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Direitos trabalhistas garantidos à empregada vítima de violência doméstica e as controvérsias pertinentes

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21/02/2019 às 19:00
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DA GARANTIA DE EMPREGO APÓS O RETORNO AO TRABALHO

O direito de manutenção do vínculo trabalhista da empregada vitimada pela violência doméstica e familiar que precisar afastar-se do trabalho, por até seis meses, concedido pela Lei Maria da Penha pode ser considerado uma nova modalidade de garantia de emprego.

No caso específico da Lei 11.340/06, a norma tem o escopo de preservar o contrato de trabalho exclusivamente durante o período de 6 meses, enquanto a empregada encontrar-se afastada das suas atividades laborais, e não visa à tutela do emprego após o retorno da obreira às suas atividades normais no local de trabalho. (MARTINS, 2012, p. 374).

A disposição legal que garante a manutenção do contrato de trabalho, somada ao Princípio da Continuidade da Relação de Emprego, visam a proteger o vínculo empregatício celebrado e deixam claro que haverá a garantia somente enquanto a medida estiver sendo aplicada. Em atenção ao princípio da legalidade, sendo a lei omissa quanto à tutela do emprego após o encerramento do prazo de 06 meses, resta claro que o poder potestativo do empregador de dispensa da obreira estará engessado apenas enquanto perdurar essa situação, e não após o retorno da trabalhadora ao seu posto de trabalho.

Sendo assim, a empregada terá direito à garantia de emprego durante o período de afastamento permitido pela lei, dentro do qual, caso seja dispensada, terá direito à reintegração, por outro lado, ultrapassado esse prazo, o empregador reassume com plenitude o seu poder diretivo, podendo rescindir o contrato – com o pagamento das verbas rescisórias devidas.

Resta evidenciado que o legislador teve a intenção de proteger a obreira vítima de violência doméstica e familiar, permitindo seu afastamento do local de trabalho, exclusivamente durante o prazo de 06 meses, nada mencionando a respeito de proteção ao emprego após a ocorrência do retorno.

Nesse sentido, Tissiano da Rocha Jobim assevera que:

[...] o legislador, ao editar o dispositivo em comento, teve como única intenção a de possibilitar que a empregada vitimada pela violência doméstica ou familiar, ao afastar-se temporariamente do seu local de trabalho, não possa ser despedida, sendo-lhe garantido o retorno ao trabalho, desde que ocorra em até seis meses. Nesse sentido, o principal efeito do art. 9°, §2°, II, da Lei n°. 11.340/06 consiste na reserva do posto de trabalho durante determinado período, nunca superior a seis meses, garantindo o retorno da empregada a função que exercia ao ensejo da configuração do evento subordinador da suspensão do contrato. Destaque-se que após o retorno não há na lei qualquer regra que obste a rescisão do contrato de trabalho sem justa causa, pelo que inapropriado classificar a garantia como de emprego. (JOBIM, 2007, p. 1).

Portanto, é possível afirmar que a garantia de emprego perdura enquanto a obreira estiver afastada, mas a manutenção do vínculo laboral não significa garantia de emprego após o seu retorno ao trabalho.


CONCLUSÃO

A prerrogativa de afastamento do local de trabalho com respectiva manutenção do vínculo empregatício certamente garante uma melhor qualidade de vida e maior segurança para empregada vítima de violência doméstica e familiar, nos moldes descritos na Lei n° 11.340, de 07 de agosto de 2006, porquanto muitas vezes há o convívio diário com o agressor, seja no ambiente de trabalho ou ainda, nas proximidades deste.

Em relação à natureza jurídica desse afastamento, em que pese a existência de consistentes argumentos em ambas as extremidades – suspensão x interrupção –, adota-se o entendimento de que a paralisação da prestação dos serviços por parte da obreira, por meio de ordem judicial, insere-se na hipótese de suspensão contratual, não havendo por consequência o pagamento de salário e a contagem do tempo de serviço para todos os efeitos.

Por sua vez, para se garantir a efetividade da providência, necessário é que se assegure o pagamento de remuneração de natureza previdenciária ou assistencial, com vistas a assegurar à mulher numerários mínimos a lhe garantir a subsistência própria e da família durante o período do afastamento, por se tratar de única renda que dispõe para tanto.

Do contrário, certo é que inexistindo remuneração, a mulher, com riscos à sua segurança física e psíquica, pode dispensar o manejo deste recurso que a lei lhe oferece, primada pela necessidade de arcar com sua subsistência financeira e de sua família.

Assim, com o intuito de garantir a efetividade da lei supracitada em todos os campos do Direito, sobretudo o trabalhista, a regulamentação das situações omissas e/ou controvertidas torna-se imperativa, com o escopo de que a obreira vítima de violência doméstica e familiar possa usufruir dos direitos previstos, sem incorrer em dúvidas acerca dos efeitos oriundos desse exercício.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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SOUZA, Sérgio Ricardo de. Comentários à Lei de Combate à Violência Contra a Mulher. 3. ed. Curitiba: Juruá. 2009.

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CHARPINEL, Manuela Valim. Direitos trabalhistas garantidos à empregada vítima de violência doméstica e as controvérsias pertinentes. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5713, 21 fev. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/64646. Acesso em: 17 abr. 2024.

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