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Novas luzes sobre o procedimento administrativo disciplinar no âmbito da execução criminal

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27/09/2017 às 15:00
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7 A questão da prescrição envolvendo faltas disciplinares

Muita confusão tem cercado esse tema. O principal equívoco que se verifica na prática, principalmente por parte dos atores judiciais, é no sentido de misturar a prescrição administrativa com a prescrição penal. Vejamos um exemplo de acórdão nesse sentido:

Prescrição do PAD: Consoante entendimento pacificado no STF, os artigos 36 e 37 do RDP do Rio Grande do Sul não têm o condão de regular prescrição penal. Razoável que assim seja, eis que o art. 22, da Constituição Federal, é taxativo ao delimitar a competência da União para legislar sobre direito penal. Assim, não havendo prazo específico na Lei de Execuções Penais, para instauração do Procedimento Administrativo Disciplinar, usa-se por analogia o menor prazo prescricional disposto no art. 109 do CP, ou seja, 03 (três) anos. Não transcorridos 03 anos entre a data da recaptura e a data da instauração do PAD. Preliminar afastada. (Agravo Nº 70073123168, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Lizete Andreis Sebben, Julgado em 10/05/2017)

O mesmo tipo de entendimento equivocado vem sendo “pacificamente” reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal, como destacado na decisão acima, em acórdão do Tribunal de Justiça do nosso Estado. Contudo, todas decisões envolvidas, ao tratar da matéria, fazem referência expressa ao HC n. 92.000/SP, deixando de aprofundar a questão. O problema é que, mesmo este julgado referido, não aprofundou a análise da referida problemática.

Na verdade, o HC n. 92.000/SP trata apenas do TERMO INICIAL para a contagem do prazo prescricional, o que no caso restou fixado como sendo a data da recaptura. Quanto ao mais, o STF manteve a decisão proferida no HC n. 56.053/SP, oriundo do STJ, que era a decisão atacada pelo remédio constitucional.

Indo, na sequência, junto ao STJ, para analisar o teor do referido julgado, percebemos que a análise também foi superficial, limitando-se a reproduzir o entendimento igualmente “pacificado” naquele Superior Tribunal. Há, no entanto, grande dificuldade em se encontrar qual seria o julgado original, isto é, aquele que teria fixado o entendimento tão seguidamente reproduzido e até hoje não questionado.

Rastreando a pesquisa aos primeiros acórdãos do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria, chegamos ao ano de 2003, oportunidade em que o Min. Paulo Medina, ao relatar o HC n. 24.266/SP, aparentemente analisou o tema pela primeira vez. Pelo menos é o único acórdão que não remete a nenhum anterior, sendo que na linha cronológica parece realmente ser o pioneiro no assunto (os demais acórdãos que lhe antecedem apenas analisavam outras questões relativas às faltas graves que não a prescrição da própria falta administrativa). Mas a prescrição propriamente dita, esta somente apareceu a partir deste julgado. E, mesmo nele, a questão passou ao largo. Vejamos o voto do Min. Paulo Medina:

Pretende a parte impetrante o reconhecimento da prescrição da infração disciplinar que embasou a decisão que determinou, em detrimento do paciente, a regressão ao regime fechado e o perdimento dos dias remidos anteriores à data da falta.

Em face da ausência de previsão legal de prescrição das infrações disciplinares praticadas na execução penal, requer a aplicação analógica do menor prazo prescricional previsto na lei penal, ou seja, 02 (dois) anos.

A infração disciplinar em que incorreu o paciente encontra-se prevista no art. 50, II, da Lei nº 7210/85, consistindo na fuga ou evasão.

O ato de fuga constitui-se em infração permanente, razão pela qual a prescrição bienal argüida iniciaria-se somente com a recaptura.

A prática da falta disciplinar pelo réu ocorreu em 16/06/1997, havendo sido recapturado em 11/09/2000, sendo este o marco inicial do prazo prescricional de 02 (dois) anos invocado.

