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Supremo Tribunal Federal e seus precedentes:

Princípios constitucionais estão morrendo à mingua?

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Estaria o STF condicionando as suas mudanças de pensamento à onda de punitivismo atual?

“O homem é um animal ideológico, que utiliza valores vigentes no sistema cultural no qual está inserido, a fim de racionalizar seu comportamento, alegando motivações diferentes das reais, com o fim de justificar-se ou de obter o consenso dos demais”. Lênio Luis Streck

O Supremo Tribunal Federal é órgão máximo da cúpula do Poder Judiciário, desempenhando a função de guardião da Carta Magna de 1988, nossa Constituição Cidadã. De modo que suas decisões deveriam guardar guarida no texto constitucional, ou seja, todo pronunciamento deve (deveria) ser sempre de acordo com a Constituição, respeitando os princípios ali esculpidos e propagados, que foram fruto de grande luta histórica e revoluções ideológicas. No presente artigo, irei expor duas decisões totalmente distintas e díspares em âmbito da Suprema Corte.

Primeiramente é importante a exposição dos ensinamentos do Jurista Uadi Lammêgo Bulos a respeito das funções da nossa Suprema Corte: “Incumbem-lhe, preponderadamente, as seguintes missões: fiscalizar a  constitucionalidade das leis e dos atos normativos; emitir a última palavra nas questões submetidas ao seu veredito; primar pela regularidade do  Estado Democrático de Direito, garantindo a separação dos Poderes; e  defender a supremacia das liberdades públicas, dos direitos fundamentais,  em face dos Poderes do Estado”. Ante a exposição do consagrado Jurista, é notório que o Supremo Tribunal Federal deve perquirir em síntese a supremacia constitucional, visando à segurança da ordem pública e controlando os atos do Poder Público de forma jurisdicional.

Acontece que isso está sendo desvirtuado, os votos exarados pelos eminentes ministros estão em total desacordo com os ditames constitucionais. Senão, lembremos que ao votar, Barroso argumentou que “a condenação de primeiro grau mantida em apelação inverte a presunção de inocência”. Segundo o ministro, o princípio da não culpabilidade é sinônimo de dois graus de jurisdição, não de trânsito em julgado.

Ouso discordar do eminente Ministro. A literalidade é clara, nosso texto constitucional veda a prisão em segunda instância, não o contrário, ou seja, não é correto imaginar o réu sendo levado ao cárcere com possibilidade de absolvição em grau de recurso. Sou do tempo (que não faz tanto tempo assim, diga-se, antes da mudança de entendimento do SFT, em 2016) que nos bancos da graduação os ilustres professores de Direito Constitucional defendiam os princípios constitucionais com unhas e dentes, era isso que movia o sentido de justiça e adequação em nós alunos, então é triste pensar de formar adversa, um princípio constitucional sendo relativizado em decorrência de uma onda de PUNITIVISMO a qualquer custo, que hoje é propagado pela República, é inglório, suscetível de ser um retrocesso ao nosso país.

Além disso, é imperioso destacar que em duas oportunidades recentes, na ADPF 347 e no Recurso Extraordinário 592.581, o Supremo reconheceu que o sistema carcerário brasileiro “está absolutamente falido”, disse Lewandowski. Logo, a incongruência se faz mais uma vez presente nas decisões da nossa Suprema Corte, é lamentável que neste momento de instabilidade (política, jurídica e social), o STF mude, diga-se mais uma vez, a jurisprudência do Tribunal.

Alerta já fez o próprio Ministro Luís Roberto Barroso em discussão travada em plenário com Ministro Gilmar Mendes: “Vossa excelência vai mudando a jurisprudência de acordo com o réu. Isso não é estado de direito, é estado de compadrio. Juiz não pode ter correligionário”, disse. Será que relatorias e decisões monocráticas devem ser vistas com a mesma visão? Isso é assunto para uma nova troca de farpas entre os Ilustríssimos Ministros (que não demorará a acontecer).

Por outro lado, decisão louvável deve ser lembrada nesse momento de instabilidade nos pronunciamentos da nossa Suprema Corte, em liminar dada no dia 19 de dezembro de 2017, quando o Eminente ministro Gilmar Mendes proibiu a condução coercitiva de investigados. 

Importante destacar as palavras do Ministro ao proferir sua decisão: “A condução coercitiva para interrogatório representa uma restrição da liberdade de locomoção e da presunção de não culpabilidade, para obrigar a presença em um ato ao qual o investigado não é obrigado a comparecer. Daí sua incompatibilidade com a Constituição Federal”, diz a liminar.

Não vou comentar neste momento (deixarei para um próximo artigo) a decisão do Ministro Gilmar Mendes, mas é inevitável acentuar que a decisão é um grande passo em busca da conservação dos valores e preceitos constitucionais, não é louvável relativizar o texto constitucional para “conveniência de momento”, isso seria uma erro grosseiro, não esqueçamos que estamos falando da nossa Suprema Corte, órgão máximo do Poder Judiciário, modular seus precedentes para atingir anseios populares do momento seria uma irresponsabilidade sem tamanho, e um caminho sem volta. Não deixemo-nos sucumbir a anseios populares passageiros, lembremos que estamos a tratar de JUSTIÇA, não de PUNITISMO A QUALQUER CUSTO!

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Sobre o autor
Higor Rian Barbosa da Conceição

Higor Barbosa. Advogado no Escritório Jâmison Monteiro Advogados. Pós-graduando em Processo Civil e Direito Público. Pesquisador em Direito Público e Processual, com ênfase em Jurisdição Constitucional.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CONCEIÇÃO, Higor Rian Barbosa. Supremo Tribunal Federal e seus precedentes:: Princípios constitucionais estão morrendo à mingua?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5391, 5 abr. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/64658. Acesso em: 19 abr. 2024.

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