Com advento das plataformas digitais e as inovações tecnológicas como os processos judiciais eletrônicos, surge o Inquérito Policial Eletrônico como desafio da Polícia Judiciária do futuro.
As vantagens com a implantação do inquérito policial eletrônico são inegáveis como forma de celeridade na sua conclusão, a racionalização dos recursos humanos atualmente empregados no formato de papel com economia e utilização das demais ferramentas tecnológicas.
Ademais, a implantação do inquérito policial eletrônico permitirá uma integração dos sistemas da Polícia Judiciária, Tribunal de Justiça e do Ministério Público, conferindo maior agilidade no andamento dos procedimentos a distanciar da morosidade, e ao mesmo tempo trará eficiência com dinamização das unidades policiais, o Poder Judiciário e o Ministério Público.
A informatização do inquérito policial traz também comodidade e facilitações às investigações como acesso do Delegado de Polícia, ao investigador de polícia (inspetor ou agente) e ao escrivão que terão a mobilidade de em qualquer local com acesso a internet, obter e manusear as peças encartadas, evitando extravios e propiciando inserção de peças novas até mesmo em diligências de campo.
Outra vantagem também dessa informatização é que o laudo pericial já seria inserido diretamente no sistema informatizado pela Perícia, integrando o inquérito policial digital, sem contar na modernização que acarreta à Polícia Judiciária do futuro.
Não distante dessas vantagens, o uso de ferramentas de tecnologia da informação, por outro lado também, traz preocupações que não podem ser ignoradas, principalmente com a segurança dos dados que trafegam pela rede mundial. Sabe-se que nenhum sistema informatizado e automatizado é totalmente seguro e imune de ataques, onde uma invasão indevida pode acarretar problemas inimagináveis na confiabilidade do sistema, marcha do inquérito entre outros transtornos como, divulgação de dados e fatos acobertados pelo sigilo legal, privacidade e intimidade – quer seja da vítima, quer seja de terceiros entre outros.
Outros pontos negativos, acerca do inquérito policial eletrônico é que este necessita de internet com capacidade para tanto, o que a depender da realidade da cidade integrante da unidade federativa e da disponibilidade pode representar problema de logística; alto custo do certificado digital das assinaturas para cada servidor; manutenção e aprimoramento do sistema – sendo que relação a estes dois últimos é algo inerente de qualquer sistema e não pareceria tanto negativo, embora represente um dispêndio financeiro contínuo para tanto.
É cediço que, por meio do inquérito policial que se apura a materialidade dos crimes e sua autoria.
O inquérito policial é a ferramenta procedimental que, via de regra, dá base empírica para a eventual propositura da competente ação penal.
Desta forma, em que pesem as inúmeras críticas dirigidas em face deste procedimento e até mesmo sobre sua dispensabilidade ou não[1], fato é que a grande maioria das ações penais em nosso país são encetadas, por propulsão desta ferramenta, que merece mais atenção e investimentos para fins de aprimoramento.
A panaceia de que é necessário abrir o leque de investigação para que outros órgãos investiguem e diminua os índices de criminalidade é uma falácia, pois se assim fosse verossímil esta constatação, também deveria abrir espaços, com todo respeito, para que outros órgãos julgassem, diante dos problemas enfrentados pelo Poder Judiciário na marcha dos processos – criados na maioria das vezes pelo próprio Estado e a cultura da litigância, já que é cediço os esforços incansáveis dos magistrados, desembargadores e servidores para mudarem esta realidade; assim como, abrir o feixe da fiscalização para que outros órgãos venham fiscalizar, a despeito dos órgãos existentes que já fiscalizam, mas não conseguem enfrentar e conter a corrupção e outros males que se agigantam.
O que deve ser feito é investimento na Segurança Público e nas Polícias Judiciárias e não ampliar órgãos que investiguem, respeitando-se o desenho constitucional das atribuições que é ignorada – por quem defende à ampliação da investigação – e dando autonomia administrativa e financeira, com vinculação apenas ao Estado. Segurança Pública não se combate apenas com o recrudescimento de lei, mas com investimentos em todas áreas como educação, infraestrutura, etc.