Digno de nota que, mais uma vez, o assunto não foi aprofundado. Veio ele trazido ao STJ pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo, que atacava decisão do Tribunal de Justiça daquele Estado para fazer prevalecer, dos prazos prescricionais do Código Penal aplicados, aquele que fosse menor (já que a LEP era silente a respeito). Mas, em momento algum foi feita qualquer análise no sentido de qual seria o prazo prescricional correto. Nem mesmo se aquele prazo do artigo 109 do CP seria o correto a se aplicar no âmbito da disciplina administrativa penitenciária. O recorrente, no caso a Defensoria Pública daquele Estado, elaborou o recurso competente já partindo do pressuposto inicial de que a prescrição era a do artigo 109 do Código Penal, discutindo apenas qual dos incisos seria o aplicável (pleiteava, no caso, em face da omissão legislativa, o reconhecimento do menor prazo previsto, entendimento este que prevaleceu e terminou por orientar toda a jurisprudência nacional).

Porém, o que se verifica é que o equívoco jurisprudencial decorre de uma interpretação falha da legislação penal e processual penal, bem como da legislação administrativa e constitucional, como já foi dito alhures.

No caso específico da prescrição, deve-se separar as esferas administrativa e penal, exatamente como fez o Min. Marco Aurélio Bellizze, ao analisar o caso que originou a súmula 533 do STJ. Prescrição administrativa e prescrição penal não se confundem, muito embora a jurisprudência e os operadores constantemente incorram nesse erro.

Segundo Damásio de Jesus (2001, p. 17), na obra mais completa sobre o assunto prescrição: “Prescrição penal é a perda do poder-dever de punir do Estado pelo não-exercício da pretensão punitiva ou da pretensão executória durante certo tempo.”

Elencando os fundamentos da prescrição em nossa legislação penal, Damásio aponta os 3 que, no seu entender, seriam os principais (2001, ps. 18/19):

  • o decurso do tempo;
  • a correção do condenado; e
  • a negligência da autoridade.

Veja-se que ao analisarmos mais a fundo o instituto, já nos elementos que fundam a prescrição podemos extrair a conclusão de que há uma prescrição administrativa (regida pelas legislações estaduais, no exercício da competência suplementar), que deve ser reconhecida quando houver inércia da autoridade ADMINISTRATIVA, e uma prescrição penal, para quando houver inércia por parte do Poder Judiciário. Logo, as duas coisas não se misturam. Novamente, forçosa a conclusão de que a prescrição das faltas administrativo-disciplinares não pode ser regulada por lei penal. Seria a direta interferência de uma esfera na outra, o que não pode ocorrer sob pena de afrontar o Princípio da Separação de Poderes, além de outros dispositivos constitucionais e legais.

Da análise, também, da obra de Guilherme de Souza Nucci (2007a, ps. 580/581), extrai-se valorosa lição, quanto ao conceito de prescrição:

É a perda do direito de punir do Estado pelo não exercício em determinado lapso de tempo. Não há mais interesse estatal na repressão do crime, tendo em vista o decurso do tempo e porque o infrator não reincide, readaptando-se à vida social.

Ou seja, mais uma vez o destaque de que a prescrição penal aplica-se para reconhecer a falta de interesse do Estado na repressão do CRIME, e não de uma falta administrativa. O uso da palavra não foi em vão pelo autor. De fato, todo cientista do direito deve se utilizar da precisão terminológica, justamente para melhor analisar o objeto de estudo (o contrário, isto é, a imprecisão não é característica da pesquisa científica, onde também se enquadra a pesquisa jurídica). Em outras palavras, partindo-se dessa premissa, que se revela basilar, podemos afirmar com elevado grau de exatidão, inclusive com substrato nas lições de NUCCI, que a prescrição penal se aplica para a punibilidade de CRIMES.

O mesmo autor faz ainda uma breve análise acerca da apuração das faltas e imposição de sanções (NUCCI, 2007b, p. 960). Infelizmente, não analisou a questão da prescrição. Mas, como já salientado à exaustão acima, mesmo este autor reconhece que a seara administrativa não se mistura com a seara da execução penal. Uma coisa é o poder disciplinar, exercido pela autoridade administrativa; outra coisa, bem diferente, são os reflexos que o reconhecimento da falta pela autoridade administrativa terão na execução penal (conforme já destacado pelos escritos de Nucci (2007b, ps. 941/942), referidos anteriormente)

Logo, inexorável a conclusão no sentido de que o prazo prescricional da falta administrativa deve ser o do Regimento Disciplinar Penitenciário – RDP, não tendo nenhum sentido a aplicação do artigo 109 do Código Penal para o âmbito da apuração das faltas graves, que são faltas administrativas, de cunho disciplinar. Como as faltas administrativas não são crimes, não devem sofrer a incidência da legislação penal.

