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Mães condenadas, filhos prisioneiros

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20/06/2018 às 14:32

Resumo:


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Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Reflexões sobre a situação de crianças e fetos prisioneiros, encarcerados na realidade de suas mães, condenadas ou presas preventivamente. O STF, por meio do HC 143.641, parece resolver parte do problema.

RESUMO: O presente artigo faz uma crítica em relação à situação em que se encontram crianças e fetos prisioneiros, encarcerados numa realidade que não ajuda em seu desenvolvimento integral. A pesquisa tem caráter bibliográfico explorando páginas da internet, legislação brasileira e alguns livros que tratam da situação das mães e filhos encarcerados. Inicia mostrando a situação e, em seguida, procura traçar um resumo sobre os direitos destas crianças e gestantes. Mostra que parte do problema foi resolvida com a decisão no Habeas Corpus 143.641, que mandou para a prisão domiciliar as mães presas preventivas. Mas o problema persiste com a falta de condições para o desenvolvimento integral da criança de mães condenadas.

Palavras-chave: Crianças encarceradas. Mães Presas. Desenvolvimento Integral da Criança. Inocentes presos. Prisão Domiciliar. Direitos Fundamentais.


1 INTRODUÇÃO

 O presente artigo tem como tema os fetos em gestação e as crianças recém-nascidas cujas mães encontram-se condenadas, especialmente aquelas que vão para a prisão no ventre da genitora. Fetos, embriões e crianças que, sem defesa, contrariando a norma constitucional de que ninguém pode ser preso sem decisão devidamente fundamentada ou por condenação penal transitada em julgada, acabam indo para as grades junto com suas mães. A necessidade de punir as mães acaba punindo junto seus filhos.

A jurisprudência sobre o tema mudou durante o interesse por esta pesquisa, mas continua importante. No final de fevereiro de 2018, a segunda turma do Supremo Tribunal Federal) julgou o Habeas Corpus 143.641 decidindo que as grávidas e a mães com filhos até 12 anos em prisão preventiva, atendidos os requisitos da lei, deveriam ter facilitadas o cumprimento domiciliar da pena.

Com isto, os ministros do STF queriam aproximar mais as crianças de suas famílias. Tinham, também, como objetivo, atender os critérios dos Direitos Humanos e das garantias constitucionais para as crianças que acabam presas de modo imerecido. Contudo, o problema continua porque o encarceramento de grávidas e mães com criança pequena condenadas permanece.

Apesar da mudança da jurisprudência, o tema continua sendo importante para o estudante de direito e para as pessoas preocupadas com as condições de educação das crianças. Não se pode esquecer que o momento da primeira infância é muito importante na formação do indivíduo. Também, é bom lembrar, que mesmo com esta jurisprudência, muitas crianças e fetos, com as mães não atendendo os critérios da lei, continuarão presas.

Trata-se de tema muito importante para a vida social, pois está em jogo não somente o cumprimento de pena pela mãe condenada. Há, também, a questão da formação das crianças que acabam passando importante fase da vida isoladas em grades com suas mães. Estas crianças ao invés de ficarem presas deviam estar nas creche e escolas, assim como no abrigo de suas famílias. Deveria prevalecer a absoluta prioridade do interesse da criança e o favorecimento par seu desenvolvimento integral.

O principal objetivo é ajudar a conhecer melhor a realidade das crianças presas, algumas ainda na barriga da mãe verificando o que o direito pode fazer para melhorar esta situação. O objetivo principal de conhecer melhor é seguido do objetivo de gerar sensibilidade para o tema tão importante para a sociedade e o Direito.

O método usado é o bibliográfico com pesquisas em artigos da internet, em livros, no Estatuto da Criança e do Adolescente e na decisão do STF no habeas corpus 143.641. Além disto, serão consultados livros que narram as condições das mulheres presas em estado de gravidez e com crianças pequenas.

Haverá a preocupação de apresentar algumas estatísticas tiradas de sites. Assim, tanto olhara o problema quanto a solução apresentada pelo STF no Acórdão do Habeas Corpus 143.641 para mostrar que, como aquela decisão atinge somente as presas preventivas que atendam os requisitos da lei, muitas crianças continuaram sendo gestadas e criadas nas condições sub-humanas das prisões.


