Artigo Destaque dos editores

Aspectos da iniciativa popular brasileira e o seu papel como instrumento de efetivação da democracia participativa

Exibindo página 3 de 3
Leia nesta página:

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após todo o exposto, importante ressaltar que além dos mecanismos de participação direta presentes no art.14, I, II e III da CF/88, já comentados anteriormente neste trabalho, existem muitos outros instrumentos previstos em nosso ordenamento que contribuem para a construção de uma efetiva democracia participativa no país, tais como a ação popular, as audiências públicas que provocam uma discussão com a população acerca de proposições legislativas, dentre outras formas, que fogem ao objeto do presente artigo.

A iniciativa popular, entretanto, ganha destaque entre essas formas, justamente por permitir uma interferência mais direta do povo na vida política do país. Aliás, os inúmeros projetos que tramitam no parlamento com o objetivo de facilitar a utilização desse macanismo, demonstram a consciência da sociedade quanto ao poder que a iniciativa popular tem, enquanto verdadeira arma de democracia.

A ignorância popular dá lugar à vontade política, à legitimidade cidadã dos brasileiros, o que se deve, em grande parte, aos inúmeros escândalos de corrupção noticiados no país, conforme comentado anteriormente neste trabalho. Como resultado, tem-se uma verdadeira crise de representatividade instaurada, que demonstra a insatisfação popular quanto a inexistência de identidade entre governantes e governados.

Nesse ponto, não se pretende defender uma ruptura com o modelo representativo de democracia, mas sim a coexistência deste com um modelo participativo da sociedade. Em verdade, essa tensão existente, como ressalta Habermas, na sua obra “Facticidade e Validade”(1929), é justamente o que mantém a legitimidade e a dinamicidade de um governo.

Acerca do tema, preleciona Menelick (2001, p.220):

O fato de vermos esses princípios contraditórios em permanente tensão impede que esse regime venha a se tornar uma res total, exigindo sempre contemporaneamente representação e identidade; o que importa uma revisão permanente dessa identidade do povo em relação aos próprios representantes, tornando essa representação sempre precária, requerente de revisões. É precisamente nesse sentido que podemos ver a dinâmica e a vitalidade da democracia, uma democracia capaz de permanente inclusão, ou seja, de reconhecer a exclusão quando tematizada, de realizar permanentemente a revisão do próprio conceito de povo, que há de ser sempre fragmentado e fragmentário em constante tensão.

De qualquer forma, tendo em vista as reflexões feitas no presente trabalho, percebe-se que a iniciativa popular é instrumento direto de formação de uma democracia participativa brasileira. Permitir ao povo a deflagração de processos legislativos de leis ordinárias, leis complementares, ou até mesmo PECs é reconhecer, antes de mais nada, a legitimidade do real titular do poder constituinte, a origem e o destinatário de um Estado Democrático de Direito.

Ressalta-se, portanto, a importância quanto à divulgação desse mecanismo, destacando-se também o papel das instituições democráticas nesse mister, a exemplo da excepcional campanha que vem cumprindo o Ministério Público Federal, conforme destacado anteriormente no presente artigo.

Antes mesmo de discutir a efetividade da iniciativa popular no Brasil, tendo em vista os seus requisitos rígidos, ou os poucos exemplos que temos na história de utilização desse instrumento, é preciso reconhecer que qualquer facilitação de seu uso é benéfica, à medida em que tem-se uma aproximação maior com exercício da soberania popular.

Não há que se falar em instituto “meramente decorativo” quando o povo sabe usar o que está em suas mãos. Ademais, o mecanismo serve, no mínimo, como instrumento de pressão para que o parlamento direcione sua atenção a matérias essenciais à sociedade, ou para lembrar aos governantes de que é preciso manter uma identidade com o verdadeiro titular do poder para que eles possam existir enquanto representantes. 


REFERÊNCIAS 

ALVES, Felipe Dalenogare. O conceito de soberania: Do estado moderno até a atualidade. Revista Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIII, n.83, dez.2010. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8786>. Acesso em 18 set, 2015.

BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Constitucional. 22.ed. São Paulo: Saraiva.2001.

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 23. ed. São Paulo: Malheiros editores. 2008.

BONFIM, Vinícius Silva. A função da sociedade civil e da esfera pública na legitimidade do processo legislativo à luz da teoria discursiva do direito e da democracia de Jürgen Habermas. 137f. Dissertação( Mestrado em Direito)- Universidade Católica de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2013.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acesso em: 15 de set de 2015.

______. Lei nº 9.709, de 18 de novembro de 1998. Regulamenta a execução do disposto nos incisos I, II e III do art. 14 da Constituição Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9709.htm>. Acesso em: 15 set.2015.

______. Resolução nº93, de 1970. Dá nova redação ao Regimento Interno do Senado Federal. Disponível em:

<http://www25.senado.leg.br/documents/12427/45868/RISF+2015+Compilado+02.09.pdf/cd5769c8-46c5-4c8a-9af7-99be436b89c4>. Acesso em 20 set.2015.

______. Resolução nº17, de 1989. Aprova o Regimento Interno da Câmara dos Deputados. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/regimento-interno-da-camara-dos-deputados/RICD%20ate%20RCD%207-2015.pdf>. Acesso em 20 set.2015.

Fique sempre informado com o Jus! Receba gratuitamente as atualizações jurídicas em sua caixa de entrada. Inscreva-se agora e não perca as novidades diárias essenciais!
Os boletins são gratuitos. Não enviamos spam. Privacidade Publique seus artigos

BRITO, Ricardo. Aprovada PEC que permite projetos de iniciativa popular.

Disponível em: <http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,aprovada-pec-que-permite-projetos-de-iniciativa-popular,1052036>. Acesso em: 21 set.2015.

BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 8. ed. São Paulo: Saraiva. 2014.

CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. 8. ed. Salvador: Juspodivm. 2014.

DIDIER JUNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. v. I. 10. ed. Salvador: Juspodivm. 2008.

FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. v. 2. São Paulo: Saraiva, 1992.

HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade; tradução: Flávio Beno Siebeneichler. v. I. 2.ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro,2003.

JUNGMANN, Mariana. Senado aprova PEC que diminui assinaturas necessárias para projetos de iniciativa popular. Disponível em:<http://memoria.ebc.com.br/agenciabrasil/noticia/2013-07-10/senado-aprova-pec-que-diminui-assinaturas-necessarias-para-projetos-de-iniciativa-popular>. Acesso em: 18 set.2015

LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 19. ed. São Paulo: Saraiva. 2015.

MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva. 2014.

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. 10 medidas contra a corrupção. Disponível em: <http://www.combateacorrupcao.mpf.mp.br/10-medidas/10-medidas>. Acesso em: 19 set.2015.

NETTO, Menelick de Carvalho. Constituição e Democracia. São Paulo: Max Limonad. 2001.

RIBEIRO, Hélcio. A iniciativa popular como instrumento da democracia participativa. Disponível em: <http://www.mackenzie.br/fileadmin/Graduacao/FDir/Artigos/helcioribeiro.pdf>. Acesso em: 18 set. 2015.

SILVA, Aurélia Carla Queiroga da. Iniciativa popular na concretização do direito fundamental à democracia. 184f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Natal, 2013.

Assuntos relacionados
Sobre as autoras
Amanda Mendes Evangelista

Amanda Mendes Evangelista, advogada e pós-graduada em Direito Constitucional (Anhanguera-UNIDERP).

Marina Felinto Siqueira

Advogada, OAB/PI nº 13.551

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

EVANGELISTA, Amanda Mendes ; SIQUEIRA, Marina Felinto. Aspectos da iniciativa popular brasileira e o seu papel como instrumento de efetivação da democracia participativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6105, 19 mar. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/67400. Acesso em: 22 nov. 2024.

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos