RESUMO:Para o escopo do presente estudo, que se baseia na inserção e adaptação do direito na sociedade da informação, objetivou-se verificar como essa ciência passou a se desenvolver nesse novo modelo de sociedade, visando às novas conquistas relacionadas ao bem estar social e à pavimentação do ambiente jurídico sob ponto de vista igualitário e satisfatório. Para tanto, além de revisão bibliográfica sobre o assunto foram analisadas algumas adaptações, atualizações, melhorias e novas perspectivas nas aplicações jurídicas, com relação às tecnologias e amplitude de acessibilidade. Entre outros aspectos, os resultados evidenciam que a sociedade da informação veio introduzir maior produtividade nos processos cotidianos via manipulação de dados por meio eletrônico, guardado o devido cuidado jurídico específico e atualizado. Concluiu-se, também, que, sob o entendimento de que as teorias de desenvolvimento da sociedade e seus meios, fins e valores dependem do correto e facilitado acesso jurídico em suas análises, a existência de um direito inserido nesta marca da contemporaneidade é de extrema valia e necessidade.
Palavras-chave: informação, tecnologia, sociedade.
INTRODUÇÃO
A princípio, o termo “sociedade da informação” nos remete a pensar em algo unicamente ligado ao relacionamento das pessoas com um novo mundo repleto de tecnologia e somente a ele relacionado. Talvez os termos “sociedade da informação” sejam uma expressão colocada de forma infeliz, ou insuficiente, para exprimir a real complexidade das novas nuances de relacionamento entre os indivíduos com as novas maneiras de se comunicar e interagir em sociedade. Na verdade, possivelmente a palavra “sociedades” já traria complexidade e pensamento genérico do que realmente encontramos no mundo real, pois as disparidades são latentes entre as diversas sociedades existentes no globo.
Para o escopo do presente estudo, que é o Direito na sociedade da informação, tentaremos verificar como esta ciência passou a se desenvolver neste novo modelo de sociedade, com a aceleração das formas de contratação e surgimento das novas ameaças à manutenção das conquistas relacionadas ao bem estar social e à pavimentação do ambiente jurídico para que o desenvolvimento social alcance a todos de maneira satisfatória. Também serão analisadas algumas adaptações, atualizações, melhorias e novas perspectivas nas aplicações jurídicas, a partir de uma mutabilidade que tem real impacto sobre uma sociedade que necessita de mudanças que visem a atender seus ensejos e que “obrigam” o direito a se inovar e acompanhar essa evolução natural.
No que muitos chamam de “Revolução Cibernética”, a velocidade e versatilidade de meios na obtenção de informações faz com que o direito se amplie, surgindo assim a necessidade de produção de novos princípios e normas relacionadas às matérias de controle e circulação de informações, abrangendo aspectos técnicos, sociais e morais.
1. A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
Diversas são as definições para sociedade da informação. Nas palavras de Jorge Werthein,
a expressão “sociedade da informação” passou a ser utilizada, nos últimos anos desse século, como substituto para o conceito complexo de “sociedade pós-industrial” e como forma de transmitir o conteúdo específico do “novo paradigma técnico-econômico” (2000).
Essa sociedade pós-industrial ou “informacional”, como prefere Castells (2000 apud WERTHEIN, 2000), está ligada à expansão e reestruturação do capitalismo desde a década de 80 do século passado. Segundo o mesmo autor, são características fundamentais deste novo paradigma: a informação é sua própria matéria prima, já que as tecnologias desenvolvidas abrem aos indivíduos possibilidades efetivas de atuar sobre a informação primária, ao contrário do passado, quando o principal foco era utilizar a informação para agir sobre as tecnologias, criando novos implementos ou mesmo adaptando os antigos para novas utilidades; extrema utilização da lógica de redes, esta sendo complexa e que cabe ao uso de qualquer processo; efeitos das novas tecnologias com grande penetrabilidade, já que a informação integra as atividades dos indivíduos de forma individual ou coletiva e, desta forma, tendem a serem afetadas diretamente pelas novas tendência tecnológicas; tecnologia que favorece processos reversíveis, oferecendo flexibilidade e possibilitando que assim exista grande capacidade de reconfiguração e reorganização de todo e qualquer componente, e; agregação de novas tecnologias em várias áreas do conhecimento, como biológica, tecnológica, eletrônica, rede de computadores e de telecomunicações.