Diante do nosso ordenamento jurídico pátrio em que as garantias e direitos individuais são primados de envergaduras constitucionais, o inquérito policial acaba por divorciar e afastar ilações e suposições, para elucidar a autoria e materialidade do delito como um verdadeiro filtro fático, com a Polícia Judiciária comprometida com a verdade real e com Estado Democrático e Constitucional de Direito.
Com isto, o inquérito policial se mostra como um instrumento apto para se realizar justiças, inclusive para evitar uma possível denúncia leviana e sem a devida apuração ou até mesmo sem justa causa. Como exemplo da importância do inquérito policial, cita-se: os fatos atípicos; casos de excludente de antijuricidade/ilicitude em que o Delegado de Polícia pode e deve adentrar, vez que goza do arcabouço jurídico para desempenhar suas funções jurídicas. Ademais, o inquérito policial serve para espancar a dúvida, acerca da materialidade ou verdade real sobre a autoria do delito, resultados estes que podem também beneficiar o investigado etc.
A Polícia Judiciária não se cuida de uma polícia de Governo e sim de uma Polícia de Estado, que possui o compromisso de apresentar a “verdade real” dentro do inquérito policial – ainda que criticada por parcela dos estudiosos por representar a esta corrente uma verdadeira “utopia”.
Em sua obra, FERNANDO CAPEZ trata do conceito de inquérito policial:
"O inquérito policial é um procedimento policial administrativo, criado pelo decreto imperial 4.824/1871, e previsto no Código de Processo Penal Brasileiro como principal procedimento investigativo da polícia judiciária brasileira. Ele apura determinado crime e antecede a ação penal, sendo, portanto classificado como pré-processual. O Inquérito Policial é composto também de provas de autoria e materialidade de crime, que, geralmente são produzidas por Investigadores de Polícia e peritos Criminais, é mantido sob guarda do Escrivão de Polícia, e presidido pelo Delegado de Polícia" (CAPEZ, 2012, p. 32).
Dando sua contribuição acerca da temática, GUILHERME DE SOUZA NUCCI define inquérito policial:
“O inquérito policial é um procedimento preparatório da ação penal, de caráter administrativo, conduzido pela polícia judiciária e voltado à colheita preliminar de provas para apurar a prática de uma infração penal e sua autoria. Seu objetivo precípuo é a formação da convicção do representante do Ministério Público, mas também a colheita de provas urgentes, que podem desaparecer, após o cometimento do crime. Não podemos olvidar, ainda, que o inquérito serve à composição das indispensáveis provas pré-constituídas que servem de base à vítima, em determinados casos, para a propositura da ação penal privada” (NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 143).
FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO colabora definindo que o inquérito policial é:
“O conjunto de diligências realizadas pela Polícia Judiciária para a apuração de uma infração penal e sua autoria, a fim de que o titular da ação penal possa ingressar em juízo” (TOURINHO FILHO, Fernando da Costa, Processo penal. volume I, 26. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 196).
Sob o aspecto legal, estabelece a disposição do art. 4º, do Código de Processo Penal que:
"Art. 4º. A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria".
A mesma ótica da missão/atribuição (de apuração das infrações penais e da sua autoria) da Polícia Judiciária encontra assento constitucional no art. 144, § 4º, da Constituição Federal da República Federativa do Brasil e em outros diplomas legais estaduais – a depender da Constituição e legislações estaduais de cada unidade federativa.
Sem dúvida, diante desses ensinamentos doutrinários sobre o inquérito policial e dos dispositivos citados, se tem que o uso racional das tecnologias possibilitará ganhos reais ao serviço policial, máxime no que se refere ao inquérito policial eletrônico, trazendo dinamismo, celeridade e economia na fase extrajudicial.
RAFAEL FRANCISCO MARCONDES DE MORAES e JAIME PIMENTEL JUNIOR sustentam a possibilidade de se arvorarem das tecnologias do art. 405, §1º, do CPP e do art. 7º, inciso XIV, do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil em sede do inquérito policial e vão mais longe ainda para admitirem o inquérito policial eletrônico em nosso sistema:
“Neste ponto, importa registrar que, considerando que o inquérito policial segue o disciplinado no Código de Processo Penal, naquilo que não for aplicável, hoje temos o parágrafo 1º, do artigo 405, cuja redação em vigor foi dada pela Lei Federal nº 11.719/2008. [...] Embora tal disposição esteja inserida na instrução judicial, o legislador acabou usando termos próprio do inquérito policial, quais sejam ‘investigado’ e ‘indiciado’. Com isso, não há óbice para que tais recursos audiovisuais, como a gravação digital, sejam empregados nos registros e atos na etapa extrajudicial da persecução, instruindo o inquérito policial” . [...] Por oportuno, espera-se que, em um futuro não distante, seja uma realidade a efetiva implantação de projetos como o denominado ‘Inquérito Policial Eletrônico’, destinado a promover a informatização e a desmaterialização física de todo, e seria disponibilizado e operado pelas autoridades e agentes públicos em arquivos eletrônicos e diretamente interligados com o sistema do Poder Judiciário, propiciando maior eficiência e transparência na atividade estatal desempenhada, bem como imensa economia de recursos materiais e celeridade na comunicação dos atos de polícia judiciária entre os órgãos estatais envolvidos, além de viabilizar o acesso dos autos digitais à defesa de modo mais célere e dinâmico. Vale ainda ressaltar que, mesmo que o sistema se modernize e receba essa merecida e desejada atualização tecnológica, e assim venha a se tornar totalmente eletrônico, o inquérito policial continuará sendo procedimento escrito, porém sem a necessidade da gigantesca quantidade de papel impresso hoje empregada de todas as dificuldades para o deslocamento de autos físicos que atualmente são enfrentadas (MORAES; PIMENTEL JR., 2017, p. 100-102).
Na mesma direção, os delegados de polícia, BRUNO TAUFNER ZANOTTI e CLEOPAS ISAÍAS SANTOS, implicitamente também admitem o inquérito policial eletrônico (formato digital) ao escreverem a possibilidade de digitalizar e usar as técnicas do art. 405, §1º, do CPP, senão vejamos:
“O legislador perdeu a oportunidade de mudar o art. 9º do CPP. Contudo, não há qualquer óbice ao registro das oitivas no curso do inquérito policial através dos meios e técnicas elencadas no art. 405, §1, do CPP. Aliás, esse dispositivo faz menção expressa a investigado e indiciado. O que se observa é uma evolução na forma de registro dessas oitivas indo da escrita (literalmente), passando pela datilografada, digitalizada (como já é feita há muito tempo), até chegar aos meios mais modernos, previstos pela reforma de 2008 (ZANOTTI; SANTOS, 2016, p. 146).
No mesmo sentido conferir ainda a lição dos delegados de polícia ADRIANO SOUSA COSTA e LAUDELINA INÁCIO DA SILVA.
Indiscutivelmente, a soma deste formato eletrônico do Inquérito Policial propiciará como dito acima, a integração com outras instituições e a possibilidade de realizar consultas - guardado o sigilo e discrição afeto à investigação, bem como daqueles procedimentos sob segredo de justiça -, sobre o andamento do caderno investigativo por meio da internet, podendo inclusive o advogado peticionar e fazer juntada de documentos como já é feito no processo eletrônico, assim como facultando mais transparência e acessibilidade às partes.
Em Brasília, no dia 21 de outubro de 2016, o ministro da Justiça e Cidadania participou do lançamento do Sistema de Gestão da Atividade de Polícia Judiciária – ePol que visava criar o inquérito policial eletrônico.
Segundo o Ministério da Justiça e Segurança Pública, o ePol é o sistema que implementa o inquérito policial eletrônico, sendo que o programa permite interface com banco de dados e capacidade de integração com os principais sistemas do Poder Judiciário, Ministério Público e outras instituições parceiras. Esse rearranjo digital, sem dúvida, é fundamental não só para estas instituições como para proteção da sociedade que, acaba ganhando um reforço nesta interface com obtenção de informações instantâneas que são essenciais para as investigações.