O que se percebe é que o equívoco jurisprudencial (que persiste até hoje) reside justamente na aplicação inadequada de dispositivos de leis federais na ausência de leis específicas, problema já percebido e descrito por Wellington Pacheco Barros (2005, pp. 33/34):

O grande problema na compreensão e assimilação do processo administrativo, e, como de regra, de todo o direito administrativo, reside na ausência de leis específicas e de aplicação de leis de outros entes ou mesmo de fontes doutrinárias, muitas delas de aplicação inadequada.

Na resolução de conflitos administrativos municipais ou estaduais, não raramente, por ausência de regras de processo administrativo em cada um destes entes, se remete às regras federais sem nenhum pejo de violação ao princípio federativo. A remissão às regras de processo administrativo somente pode ocorrer com expressa autorização legislativa.

E muitas vezes isso é aplicado, mesmo na constância de regras expressas

Então, no plano do dever-ser, como que deveria ocorrer a análise da prescrição nas faltas disciplinares? Primeiramente, destacamos que se deve olhar o assunto sob o prisma do Regimento Disciplinar Penitenciário do Estado do Rio Grande do Sul (Decreto n. 46.534/09).

O RDP regula a prescrição nos artigos 36 e 37:

Art. 36 - Considerar-se-á extinta a punibilidade pela prescrição quando, a partir do conhecimento da falta, não ocorrer a instauração do Procedimento Disciplinar no prazo de 30 (trinta) dias. (Alterado pelo Decreto 47.594/2010)

Parágrafo único - Nos casos de fuga, inicia-se o cômputo do prazo a partir da data do reingresso do preso no sistema prisional, oportunidade em que será comunicada imediatamente a recaptura ao Poder Judiciário para que proceda da forma do art. 22, III. (Alterado pelo Decreto 47.594/2010)

Art. 37 - O Procedimento Disciplinar deverá ser concluído no prazo de 60 (sessenta) dias a contar da sua instauração, podendo ser prorrogado por 30 (trinta) dias na hipótese de justificada necessidade. (Alterado pelo Decreto 47.594/2010)

Parágrafo único - A prorrogação que trata o caput deste artigo será concedida pela autoridade administrativa a quem o Conselho Disciplinar estiver vinculado e, caso o procedimento não seja concluído no prazo previsto, será considerado prescrito.

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A primeira coisa que se deve ter em mente é que faltas disciplinares são atribuição das Casas Prisionais, como já destacado alhures. Então, forçoso concluir que o Poder Judiciário não pode “determinar” que seja instaurado nenhum procedimento. O máximo que se poderia cogitar é do Poder Judiciário noticiar algum fato para a Direção do estabelecimento penal envolvido para que tome as providências que entender pertinentes (como instaurar um procedimento se ainda estiver no prazo legal). Porém, neste espectro de atuação, a Casa Prisional teria total liberdade para oficiar de volta, respondendo que entende não ser o caso de falta grave, por exemplo, ou mesmo que o fato já está prescrito pelo regimento penitenciário.

De qualquer forma, considerando-se a seara administrativa, deve-se analisar a data do fato e a data de instauração do PAD. Se superior a 30 dias, verifica-se prescrição. Da mesma forma, a prescrição ocorre se o procedimento se alongar além do permitido. Segundo a norma regimental gaúcha, o procedimento disciplinar deve ser concluído no prazo de sessenta dias, a contar da sua instauração, podendo ser prorrogado por trinta dias na hipótese de justificada necessidade.

O primeiro equívoco é entender que a prescrição tratada pelo RDP seria prescrição PENAL. De fato, dela não se trata. A prescrição penal, cuja competência exclusiva para legislar é da União, encontra-se regulada no Código Penal. Mas disso não se trata quando o assunto é faltas administrativas. As faltas disciplinares são faltas administrativas e como tais devem ser tratadas, circunscritas ao âmbito do poder disciplinar. Cabe, neste passo, destacar o art. 24 da Constituição Federal, que determina ser competência também dos Estados e Municípios (em conjunto com a União) legislar sobre direito PENITENCIÁRIO. E é aqui que se enquadram as regras de prescrição de faltas administrativas disciplinares, praticadas dentro do sistema penitenciário.

A sua repercussão penal, posterior, é outro assunto e que deve sofrer interpretação diversa (os efeitos penais do reconhecimento administrativo de uma falta grave é que recaem sob o olhar do Poder Judiciário). Mas a apuração, análise e sanção de uma alegada falta grave é um problema administrativo disciplinar, sujeito à legislação administrativa penitenciária. Neste passo, possível a análise da prescrição administrativa enquanto fato administrativo, ocorrido no âmbito disciplinar.

Logo, se o Juízo da VEC não pode se imiscuir em tarefas exclusivas da Direção Prisional (como o poder disciplinar), da mesma maneira não pode interferir em questões como a prescrição administrativa penitenciária.

A prescrição do Código Penal, que deve ser lida da maneira como registrado no acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (“não havendo prazo específico na Lei de Execuções Penais, para instauração do Procedimento Administrativo Disciplinar, usa-se por analogia o menor prazo prescricional disposto no art. 109 do CP, ou seja, 03 [três] anos”), deve assim ser entendida apenas para que o magistrado aplique aquelas chamadas “consequências legais”, se entender que é o caso de aplicá-las. Ou seja, notificado acerca do reconhecimento de uma falta grave, terá o magistrado até 3 (três) anos para decidir se: regride o regime do apenado, altera a data-base e decreta a perda de 1/3 da remição (digno de nota que pode optar por todas, nenhuma, apenas uma ou, até mesmo, a combinação de duas delas).

Dito de outro modo: a prescrição administrativa da falta disciplinar deve ser aquela prevista no regulamento administrativo respectivo (quando previsto nas legislações estaduais); já para os efeitos PENAIS do reconhecimento administrativo da falta (aplicação ou não dos “consectários legais”), daí sim será o caso de aplicação analógica do prazo prescricional do artigo 109 do Código Penal, por omissão da LEP.

Afinal, são esferas diferentes, a penal e a administrativa. Cada uma com regramentos próprios e consequências próprias. Tanto que a jurisprudência mansa e pacífica a respeito é a seguinte:

As instâncias das esferas civil, penal e administrativa são autônomas e não interferem nos seus respectivos julgados, ressalvadas as hipóteses de absolvição por inexistência de fato ou de negativa de autoria. (Precedente: RMS 26.510/ RJ, Rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, DJe 26/3/2010) (RMS 26951 AgR, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 03/11/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-231 DIVULG 17-11-2015 PUBLIC 18-11-2015)

Dessa forma, é perfeitamente cabível que a prescrição administrativa tenha regramento diferenciado da prescrição penal. Uma esfera não interfere na outra. A prescrição administrativa atinge tão somente a pretensão da Direção da casa prisional em investigar e punir o apenado por uma alegada falta ADMINISTRATIVA.

Vejamos um outro caso. Por exemplo, o art. 142 da Lei 8112/90, que prevê os prazos de prescrição para a punição disciplinar no âmbito administrativo do servidor público federal. Ninguém dirá que a norma é inconstitucional. E por quê? Porque editada de forma escorreita, seguindo os trâmites legais e, também, porque as esferas administrativa e penal são independentes. Ninguém pensaria em dizer que os prazos do Código Penal teriam aplicabilidade às faltas ali previstas.

O Regimento Disciplinar Penitenciário (RDP) não é diferente. De fato, a única diferença é que o fundamento para a sua edição não está no artigo 22 da Constituição Federal, como equivocadamente se aponta, simplesmente porque ele não regula prazos de prescrição penal. Ele nunca pretendeu isso. Basta olhar o art. 1º dele para se perceber isso:

Este Regimento Disciplinar destina-se a estabelecer os princípios básicos da conduta, da disciplina, direitos e deveres dos presos no Sistema Penitenciário do Estado do Rio Grande do Sul

E, neste passo, ele se enquadra como norma afeita ao artigo 24 da Constituição da República, onde está a chamada competência concorrente/suplementar dos entes federativos:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

I - direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico;

§ 1º No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.

