Responsabilidade penal, civil e trabalhista em decorrência dos atos de greve.

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IV. CASOS ESPECIAIS

Importante destacar os casos específicos dos militares e dos servidores públicos civis.

Quanto aos militares, sendo estes os que servem na Marinha, no Exército e na Aeronáutica, em nível federal, a Constituição Federal de 1988 determina expressamente que lhes são proibidas a sindicalização e a greve (art. 142, §3º, IV da CF/88). Já quanto aos membros das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares (militares estaduais), apesar de a Constituição não determinar que lhes sejam aplicadas as mesmas regras, a doutrina majoritária entende que é impossível, da mesma maneira, a sindicalização e a greve. Suas reinvindicações são normalmente feitas por meio de associações dos familiares com petições públicas ao legislativo, uma vez que a greve seria considerada um ato de insubordinação, resultando, por exemplo, no crime de motim (Artigo 182 do Código Penal Militar) ou nos crimes de insubordinação (artigos 163 a 166 também do Código Penal Militar).

Assim, conclui-se que os militares também se sujeitam às responsabilidades criminais e civis decorrentes dos atos de greve, ainda que essa seja ilegal.

Temos, ainda, a questão da greve para os servidores públicos. Ainda que a regulamentação da greve para os servidores seja diferente da aplicável aos trabalhadores na esfera privada, por força do que dispõe o artigo 37, VI e VII da Constituição Federal[1], não há dúvida que servidores também estão impedidos civil e criminalmente de causar danos a outrem, incluindo-se, aí, os atos de greve (art. 9º, §2º também da CF/88).

Na ausência de lei específica sobre o tema, e sendo garantido o direito fundamental de greve, o STF decidiu por aplicar, em decisão em Mandado de Injunção (especialmente os de nºs 670, 708 e 712), a Lei 7.783/89 aos servidores públicos, no que couber e enquanto não houver lei específica. Assim, devem ser mantidas as atividades consideradas essenciais e todos os requisitos da referida lei.

Ressalte-se a competência da Justiça Comum para apreciar as consequências da greve, como a remuneração dos dias de paralisação, os eventuais abusos decorrentes da greve e as medidas cautelares incidentes, por decisão do STF em Mandado de Injunção, de acordo com a divisão de competência estadual e federal. Segundo o STF, o juízo competente pode, ainda, optar por determinar regime mais severo que o da Lei 7.783/89.

Insta salientar que, com esta ausência de legislação específica, o Brasil, atualmente, não se pode dizer um verdadeiro implementador do quanto disposto na Convenção nº 151 e na Recomendação nº 159 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que dispõem sobre o direito de greve no serviço público e garantia da negociação coletiva.

No que toca à responsabilidade dos servidores, portanto, além das responsabilidades civis e penais que se aplicam a quaisquer trabalhadores, incontroversas, considera-se a especificidade da relação do servidor com a Administração Pública. É dizer, para os empregados públicos, aplica-se o disposto na CLT e aos servidores estatutários o regime estatutário.

Na omissão da lei específica conforme art. 37, VII da CF, tem-se sanado-a por meio de decretos, regimentos internos e até via judicial, pelo STF.

Há, por exemplo, a Súmula 679 do STF: “A fixação de vencimentos dos servidores públicos não pode ser objeto de convenção coletiva.”.

Veja-se, também, o Decreto nº 1.480, de 03/05/95, que, segundo sua ementa, “Dispõe sobre os procedimentos a serem adotados em casos de paralisações dos serviços públicos federais, enquanto não regulado o disposto no art. 37, inciso VII, da Constituição.”, dispondo, em síntese, que as faltas decorrentes da greve não podem ser abonadas, compensadas, ou contadas no tempo de serviço. Esta é a principal consequência trabalhista para os servidores públicos que aderem à greve considerada ilícita ou abusiva, tendo os dias paralisados descontados de sua remuneração e não contabilizados para tempo desserviço, em similitude com a suspensão do contrato para os trabalhadores regidos pela CLT.

