Aplicação do princípio da insignificância no crime de roubo

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2 ROUBO – ART. 157 DO CPB

Para melhor entender a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância no crime de roubo, mister se faz um breve estudo sobre este delito.

O delito de roubo está previsto no Capítulo II do Título II da Parte Especial no artigo 157 do Código Pena Brasileiro, que assim o tipifica:

Art. 157. Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência.

Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 10 (dez) anos, e multa.

O delito ora em comento trata-se de crime complexo. Segundo as palavras de Mirabete (2005, p.135), que chama a atenção para duas espécies de crimes complexos: “[...] são complexos os crimes que encerram dois ou mais tipos em uma única descrição legal (em sentido estrito) ou os que, em uma figura típica, abrangem um tipo simples, acrescido de fatos ou circunstâncias, que, em si, não são típicos (em sentido amplo)”. E como exemplo de crime complexo em sentido estrito, o autor cita o roubo, "que nada mais é que a reunião de um crime de furto (art. 155) e de ameaça (art. 147) ou lesão (art. 129), ofendendo o patrimônio e a liberdade psíquica da vítima ou sua integridade corporal" (MIRABETE, 2005, p.135).

O núcleo do tipo é “subtrair”, que equivale a retirar algo de alguém, invertendo o título da posse do bem. No âmbito do roubo, interpretando-se a ação nuclear em sintonia com os demais elementos do tipo, pode-se afirmar que subtrair significa apoderar-se da coisa móvel da vítima. Porém, esta ação tem que ocorrer mediante grave ameaça ou violência à pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência (MASSON, 2013).

O elemento subjetivo é o dolo, acrescido do elemento subjetivo diverso do dolo, qual seja um especial fim de agir representado pela expressão “para si ou para outrem”, que é o fim de apossar-se como se fosse proprietário da coisa.

É crime comum, por não determinar sujeito ativo qualificado ou especial para sua prática, podendo ser qualquer pessoa, e o sujeito passivo é o proprietário/possuidor/detentor da coisa móvel, bem como qualquer outra pessoa que seja atingida pela violência ou grave ameaça.

É crime material, pois se faz necessário a caracterização do resultado naturalístico, consistente na diminuição do patrimônio da vítima.

Em regra, é crime comissivo, pelo fato de “subtrair” implicar em uma ação e, excepcionalmente, comissivo por omissão - omissivo impróprio -, pela relevância da omissão.

O crime de roubo possui pluralidade de objetos materiais, quais sejam: a coisa subtraída – coisa alheia móvel -, e a pessoa humana contra quem se volta a violência ou grave ameaça.

O roubo é crime pluriofensivo, ou seja, afronta dois bens jurídicos tutelados pela lei penal, sendo estes: o patrimônio e a integridade física – se praticado com violência a pessoa -, ou o patrimônio e a liberdade individual – quando cometido mediante grave ameaça. Existe uma junção de crimes contra o patrimônio e contra a pessoa, mas o roubo foi inserido no título dos crimes contra o patrimônio pelo fato de eu o resultado almejado pelo agente é a subtração patrimonial (MASSON, 2013)

O delito de roubo divide-se em roubo próprio e roubo impróprio. O roubo próprio tem previsão no caput do art. 157 do CP, e nele ocorre a prática do tipo penal previsto neste artigo, uma vez que o agente utiliza da ameaça ou da violência contra a pessoa para subtrair a coisa alheia móvel, ou seja, o momento do emprego do meio de execução é antes ou durante a subtração da coisa. Já no roubo impróprio, previsto no § 1º do art. 157 do Código Penal, a violência ou grave ameaça é exercida após a subtração da coisa, com o intuito de assegurar a impunidade do delito ou preservar a detenção da coisa subtraída.

2.1 DOS BENS JURIDICAMENTE TUTELADOS PELO CRIME DE ROUBO

Existem determinados “bens” que possui maior relevância que outros, bens estes pelos quais o legislador se interessa, expressando este interesse em uma norma jurídica, fazendo com que estes bens se tornem juridicamente tutelados, ou bens jurídicos penalmente tutelados. Deste modo, todas as condutas tipificadas com crime afetam algum bem jurídico, posto que os tipos penais são manifestações de tutela jurídica desses determinados bens.

O roubo é crime pluriofensivo, ou seja, afronta dois bens jurídicos tutelados pela lei penal, sendo estes: o patrimônio e a integridade física – se praticado com violência a pessoa -, ou o patrimônio e a liberdade individual – quando cometido mediante grave ameaça.

