Feminicídio

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Neste artigo pretende-se lançar um breve olhar sobre a efetividade da Lei nº 13.104/2015, buscando-se verificar se houve uma regressão nas agressões sofridas pelas mulheres nestes dois anos pós-promulgação da referida lei.

RESUMO: Neste artigo pretende-se lançar um breve olhar sobre a efetividade da Lei nº 13.104/2015, buscando-se verificar se houve uma regressão nas agressões sofridas pelas mulheres nestes dois anos pós-promulgação da referida lei.

Palavras-chave: Feminicídio; Mulher; Lei nº13. 104/2015


INTRODUÇÃO

A Lei nº 13.104/2015 alterou o código penal  incluindo mais uma modalidade de homicídio qualificado, o feminicídio, crime praticado contra a mulher por razões da condição de sexo feminino.

 A adição do §2º-A como norma explicativa do termo "razões da condição de sexo feminino", estabelece que o feminicídio acontece em duas situações: a) violência doméstica e familiar; b) menosprezo ou discriminação à condição de mulher.

 O §7º acrescentado ao art. 121 do CP convenciona as causas de aumento de pena para o referido crime.

 A Lei acima, ao buscar alterar o cenário de violência praticado contra a mulher, prescreveu taxativamente que o feminicídio deve ser punido como homicídio qualificado.

Não pretendemos nos aprofundar no tema, por si só bastante extenso, mas apenas lançar um primeiro olhar sobre as alterações práticas dessa Lei na vida das mulheres que sofrem esse tipo de violência.

Para tanto, fizemos um breve levantamento em publicações que tratam do assunto, buscando resposta ao questionamento levantado pelo presente artigo.


POR QUE CRIAR A LEI Nº 13.104/2015? 

Define-se feminicídio como homicídio doloso praticado contra a mulher por “razões da condição de sexo feminino”, ou seja, desprezando, menosprezando, desconsiderando a dignidade da vítima enquanto mulher, como se as pessoas do sexo feminino tivessem menos direitos do que as do sexo masculino.

Convém lembrar que essa forma de assassinato é parte de um contexto de violência contínua contra a mulher que tem suas raízes históricas no sistema de patriarcado que, ao considerar a mulher como objeto de posse, justifica esse tipo de violência buscando corrigir comportamentos considerados inadequados ou não aceitáveis por parte das mulheres.

Destarte, os atos de violência longe de serem eventos isolados ou não esperados  ou surpreendentes fazem parte de um rol de abusos, desde verbais, físicos e sexuais, emocionais e psicológicos.

Segundo a ONU (Organização das Nações Unidas) o Brasil ocupa o quinto lugar no mundo em agressões às mulheres. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) conta de que a cada uma hora e meia no Brasil, uma mulher é agredida e morta, sendo que  um terço dos crimes acontece dentro de casa.

Ao contrário do que muitos pensavam, a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06) não tipificava condutas de violência contra a mulher, isto é, não apontava um rol de crimes em seu texto, abarcando tão somente um conjunto de regras processuais para proteger a mulher vítima de violência doméstica

Assim, antes da Lei n.º 13.104/2015, o homicídio praticado contra a mulher era punível na forma do homicídio simples.

Agora, o art.121, inciso VI, §2º do Código Penal, define que feminicídio é matar mulher por “razões da condição de sexo feminino”. Acrescentando ainda, o §2º do mesmo artigo que: “Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve: I - violência doméstica e familiar; II - menosprezo ou discriminação à condição de mulher”.

É certo que a nova lei não impedirá que agressões continuem acontecendo. No entanto, a tipificação do feminicídio na legislação, se não for um impedimento, significa uma vitória das mulheres brasileiras nessa luta, garantindo-lhes o Direito à vida, a sua integridade física e o acesso à Justiça.


FEMINICÍDIO NO BRASIL

Com uma taxa de 4,8 assassinatos em 100 mil mulheres, o Brasil está entre os países com maior índice de homicídios femininos segundo Mapa da Violência 2015 (Cebela/Flacso).

Considerando que existem poucas estatísticas quanto à realidade dos assassinatos ou agressões às mulheres, o quadro do feminicídio pode ser pior do que o apresentado em algumas pesquisas de vitimização. No Brasil o fator social, o gênero, a raça e as condições socioeconômicas compõem o caldo que nutre a violência contra a mulher. De fato, constata-se que as brigas e agressões domésticas fazem parte da cultura nacional agravadas pela inércia das autoridades que não se esforçam para enfrentar o problema.