2 SITUAÇÃO ATUAL DO PROBLEMA 

Ao apresentar seu voto no HC 143.641, o Ministro Lewandowski destacou que, no começo de 2018, "mais de 2 mil pequenos brasileirinhos" estavam "atrás das grades com suas mães, sofrendo indevidamente,  contra o que dispõe a Constituição, as agruras do cárcere" (STF, HC 143.641). Com esta referência inicial segue breve análise da situação das crianças presas.

Em primeiro lugar é preciso entender que o fato de a criança ficar presa com a mãe nos primeiros meses de vida é considerado um avanço, uma conquista, voltada para assegurar a proximidade entre mãe e filho.

Porém é bom destacar que a falta de estrutura das prisões e as condições em que as mães ficam está longe de ser ideal para a saúde, crescimento e educação das crianças. Coisas que a lei exige estão longe de serem atendidas. Além da falta do convício com a família, as crianças crescem em meio à falta de creches, berçários, ambiente para brincar e cuidado médico. O ambiente da prisão já é inadequado para uma criança nascer e passar seus primeiros dias de vida, mais ainda se não possuir infraestrutura adequada. Até porque, conforme afirma Daniele Viafiore (2005, p. 93), mesmo na "história da estruturação do sistema prisional brasileiro, não houve uma preocupação com a mulher criminosa e nem com a família".

A estrutura não tem acompanhado nem as exigências da lei. Letícia Casado e Natália Casian publicaram um texto na folha.uol no qual destacam que apesar das exigências da lei,

os presídios femininos não possuem estrutura para abrigar as mães: apenas 34% dispõem de cela ou dormitório adequado para gestantes, 32% dispõem de berçário ou centro de referência materno infantil e 5% têm creche. Nas penitenciárias mistas, os dados são 6%, 3% e zero, respectivamente, afirmou. (CASADO; CASIAN, 2018)

Assim fica claro que não há estrutura física adequada para as mães grávidas e as crianças recém nascidas. Sem um lugar adequado para a gestante ficar, sem berço, sem creche e sem o ambiente que este tipo de pessoa precisa pode-se falar que estamos diante de uma situação muito desumana, que fere a dignidade da pessoa. Neste caso, algumas delas nem sequer conhece o mundo ainda e já são maltratadas.

Letícia Casado e Natália Casian mostram, ainda, que nem mesmo o básico exigido pela lei em relação à saúde da mãe e da criança é cumprido. Ao comentar o Acórdão do HC 143.641, elas lembram que o próprio Ministro Lewandowski reconhece esta limitação no cumprimento da pena de mulheres grávidas ou acompanhada de seus bebês. Segundo elas,

Ele destacou que a Lei de Execução Penal prevê acompanhamento médico à mulher, "principalmente no pré-natal e no pós-parto, extensivo ao recém-nascido", entre outras determinações que não estão sendo seguidas pelo sistema penitenciário. (CASADO; CASIAN, 2018)

Se é muito difícil a vida das crianças na prisão é um grande desafio para as mães ficarem sem seus pequenos que só podem ver as mães nas visitas. Assim, ficar preso com a mãe e poder ser amamentado já é uma conquista. Porém, uma conquista com muitos aspectos negativos. Segundo Daniele Viafiore (2005, p. 95), o problema é que mesmo os pequenos inocentes acabam passando por vistorias bem constrangedoras para entrar nas unidades.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mantém uma página na internet através da qual é possível acompanhar dia a dia o painel de dados sobre as presas grávidas e lactentes nas prisões do Brasil, tanto os números nacionais quanto os dos Estados. Os números mostram que com o crescimento do número de mulheres presas, cresceu, também, a quantidade de grávidas e mãos que amamentam.

A consulta dos dados médios do mês de março de 2018 (CNJ, 2018) indicava um total de 633 mulheres grávidas ou amamentando os filhos. As grávidas somavam 317 mulheres. Outras 215 estavam amamentando. Este número vária muito em vista das novas prisões, das crianças que são levadas pelas famílias, das mulheres que são soltas e outros motivos. Isto porque a atualização dos dados é feita todos os dias.

