Em que pese, no íntimo dos nossos conscientes (e no meu também), desejamos uma verdadeira mudança política no Brasil, instituir concurso para cargos políticos não é a saída mais inteligente.
De início, destaco um dado que pode jogar um balde de água fria em quem deseja que, para ser Presidente da República, por exemplo, pudéssemos fazer uma grande seleção respondendo questões de múltipla escolha: nenhum país no MUNDO adota qualquer forma de seleção pública para cargos políticos.
A realidade brasileira, notória por sua péssima gestão pública, recheada com uma casta de políticos da pior envergadura, traz ao cidadão um sentimento de impotência, de indignação, de revolta. No entanto, o radicalismo de uma mudança de estrutura política, que repito, não existe em nenhum lugar do Mundo, não deve prosperar.
Isto se dá porque o cargo político tem uma natureza jurídica distinta do servidor público tradicional, lato sensu. Aquele, é um cargo que tem origem no voto, como materialização da própria democracia, de modo que o povo, por si, elege determinado indivíduo para gerir o Estado. (art. 1º, parágrafo único da Constituição Federal). É a noção mais básica da prevalência da vontade da maioria.
Por outro lado, o cargo público acessível mediante concurso (art. 37, II da Constituição Federal), possui natureza meramente técnica, ou administrativa, ou seja, de modo que tal tarefa é rotineira, de praxe, que não necessita de aprovação popular, mediante escolha, de modo que a maneira mais adequada para se alcançar o cargo, é por meio de seleção pública, de modo a ressaltar a isonomia entre os participantes (art. 5º, caput, Constituição Federal) e a impessoalidade da administração (art. 37, caput, da Constituição Federal)
A doutrina é clara¹:
"Exceções à regra do concurso público:
A título de exceção, em algumas situações a própria Constituição Federalprevê que o acesso a cargos e empregos públicos se dê sem a necessidade de concurso público, o que ocorre nos seguintes casos:
a) cargos de mandato eletivo, em que a escolha se dá por eleição";
Assim, verifica-se que trazer a seleção pública para cargos políticos não é a saída adequada. Podemos sim pensar em alternativas como a imposição de requisitos de acesso aos cargos, como Nível Superior, determinada qualificação acadêmica, antecedentes criminais/eleitorais (como a própria Lei da Ficha Limpa assim o faz - Lei Complementar nº 135, de 4 de junho de 2010), avaliação psicológica, histórico de carreira profissional, experiência em determinada área, enfim, padrões objetivos, mas que não tirem o PODER DO POVO em decidir o futuro de seu Estado (art. 14 da Constituição Federal).
Mais que princípio inscrito na Lei Magna, a democracia constitui fundamento e valor essencial das sociedades ocidentais (desde a Grécia Antiga, com Aristóteles). Tanto é que o artigo XXI da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, e o artigo 25 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, de 1966, elevaram-na ao status de direitos humanos².
No entanto, destaca-se que existem sim debates sobre a possibilidade de instituir uma seleção pública prévia ao sistema eleitoral, de modo a se selecionar candidatos, para posteriormente submetê-los ao crivo popular, conforme proposta oriunda no e-cidadania do Senado Federal, transformado na Sugestão nº 41, de 2017.
É completamente irreal se cogitar de concurso público para um cargo político, posto que isso não atende em nada a noção de representatividade, de democracia. Neste cenário, pessoas mais bem preparadas, com recursos, que possuíram privilégios a vida inteira, PROVAVELMENTE levariam vantagem.
Portanto, verifica-se que a proposta reduziria o acesso ao Poder a uma minoria. A igualdade vista é meramente teórica, posto que se implementada, traria uma restrição ao Poder muito maior do que a atual. A grande maioria da população, ainda que ignorante no sentido técnico, só consegue se fazer representada através do voto.
Referências
1 - ALENXADRE, Ricardo. Direito administrativo. 3ª ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2017
2 - GOMES, José Jairo. Direito eleitoral.13ª. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Atlas, 2017.