A partir da implementação do ePol, a tendência é de que todos os inquéritos policiais passem a tramitar eletronicamente, valendo ressaltar que o sistema foi desenvolvido pela Polícia Federal em parceria com o Departamento de Sistema e Computação da Universidade Federal de Campina Grande/PB. Essa parceria teve como objetivo dar ênfase ao caráter colaborativo e dinâmico da atividade de Polícia Judiciária, propiciando o rápido registro, acesso e manutenção das informações inseridas no sistema.
Dando sequência ao tema, um dos projetos pioneiros após o lançamento do ePol que se têm notícias é o da própria Polícia Federal que já lançou o sistema de inquérito eletrônico. Com o ePol, estima-se que será feita uma economia anual de 14 milhões de folhas de papel, pois em média, a Polícia Federal instaura 70 (setenta) mil inquéritos por ano, cada um deles com cerca de 200 (duzentas) laudas. Em breve o sistema passará a ser adotado em todo o Nordeste e nas demais unidades do órgão.
Outro projeto pioneiro, diz respeito às delegacias da Seccional de Sorocaba da Polícia Civil do Estado de São Paulo que agora têm sistema eletrônico para a realização de inquéritos policiais e seu encaminhamento ao Fórum. Trata-se do sistema Sage, o mesmo utilizado pelo Poder Judiciário, no qual foi instalado em todas as 38 delegacias das 18 cidades sob a circunscrição da supracitada seccional.
Além disso, o sistema foi testado na Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) da capital em São Paulo.
Com esse sistema do Inquérito Policial Eletrônico de São Paulo, os casos de flagrantes, solicitações de medidas protetivas da Lei Maria da Penha e cautelares, como as representações de prisão preventiva e de intercepção telefônica, entre outros, são encaminhados com imediatismo para avaliação do juiz, o que possibilita que as decisões sejam tomadas e despachadas rapidamente, como o caso reclama.
De mais a mais, outro projeto pioneiro do inquérito policial digital, já foi implementado pelo programa Delegacia Legal, das Delegacias de Polícia Judiciária Civil do estado do Rio de Janeiro.
Em Mato Grosso, a implantação do Inquérito Policial Eletrônico, está em andamento para sua formatação e a previsão é de que em breve a Polícia Judiciária Civil do Estado de Mato Grosso possa contar com este importante instrumento[2] no combate e repressão à criminalidade.
Diante do aprofundamento do tema, a indagação inevitável que surge é a seguinte: necessitaria de lei em sentido estrito para permitir a tramitação de Inquéritos Policiais Eletrônicos (Digitais)?
A legalidade na Administração Pública é estrita, assim, a Administração Pública, incluindo a Polícia Judiciária (Polícia Civil e Polícia Federal entre outras) somente pode fazer algo em virtude de lei. Do contrário, caso não esteja na lei não poderia fazer. A legalidade estrita é diversa da legalidade do Direito Civil na seara privada, onde o que não é proibido é permitido.
De qualquer forma, existe em tramitação Projeto de Lei 1.811/2015 de autoria do deputado federal, Laerte Bessa, que dispõe sobre o inquérito policial eletrônico, e dá outras providências no Congresso nacional.
Veja a proposta inicial das alterações do Código de Processo Penal, contidas no Projeto de Lei 1.811/2015:
“Art. 1º O art. 9º do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941, passa a vigorar com a seguinte redação:
Art. 9º O inquérito policial observará o sigilo necessário à apuração das infrações penais e a forma indispensável à segurança jurídica, à proteção dos direitos e da imagem da pessoa submetida à investigação e à validade dos elementos de prova produzidos no inquérito.
§ 1º No inquérito policial eletrônico e demais procedimentos de polícia judiciária serão utilizados, sempre que possível, os meios tecnológicos disponíveis e não vedados pela lei, de tudo formando um só processado, sob o controle do delegado de polícia titular da investigação.
§ 2º As diligências serão registradas, sempre que possível, em meio eletrônico.
