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Do cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de pagar quantia certa pela fazenda pública

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12. Precatório e RPV

I - expedir-se-á, por intermédio do presidente do tribunal competente, precatório em favor do exequente, observando-se o disposto na Constituição Federal;

II - por ordem do juiz, dirigida à autoridade na pessoa de quem o ente público foi citado para o processo, o pagamento de obrigação de pequeno valor será realizado no prazo de 2 (dois) meses contado da entrega da requisição, mediante depósito na agência de banco oficial mais próxima da residência do exequente.

Como dito anteriormente, o recebimento de créditos da Fazenda Pública tem procedimento específico a ser seguido, tendo suas bases previstas na Constituição Federal, mais precisamente no artigo 100 e seus parágrafos.

O pagamento pode se dar por precatório, ordem de pagamento de competência do Presidente do Tribunal, a quem caberá observar a sua ordem cronológica. É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades de direito público, de verba necessária ao pagamento de seus débitos oriundos de decisões judiciais transitadas em julgado e constantes de precatórios judiciários apresentados até 1º de julho, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte, quando terão seus valores atualizados monetariamente.

Importante destacar que os débitos de natureza alimentícia, que compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, serão pagos com preferência sobre os demais débitos, exceto sobre alimentares cujos titulares tenham 60 (sessenta) anos de idade ou mais na data de expedição do precatório, ou sejam portadores de doença grave, definidos na forma da lei, que serão pagos com preferência sobre os demais débitos, até o valor equivalente ao triplo do fixado em lei para os débitos sujeitos à expedição de Requisições de Pequeno Valor, admitido o fracionamento para essa finalidade, sendo que o restante será pago na ordem cronológica de apresentação do precatório.

Quanto aos Juros e atualização monetária, é essencial, de início, conhecer o teor da súmula vinculante nº. 17 do STF:

Durante o período previsto no parágrafo 1º do artigo 100 da Constituição3, não incidem juros de mora sobre os precatórios que nele sejam pagos.

No que toca à forma de aplicação dos índices previstos no art. 100, § 12 da CF4, sua redação foi considerada inconstitucional pelo STF ao julgar as ADIs 4357 e 4425, o que por consequência também demonstra a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei 9494/97, de idêntica redação.

Segundo Leonardo Carneiro da Cunha:5

“Na verdade, os juros moratórios somente incidem a partir do atraso no pagamento, ou seja, decorrido o exercício financeiro, e não tendo sido pago, a partir de janeiro do ano seguinte é que deve iniciar o cômputo dos juros. Assim, tome-se como exemplo um precatório que tenha sido inscrito até o dia 10 de julho de 2015. Deverá; como se viu, ser efetuado o pagamento até o dia 31 de dezembro de 2016, respeitada a ordem cronológica de inscrição. Sendo o pagamento realizado até aquele dia 31 de dezembro, não haverá cômputo de juros moratórios, pois não houve inadimplemento. Passado, contudo, o dia 31 de dezembro de 2016, sem que tenha havido o pagamento, incidirão juros moratórios a partir de 10 de janeiro de 2017 até a data em que ocorrer o efetivo pagamento”.

Nos casos de RPV, o “pequeno valor” apontado pelo dispositivo constitucional deverá ser indicado por cada entidade federada, por meio de legislação específica, segundo previsão do art. 100, § 4.º, da CF. O art. 97, § 12, do ADCT (incluído pela EC 62/2009) dispõe ainda que, se a lei referida no art. 100, § 4.º da CF não tiver sido publicada em até 180 dias contados da publicação da emenda constitucional, para os Estados e Distrito Federal o valor será de 40 salários-mínimos e para os Municípios de 30 salários-mínimos. No âmbito federal, o pequeno valor foi determinado pelo art. 17, § 1.º, da Lei dos Juizados Especiais Federais (Lei 10.259/2001) e confirmado pelo art. 2.º da Resolução 373/2004 do Conselho da Justiça Federal em 60 salários-mínimos (art. 17, § 1.º)”6.

Outra questão importante é a possibilidade de cessão e compensação no âmbito dos precatórios, temas sobre os quais trata Humberto Theodoro Júnior7:

“Os créditos constantes de precatórios, mesmo os de natureza alimentar, podem ser livremente cedidos, sem depender da concordância da Fazenda devedora (CF, art. 100, § 13, com a redação da EC nº 62/2009). Contudo, se tal ocorrer em relação a créditos alimentares, o cessionário não se beneficiará dos privilégios executivos anteriormente conferidos ao cedente. Vale dizer: após a cessão, o crédito perde sua natureza alimentar, passando à categoria de crédito comum, em face da executada. O mesmo ocorre com a obrigação de pequeno valor: o cessionário não poderá se valer da execução por requisição direta. É nesse sentido que se deve entender a ressalva do § 13 do art. 100 da CF, que afasta o cessionário das regras dos §§ 2º e 3º do mesmo dispositivo constitucional.

Há, por outro lado, uma compensação possível entre o crédito que se pretende executar por meio do precatório e o débito líquido e certo acaso mantido pelo exequente em face da executada (CF, art. 100, § 9º). Não se trata de compensação tributária regida pelo CTN, mas de compensação constitucional que nem sequer reclama inscrição prévia em dívida ativa da Fazenda credora. Basta que se trate de obrigação líquida e certa, expressa em valor monetário tal como se dá com o crédito exequendo, pouco importando a fonte de que se tenha originado.

Para se cumprir a compensação constitucional, o Tribunal, antes de expedir o precatório, solicitará à Fazenda devedora que informe sobre os débitos passíveis de compensação. A informação deverá ser prestada no prazo de trinta dias, sob pena de perda do direito de abatimento (CF, art. 100, § 10).

Havendo dívida compensável, o precatório será expedido pela soma líquida, isto é, pelo apurado depois do devido abatimento.

Outra compensação autorizada pela EC nº 62/2009 é aquela que se previu no novo art. 97, § 10, II, do ADCT, para caso de não liberação tempestiva dos recursos relativos ao regime especial instituído pelo citado dispositivo transitório. Em tal conjuntura, o credor poderá obter do Presidente do Tribunal ordem de compensação automática com seus débitos líquidos mantidos com a Fazenda executada. Sobejando saldo em favor do exequente, seu valor terá automaticamente poder liberatório para pagamento de tributos devidos à executada, até onde se compensarem.

Prevê, por último, a EC nº 62/2009 a possibilidade de utilização do crédito constante de precatório para compra de imóveis públicos do respectivo ente federado. Essa faculdade, todavia, dependerá de futura regulamentação em lei (CF, art. 100, § 11)”.


13. A impugnação parcial e seus desdobramentos

§ 4o Tratando-se de impugnação parcial, a parte não questionada pela executada será, desde logo, objeto de cumprimento.

Nada mais razoável do que desde logo permitir ao credor o recebimento do valor incontroverso, o que inclusive já encontrava precedentes nos tribunais antes mesmo da inovação legislativa8, já que a demora no pagamento de parte incontroversa prejudica o direito não só do credor, mas também do devedor, que continuará a ver juros e atualizações monetárias incidindo inclusive sobre a parte que sabe ser incontroversa da obrigação de pagar.

Ocorre que não se pode confundir o disposto no § 4º com o cumprimento provisório de sentença em face da Fazenda Pública. Explico.

Nas execuções contra o ente fazendário, é da própria natureza da ordem que determina obrigação de fazer, não fazer ou entrega de coisa, que sejam adotas as medidas para sua execução provisória, as vezes fundadas em ordem liminar, e as vezes em sentença ainda sujeita a recurso sem efeito suspensivo, como ocorre nos mandados de segurança, por exemplo.

Ocorre que a regra quanto à obrigação de pagar quantia certa é a vedação ao cumprimento de sentença provisório9. Veja-se:

(…) 2. É cediço que na obrigação de pagar quantia certa, o procedimento executório contra a Fazenda é o estabelecido nos arts. 730 e 731 do CPC que, em se tratando de execução provisória, deve ser aplicado em harmonia com as normas constitucionais, que determinam que a expedição de precatório ou o pagamento de débito de pequeno valor de responsabilidade da Fazenda Pública, decorrentes de decisão judicial, mesmo em se tratando de obrigação de natureza alimentar, pressupõem o trânsito em julgado da respectiva sentença. (…) (REsp 1271184/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/09/2011, DJe 21/09/2011)

Apesar de parecer que o §4º permite a execução provisória, este não é o caso, já que o cumprimento de sentença provisório pressupõe a possibilidade de ainda se discutir o débito, seja sua validade ou valor, o que após o trânsito em julgado e a concordância por parte da Fazenda Pública, quando deixa de apresentar impugnação, passa a ser incontroverso.

