória de Prelação, depositando o valor em juízo. Caso não tenha ocorrido a ciência anteriormente, conta-se do registro do título de propriedade.

Sobre os requisitos da regular fruição desse direito de preferência, “o condômino deve provar que reúne as condições necessárias, quais sejam: reclamação dentro do prazo legal, depósito do preço e indivisibilidade do imóvel” (TJPE, inteiro teor do voto no Agravo de Instrumento nº 0249052-6, Relator Desembargador Roberto da Silva Maia, 1ª Câmara Cível, data do julgamento: 26/03/2013, data da publicação: 05/04/2013).

Destaque-se haver controvérsia doutrinária e jurisprudencial sobre os limites da aplicação do art. 504 do CC (que, como visto, estabelece o direito de preferência para condôminos de bem indivisível).  Embora a existência do direito de preferência no caso de imóveis indivisíveis por natureza e força de lei seja incontestável, há certa celeuma sobre o alcance desse dispositivo para os imóveis que se encontrem em situação de indivisibilidade mas que possam ser divididos. 

Houve recente julgado no STJ consagrando o entendimento de que o direito de preferência é aplicável a tais bens passíveis de divisão, mas que estão em situação de indivisibilidade (REsp 1207129/MG, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 16/06/2015, DJe 26/06/2015). Tal posicionamento havia sido uniformizado no REsp 489.860/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 27/10/2004, DJ 13/12/2004, que tratava do Código Civil anterior:

Civil. Recurso especial. Condomínio. Alienação de parte ideal por condômino. Estado de indivisão do bem. Direito de preferência dos demais condôminos.

- Na hipótese de o bem se encontrar em estado de indivisão, seja ele divisível ou indivisível, o condômino que desejar alienar sua fração ideal do condomínio deve obrigatoriamente notificar os demais condôminos para que possam exercer o direito de preferência na aquisição, nos termos do art. 1.139 do CC16. Precedentes da Quarta Turma.

Recurso especial conhecido e provido. (REsp 489.860/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, julgado em 27/10/2004, DJ 13/12/2004)

Frise-se que não houve alteração substancial da matéria com o advento do novo código, conforme dicção do REsp 1207129/MG.

Ressalte-se que a alienação de bem indivisível será ineficaz para o coproprietário de bem indivisível se não for oportunizado o seu direito de preferência:

Por fim, a venda e compra de parte ideal de coisa comum indivisível a terceiro estranho, sem oportunizar o coproprietário a aquisição nas mesmas condições ofertadas, não invalida o negócio jurídico, apenas o torna ineficaz perante o condômino que desconhece o ato.[9]

No que se refere à atuação do notário frente ao artigo 504 do Código Civil, à evidência de seu dever de transparência e fornecimento de informações, as partes podem optar pela lavratura da escritura de compra e venda, em que pese a inobservância do preceito em estudo.

Assim o fazendo, o notário ao elaborar o documento público, dotado de fé pública e, que, portanto, pressupõe o preenchimento dos requisitos formais, observância da lei ao caso concreto, prévia orientação e conhecimento das partes sobre tudo o que ali se dispõe, deve fazer constar de forma expressa na escritura pública a ciência das partes sobre o que dispõe o artigo 504 do Código Civil.[11]

A ineficácia do ato perante o coproprietário foi tratada no aresto a seguir do STJ:

PROMESSA DE COMPRA E VENDA.

Condomínio. Ação declaratória. Ação possessória.

O contrato de promessa de compra e venda de bem indivisível, por um dos condôminos, é válido, mas ineficaz em relação ao condômino que não participou do ato. Ação declaratória julgada procedente.

Não estando fundado o litígio sobre a posse em alegação de domínio, que não ficou provado por nenhuma das partes, não se aplica a regra de que a ação possessória não será julgada a favor de quem evidentemente não pertence o domínio. O promissário comprador que exerce a posse em razão do contrato não comete esbulho.

Recurso conhecido e provido em parte. (REsp 216.979/RJ, Rel. Ministro Ruy Rosado de Aguiar, 4ª T., julgado em 16/11/1999)

Assuntos relacionados
Sobre a autora
Ana Carolina de Araújo Dantas Loureiro

Advogada - Pós-Graduada em Direito Público

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LOUREIRO, Ana Carolina Araújo Dantas. Do direito de preferência nas alienações de bens indivisíveis de propriedade comum. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5200, 26 set. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60463. Acesso em: 21 nov. 2024.

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos