I - REGIME DE BENS E SEPARAÇÃO OBRIGATÓRIA
O regime de bens é o conjunto de regras que os noivos devem escolher antes da celebração do casamento, para definir juridicamente como os bens do casal serão administrados durante o casamento. O regime de bens deve ser escolhido quando os noivos fazem o pedido da habilitação do casamento e disciplina as relações econômicas entre os cônjuges durante o casamento.
Essas relações devem se submeter a três princípios básicos, sendo estes: a irrevogabilidade, a livre estipulação e a variedade de regimes. Tal imutabilidade não é absoluta de acordo com o artigo 1.639, § 2°, do Código Civil, o qual autoriza a alteração do regime ao dispor que "é admissível alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros".
O princípio da livre estipulação pode ser extraído do artigo 1.639 do Código Civil, o qual permite aos nubentes a escolha do regime de bens antes da celebração do casamento. O parágrafo único do artigo 1.640 do CC também estabelece neste sentido, ao prever que "poderão os nubentes, no processo de habilitação, optar por qualquer dos regimes que este código regula. Quanto à forma, reduzir-se-á a termo a opção pela comunhão parcial, fazendo-se o pacto antenupcial por escritura pública, nas demais escolhas".
Exceção a este princípio decorre da expressa fixação do regime de bens por lei, como, por exemplo, as pessoas que se encontrem nas situações previstas no artigo 1.641 do Código Civil.
Esta livre estipulação não é absoluta também, pois, conforme dispõe o artigo 1.655 do CC, "é nula a convenção ou cláusula dela que contravenha disposição absoluta de lei". Sendo assim, não será considerada válida qualquer cláusula que isente um dos cônjuges dos deveres conjugais ou algo do gênero. Não tendo optado por um regime de bens específico ou sendo este nulo ou inválido, o regime adotado será o da comunhão parcial.
Por fim, a variedade de regimes dá-se no momento em que a lei autoriza aos nubentes selecionar um dentre os diversos regimes que podem ser adotados. São quatro os regime de bens estabelecidos pelo Código Civil, sendo estes: os de comunhão parcial, comunhão universal, separação convencional ou legal e participação final nos aquestos.
II - O REGIME DA SEPARAÇÃO LEGAL
Fala-se do regime de separação legal.
O Código Civil prevê dois tipos de regime de separação de bens: a separação legal ou obrigatória, que decorre expressamente da lei e a convencional, que decorre da manifestação de vontade dos nubentes.
Os incisos do artigo 1.641 do Código Civil definem quais são as hipóteses em que é obrigatório o regime da separação de bens, são eles:
O Regime da Separação Total (Absoluta) de bens consiste na incomunicabilidade dos bens e dívidas anteriores e posteriores ao Casamento, constituindo o gênero, desmembrando-se em duas espécies: a) Regime da Separação Absoluta na forma Convencional (art. 1.687 e 1.688, do Código Civil); b) Regime da Separação Absoluta na forma Obrigatória. O regime da Separação de Bens Obrigatória é aquele estabelecido no artigo 1.641, do Código Civil, o qual determina que se casarão neste regime, sem qualquer comunicação dos bens ou dívidas:
a) as pessoas casadas com os impedimentos descritos no artigo 1.523, do Código Civil(causas suspensivas do casamento);
b) a pessoa maior de sessenta anos;
c) todos os que dependerem de suprimento judicial para casar.
No regime de separação obrigatória de bens, também chamada de separação legal de bens, em caso de divórcio, deve ser levado em consideração a regra pacificada pela Súmula 377 do STF, que diz: "No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento", ou seja, os bens adquiridos durante a união devem ser divididos pelos cônjuges em caso de divórcio, aqueles adquiridos antes da união, pertencem exclusivamente àquele que o adquiriu.
Há outros julgados, no entanto, que entendem que, para que ocorra a divisão, deve ser provado o esforço comum, caso que deve ser proposta ação judicial para provar e requerer a divisão, cuja decisão final depende exclusivamente do Judiciário, e, pelo que se vê, depende também da realidade de cada caso concreto.
No caso de falecimento de qualquer um dos cônjuges, em regime de separação obrigatória de bens, caso haja descendentes, o cônjuge sobrevivente não será considerado herdeiro. Porém, caso o falecido deixe apenas ascendentes, o cônjuge sobrevivente terá direito à herança, na mesma proporção que os ascendentes.
Caso o falecido não deixe nem descendentes e ascendentes, o cônjuge sobrevivente receberá a herança em sua totalidade. Tais regras, contudo, também são objeto de discussões judiciais, inclusive considerando o posicionamento da citada súmula 377 do STF, que embora destinada a casos de divórcio, também está sendo interpretada para discussões sobre sucessão.
Já no regime de separação convencional de bens, em caso de divórcio, não há divisão de bens, cada um dos cônjuges permanece com os seus respectivos bens. No falecimento de qualquer um dos cônjuges, caso tenham descendentes, o cônjuge sobrevivente concorrerá com esses ao seu quinhão na herança. (artigo 1829 do CC).
Caso não tenham descendentes, o cônjuge sobrevivente, concorrerá com os ascendentes, conforme determinam os artigos 1.836 e 1.837 do CC, e caso não hajam descendentes ou ascendentes, o cônjuge sobrevivente herdará a totalidade da herança, independente do regime estabelecido.
No regime da separação absoluta, total ou convencional de bens, que não se confunde com o da separação obrigatória ou legal de bens, a escolha deriva da autonomia da vontade dos nubentes, a partir da Escritura Pública de pacto antenupcial, não havendo comunicação de quaisquer bens, sejam advindos antes ou após a constância do casamento. Há uma liberdade negocial maior e os patrimônios dos cônjuges varão e virago são independentes entre si.
Assim, caberá a cada cônjuge a livre administração de seus bens, de forma exclusiva, podendo dar, dispor, alienar, gravar de ônus real sem que haja necessidade de anuência do outro cônjuge, nos termos do art. 1.647 do CC.
Pelo artigo 258, parágrafo único, inciso II, do Código de 1916, hoje revogado, tem-se:
Art. 258. Não havendo convenção, ou sendo nula, vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime de comunhão parcial. (Redação dada pela Lei nº 6.515, de 26.12.1977)
Parágrafo único. É, porém, obrigatório o da separação de bens do casamento:
I - Das pessoas que o celebrarem com infração do estatuído no art. 183, XI a XVI (art. 216);
II - do maior de 60 (sessenta) e da maior de 50 (cinqüenta) anos;
III - do órfão de pai e mãe, ou do menor, nos termos dos arts. 394 e 395, embora case, no termos do art. 183, XI, com o consentimento do tutor; (Redação dada pelo Decreto do Poder Legislativo nº 3.725, de 15.1.1919)
IV - de todos os que dependerem, para casar, de autorização judicial (arts. 183, XI, 384, III, 426, I, e 453). (Redação dada pelo Decreto do Poder Legislativo nº 3.725, de 15.1.1919)
III - A UNIÃO ESTÁVEL E REGIME DE BENS
União estável é a relação de convivência entre dois cidadãos que é duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição familiar. O Código Civil não menciona o prazo mínimo de duração da convivência para que se atribua a condição de união estável.
Não é necessário que morem juntos, isto é, podem até ter domicílios diversos, mas será considerada união estável, desde que existam elementos que o provem, como por exemplo, a existência de filhos.
Na união estável prevalece o regime da comunhão parcial de bens, mas pode haver um contrato entre as partes sobre os bens dos companheiros com a mesma flexibilidade admitida no pacto ante-nupcial.
De acordo com a legislação, para que a união estável se configure e seja formalmente reconhecida, é preciso que apresente algumas características, devendo ser pública, contínua e duradoura e que as partes tenham a intenção de constituir família. Também, segundo a lei, a união estável deve ser equiparada ao casamento e sua conversão em casamento facilitada ao máximo.
Seus requisitos caracterizadores são bastante subjetivos, principalmente em relação ao tempo de relacionamento, se levarmos em conta que o único dado contido na lei acerca disso diz que a relação tem que ser "duradoura". Dispositivo legal anterior ao Código Civil de 2002, hoje em vigor, fazia menção ao prazo de cinco anos, mas o fato de a lei ser omissa em relação a isso causa temor naqueles que mantêm entre si uma relação de namoro ou noivado.
Considerando-se a subjetividade de seus requisitos caracterizadores, para reconhecimento de uma união estável os julgadores analisam outros vários elementos, além daqueles mencionados na lei, de modo a obter mais indícios de estarem diante de uma união estável ou qualquer outro relacionamento que não esse.
Para que se dissolva uma união estável, é preciso que ela, antes, seja reconhecida e a tarefa exige muita cautela, considerando-se que na dissolução podem estar envolvidos filhos, além de partilha de bens, pensão alimentícia e outras questões importantes.
Diante da complexidade e da gravidade que envolve reconhecer e dissolver uma união estável, os julgadores avaliam provas escritas (cartas, bilhetes, declarações), fotografias, depoimentos de testemunhas e tudo mais que puder ser útil para formar sua convicção.
Repita-se que se o casal vive em união estável sem a elaboração de uma escritura pública ou se nela nada estiver estabelecido em relação ao regime de bens, em caso de separação aplicar-se-ão as regras da comunhão parcial de bens. Caso a opção do casal seja por um outro regime, é preciso que isso conste expressamente da escritura, que deverá contemplar, também, todos os demais aspectos que o casal julgue importantes, inclusive pensão alimentícia, guarda e visitação de filhos, partilha do patrimônio etc, da forma que lhes for mais conveniente, desde que não haja contrariedade à lei.
União estável é a relação de convivência entre dois cidadãos que é duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição familiar. O Código Civil não menciona o prazo mínimo de duração da convivência para que se atribua a condição de união estável.
Com o advento do novo Código Civil, o art. 1.725 foi taxativo ao disciplinar que o regime de bens a ser adotado na união estável seria o da comunhão parcial de bens, salvo contrato escrito entre os companheiros que regule de forma diversa.
Art. 1.725 do Código Civil – Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.
Uma questão que gerou discussão por muito tempo foi referente à necessidade ou não da contribuição de ambos os companheiros na constituição do patrimônio do casal para que somente assim se falar em meação igualitária, pois conforme texto da citada Súmula 380 do STF, na união estável “é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum.”
Para solucionar essa questão o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul já julgou que, independentemente da contribuição individual dos conviventes, ambos terão direitos iguais no momento da partilha:
UNIÃO ESTÁVEL – DISSOLUÇÃO – PARTILHA – BENS MÓVEIS – PROVA. Comprovada a união estável, os bens adquiridos na constância da vida em comum devem ser partilhados de forma igualitária, pouco importando qual tenha sido a colaboração prestada individualmente pelos conviventes. Recurso provido. (TJRS - Apelação Cível 70.018.869.891- Relatora: Desembargadora Maria Berenice Dias).
IV - REGIME DE BENS NA COMUNHÃO PARCIAL
Com a introdução da Lei do Divórcio (6.515/77) o regime de comunhão parcial de bens é o regime que vigora quando não há manifestação de vontade dos nubentes – chamado de regime legal (artigo 1.640 do CC). Atualmente, encontra-se previsto nos artigos 1.658 até 1.666 do Código Civil. Esse regime determina que se comunicam os bens adquiridos pelo casal na constância do casamento.
O regime de comunhão parcial faz surgir três massas distintas de bens:
a) bens particulares do marido;
b) bens particulares da esposa;
c) bens comuns do casal.
O que significa que todos os bens adquiridos individualmente antes do casamento permanecem exclusivamente ao adquirente, inclusive aqueles bens que tem por título uma causa anterior (exemplo herança).
A esse respeito o artigo 1.659 do Diploma Civil arrola os bens que são excluídos da comunhão, a saber:
Art. 1.659. Excluem-se da comunhão:
I - os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar;
II - os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares;
III - as obrigações anteriores ao casamento;
IV - as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal;
V - os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão;
VI - os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge;
VII - as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.
Por sua vez os bens que entram na comunhão estão relacionados no artigo subsequente – 1.660 – vejamos:
Art. 1.660. Entram na comunhão:
I - os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges;
II - os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior;
III - os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges;
IV - as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;
V - os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.
Quanto aos bens móveis, à lei presume que foram contraídos na constância do casamento se não for possível comprovar que a aquisição antecedeu as núpcias.
A administração dos bens comuns compete a ambos os cônjuges (inteligência do artigo 1.663 do CC). Alguns autores denominam esse regime como comunhão dos aquestos ou de adquiridos.