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A terceirização e a reforma trabalhista no Brasil

Uma análise crítica da possibilidade de terceirização das atividades-fim

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13/08/2018 às 09:00
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Conclusão

O mundo está em mutação constante e a sociedade precisa adequar-se aos novos parâmetros da contemporaneidade. Afinal, em cada período da história, predominou um modelo social e de produção e, com o avançar da marcha histórica e o advento do modelo econômico neoliberal, a terceirização emergiu como um fenômeno dos tempos atuais.

Nos dias de hoje, é a forma de flexibilização dos direitos trabalhistas mais utilizada pelas empresas, objetivando a redução de custos e aumento da produção através da descentralização das atividades do empreendimento.

A legislação acerca da terceirização se mostrava esparsa e insuficiente para regular a matéria, o que possibilitava às empresas se aproveitarem da situação de falta de parâmetros, para contratar trabalhadores em condições, por vezes, subumanas de labor. Isto porque a terceirização provoca a redução dos salários com aumento de jornada de trabalho e péssimas condições de trabalho, o que se traduz em uma afronta aos direitos trabalhistas conquistados historicamente e garantidos pela Constituição Federal de 1988.

Não se poderia exigir que a Súmula 331 do TST cumprisse o papel normativo delegado às leis, sendo premente que o legislador se insurgisse de sua posição inerte e criasse uma lei que normatizasse a terceirização trabalhista no Brasil.

Após tanto tempo de omissão legislativa, surge o atual regramento, com as inserções realizadas na Lei nº 6.019/1974, pela Lei n 13.429/2017, e modificações decorrentes da reforma trabalhista (Lei nº 13.4267/2017). As inovações revelam o objetivo de proteção aos empresários contra as reclamações trabalhistas que hoje abarrotam a Justiça do Trabalho, além de não se preocupar em tutelar o trabalhador, quem verdadeiramente está na posição de hipossuficiente.

Dentre absurdos e considerações genéricas, a legislação autoriza a contratação de pessoal, mediante empresas prestadoras de serviço, para a execução de trabalhos em atividades essenciais ou acessórias da empresa tomadora, ou seja, atividades fim ou meio, qualquer tipo de atividade.

É a temida permissão da terceirização sem limites, direcionada a tornar os direitos trabalhistas vulneráveis e flexíveis aos interesses da empresa, generalizando os efeitos do fenômeno de forma desarrazoada. Mais uma vez fica clara a tentativa de fazer com que o econômico supere o político e social, independente das consequências negativas as quais podem sofrer os trabalhadores.

Ademais, as novas disposições maculam os objetivos e fundamentos da República Federativa, entre os quais sobressaem a dignidade humana, a valorização do trabalho e a solidariedade, além de desrespeitarem os princípios de proteção ao trabalhador estampados na CLT e, ademais, compromissos internacionais assumidos pelo governo Brasileiro, como a Agenda Nacional do Trabalho decente, violando, portanto, preceitos da OIT para a efetivação do trabalho que confira produtividade e qualidade, com segurança, liberdade, equidade e dignidade para os trabalhadores.

Resta claro que o legislador deve buscar soluções que compatibilizem o instituto com os direitos trabalhistas e o trabalho decente, o que, certamente, não comporta a terceirização das atividades-fim da empresa, mesmo porque é inovação eivada de inconstitucionalidade. Não se nega que a terceirização é um fenômeno mundialmente consolidado, característico das relações de trabalho contemporâneas, mas deve ser submetido a regras as quais tenham por finalidade assegurar a proteção ao trabalhador.

As regras regulamentadoras do instituto devem ser pautadas na isonomia salarial, responsabilidade solidária da empresa tomadora quanto às verbas trabalhistas, enquadramento sindical e tratamento igualitário nas questões concernentes à saúde e segurança do trabalho.

Dar voz ao retrocesso é um erro. A valorização do trabalho é o mínimo que se pode esperar de um Estado Democrático de Direito, em que o ordenamento jurídico se funda em princípios democráticos e de justiça social.


Referências:

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BRASIL. Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017. Altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1953, e as Leis nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974, 8.036, de 11 de maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991, a fim de adequar a legislação às novas relações de trabalho. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13467.htm>. Acesso em maio de 2018.

CASTRO, Rubens Ferreira de. A terceirização no direito do trabalho. São Paulo: Malheiros, 2000.

DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 13. ed. São Paulo: LTR, 2014.

MAIOR, Jorge Luiz Souto. O direito do trabalho como instrumento de justiça social. São Paulo: LTr, 2001.

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MELO, Raimundo Simão de. Lei da terceirização retira garantias e precariza relações de trabalho. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2017-abr-21/reflexoes-trabalhistas-lei-terceirizacao-retira-garantias-precariza-relacoes-trabalho. Acesso em 24/05/2018.

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MIRAGLIA, Lívia Mendes Moreira. A terceirização trabalhista no Brasil. São Paulo: Quartier Latin, 2008.

ROBORTELLA, Luiz Carlos Amorim. Terceirização – aspectos jurídicos – responsabilidades – direito comparado. Vol. 58, n. 08. São Paulo, LTr, 1994.

VIANA, Márcio Túlio. Terceirização e sindicato. In: HENRIQUE, Carlos Augusto Junqueira; DELGADO, Gabriela Neves. (Coord.) Terceirização no direito do trabalho. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004.


Notas

[1] Art. 9º. Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.

[2] Art. 581. Para os fins do item III do artigo anterior, as empresas atribuirão parte do respectivo capital às suas sucursais, filiais ou agências, desde que localizadas fora da base territorial da entidade sindical representativa da atividade econômica do estabelecimento principal, na proporção das correspondentes operações econômicas, fazendo a devida comunicação às Delegacias Regionais do Trabalho, conforme localidade da sede da empresa, sucursais, filiais ou agências. (...) §2º Entende-se por atividade preponderante a que caracterizar a unidade de produto, operação ou objetivo final, para cuja obtenção todas as demais atividades convirjam, exclusivamente em regime de conexão funcional.

[3] Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (...) XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil.

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Sobre a autora
Evellyn Barbosa Rêgo

Servidora Pública. Assessora no Tribunal Regional Federal da 5ª Região. Pós-graduada especialista em Direito e Processo do Trabalho. Graduada em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RÊGO, Evellyn Barbosa. A terceirização e a reforma trabalhista no Brasil : Uma análise crítica da possibilidade de terceirização das atividades-fim. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5521, 13 ago. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/66910. Acesso em: 24 abr. 2024.

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