O problema se agravou de 2000 até os dias atuais com o grande aumento do número de mulheres presas. Para se ter uma ideia, segundo os dados do CNJ (2017), em notícia publicada no mês de outubro de 2017, o número de mulheres presas passou de 5.601 em 2000 para 44.721 em 2016. O aumento é de mais de 500%. Com mais mulheres presas o problema da gravidez, da presença de bebês amamentados e de crianças na primeira infância nas prisões aumentou, também.

Ainda assim, Danile Viafiore (2005, p. 92) aponta que no "universo carcerário, poucas são as reflexões acerca dos estabelecimentos prisionais femininos". Isto porque, segundo ela, apesar do crescimento no número de encarceradas, a "mulher presa não representa um número expressivo dentro do cenário prisional brasileiro", representando, pelos dados do Departamento Penitenciário Nacional, as "4,4% da população carcerária brasileira".

Especificamente, sobre grávidas e filhos em companhia, os dados são menores ainda:

Conforme os dados no Ministério da Justiça, no início de 2008, a população prisional feminina brasileira era de 27.000 mulheres, sendo 1,24% das mulheres encontravam-se grávidas, 1,04% possuíam filhos em sua companhia e 0,91% de mulheres encarceradas estavam em período de amamentação. (MELLO; GAUER, 2011, p. 113)

Considerando somente o número de presas em situação de maternidade de filhos recém-nascidos e gestação, o número ainda é menor, mas não menos preocupante conforme indica Daniele Viafiore:

Todavia, não menos alarmante é a situação de uma reclusa grávida. A vida de uma gestante no mundo carcerário é desconhecida, obscura, porém cada vez mais presente nesta crescente população prisional. Viafore (2005, p.99)

Desta forma, este tema importante acaba sendo pouco discutido. Mas as crianças gestadas, nascidas ou crescidas na prisão, são brasileiros que precisam ter seus direitos protegidos. Até para não reproduzir em suas vidas a criminalidade que acompanharam com suas genitoras.

2.1 A realidade das prisioneiras com seus filhos

O tema das mulheres presas em situação desumana ganhou destaque nos últimos tempos com a publicação de vários livros de relatos. Este livros procuram mostrar a dura realidade das prisões para as mulheres e, mais ainda, para as grávidas e as que estão acompanhadas dos filhos pequenos. Entre eles destacam-se três: Contando os dias, As prisioneiras e Presos que Menstruam.

O livro Contando os dias (MARQUES et. al., 2014), conforme o próprio subtítulo, com "relatos de mulheres que vivem atrás das grades, distantes de seus filhos", escrito por vários autores. Outra obra importante é As Prisioneiras, de Dráuzio Varela (2017). Por fim, o livro de Nana Queiróz intitulado Presos que Menstruam (QUEIRÓZ, 2017), que mostra as mulheres sendo tratadas como se fossem homens. Isto é, as prisões não foram adaptadas para a realidade feminina.

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Estas obras mostram, através de histórias contadas, a dura realidade das prisões. Quando se lê a vida das presas e os problemas do dia-a-dia dentro das prisões, conclui-se que ali não é o lugar mais adequado para as crianças nascerem e passarem os seus primeiros dias de vida. Já é um lugar inadequado para as mulheres adultas, mais ainda para pequenas crianças e mulheres grávidas.

Para Nana Queiroz "é fácil esquecer que mulheres são mulheres sob a desculpa que todos os criminosos devem ser tratados de maneira idêntica". Porém, ela lembra que "a igualdade é desigual quando se esquecem as diferenças" (QUEIRÓZ, 2017, p. 19). Então, mesmo na prisão, as mulheres não podem ser tratadas do mesmo jeito que os homens.

Tratando todos os presos da mesma forma, como se todos fossem homem acaba não se considerando os "os bebês nascidos no chão das cadeias" (QUEIRÓZ, 2017, p. 19) e as demais situações envolvendo a maternidade, o cuidado com a gestação, com o parto, com a amamentação e com a criação dos filhos nos primeiros dias de vida.