Infelizmente ainda faltam protocolos que obriguem a clara designação do assassinato de uma mulher neste contexto discriminatório

As mulheres, quando da denúncia, encontram-se diante de estruturas sociais einstitucionais despreparadas para recebê-las. O problema relatado não encontra eco nas instituições (principalmente Delegacias de Mulheres) que tendem a desqualificar ou diminuir seu sofrimento, muitas vezes responsabilizando a vítima pelo acontecido.

As Diretrizes Nacionais para Investigar, Processar e Julgar com Perspectiva de Gênero as Mortes Violentas de Mulheres, documento elaborado pela ONU Mulheres Brasil, pelo Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU, pela Campanha do Secretário-Geral da ONU “UNA-SE pelo Fim da Violência contra as Mulheres”, pela Secretaria de Políticas para as Mulheres do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos e pelo Ministério da Justiça, com o apoio da Embaixada da Áustria, elencam uma série de procedimentos a serem adotados por instituições que atuam na apuração de responsabilidades criminais: a revisão de procedimentos de perícia, polícia, saúde e justiça, com o objetivo de colaborar para a implementação da Lei 13.104/2015, desde a notícia crime até o seu julgamento para justiça e reparação à vítima e fim da impunidade da violência contra as mulheres.


5 EFEITOS DA  LEI Nº11.104/2015

No Brasil, há nove anos, em agosto de 2006, era sancionada a Lei 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha, foi sancionada em agosto de 2006 buscando justamente aumentar  o rigor das punições para o crime de feminicídio.

Em março de 2015 foi sancionada a Lei 13.104/2015, a Lei do Feminicídio, tornando-o crime hediondo e com agravantes quando ocorrer em situações específicas de vulnerabilidade (gravidez, menor de idade, na presença de filhos, etc.). Assim, existe feminicídio quando a agressão/morte abrange não apenas a violência doméstica e familiar, mas também quando demonstra menosprezo ou discriminação à condição de mulher deixando patente ser o crime por razões de condição do sexo feminino.

Os registros do SIM (Sistema de Informações de Mortalidade) mostram que entre 1980 e 2013, morreu um total de 106.093 mulheres vítimas de homicídio num arco crescente ao longo do tempo, tanto em número quanto em taxas. Com a sanção da Lei nº 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha, no período 2006/2013, o crescimento do número desses homicídios caiu para 2,6% ao ano e o crescimento das taxas caiu para 1,7% ao ano.

No período anterior à Lei o crescimento do número de homicídios de mulheres foi de 7,6% ao ano.

No Rio de Janeiro, entre janeiro e agosto de 2017, 41 casos foram registrados pelo Instituto de Segurança Pública (ISP). Em São Paulo, no mínimo 63 mulheres foram mortas por seus companheiros entre janeiro e agosto deste ano.

No Espírito Santo a Universidade Federal do Espirito Santo revelou a existência de 84 casos de crimes de ódio contra mulheres, até 30 de agosto de 2017.

A Região Centro Oeste é a que apresenta mais estados com dados específicos. De janeiro ao fim de agosto, Goiás registrou 13 crimes suspeitos de serem feminicídios. Em 2016 foram 16. Mato Grosso do Sul e Mato Grosso registraram 22 crimes suspeitos de serem feminicídios cada um, sendo que em 2016 foram 16 crimes sob suspeitas de feminicídio no Mato Grosso do Sul e 34 no Mato Grosso.

O Distrito Federal mantém estatística mensal informando que entre janeiro e junho de 2017, 9 crimes suspeitos de feminicísio foram registrados no DF, contra 19 de janeiro a dezembro de 2016.

O Rio Grande do Sul registrou 40 suspeitas desse tipo de crime de janeiro a junho de 2017 e 96 casos em 2016. O estado mapeia feminicídios desde 2012 podendo-se verificar que até agora 463 deles foram consumados.

Pará, Amapá, Roraima e Rondônia não publicam dados sobre feminicídio. Segundo levantamento feito com base em  números do Ministério da Saúde de 2015, Ananindeua, no Pará, é a cidade que apresenta mais casos de violência contra a mulher no país, com uma taxa de 21,9 mortes de mulheres a cada 100 mil habitantes.