2.1.1 DO PATRIMÔNIO

Apesar de o delito de roubo tratar-se de um delito pluriofensivo, ou seja, que protege mais de um bem jurídico, porém, não se pode esquecer da relação de precipuidade que o patrimônio exerce sobre os demais – integridade física e liberdade individual -, mesmo o valor dos outros sendo superior ou deste (GRECO. 2011).

O patrimônio é defendido por diversas áreas do direito, e como não podia deixar de ser, pela área do Direito Penal.

O art. 5º[1], caput, da Constituição da República Federativa do Brasil, determina, que todos são iguais perante a lei, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade ao direito à propriedade, sendo considerado como um dos direitos fundamentais.

Da mesma forma, o Código Penal tutela e protege o direito de propriedade, onde foi tipificado crimes contra o patrimônio, localizados no Título II de sua Parte Especial.

Contudo, o que deve ser observado é que para o Direito Penal o patrimônio não possui a mesma concepção dos outros ramos, como a noção civilista por exemplo.

Para o Direito Civil, o patrimônio compreende o conjunto de relações ativas e passivas de que uma pessoa é titular. É, na definição de Clóvis Beviláqua (2007. p. 209/210) "o complexo das relações jurídicas de uma pessoa, que tiverem valor econômico".

Para o Direito Penal, o conceito de patrimônio não corresponde apenas, e necessariamente, ao do valor econômico, sendo assim, por consequência, o dano patrimonial não é sinônimo de dano econômico. Os crimes contra o patrimônio se dirigem, normalmente, contra certos direitos particulares integrantes da propriedade em sentido amplo.

Com efeito, na concepção de patrimônio do Direito Penal é compreendido a concepção do Direito Civil, possuindo, ainda, uma maior extensão, pois diz respeito também a coisas insuscetíveis de valor monetário.

Sobre a aplicação do princípio da insignificância nos crimes contra o patrimônio, discorre Maurício Antônio Ribeiro Lopes (1997, p. 163):

Um dos campos potencialmente mais conflituosos para a definição de um parâmetro concreto para a aplicação do princípio da insignificância tem sido, ao longo do tempo, o dos delitos patrimoniais. Duas justificativas podem servir para explicar essa afirmação. Inicialmente porque o desenvolvimento de uma mentalidade mais aceite aos princípios de um Estado Social e Democrático de Direito, que tende à revalorização dos interesses humanos fundamentais, e que é tônica deste tempo, têm levado mais e mais pessoas a ver, rever e reverter os desastres que uma pena criminal podem causar à vítimas dos sistema penitenciário, e o desvalor ético que se projeta na proteção da propriedade com a perda da liberdade do ofensor – o que hoje parece demasiado. Depois porque a legislação, por vezes, no afã de privilegiar uma infração que materialmente produz um resultado lesivo que, segundo critérios não muito bem explicados ou definidos até hoje, possa ser considerado de pequeno valor, defere já alguma espécie de benefício obstando a expressão mais assídua do princípio da insignificância.

Deste modo, fica claro, de acordo com o posicionamento majoritário, que quando insignificante a lesão ao patrimônio da vítima, deve ser aplicado o princípio da insignificância. Todavia, a problemática é encontrada quanto a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância quando o delito, apesar de ser classificado como crime contra o patrimônio, é praticado com violência ou grave ameaça e não atingi apenas o patrimônio da vítima, mas também sua integridade física ou a liberdade daquele que vier a sofrer a prática de tal delito.

2.1.2 DA INTEGRIDADE FÍSICA E LIBERDADE INDIVIDUAL

O que torna o roubo especial em relação ao furto é justamente o emprego de violência ou grave ameaça a pessoa (GRECO, 2011)

A integridade física e a liberdade do indivíduo são bens jurídicos considerados indisponíveis para o Direito Penal, em decorrência da grande importância de ambos bens.

Essa indisponibilidade quer dizer que as pessoas não podem dispor desses bens da maneira que bem entenderem, ou seja, da mesma maneira que podem dispor de seu patrimônio, por exemplo. Em relação à indisponibilidade dos bens jurídicos Eugenio Raul Zaffaroni e José Henrique Pierangeli (2010, p.467) afirmam que “[...] todos os bens jurídicos poderiam ser reduzidos a um único: a disponibilidade” e que “[...] bem jurídico penalmente tutelado é a relação de disponibilidade de um indivíduo com um objeto, protegido pelo Estado que revela seu interesse mediante a tipificação penal de condutas que o afetam”. Concluem os autores que “[...] no sentido de disponibilidade como uso, a vida é o mais disponível dos bens jurídicos, porque costumamos consumi-la a cada momento a nosso bel-prazer, mas ao decidir sobre ela frequentemente somos condecorados por arriscá-la”.