O doutor Dráuzio Varela fala sobre o mesmo tema usando de sua experiência de onze anos de trabalho voluntário atendendo a realidade das penitenciária feminina da cidade de São Paulo situada onde um dia foi a prisão chamada de Carandiru (VARELA, 2017, p. 9).

Suas observações vão na mesma linha apresentada acima que identifica o tratamento igual entre homens e mulheres e fala da necessidade de cuidados diferenciados entre os gêneros. Ele mostra que enquanto o atendimento das prisões igualam homens e mulheres, até as reclamações de saúde são diferente entre os presos e as presas. Ele fala que:

Em vez de feridas mal cicatrizadas, sarna, furúnculos, tuberculoso, micoses e as infecções respiratórias dos homens, elas se queixavam de cefaleia, dores na coluna, depressão, crises de pânico, afecções ginecológicas, acne, obesidade, irregularidades menstruais, hipertensão arterial, diabetes, suspeita de gravidez.

Portanto, as preocupações com a saúde devem respeitar os diferentes problemas enfrentados pelos homens e pelas mulheres. Na citação acima é fácil verificar que muitas preocupações das mães com sua saúde estão relacionadas com a maternidade.

Contando os dias fala da situação das mães que ficam presas sem seus filhos pequenos e, literalmente, contam os dias para encontrá-los. "Seus filhos não podem morar no local, mas possíveis visitas e saídas das presas para passar um fim de semana em casa, com seus familiares. Contata-se que no tempo do encarceramento "essas mulheres sentem muita falta de seus filhos" (MARQUES et al., 2014, p. 14).

Neste sentido,

A companhia do filho durante o aprisionamento é percebida como um aspecto positivo, o qual a mulher projeta no filho a minimização das dificuldades enfrentada durante este período. (MELLO; GAUER, 2011, p. 117)

Além destas obras citadas, em estudo sobre o problema das mães encarceradas com seus filhos, de 2007, ARMELIN, MELLO E GAUER (2010) resumem os dados do Ministério da Justiça para mostrar como era precária a situação.

Com relação aos estabelecimentos com berçários, foi constatação que apenas 19,61% das prisões femininas possuem berçários ou estruturas separadas das galerias prisionais. As mães passam, em 81,25% dos casos, o período integral com os filhos. Em 12,5% dos casos as mães permanecem no local durante o dia e retornam para as celas durante a noite em companhia de seu filho. Enquanto que 6,23% das presas permanecem no local durante o dia e retornam para as celas sem a companhia da criança. (ARMELIN, MELLO; GAUER, ARQUIVO DIGITAL, pp. 7 - 8)

Os dados confirmam que as prisões foram feitas para punir as mães condenadas, mas não estão preparadas para criar e educar os filhos que acabam indo junto com elas. Então, sem ter cometido nenhum crime, os pequenos acabam privados da defesa de seus interesses prioritários e do desenvolvimento integral. Nem mesmo um berçário é encontrado na maioria das prisões. Isto porque, como mostra Stella (2009, p. 294), ao longo do tempo, o "papel outorgado às mulheres em nossa sociedade é o de serem as primeiras e principais guardiãs das crianças". Então, para as mães presas a sociedade, o direito e o afeto da família continua a responsabilidade pelos cuidados de suas crianças pequenas.

Viofore (2005, p. 99) lembra que a "prisão é fator emocional de constante estresse na vida de qualquer detenta". Contudo o estresse aumenta se com aos problemas prisionais são acrescentados os da gravidez, da amamentação e dos cuidados com um filho pequeno. Seja pelo ambiente de convivência da prisão ou pela estrutura precária. A proximidade entre mãe e filho acaba trazendo reflexos na vida dos inocentes presos, que, em meio ao ambiente da preisão, sem berço, sem banheiro adequado e sem cozinha com higiene, as crianças crescem longe dos olhos da sociedade.

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Sobre a autora
Bárbara C Pagnozzi

Discente do 5º ano do curso de Direitodo Centro Universitário “Antônio Eufrásio de Toledo” de Presidente Prudente.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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