Diversas áreas do saber são interligadas e, na visão de Sérgio Iglesias, o termo “sociedade da informação” consolidou-se na Europa, em Conferência Internacional celebrada em 1980, onde a Comunidade Econômica Europeia reuniu estudos para analisar o futuro de uma nova sociedade, assim denominada por convenção, pelo interesse em regulamentação da liberdade de circulação de serviços e de medidas para implementação de mecanismos de comunicação que permitiriam aos Estados-membros da União Europeia estarem informados e terem acesso aos bens e serviços, sob a sigla TIC (Tecnologias de Informação e de Comunicação).
Acrescenta, ainda, que o termo “sociedade da informação” é uma expressão que traduz um novo conceito de proteção dos direitos fundamentais, uma nova orientação internacional em busca do direito ao desenvolvimento através da interação da comunicação e da telemática, em uma nova era de informações em tempo real, com transmissão global e assimilação simultânea. Aqui temos uma visão que se aproxima mais do papel que a ciência do Direito deve exercer nesta nova sociedade.
Assim, se visualizarmos o fenômeno do desenvolvimento da humanidade do ponto de vista sociológico (abordagem mais encontrada), observamos que existe um núcleo de significado: sociedade da informação é um termo cunhado para expressar um momento histórico da humanidade que é o novo formato assumido pelas relações de produção e interação social decorrentes do desenvolvimento da telemática surgida na sociedade pós-moderna, principalmente a partir de 1960.
2. O DIREITO INSERIDO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
Podemos entender o atual estado de organização da sociedade atual como fruto de uma revolução recente, baseada no desenvolvimento da telemática e mais visualizada por nós pela presença de computadores. Não é para menos, pois o computador é o veículo final pelo qual nós nos beneficiamos do desenvolvimento das telecomunicações e dos avanços da tecnologia empregada na construção de dispositivos eletrônicos (Ex.: nanotecnologia). Desta forma, ficamos tentados a simplificar o nosso entendimento do meio em que vivemos e trazemos, quase como sinônimos, “sociedade da informação” e a presença de computadores em nossas vidas.
Entretanto, como ressaltou Krishan Kumar, o conceito de sociedade da informação sob esta ótica é questionável e se ajusta bem à tradição liberal, progressista, do pensamento ocidental, porque mantém a fé do Iluminismo na racionalidade e no progresso. A melhor designação seria a teoria da sociedade pós-moderna, pois é a mais abrangente dentre as teorias recentes por acolher todas as formas de mudanças (culturais, políticas e econômicas).
Tais mudanças e seus efeitos são o novo espectro de atuação do Direito. No entendimento de Senise Lisboa, “sociedade da informação‟, também denominada de “sociedade do conhecimento‟, é a expressão utilizada para identificar o período histórico a partir da preponderância da informação sobre os meios de produção e a distribuição dos bens na sociedade que se estabeleceu a partir da vulgarização das programações de dados utilizadas nos meios de comunicação existentes e dos dados obtidos sobre uma pessoa e/ou objeto, para a realização de atos e negócios jurídicos”. Ainda, a “era da informação” não é apenas um slogan, mas um fato; a economia baseada no conhecimento é, realmente, uma nova economia, com novas regras, exigindo novas maneiras de fazer negócios.
Sobre esta economia, vale dizer que a mesma ancora-se em três pilares: a) o conhecimento impregna tudo o que compramos, vendemos e produzimos; b) os ativos do conhecimento, isto é, o capital intelectual, passou a ser mais importante para as empresas que os ativos financeiros e físicos e; c) prosperar na nova economia: explorar esses novos ativos significa a maior utilização de novas técnicas de gestão, novas tecnologias e novas estratégias”.
