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O delegado de polícia como garantia da segurança jurídica

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06/03/2019 às 10:15

Resumo:


  • O artigo aborda a importância da autonomia do delegado de polícia para garantir a segurança jurídica da sociedade.

  • Destaca a ilegalidade e inconveniência da realização de atividades de polícia judiciária por policiais militares não qualificados juridicamente.

  • Apresenta a evolução dos modelos policiais ao longo da história, destacando a separação das funções policiais entre polícia militar e civil.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A autonomia do delegado garante investigação justa e preserva direitos? O artigo analisa modelos policiais e defende a polícia judiciária civil como essencial à segurança jurídica.

Introdução

O presente artigo trata da polícia judiciária como atividade de Estado e da importância da autonomia do delegado de polícia como garantia para a segurança jurídica da sociedade. Realiza um estudo sobre os diversos modelos policiais da Inglaterra, Estados Unidos, Europa continental e, mais especificamente, do modelo brasileiro, com sua peculiaridade de instituir uma autoridade policial com independência funcional nos trabalhos de qualificação das ocorrências policiais, coleta de provas e respeito às garantias individuais da pessoa do incriminado. Aborda, ainda, a ilegalidade e a inconveniência do exercício de atividades de polícia judiciária por parte de policiais militares não qualificados juridicamente para essa natureza de função, com gravíssimos prejuízos para a segurança jurídica e para os direitos e garantias individuais.


1. A Polícia Judiciária no Estado Democrático de Direito

No Estado Democrático de Direito, a persecução penal envolve, necessariamente, quatro atores: a Polícia, a Acusação, a Defesa e a Justiça. São quatro instituições indispensáveis para que o sistema penal se desenvolva conforme o devido processo legal. A polícia atua na preservação da ordem pública, por meio da polícia preventiva, e na persecução penal, através da polícia judiciária. Esta última atividade é responsável pelo atendimento das ocorrências, dando a primeira forma jurídica aos fatos concretos – criminais ou não – e delimitando-os para que as demais providências sejam selecionadas.

O primeiro atendimento de uma ocorrência é mais complexo do que pode parecer numa análise superficial. Ele envolve diversas providências e decisões que iniciam a persecução penal, e o atendimento inadequado ou insuficiente acarreta graves prejuízos para a instrução penal e para os direitos do acusado. Danos que podem ser atenuados, mas dificilmente corrigidos em fase posterior.

Se as provas não forem coletadas e preservadas, a instrução criminal será comprometida; e se os direitos e garantias constitucionais do suspeito não forem respeitados, o processo será contaminado. O primeiro atendimento de uma ocorrência policial vai muito além das medidas repressivas imediatas e do registro. Ele requer conhecimentos jurídicos e de criminalística, imparcialidade, sensibilidade e discernimento para a tomada de decisões necessárias, sem excessos.

Levando em conta a variedade de sistemas de polícia judiciária existentes no mundo, pode-se apontar as seguintes providências, sem pretensão de esgotar o tema:

  • Qualificação da natureza da ocorrência;

  • Diligências para impedir o agravamento do crime;

  • Preservação e coleta de provas;

  • Esclarecimento da autoria do delito;

  • Custódia do acusado;

  • Preservação das garantias individuais do suspeito;

  • Instauração do procedimento investigatório;

  • Indiciamento do averiguado;

  • Arquivamento da investigação (sistemas inglês e norte-americano);

  • Decisão quanto à oportunidade de deflagrar a ação penal (sistema inglês);

  • Cumprimento de diligências requisitadas pela Justiça e pelo Ministério Público.

Portanto, o atendimento das ocorrências pela polícia, sejam elas criminais ou não, exige a atuação de uma autoridade policial juridicamente qualificada e com atribuições para decidir com discricionariedade, sem estar adstrita às interferências de superiores hierárquicos.

Por esse motivo, existem dois ramos de atividade policial especializados. Em muitos países, tais atividades são exercidas por corporações distintas, frequentemente com uma polícia militar de segurança e uma polícia judiciária civil (modelo napoleônico). Em menor número, há países que seguem o modelo inglês, em que uma só polícia desenvolve as duas funções, por meio de ramos diferenciados da corporação.


2. Modelos Policiais no Mundo

É bastante variada a forma como cada povo trata a segurança pública e organiza a sua polícia. Num mundo cada vez mais globalizado, a influência entre os diversos sistemas tem crescido, contribuindo para o aperfeiçoamento das atividades policiais. Três modelos, contudo, se destacam: o do Antigo Regime (que ainda sobrevive em amplas regiões do terceiro mundo), o da common law – adotado na Inglaterra, no País de Gales e em nações colonizadas pelos britânicos – e o da civil law – típico da Europa continental e dos países por ela colonizados, como os da América Latina.

2.1. Modelo do Antigo Regime

No modelo arbitrário, correspondente ao Antigo Regime, a atividade policial é exercida por agentes não especializados, que agem de forma violenta e arbitrária, atemorizando a sociedade tanto quanto os criminosos. A denominação “arbitrário” decorre do fato de o agente policial não estar vinculado às leis, atuando conforme a sua própria vontade.