§ 3º As oitivas informais serão tomadas por meio de entrevista, que poderá ser registrada em relatório policial, e submetida à apreciação do delegado de polícia.
§ 4º As oitivas relevantes à investigação serão reduzidas a termo e assinados por quem as tiver prestado perante o delegado de polícia, sendo posteriormente digitalizadas e juntadas ao inquérito policial eletrônico em ordem cronológica. § 5º No interrogatório policial é garantida a participação de defensor, contratado ou nomeado, o qual subscreverá o termo de interrogatório, que será digitalizado e juntado ao inquérito policial eletrônico.
§ 6º Os laudos periciais e papiloscópicos requisitados pelo delegado de polícia serão confeccionados e assinados eletronicamente pelo responsável pelo exame e juntados ao inquérito policial eletrônico.
§ 7º Sem prejuízo do exame de corpo de delito, a materialidade e os elementos que indiquem a autoria delitiva poderão ser corroborados por outros meios de prova que demonstrem, direta ou indiretamente, os fatos que se busca elucidar, utilizando-se para tanto os recursos tecnológicos disponíveis.
§ 8º O auto de prisão em flagrante será confeccionado em meio eletrônico, digitalizando-se as peças subscritas pelas testemunhas e demais pessoas que tiverem participado do ato, sendo ao final homologado pelo delegado de polícia que o presidiu e remetido ao Poder Judiciário, ao Ministério Público e, se for o caso, à Defensoria Pública.
§ 9º Quando, por motivo técnico, for inviável a utilização de recursos tecnológicos para realização dos atos do inquérito, estes poderão ser praticados seguindo a forma tradicional, digitalizando-se, no caso de oitivas ou documentos em geral, os papéis físicos, do que será certificado pelo escrivão e homologado eletronicamente pelo delegado de polícia titular da investigação.
§ 10 A tramitação física dos autos do inquérito policial, antes do prazo de sua conclusão, será excepcional, limitando-se às hipóteses de apreciação de medidas cautelares requeridas diretamente pelo delegado de polícia ou pelo Ministério Público à autoridade judiciária, ou quando por esta requisitada.
§ 11 No caso de inquérito policial eletrônico, é garantido o acesso permanente do juiz e do membro do Ministério Público que oficiar nos autos, mediante controle; e à defesa do investigado ou indiciado é garantido o acesso aos elementos de prova já materializados, desde que não digam respeito a diligências sigilosas ou em andamento, incumbindo ao delegado de polícia titular da investigação delimitar a amplitude de acesso da defesa.
§ 12 Aplica-se, no que couber, ao inquérito policial eletrônico, o disposto na Lei nº 11.419, de 19 de dezembro de 2006”.
A justificativa do indigitado Projeto de Lei assenta que:
“JUSTIFICAÇÃO
Tendo em vista os avanços tecnológicos, é necessário que os procedimentos investigatórios criminais, notadamente o principal deles, o inquérito policial, acompanhe essa evolução, substituindo alguns métodos tradicionais de colheita de provas e de materialização delas no inquérito policial. Não obstante a necessidade de aprimoramento, impende consignar que a forma prescrita em lei é medida que garante a segurança jurídica, especialmente no que se refere à proteção da pessoa investigada, pois é no prévio conhecimento das formas legais e das regras procedimentais que o investigado e sua defesa podem ter a garantia de que o Estado atuará com o devido respeito aos direitos individuais.