E, ainda na jurisprudência, o Poder Judiciário foi determinando os limites da greve para os servidores públicos, como se vê nos seguintes julgados:

1. Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Parágrafo único do art. 1º do Decreto estadual n.º 1.807, publicado no Diário Oficial do Estado de Alagoas de 26 de março de 2004. 3. Determinação de imediata exoneração de servidor público em estágio probatório, caso seja confirmada sua participação em paralisação do serviço a título de greve. 4. Alegada ofensa do direito de greve dos servidores públicos (art. 37, VII) e das garantias do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LV). 5. Inconstitucionalidade. 6. O Supremo Tribunal Federal, nos termos dos Mandados de Injunção n.ºs 670/ES, 708/DF e 712/PA, já manifestou o entendimento no sentido da eficácia imediata do direito constitucional de greve dos servidores públicos, a ser exercício por meio da aplicação da Lei n.º 7.783/89, até que sobrevenha lei específica para regulamentar a questão. 7. Decreto estadual que viola a Constituição Federal, por (a) considerar o exercício não abusivo do direito constitucional de greve como fato desabonador da conduta do servidor público e por (b) criar distinção de tratamento a servidores públicos estáveis e não estáveis em razão do exercício do direito de greve. 8. Ação julgada procedente. (STF - ADI: 3235 AL, Relator: Min. CARLOS VELLOSO, Data de Julgamento: 04/02/2010,  Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-045 DIVULG 11-03-2010 PUBLIC 12-03-2010)

MEDIDA CAUTELAR NA RECLAMAÇÃO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DETERMINAÇÃO DE PAGAMENTO DOS DIAS PARALISADOS EM MOVIMENTO GREVISTA. ART. 7º DA LEI N. 7.783/1989. ALEGADO DESCUMPRIMENTO DA SÚMULA VINCULANTE N. 10 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. MEDIDA LIMINAR INDEFERIDA. PROVIDÊNCIAS PROCESSUAIS.Relatório1. Reclamação, com pedido de medida liminar, ajuizada pelo Município de Valparaíso de Goiás, em 5.4.2011, contra julgado da 1ª Turma da 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás, que, nos autos da Ação Declaratória de Ilegalidade de Greve n.187225-94.2010.8.09.0000 e da Medida Cautelar n. 201356-74.2010.8.09.0000, teria descumprido a Súmula Vinculante n. 10 do Supremo Tribunal Federal.O caso2. Em 27.5.2010, o Sindicato dos Servidores Públicos e Empresas Públicas Municipais de Valparaíso de Goiás – Sindsepem/val ajuizou ação cautelar, com pedido de liminar inaudita altera pars, contra o Município de Valparaíso de Goiás, com o objetivo de que ele se “absti[vesse] de efetuar qualquer lançamento de falta ou corte de salários dos servidores substituídos que aderiram e que venham a aderir ao movimento paredista deflagrado, até que se decida sobre a legalidade ou não do movimento, sob pena imposição de multa diária no valor de R§ 50.000,00 (cinquenta mil reais) a ser revertido em favor do autor” (fl. 19, doc. 5).Em 15.2.2011, a 1ª Turma da 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás julgou procedente a medida cautelar, nos termos seguintes:“MEDIDA CAUTELAR INOMINADA. RESTITUIÇÃO DOS DESCONTOS DE DIAS TRABALHADOS EM RAZÃO DE GREVE. É pacífico o entendimento de que se cuida de verba alimentar o vencimento do servidor, tanto quanto que o direito de greve não pode deixar de ser titularizado também pelos servidores públicos, não havendo como pretender a legitimidade do corte dos vencimentos sem que se fale em retaliação, punição, represália ou modo direto de reduzir a um nada o legítimo direito de greve consagrado na Constituição da República. Reconhecida, na ação principal, a não abusividade do movimento paredista, defeso é o desconto dos dias paralisados. AÇÃO CAUTELAR PROCEDENTE” (fl. 2, doc. 6).Os embargos de declaração opostos contra essa decisão (doc. 4) foram rejeitados (doc. 12).3. Em 18.5.2010, o Município de Valparaíso de Goiás ajuizou ação declaratória de ilegalidade de greve, com pedido de medida liminar, em desfavor do Sindicato dos Servidores Públicos e Empresas Públicas Municipais de Valparaíso de Goiás – Sindsepem/val,com o objetivo de “decretar a ilegalidade da greve e consequentemente sustar os seus efeitos, abstendo-se os grevistas de promover ou concorrer de qualquer modo para a paralisação dos serviços de ensino no Município” (fl. 17, doc. 9) Em 15.2.2011, a 1ª Turma da 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Goiás julgou improcedente a ação declaratória, nestes termos:“AÇÃO DECLARATÓRIA. DISSÍDIO COLETIVO DE SERVIDOR MUNICIPAL. REGULAMENTAÇÃO DA LEI DE GREVE DOS TRABALHADORES EM GERAL. LEI N. 7.783/1989. COMPETÊNCIA PARA A CAUSA. ABUSIVIDADE E ILEGALIDADE DA GREVE. DESCONTO DOS DIAS PARADOS. IMPROCEDÊNCIA.I – Por força do julgamento dos Mandados de Injunção ns. 670/ES e 708/DF, firmou-se o entendimento de que, em casos de dissídios coletivos no serviço público, a legislação aplicável, considerada a omissão legislativa à espécie, é a que regulamenta o direito de greve dos trabalhadores em geral, Lei n. 7.783/1989, como modo de preservar a qualidade desse direito, topologicamente consagrado na Constituição Federal de 1988 como uma garantia fundamental; exegese do art. 9 e inciso VII do art. 37. Também nesses julgados teve-se por firmado, enquanto perdurar a lacuna legislativa, ser de competência do Tribunal de Justiça Estadual as paralisações no âmbito da jurisdição estadual e municipal, se a controvérsia estiver adstrita a uma unidade da federação,ou a grave for de âmbito local municipal ou estadual.II – Havendo mostras de que o movimento paredista derivou da inércia contumaz da alcaide do Município de Valparaíso de Goiás, que negava à composição dos interesses e direitos, de naturezas econômico-jurídicos, dos professores da rede pública municipal,como modo de alienação à força de trabalho, sendo dela a atitude reprovável, não se pode declarar abusiva greve que se arrima justamente na busca desses direitos negados e interesses desatendidos; movimento esse que se mostrou único meio de impulsionar a devida garantia constitucional.III – Apesar do art. 7º da Lei n. 7.783/89 dispor que a participação em greve suspende o contrato de trabalho, assentando a ausência de segurança quanto ao desconto ou não dos dias parados, certo é que, no caso em comento, o dissídio levantado em sede coletiva, cuja abusividade não se reconheceu, descabe o desconto dos dias não trabalhados. AÇÃO DECLARATÓRIA JULGADA IMPROCEDENTE. (...) (STF - Rcl: 11536 GO, Relator: Min. CÁRMEN LÚCIA, Data de Julgamento: 06/04/2011, Data de Publicação: DJe-070 DIVULG 12/04/2011 PUBLIC 13/04/2011)

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V. BIBLIOGRAFIA

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- DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 11. Ed. – São Paulo: LTr, 2012.

- DELGADO, Maurício Godinho. Direito Coletivo do Trabalho. São Paulo: LTr, 2012.

- FRAGA, Ricardo Carvalho e VARGAS, Luiz Alberto de. GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS E STF. In: Rev. TST, Brasília, vol. 76, no 2, abr/jun 2010. Disponível em: <http://goo.gl/zUYJNp>. Acesso em 29 de abril de 2016.

- GERALDES, Pedro. A GREVE NO DIREITO COLETIVO DO TRABALHO. Disponível em: <https://www.trabalhosgratuitos.com>. Acesso em 30/10/2014.

- MARTINS, Sérgio Pinto. Curso de direito do trabalho. 4. ed., rev. e atual São Paulo: Dialética, 2005. 335 p. ISBN 8575001264.

- MARTINS, Sérgio Pinto. Greve do Servidor Público. São Paulo: Atlas, 2001.

- MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. 18ªEd. São Paulo: Atlas, 2002.

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- SILVA, Antônio Álvares da. Greve no serviço público depois da Decisão do STF. São Paulo: LTr, 2008.

- SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito constitucional do trabalho. 4. ed., ampl. e atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2010. 545 p. ; 23 cm ISBN 8571472629.

- TEIXEIRA, Bruno Cesar Gonçalves. Inconstitucionalidade da greve dos militares estaduais. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XVI, n. 109, fev 2013. Disponível em: <http://goo.gl/OPzUkH>. Acesso em 29 de abril de 2016.

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Sobre os autores
Anderson Fortti Pereira

Advogado pós graduado em Direito Civil, Direito do Trabalho e Direito Processual do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Camila Matsukura Evora

Advogada pós graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Raquel de Azevedo

Advogada pós graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Regina Markovits

Advogada pós graduada em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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O presente artigo foi elaborado a fim de suprir a ausência de material compilado que trata da responsabilidade decorrente dos atos de greve nas aludidas áreas do direito.

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