Em muitos países subdesenvolvidos e não democráticos, esse modelo policial ainda vigora. Policiais desqualificados, geralmente militares, atuam arbitrariamente, sem vinculação às leis ou à proporcionalidade dos fatos. O registro das ocorrências é precário; a punição do delito, frequentemente imediata, ocorre sem o devido julgamento judicial. A atuação policial é marcada pela informalidade e raramente se observa um procedimento formal ou julgamento. Por isso, a coleta e preservação de provas não têm relevância, sendo substituídas pelo arbítrio do agente, que busca a confissão do suspeito por meios ilegais.

2.2. O Modelo da Common Law

A common law é oriunda do antigo direito germânico e caracteriza-se pela preeminência da jurisprudência dos tribunais, em contraste com a civil law da Europa continental, em que o direito legislado escrito é dominante (DAVID, 2006). Essa concepção reflete-se na natureza da polícia inglesa, forjada no princípio do policing by consent, ou seja, a ideia da polícia como poder estatal legitimado pelo consentimento da comunidade.

A Inglaterra possui 45 polícias regionais, duas delas localizadas em Londres. A City of London Police é responsável pela segurança pública na área central da cidade – a Square Mile – enquanto a Metropolitan Police Service protege a maior parte da capital (VOGLER, 2003, p. 21). A polícia inglesa é civil e acumula as funções de preservação da ordem pública e de polícia judiciária, tendo ampla autonomia para conduzir investigações, embora dependa de mandados judiciais em casos específicos. A própria polícia instaura as investigações, atua sem necessidade de comunicação prévia ao Ministério Público e ainda detém o poder de arquivá-las e decidir se a persecução penal deve ser iniciada (SPENCER, 2005). Não há subordinação direta ao Ministério Público nem ao juiz de instrução. A Metropolitan Police Service possui atribuição para atuar em toda a Inglaterra, sempre que necessário.

As investigações mais complexas são realizadas pelo Criminal Investigation Department – CID, conduzidas por detectives, oficiais submetidos a treinamento intenso e provas específicas de capacitação. Há ainda, como ramo da Metropolitan Police Service, a Forensic Identification Section, responsável pelas perícias técnicas. Os peritos são oficiais de polícia especializados em criminalística. É relevante observar que as ocorrências são elaboradas sob supervisão de agentes qualificados por cursos e com ampla experiência, e não por meros patrulheiros incumbidos apenas do atendimento inicial no local dos fatos.

2.3. O Modelo Norte-Americano

Os Estados Unidos seguiram, fundamentalmente, o sistema inglês. As polícias municipais norte-americanas adotaram o modelo da Metropolitan Police Service de Londres. As corporações policiais norte-americanas atuam tanto na polícia de segurança preventiva quanto na atividade de polícia judiciária.

Pelo sistema processual penal norte-americano, a fase de investigação (investigation stage) divide-se em dois períodos. No primeiro, ocorre o levantamento dos fatos e a busca da autoria, não havendo ainda um acusado. Na segunda fase, que geralmente se inicia com a prisão do suspeito (arrest), a polícia dedica-se à obtenção e conservação das provas (RAMOS, 2006, p. 178). Na fase inicial, o primeiro atendimento pode ser realizado por um police officer fardado, acionado para comparecer ao local do crime. A ocorrência é então levada ao distrito policial (police district ou precinct), onde um sargento inspeciona os relatórios e revisa os trabalhos. Na própria unidade, existem detectives-investigators que conduzem as investigações, dando início à segunda fase, na qual as provas serão coletadas.

Os promotores (district attorneys) atuam em contato com as equipes de investigação, inclusive orientando-as. Contudo, ao contrário do modelo europeu continental, a polícia norte-americana só submete os resultados das investigações ao crivo de outras instituições quando assim o deseja (RAMOS, 2006, p. 183). Nesse procedimento, há participação do representante do Ministério Público desde o início. Embora o district attorney não presida formalmente as investigações, exerce papel importante na primeira apreciação jurídica do fato concreto, verificando a viabilidade de uma acusação perante a Corte e requisitando providências e produção de provas.

Verifica-se, portanto, que no modelo norte-americano, tal como ocorre no inglês, uma única polícia desempenha as atividades de patrulhamento e de polícia judiciária, gozando de grande autonomia. A atividade investigatória, incluindo a polícia científica, é desenvolvida por um ramo especializado e não pelos patrulheiros (police officers), também conhecidos como rookies, que realizam trabalho semelhante ao dos policiais militares no Brasil.

2.4. O Modelo Europeu Continental

No modelo europeu continental, o Ministério Público dirige as investigações criminais, como ocorre na Alemanha e na Itália. Na França e na Bélgica, além dos procuradores, um papel relevante é reservado ao juiz de instrução na fase investigatória. Ao receber a notitia criminis, a polícia deve comunicá-la ao Ministério Público, que assumirá a direção dos trabalhos investigativos (MATHIAS, 2005, p. 483). Na prática, contudo, essa comunicação nem sempre é imediata ou sequer realizada, fazendo com que as investigações acabem sob responsabilidade da polícia judiciária.