Integridade física nos remete a ideia de bem estar ou saúde física do indivíduo. Enquanto liberdade individual traz a ideia de que o indivíduo dentro de uma sociedade é livre para fazer suas próprias escolhas, ou seja, o Estado não impõe o que os cidadãos devem fazer, porém todos os cidadãos estão sujeitos a punição pelo eventual dano que essas escolhas venham a causar aos outros.

É a indisponibilidade deste bens que são utilizadas pela jurisprudência majoritária e pela doutrina para justificar a inaplicabilidade do princípio da insignificância no crime de roubo.


3 DA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NO CRIME DE ROUBO

Assim sendo, analisando mais profundamente sobre a aplicação do princípio da insignificância no crime de roubo, verifica-se que, em outros crimes, tal excludente é amplamente aceita. Entretanto, a jurisprudência pátria, em sua maioria, aponta para a impossibilidade da aplicação de determinado princípio no crime de roubo, independentemente da valoração da lesão ou da grave ameaça. De mister relevância se faz uma análise destas jurisprudências.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) assenta o entendimento majoritário no sentido de, por ser o crime de roubo um delito complexo, que atinge não só o patrimônio da vítima, como também a sua integridade física ou a liberdade do indivíduo, é impossível aplicação do princípio da insignificância em todos ao caso.

Seguem alguns arrestos do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acerca da inaplicabilidade do princípio da insignificância no delito de roubo:

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APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE ROUBO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. NÃO APLICAÇÃO. CONFISSÃO ESPONTÂNEA JÁ RECONHECIDA PELA SENTENÇA. REDUÇÃO DA PENA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. NÃO É CABÍVEL A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NO CRIME DE ROUBO, EM RAZÃO DA VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA A ELE INERENTE, E POR SEREM TUTELADAS, ALÉM DO PATRIMÔNIO, A INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL DA VÍTIMA. 2. DEVE SER EXCLUÍDA A AVALIAÇÃO DESFAVORÁVEL DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DA CONDUTA SOCIAL, DA PERSONALIDADE, DOS MOTIVOS E DAS CONSEQUÊNCIAS DO CRIME, MANTENDO-SE, TODAVIA, A AVALIAÇÃO NEGATIVA DOS ANTECEDENTES. NÃO É POSSÍVEL A EXACERBAÇÃO DA PENA-BASE COM FUNDAMENTO EM CONJECTURAS NÃO COMPROVADAS NOS AUTOS E NAQUELAS INERENTES AO TIPO PENAL. 3. NÃO HÁ INTERESSE NO PEDIDO DA DEFESA QUANTO AO RECONHECIMENTO DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA, TENDO EM VISTA QUE A REDUÇÃO PRETENDIDA JÁ FORA DEVIDAMENTE REALIZADA PELA SENTENÇA. 4. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO PARA EXCLUIR A AVALIAÇÃO DESFAVORÁVEL DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DA CONDUTA SOCIAL, DA PERSONALIDADE, DOS MOTIVOS E DAS CONSEQUÊNCIAS DO CRIME, REDUZINDO A PENA PARA 04 (QUATRO) ANOS DE RECLUSÃO E 10 (DEZ) DIAS-MULTA, NO VALOR MÍNIMO LEGAL. (grifo nosso)

PENAL E PROCESSUAL - ROUBO CIRCUNSTANCIADO - CONCURSO DE AGENTES - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - ALEGAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE GRAVE AMEAÇA E DANO EFETIVO OU SIGNIFICATIVA LESIVIDADE - DESCLASSIFICAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - APELO IMPROVIDO. I. REUNIDOS ELEMENTOS HÁBEIS E PROPÍCIOS A CORROBORAR A AUTORIA DELITIVA, NOTADAMENTE AS DECLARAÇÕES FIRMES E COESAS DA VÍTIMA E DAS TESTEMUNHAS, NÃO SE HÁ COGITAR DE ABSOLVIÇÃO. II. EM CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO, NORMALMENTE PRATICADOS ÀS ESCONDIDAS, A PALAVRA DO OFENDIDO CONSTITUI FORTE ELEMENTO DE CONVICÇÃO. III. INCABÍVEL A DESCLASSIFICAÇÃO PARA FURTO SE CARACTERIZADA A VIOLÊNCIA, QUE PODE SER FÍSICA OU MORAL. III. NÃO SE APLICA O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NO CRIME DE ROUBO. IV. APELO IMPROVIDO. (grifo nosso)

HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL. ROUBO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. INCABIMENTO. 1. Em se cuidando o roubo de delito complexo, não há pretender a aplicação do princípio da insignificância sem a consideração do crime-meio, que impede a afirmação da indiferença penal da conduta do agente. 2. A suspensão condicional do processo somente alcança os crimes em que a pena mínima cominada é igual ou inferior a um ano. 3. Ordem denegada.

