5. CONCLUSÃO
No presente artigo buscamos expor a importância da positivação de direitos fundamentais, demonstrando a sua vinculação com a construção do Estado de Direito e das Constituições que os guiam. Vimos que referida positivação permite que os indivíduos se autodeterminem a partir dos ideais de igualdade e dignidade, o que provoca certa “homogeneidade social” e segurança, já que são garantias para a coletividade e não apenas para indivíduos isolados.
Salientamos, também, o processo de construção da Constituição Federal de 1988, apontando suas principais características e compreendendo aquela como símbolo do avanço quanto aos direitos fundamentais no Brasil.
Após analisarmos os dados ligados à judicialização da saúde, pudemos concluir que o estabelecimento de critérios para a propositura de ações é medida necessária, tanto para conceder segurança jurídica aos pacientes, quanto para o Poder Público na elaboração de sua política orçamentária.
Nesse sentido, analisando os votos já proferidos pelos ministros do Supremo Tribunal Federal identificamos concordâncias e discordâncias entre as teses de repercussão geral propostas.
Tratando do voto do Ministro Marco Aurélio, é possível observar que o Ministro não destoou da atual jurisprudência do STF, fixando a responsabilidade do Estado nos casos de imprescindibilidade, impossibilidade de substituição do fármaco e hipossuficiência financeira do paciente. Porém, Marco Aurélio destaca um ponto fundamental do debate, qual seja a responsabilidade solidária da família do paciente.
Costumeiramente, nos casos de postulação de medicamentos via judicial, apura-se apenas a capacidade econômica do paciente e não de sua família. A proposta do Ministro, quanto à solidariedade familiar, é viável já que poderá evitar incongruências no fornecimento de medicamentos a pessoas que possuem condições de arcar com o fármaco postulado.
Apesar de a Constituição Federal não determinar critérios objetivos nesse sentido, a solidariedade da família, como apontado pelo Ministro, pode servir de orientação para essa interpretação. Tal medida, portanto, poderia contribuir para a redução da judicialização da saúde sem prejudicar os mais necessitados.
O voto do Ministro Luís Roberto Barroso, por sua vez, restringe demasiadamente a responsabilidade do Estado em fornecer fármacos de alto custo, ou aqueles não incluídos nas políticas públicas de saúde. Apesar de concordarmos com a exposição fática da atual situação orçamentária do Ministério da Saúde, podemos inferir que os critérios sugeridos pelo Ministro tornam o acesso aos medicamentos um caminho tortuoso e cheio de barreiras. O risco em tal proposta é o de não possibilitar aos mais carentes e humildes o alcance aos medicamentos, tanto por hipossuficiência financeira de arcar com os custos dos processos, como por falta de conhecimento dos meios para alcançar o tratamento necessário.
O voto do Ministro Fachin, em harmonia com o do Ministro Marco Aurélio, reitera – de certa maneira – a jurisprudência já pacificada nos tribunais, a qual prevê a responsabilidade do ente estatal para fornecer os medicamentos de alto custo e/ou não incluídos nas listas oficiais para pessoas hipossuficientes.
O destaque que podemos identificar no voto no Ministro Fachin está em orientar a judicialização para o aspecto coletivo, e não individual como feito. Tal critério harmonizaria com o princípio da economia processual, possibilitando a redução no número de ações e, consequentemente, dos gastos gerados com custas, honorários, multas, entre outras despesas originadas nos processos judiciais.
Não há previsão para a conclusão do julgamento do RE 566.471, porém, os votos aqui expostos nos fornecem uma amostragem das opiniões dos ministros, além de aprofundar a temática em diversos aspectos. É certo que existem milhares de ações sobrestadas nas cortes brasileiras, aguardando a decisão do STF. A esperança, porém, é a de que todo o tempo de espera para pacificação da matéria, seja recompensado com a aprovação de uma tese de repercussão geral que possibilite o equilíbrio entre a judicialização da saúde e as demandas de indivíduos que buscam por sobrevivência.
REFERÊNCIAS
BARROSO, Luís Roberto. RE 566.471-RV. Voto. 2016. Disponível em: <https://www.luisrobertobarroso.com.br/wp-content/uploads/2016/10/RE-566471-Medicamentos-de-alto-custo-versa%CC%83o-final.pdf>. Acesso em: out. 2018.
BRASIL. Constituição Federal de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituição.html>. Acesso em: set. 2018.
______. Supremo Tribunal Federal. RE 566.471-RN. Voto do Relator: Ministro Marco Aurélio. 2016. Disponível em: <https://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/RE566471.pdf>. Acesso em: out. 2018.
______. Tribunal Regional Federal Da 1ª Região. AC 38591620074014300-TO. 0003859-16.2007.4.01.4300. Publicação: e-DJF1 p.337 de 19/02/2014; Julgamento: 03 de Fevereiro de 2014; Relator: Desembargador Federal Kassio Nunes Marques.
FACHIN, Edson. CONJUR. Resumo Voto Ministro Fachin. 2016. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/dl/resumo-voto-fachin-re-566471.pdf>. Acesso em: out. 2018.
INSTITUTO DE ECONOMIA APLICADA. Texto para Discussão. Evolução do Gasto com Medicamentos do Sistema Único de Saúde no período de 2010 a 2016. Rio de Janeiro: IPEA, 2016.
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 13.ed. rev. e atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2018.
Notas
1 “As ideias de Constituição e direitos fundamentais são, no âmbito do pensamento da segunda metade do século XIII, manifestações paralelas e unidirecionadas da mesma atmosfera espiritual. Ambas se compreendem como limites normativos ao poder estatal. Somente a síntese de ambas outorgou à Constituição a sua definitiva e autêntica dignidade fundamental” (STERN, 1988, p.181 apud SARLET, 2018, p.59).
2 “Cumpre frisar, ainda, que a ideia do reconhecimento de determinadas posições jurídicas sociais fundamentais, como exigência do princípio da dignidade da pessoa humana, decorre, consoante leciona Klaus Stern, da concepção de que ‘homogeneidade social’ e uma certa medida de segurança social não servem apenas ao indivíduo isolado, mas também à capacidade funcional da democracia considerada na sua integralidade” (SARLET, 2018, p. 63).
3 (INSTITUTO DE ECONOMIA APLICADA, 2016, p. 23).
4 Ibid., p. 24.
5 TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 1ª REGIÃO. AC 38591620074014300-TO. 0003859-16.2007.4.01.4300. Publicação: e-DJF1 p.337 de 19/02/2014; Julgamento: 03 de Fevereiro de 2014; Relator: Desembargador Federal Kassio Nunes Marques.
6 (BARROSO, 2016, p. 05).
7 (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, 2016, p. 03)
8 Ibid., p. 04.
9 Ibid., p. 04
10 Ibid., p. 04-05.
11 Ibid., p. 05.
12 Ibid., p.07.
13 Ibid., p. 08.
14 Ibid., p.11.
15 Ibid., p. 15.
16 Ibid., p. 19-20.
17 (BARROSO, 2016, p. 06)
18 Ibid., p. 06
19 Ibid., p. 07
20 Ibid., p.09
21 Ibid., p. 02.
22 Ibid., p. 2-3.
23 Ibid., p. 3.
24 (FACHIN, 2016, p 14).
25 Ibid., p. 03.
26 Ibid., p. 03.
27 Ibid., p. 8-9.
28 Ibid., p. 9.