É indiscutível o fato de que o inquérito policial se reveste de verdadeiro filtro procedimental contra acusações açodadas, imputações levianas ou ações penais sem justa causa, sendo, por conseguinte, uma garantia do cidadão de que não terá sua vida devassada de forma secreta, sem procedimento claro, sem forma definida, sem controle e sem uma apuração prévia séria e compromissada com a verdade. Ao contrário de procedimentos investigatórios realizados por outras instituições, o inquérito policial tem expressa previsão legal e é certamente o procedimento mais controlado e fiscalizado de que se tem notícia dentro do nosso ordenamento jurídico, porquanto o primeiro controle de legalidade já é realizado pelo delegado de polícia. A par disso, o inquérito policial sofre o controle externo exercido pelo Ministério Público, além de também ser fiscalizado pela defesa do investigado ou indiciado que, constatando qualquer ilegalidade, promove as medidas judiciais cabíveis, além, é claro, do principal, que é o controle exercido pelo Poder Judiciário. Podemos falar até mesmo no controle social, exercido com apoio da imprensa e entidades da sociedade civil organizada que não raramente cobram do poder público, especialmente da polícia judiciária, providências na apuração de crimes de maior repercussão. Logo, pode-se falar em um direito-garantia do investigado a um procedimento investigativo formal, visto que a forma se reveste como mecanismo de controle contra procedimentos investigatórios criminais sem regras. Certo da necessidade da existência de formas mínimas necessárias à segurança jurídica, o presente projeto permite um avanço no quesito eficiência do inquérito policial, valorizando a presunção de legalidade dos atos praticados pelos agentes policiais, sob o controle direto do delegado de polícia titular da função de investigação criminal exercida pela polícia judiciária. Com efeito, a atualização dos métodos investigativos é imperiosa, uma vez que a criminalidade avança em métodos mais sofisticados, enquanto ainda permanecemos com o inquérito policial basicamente cartorial e fundado na produção de papéis.
Forte nessas razões, o presente projeto altera pontualmente o Código de Processo Penal, especificamente o art. 9º, porém traz um efeito prático robusto, na medida em que diligências poderão ser realizadas de forma mais célere e eficiente, com registro de atos em meios eletrônicos, sob supervisão da autoridade policial titular da investigação criminal”. [destaques nossos].
No despacho da tramitação legislativa houve determinação do apensamento do Projeto de Lei 1.811/2015 de autoria do deputado federal, Laerte Bessa, ao Projeto de Lei nº401/2015. O último andamento que tem notícia do Projeto de Lei nº401/2015, data do dia 28 de abril de 2016, na qual houve o indeferimento da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados (MESA) acerca do Requerimento n. 2.412/2015, vazado no seguinte teor: "Indefiro, nos termos do art. 142 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, o pedido de desapensação contido no Requerimento n. 2.412/2015, porquanto os Projetos de Lei n. 401/2015 e n. 1.811/2015 tratam de matérias correlatas. Publique-se. Oficie-se."[3].
De outro lado, há quem defenda que a regulamentação do inquérito eletrônico possa ser feita utilizando como base a já existente Lei nº 11.419/2006[4], que, apesar de não fazer qualquer referência a inquéritos, diz, no primeiro parágrafo de seu primeiro artigo, que deverá ser aplicada “indistintamente, aos processos civil, penal e trabalhista”, segundo o delegado de polícia, DR. RUCHESTER MARREIROS BARBOSA. Assim, como o inquérito é parte do processo penal, nada impediria que a lei se aplicasse a ele na forma eletrônica, como já se aplica aos processos judiciais [5].
Podem surgir outros argumentos de que o Inquérito Policial antes era datilografado e agora é digitado pelo computador e impresso, sem a necessidade de Lei para tanto. Nesse ponto, segundo o ponto de vista calcado nestes argumentos, se cuidaria na verdade de mera adaptação instrumental para se amoldar à tecnologia da atualidade, porquanto não se pode ser escravo do papel impresso que gera burocracia, falta com o dever de transparência e eficiência.
Além disso, outro argumento – como já enfatizado em linhas pretéritas – seria sustentar a aplicação do art. 405, § 1º, do Código de Processo Penal, ainda que por analogia ao caso concreto:
“Art. 405 [...]
§ 1o Sempre que possível, o registro dos depoimentos do investigado, indiciado, ofendido e testemunhas será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações . (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008)”.
Esses 03 (três) últimos argumentos parecem os mais consentâneos com a realidade, sem dizer que não se pode fechar os olhos para as inovações tecnológicas em que a forma cada vez mais, tende a ser menos importante (diante da instrumentalidade das formas), dando lugar a substância e atendimento da finalidade dos atos - rechaçando desse modo, a incidência da legalidade estrita na situação em análise.