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O Amazonas registrou 12 suspeitas no estado em 2016 e outros 12 casos entre janeiro e agosto de 2017.

Em Pernambuco, de acordo com a Secretaria de Defesa Social, 21.125 mulheres foram vítimas de agressões domésticas entre janeiro a agosto de 2017, não sabendo informar quantos acabaram em morte.

O Piauí, assim como os demais nove estados da região Nordeste  não possuem dados estatísticos sobre o assunto.

De acordo com o Conselho Nacional do Ministério Público, órgão que faz levantamento do feminicídio a partir de denúncias e investigações a nível nacional, em todo país foram abertos, de março 2016 a março de 2017, 947 inquéritos de feminicídios.

A nível estadual o Brasil registrou, entre março de 2016 e março de 2017, no mínimo, oito casos de feminicídio (dados dos Ministérios Públicos estaduais). No total foram 2.925 casos no país. Um aumento de 8,8% no mesmo período do ano anterior.


CONCLUSÃO

O Brasil ocupa uma posição vergonhosa no ranking de agressões a mulheres no levantamento apresentado pela ONU, razão pela qual a qualificação do crime de feminicídio busca, senão solucionar, pelo menos abrandar a triste realidade vivida por uma grande parcela das mulheres brasileira, vítimas de agressões diárias conforme se infere dos dados apresentados.

Pergunta-se: a edição de uma lei terá o condão de modificar a cultura de violência presente hoje no País? .

Apos dois anos da sanção da Lei as estatísticas não demonstram que os agressores tenham se sentidos ameaçados pela sua aplicação.

O Direito Penal, por si só, não é capaz de oferecer proteção integral à mulher sem que da parte dos governantes haja implantação de políticas públicas que contribuam para uma efetivação da lei de maneira cabal, buscando antes prevenir a atenuar as consequências de um comportamento abusivo e inaceitável.

Observa-se por parte das autoridades uma negligência na coleta ou na publicação de dados que permitiriam aferir com maior clareza a sua efetividade.

Assim, cabe à sociedade civil e organizada se mobilizar em prol de ações que visem não só a punição exemplar dos agressores, como também a implantação de políticas públicas que visem coibir esse tipo de comportamento, cobrando dos estados políticas públicas que atinjam esse fim.


REFERÊNCIAS

brasildebate.com.br/brasil-e-um-dos-5-paises-com-maiores-taxas-de-feminicidio/.Acesso em 31/10/2017

https://draflaviaortega.jusbrasil.com.br/artigos/.../feminicidio-art-121-2-vi-do-cp, Acesso em 31/10/2017

bdm.unb.br/handle/10483/17528 Acesso em 31/10/2017

www.iesb.br/.../TCC-FEMINIC-DIO-Crime-por-omiss-o-do-Estado-Taynara-Pires.pdf. Acesso em 31/10/2017

https://estilo.uol.com.br/.../2017/.../feminicidio-estados-ainda-nao-divulgam-assassinat..Acesso 02/02/2017

https://g1.globo.com/.../brasil-registra-oito-casos-de-feminicidio-por-dia-diz-ministeri..Acesso 02/02/2017

www.agenciapatriciagalvao.org.br/dossie/violencias/feminicidio/ Acesso em 01/11/2017

https://nacoesunidas.org/onu-feminicidio-brasil-quinto-maior-mundo-diretrizes-nacio. Acesso em 01/11/20

https://apublica.org/wpcontent/uploads/2016/.../MapaViolencia_2015_mulheres.pdf.Acesso em 01/11/2017

ww.apoionamonografia.com.br/‎   Acesso em 31/10/2017

https://www.univates.br/bdu/bitstream/.../1/2015CarlaSimoneDienstmannPandolfo.pdfAcesso em 31/10/2017

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https://estilo.uol.com.br/.../2017/.../feminicidio-estados-ainda-nao-divulgam-assassinat..Acesso em 02/11/2017

www.ambitojuridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=17947 Acesso em 02/11/2017

openrit.grupotiradentes.com/.../VIOLÊNCIA%20CONTRA%20A%20MULHER%20o%... Acesso em 02/11/201

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Sobre os autores
Fabrício

Estudante de Direito na Faculdade Pitagoras

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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