Ressalva que deve ser feita neste ponto diz respeito ao pagamento mensal de verbas alimentares decorrentes de ato ilícito praticado pelo ente público ou de pensões previdenciárias, o que encontra respaldo nos precedentes jurisprudenciais, como no caso em que se determina liminarmente o pagamento de pensão mensal à viúva de um servidor ou a uma família que perdeu o provedor por suposto ato praticado pelo preposto do ente público, como em acidente causado tendo como responsável o servidor na direção de ambulância pública. Vejamos:

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Não obstante as restrições à concessão de medidas liminares, agrupadas agora no art. 7º, § 2º, da Lei n. 12.016/09, é possível a concessão de tutela antecipada, contra a Fazenda Pública, nas causas que tenham por objeto benefício de natureza previdenciária (Súmula 729/STF). 2. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 261.364/ES, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10/06/2014, DJe 20/06/2014)

Vale ressaltar, por fim, que se concorda com o posicionamento10 de que a vedação ao cumprimento provisório de sentença alcança apenas a expedição do precatório ou do RPV, sendo perfeitamente possível que a parte exequente o inicie, com a intimação da Fazenda Pública para impugná-lo, seguida de decisão judicial e se for o caso de recursos, para que ao final do julgamento do processo principal, quando transitado em julgado o título executivo judicial, seja expedida tão somente a ordem de pagamento no caso de manutenção do julgado provisoriamente executado.

Outro ponto a ser destacado quanto a este cumprimento parcial da sentença é a possibilidade ou não de complementação do Precatório ou do RPV anteriormente expedido, bem como a inconstitucionalidade da cisão da execução para fins de recebimento por RPV. Explico:

Quanto à complementação do precatório já formado no tribunal de justiça, o Supremo Tribunal Federal só a admite em três situações específicas: a) erro material; b) inexatidão aritmética; e c) substituição do índice aplicado ao caso, por força normativa.

Veja-se:

I- A complementação de precatório original apenas pode ocorrer em três hipóteses: a) erro material; B) inexatidão aritmética; C) substituição do índice aplicado ao caso, por força normativa. ADI 2.024/SP , Rel. Min. Carlos Velloso. II- A não verificação de uma das hipóteses permissivas enseja a expedição de novo precatório, observada a vedação do § 8º do art. 100 da CF/1988. (STF - AgRg-RE-AG 722.803 - São Paulo - 2ª T. - Rel. Min. Ricardo Lewandowski - J. 24.06.2014).

Assim, caso a discussão da parte controversa seja especificamente quanto a uma destas três situações, deve-se complementar o Precatório já expedido.

Outrossim, caso a discussão envolva outras matérias, como por exemplo a inconstitucionalidade de parte do valor devido, é certo que se deve expedir novo Precatório.

Quanto à impossibilidade de cisão, esta deve prevalecer para resguardar o disposto no art. 100, § 8º da Constituição Federal: “É vedada a expedição de precatórios complementares ou suplementares de valor pago, bem como o fracionamento, repartição ou quebra do valor da execução para fins de enquadramento de parcela do total ao que dispõe o § 3º deste artigo”.

Exemplificando, se o exequente busca receber valor cujo pagamento deve se dar por Precatório, no caso de antecipação do pagamento da parte incontroversa (art. 535, §4º do CPC/15), se os valores desta ou da parte ainda em discussão separadamente possibilitarem a expedição de RPV, para uma delas ou para ambas, mesmo assim não será possível tal expedição sob pena de ofensa à Constituição Federal (art. 100, §8º da CF/88), devendo ambos serem pagos por Precatório mesmo que em valor condizente com a RPV.

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GALVÊAS, Thiago Albani Oliveira. Do cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de pagar quantia certa pela fazenda pública. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5672, 11 jan. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/65474. Acesso em: 22 dez. 2024.

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