Entendimento idêntico aos supra mencionados é encontrado em algumas jurisprudências do Tribunal de Alçada do Paraná, conforme os arrestos abaixo:

APELAÇÃO CRIMINAL – CRIME DE ROUBO QUALIFICADO – PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA – INAPLICABILIDADE – DESCLASSIFICAÇÃO PARA A TENTATIVA – INVIABILIDADE – REPRIMENDA PENAL EXCESSIVA – REINCIDÊNCIA DO APELANTE CONSIDERADA DUAS VEZES – BIS IN IDEM VEDADO EM NOSSO ORDENAMENTO JURÍDICO – ALTERAÇÃO DA DOSIMETRIA PENAL DE OFÍCIO – APELAÇÃO DESPROVIDA COM REDUÇÃO DA REPRIMENDA PENAL DE OFÍCIO - O princípio da insignificância não tem aplicação em crime de roubo, face a violência ou grave ameaça, que o caracteriza, posto que se tutela com o tipo penal, não só o patrimônio, mas também a integridade física da vítima".

"Opera-se o crime de roubo em sua forma consumada quando além de ser a res furtiva retirada da posse da vítima, passando para a posse do agente, ainda que por pequeno espaço de tempo, se verifica a cessação da ameaça exercida sobre a vítima". "Sendo a reincidência considerada como maus antecedentes na primeira etapa da fixação da penal, para ser considerada em uma segunda etapa como condição agravante da pena, ocorre bis in idem, circunstância que deve ser aparada, mesmo que de ofício, por causar evidente prejuízo ao agente. (grifo nosso)

PENAL – CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO – ROUBO – ARTIGO 157, PARÁGRAFO 2º, INCISO I E II DO CÓDIGO PENAL – MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADOS COM O BOLETIM DE OCORRÊNCIA, AUTO DE EXIBIÇÃO E APREENSÃO, AUTO DE ENTREGA E PELAS PALAVRAS DAS VÍTIMAS – VALOR PROBANTE – PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA – INAPLICABILIDADE – PENA E REGIME PRISIONAL CORRETAMENTE FIXADOS – RECURSO DESPROVIDO 1. Em sede do delito de roubo, as palavras da vítima são sumamente valiosas e não podem ser desconsideradas, máxime em crimes patrimoniais, quando incidem sobre o proceder de desconhecidos, pois o único interesse do lesado é apontar os verdadeiros culpados e narra-lhes a atuação e não acusar pessoas inocentes. 2. Na aplicação do princípio da insignificância devem ser considerados o tipo de injusto e o bem jurídico atingido. O objeto material, aí, nem sempre é decisivo mormente em se tratando de crime complexo em sentido estrito. 3. Em sede de delito de roubo, havendo a presença de mais de uma qualificadora, a pena aplicada deve sofrer aumento específico de, pelo menos 2/5, pois proporcional à exacerbação da submissão da vítima. 4. Se um dos agentes se utiliza de arma de fogo na prática do assalto, a circunstância é bastante a que o roubo seja qualificado, desimportando não tenham os demais se utilizado dela ou estivessem desarmados. (grifo nosso)

PENAL – CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO – ROUBO – ARTIGO 157 C/C ARTIGO 14, INCISO II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL – MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADOS COM O AUTO DE APREENSÃO, AUTO DE ENTREGA, CONFISSÃO EXTRA-JUDICIAL DO RÉU E PELAS PALAVRAS DA VÍTIMA – VALOR PROBANTE – PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA – INAPLICABILIDADE – RECURSO DESPROVIDO  1. A confissão, já chamada a rainha das provas é peça valiosa na formação do convencimento judicial. Toda vez que surgir de maneira espontânea, traduzindo a assunção da responsabilidade e afastada a mais remota hipótese de auto-imputação falsa, constitui elemento valioso para justificar a condenação. 2. Em sede do delito de roubo, as palavras da vítima são sumamente valiosas e não podem ser desconsideradas, máxime em crimes patrimoniais, quando incidem sobre o proceder de desconhecidos, pois o único interesse do lesado é apontar os verdadeiros culpados e narra-lhes a atuação e não acusar pessoas inocentes. 3. Na aplicação do princípio da insignificância devem ser considerados o tipo de injusto e o bem jurídico atingido. O objeto material, aí, nem sempre é decisivo mormente em se tratando de crime complexo em sentido estrito. (grifo nosso)