§ 2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.

§ 3º Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.

§ 4º A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.

Logo, a previsão normativa dos artigos 36 e 37 do RDP não tem nada de inconstitucional, pois regulam a prescrição para apuração de faltas ADMINISTRATIVAS, no âmbito do exercício do poder disciplinar inserido na atribuição dos Diretores de casas prisionais. Ou seja, trata-se de legislação PENITENCIÁRIA, que, por se inserir dentro do Poder Executivo (administração pública), acaba por se inserir na esfera do direito administrativo. Inclusive, não por outra razão, chama-se de Administração Prisional.

Assim, sendo a LEP omissa, incide a hipótese dos parágrafos do artigo 24 da CF/88 de exercício da competência suplementar. Ou seja, o Estado tem toda a legitimidade (competência plena) para editar normas que regulem matéria omissa na legislação federal, até que sobrevenha legislação federal a respeito. Portanto, perfeitamente constitucionais os artigos 36 e 37 do RDP.

Segundo Uadi Lammêgo Bulos (2009, p. 777), “Os Estados também podem suprir o rol de matérias do art. 24, I a XVI, da Constituição, colmatando possíveis vazios normativos, muitos dos quais oriundos da inércia do legislador.”

O mesmo se tira da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento da ADIn n. 3.098/SP:

O art. 24 da CF compreende competência estadual concorrente não-cumulativa ou suplementar (art. 24, § 2º) e competência estadual concorrente cumulativa (art. 24, § 3º). Na primeira hipótese, existente a lei federal de normas gerais (art. 24, § 1º), poderão os Estados e o DF, no uso da competência suplementar, preencher os vazios da lei federal de normas gerais, a fim de afeiçoá-la às peculiaridades locais (art. 24, § 2º); na segunda hipótese, poderão os Estados e o DF, inexistente a lei federal de normas gerais, exercer a competência legislativa plena "para atender a suas peculiaridades" (art. 24, § 3º). Sobrevindo a lei federal de normas gerais, suspende esta a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário (art. 24, § 4º).

A “pá de cal” sobre o assunto parece vir, novamente, da lição de Guilherme de Souza Nucci (2007b. p. 942), que é de clareza solar:

Dessa maneira, é preciso frisar caber à União, privativamente, a competência para legislar em matéria de execução penal, quando as regras concernirem à esfera penal ou processual penal (art. 22, I, CF). Sob outro aspecto, quando envolver matéria pertinente a direito penitenciário, vinculada à organização e funcionamento de estabelecimentos prisionais, normas de assistência ao preso ou ao egresso, órgãos auxiliares da execução penal, entre outros temas correlatos, a competência legislativa é da União, mas concorrentemente com os Estados e Distrito Federal (art. 24, I, CF) (o grifo é nosso).

Na verdade, a confusão tem origem na questão já destacada pelo Min. Marco Aurélio Bellizze, em que Juízes acabam por interferir de maneira equivocada na atividade disciplinar – no próprio mérito administrativo –, que é atribuição exclusiva do Diretor das Casas Prisionais. A realidade é que cada um tem esferas próprias de atuação, com regramentos próprios, valendo o mesmo para a prescrição.

Dessa forma, aplicar o art. 109 do Código Penal a casos equivocados termina por afrontar de forma direta o dispositivo legal em questão, assim como atinge os artigos 22 e 24 da Carta Magna, de forma inclusive a permitir o manejo dos recursos extraordinários (Especial e Extraordinário).

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Sobre o autor
Everton Hertzog Castilhos

advogado do escritório Ribeiro Machado Advogados, em Porto Alegre (RS), especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET)

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CASTILHOS, Everton Hertzog. Novas luzes sobre o procedimento administrativo disciplinar no âmbito da execução criminal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5201, 27 set. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60500. Acesso em: 22 dez. 2024.

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