As transformações na sociedade foram extremamente profundas devido a massificação da informação e seus efeitos ainda são relativamente desconhecidos. E as mudanças não aconteceram somente para aqueles que tem acesso a um computador. A revolução se fez em todas as direções e atinge o modo de vida direta ou indiretamente de qualquer pessoa na era atual. O que fica explícito nesta colocação é a disparidade gerada entre os indivíduos que tem e os que não tem acesso a esse fluxo de informações, acarretando em diferentes produtividades e consequentemente em disparidades de renda.
A introdução do computador gerou uma revolução nas relações jurídicas. Entretanto, não se deve restringir esta noção apenas ao campo dos “direitos intelectuais que envolvem a questão da titularidade do hardware, com propriedade industrial, nem acerca da titularidade do software, como direito autoral”, diz Lisboa. Assim como ocorreu na revolução industrial, a alteração das relações jurídicas deve ser bem analisada. A sociedade da informação não é apenas restrita ao ambiente virtual. As relações continuam a ser interpessoais, assim como eram na sociedade industrial. A sociedade da informação veio introduzir uma maior produtividade dos processos via manipulação de dados por meio eletrônico nas mais diversas áreas (transportes, comércio, biotecnologia, meio ambiente, etc.). Deste modo, todos os ramos do Direito foram afetados e devem ser revisitados (Direito Civil, Direito Tributário, Direito Empresarial, Direito do trabalho, etc.). Importante também não confundir o Direito na sociedade da informação com o Direito da Informática, sendo este último apenas para estudar as relações jurídicas celebradas pelo meio virtual.
3. APLICAÇÃO CONCRETA DO DIREITO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
Como já discutido, o estudo do direito acompanha a evolução da sociedade e encontra, principalmente no campo cibernético, formas de atuação ou inserção de seus mecanismos de funcionamento. Através da internet, por muitos considerada o principal veículo de informação da sociedade contemporânea, o direito encontra a possibilidade de oferecer segurança às diversas relações jurídicas e procura, pode-se dizer que a passos largos, transitar cada vez mais entre o mundo real e o mundo digital. Sobretudo, a informação digital aparenta conferir estabilidade nestas relações, considerando, é claro, o fácil acesso ao mundo digital por grande parte da população que usa o sistema judiciário.
Essa inserção do direito na era digital, todavia, surgiu até mais por necessidade do que por iniciativa de inovação. Avanços e discussões sobre a regulamentação dos sistemas informáticos, atuação negocial e econômica por meios eletrônicos, crescimento do comércio via internet, acesso à publicações acadêmicas e literárias – facilmente disponíveis e em grande circulação na internet – o que desponta debates sobre direitos autorais, entre outros, são exemplos de como o direito, como mecanismo de controle social, teve (e cada vez mais terá) que se adaptar e ampliar seus estudos para as relações virtuais.
Devemos considerar, em contrapartida com todos os benefícios que a era da informática e tecnologia nos traz, a evidente problemática que acompanha a disseminação de informação via internet: a vida privada dos indivíduos se tornou mais vulnerável. Pode-se dizer, ainda, que essa vulnerabilidade muito em parte se dá por ações das próprias pessoas que, visando a atender as novas modalidades tecnológicas, chegam a comercializar dados pessoais e até a compartilhar informações profissionais, fortemente influenciadas pela cultura contemporânea que sinaliza que quanto mais “cibernético”, melhor; o indivíduo atualizado e conhecedor das novas tecnologias é, sobretudo, uma pessoa culta e atualizada.