A fundamentação utilizada na maioria dos julgados reside no fato de ser o delito de roubo - art. 157 do CP - um crime complexo, uma vez que unifica duas condutas típicas previstas como crime em um só tipo penal, e, principalmente, pela indisponibilidade dos bens jurídicos tutelados por este delito, quais sejam, integridade física e a liberdade do indivíduo. Todavia, em relação a essa indisponibilidade, Zaffaroni e Pierangeli (2010, p.467) afirmam que “[...] no sentido de disponibilidade como uso, a vida é o mais disponível dos bens jurídicos, porque costumamos consumi-la a cada momento a nosso bel-prazer, mas ao decidir sobre ela frequentemente somos premiados e condecorados por arriscá-la”.

Porém, o que dever ser observado é que quando trata-se de situações excepcionais, observa-se a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância no delito de roubo, como verificado no Acórdão elaborado pelo relator Alexandre Victor de Carvalho (TJ/MG, 2007):

APELAÇÃO – ROUBO – PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA – CRIMES COM VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA – DELITO COMPLEXO – TIPICIDADE MATERIAL – NECESSIDADE DE OFENSA A AMBOS OS BENS JURÍDICOS TUTELADOS. É possível a incidência do princípio da insignificância mesmo nos crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, porque o juízo de tipicidade material não passa pela análise do comportamento da vítima, ou seja, seu dissenso ou contrariedade à ação do agente e, sim, em um juízo de lesividade da conduta – nullum crimem sine iniuria. Sendo o delito de roubo espécie de crime complexo, a lesividade da conduta para se adequar a este tipo penal deve abranger necessariamente os dois valores protegidos pela norma, sendo imprescindível significativa lesão ao patrimônio e à pessoa, cumulativamente. Não havendo lesividade relevante ao patrimônio da ofendida, ocorre a descaracterização do crime complexo de roubo. A tipicidade do crime de roubo está atrelada a lesões ao patrimônio e à liberdade individual (...). (grifo nosso)

Para uma melhor compressão da possibilidade de aplicação do referido princípio ao crime de roubo, mister se faz a menção a um caso prático, por exemplo, o sujeito “A” querendo subtrair para si a carteira do sujeito “B”, utiliza-se de uma trombada, configurando a violência, conseguindo assim subtrai a carteira do sujeito “B”. Porém, na carteira só existia uma nota de R$ 5,00 (cinco reais). Deste modo, fica claro que tanto a ofensa ao patrimônio, quanto a integridade física da vítima, ou seja, ambos bens jurídicos protegidos pelo delito, foram ínfimas, cumulativamente.

Como pode-se observar com o decorrer do trabalho, a tipicidade não se restringe a mera adequação da conduta do agente ao modelo abstrato previsto na lei, sendo necessária a ocorrência de uma relevante lesão ou perigo de lesão ao bem protegido pela lei. Sendo assim, o que deve ser observado é que o reconhecimento da tipicidade material não está na qualidade do bem tutelado, mas na ofensa efetiva ou provável ao bem jurídico tutelado.

Ademais, vale ressaltar que dos critérios fixados pelo Supremo Tribunal Federal, a ausência de periculosidade social da ação, mínima ofensividade da conduta, falta da reprovabilidade da conduta e a inexpressividade da lesão causada referem-se ao desvalor da conduta ou do resultado, não sendo citado em momento algum que deve ser observado a qualidade do bem jurídico tutelado.

Nesse sentido, não se pode esquecer do requisito da moderação: da proporção entre a pena e a conduta que se deseja reprovar. Os efeitos colaterais da pena imposta pelo Estado serão muito mais graves do que o próprio crime.

Sendo o crime de roubo, crime complexo e pluriofensivo, a ínfima lesão deve abranger ambos bens jurídicos, cumulativamente, protegidos pela tipo, para a possibilidade de aplicação do princípio da insignificância no delito, ou seja, é de fundamental importância a análise das peculiaridade de cada caso concreto.

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Sobre os autores
Alessandro Dorigon

Mestre em direito pela UNIPAR. Especialista em direito e processo penal pela UEL. Especialista em docência e gestão do ensino superior pela UNIPAR. Especialista em direito militar pela Escola Mineira de Direito. Graduado em direito pela UNIPAR. Professor de direito e processo penal na UNIPAR. Advogado criminalista.

Denise de Caires Silva

Graduada em direito pela Unipar. Advogada.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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