Neste sentido, o direito na sociedade da informação deve compor legislações atualizadas no âmbito privado, atentando para os avanços tecnológicos e sociais. Aparentemente identificado em campos distintos – Civil (negócios jurídicos, contratos virtuais e relações econômicas de consumo) e Intelectual (direitos autorais e circulação de cultura) – tem que agir de forma a proteger a liberdade de expressão, a garantia da informação e a própria intimidade de seus usuários, estes, inclusive, preceitos fundamentais de nossa atual Constituição Federal “cidadã” de 1988. Já no âmbito público, o Estado vê sua atuação de forma diferenciada, tendo que atentar para aqueles que não têm acesso à informação e que têm dificuldades em se incluir na era digital, até do ponto de vista social, como analisaremos em capítulo próximo.
Seus esforços devem, portanto, alcançar todos de forma indiscriminada. Pode-se dizer que o direito no âmbito público segue uma relação no sentido Estado-Sociedade. Isto significa dizer que é por excelência, a partir do Estado, que as relações jurídicas devem ser moldadas às diversas formas de comunicação, com a prestação de serviços sendo realizada de forma segura e célere aos os cidadãos e melhorando a dinâmica do sistema, diga-se de passagem, já que o sistema judiciário encontra-se “atolado”.
Um grande avanço no aspecto do funcionalismo do Poder Judiciário é o “Processo Judicial Eletrônico”. Este instrumento eletrônico revela, de forma promissora, como que o Estado pode tornar menos burocrática a consulta e andamento de processos judiciais; é, sobretudo, uma grande amostra de como a justiça pode adequar-se à tecnologia, e vice-versa. Outros ramos do direito público também englobam questões da sociedade da informação, e não somente o processual, onde se pauta a inovação descrita acima. Talvez o mais discutido seja o Direito Penal, nos tão falados “crimes cibernéticos”, também conhecidos como crimes eletrônicos ou informáticos.
Em uma definição sucinta, o crime eletrônico é aquele que decorre da utilização de computador (internet) como ferramenta para invasão, ataque ou coleta de dados de forma ilegal. Contudo, vale apresentar algumas definições mais técnicas e que ampliam a interpretação do uso mal intencionado da tecnologia à serviço da informação: qualquer conduta criminal em que o computador está envolvido como material, objeto ou mero símbolo; são elas: “criminalidade informática” -todas as formas de comportamento ilegal que venham a, de qualquer forma, provocar danos sociais por intermédio de um computador; “crime informático” - toda ação dolosa que provoca prejuízos a pessoas ou entidades, utilizando dispositivos habitualmente empregados nas atividades de informática para sua consumação. Em outras palavras, é a conduta que atenta contra o estado natural dos dados e recursos oferecidos por um sistema de processamento de dados, seja pela compilação, pelo armazenamento ou pela transmissão de dados (Rodrigues da Costa).
Além disso, são crimes de difícil controle, pois a rede mundial de computadores permite que usuários em todo o mundo se comuniquem e troquem informações. Violação de dados, mensagens falsas, movimentação bancárias, transações nacionais e internacionais e subtração de arquivos são alguns exemplos corriqueiros de crimes eletrônicos. Em algumas situações, a subtração de arquivos e dados pessoais não objetiva, por exemplo, vantagem econômica, mas representa um ataque moral, nos casos que o criminoso visa denigrir a imagem da vítima, podendo até se passar por esta, assumindo falsamente sua personalidade. No aspecto econômico-empresarial, muito comum, os alvos são empresas e demais organizações que sofrem com vazamento de informações, sabotagens, pirataria e espionagens de sistema e informações (através dos vírus, spywares, etc.).
O Direito Administrativo é outro ramo que merece destaque por sua relação com a sociedade da informação. O maior exemplo é a Portaria Interministerial nº 140, de 16 de março de 2006, que disciplina a divulgação de dados e informações pelos órgãos e entidades da Administração Pública Federal, por meio da rede mundial de computadores, além de determinar que todo órgão público tenha sua própria página de transparência. Há de se concordar que, desta forma, a eficiência da Administração é destacada, a prestação de serviço fica mais clara perante a sociedade e, ainda, fortalece o espírito democrático em nosso país.