A grande quantidade de ocorrências atendidas pela polícia judiciária inviabiliza o Ministério Público de presidir a maioria das investigações, levando-o a concentrar-se apenas nos casos mais graves ou de maior repercussão. Assim, os procuradores atuam com agentes policiais especializados em investigação, a quem confiam a maior parte das tarefas, intervindo somente quando necessário. O sistema não pode funcionar sem que a polícia judiciária, por meio de oficiais devidamente capacitados, desenvolva grande parte das investigações de forma autônoma, sobretudo nos casos de urgência. Ainda que existam atos exclusivos dos procuradores, a polícia mantém autonomia e iniciativa, sem as quais a investigação e a coleta de provas seriam prejudicadas.


3. O modelo brasileiro

O Direito brasileiro herdou de Portugal a tradição da civil law e, portanto, o nosso processo penal segue os princípios adotados na Europa continental. Contudo, como é de conhecimento geral dos operadores do direito, o sistema de persecução penal brasileiro apresenta uma originalidade: a existência de uma autoridade policial com formação jurídica, que preside os trabalhos de polícia judiciária. O delegado de polícia exerce uma função semelhante à de um juiz de instrução provisória e, desde os primeiros momentos do atendimento da ocorrência, atua na adequada qualificação jurídica do fato concreto, na coleta de provas conforme a lei e na preservação dos direitos do suspeito, por meio de um procedimento administrativo formal, sob a fiscalização do Ministério Público e da Justiça.

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O processo penal brasileiro, portanto, foi inovador. O sistema inglês atribui à polícia a investigação e a coleta de provas, com ampla autonomia e quase sem controle por parte de outras instituições. O sistema europeu continental, por sua vez, subordina formalmente os trabalhos de polícia judiciária ao procurador e ao juiz de instrução, mas esse controle torna-se inviável diante da falta de estrutura do Parquet e da Justiça, o que, na prática, leva a polícia a assumir tais funções, em razão do grande número de ocorrências. Assim, o controle ministerial das investigações restringe-se aos casos de maior gravidade ou repercussão, fazendo com que a instrução provisória fique a cargo de agentes policiais experientes, porém sem formação jurídica nem a devida atribuição legal. Trata-se de uma adaptação necessária, mas que extrapola os limites estabelecidos pela legislação.

No Brasil, desde o período colonial, a atividade policial estava dividida entre uma milícia militar e uma polícia judiciária civil, sendo esta última atribuída às câmaras municipais (VIEIRA, 1965). Atualmente, as duas atividades — a de polícia de segurança e a de polícia judiciária — continuam separadas, respectivamente, entre a Polícia Militar e a Polícia Civil, seguindo o modelo napoleônico. O processo penal brasileiro, contudo, inovou ao criar a figura do delegado de polícia, com atribuição legal para investigar e coletar provas e com a qualificação jurídica indispensável para o exercício dessa carreira. Dessa forma, conferiu à polícia judiciária uma autoridade apta a construir o suporte probatório necessário à propositura da ação penal, observando rigorosamente os ditames da lei e salvaguardando os direitos do investigado.

De acordo com o § 4º do art. 144 da Constituição Federal:

Às polícias civis, dirigidas por delegado de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração das infrações penais, exceto as militares.

No mesmo sentido, o art. 4º do Código de Processo Penal:

A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria.

Mais recentemente, a Lei nº 12.830/13 aprofundou o entendimento acerca da função do delegado de polícia:

Art. 2º As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado.

Parágrafo 1º Ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a condução da investigação criminal por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei, que tem como objetivo a apuração das circunstâncias, da materialidade e da autoria das infrações penais.

Parágrafo 2º Durante a investigação criminal, cabe ao delegado de polícia a requisição de perícias, informações, documentos e dados que interessem à apuração dos fatos.

Parágrafo 4º O inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei em curso somente poderá ser avocado ou redistribuído por superior hierárquico, mediante despacho fundamentado, por motivo de interesse público ou nas hipóteses de inobservância dos procedimentos previstos em regulamento da corporação que prejudique a eficácia da investigação.

O novo diploma legal explicita a natureza jurídica e essencialmente estatal das atividades da Polícia Civil, comandadas pelo delegado de polícia. Não poderia ser diferente, uma vez que a persecução criminal constitui, historicamente, a primeira atribuição do Estado. Seria, portanto, inadmissível que a função de apurar a violação da norma penal não fosse assumida pela Administração Pública, por meio de órgão especializado, o que equivaleria a um retorno ao sistema de vingança privada.

Nada obstante, não se exclui o exercício de outras formas de investigação, seja pelo Parquet, por outros órgãos da Administração Pública ou mesmo por entes privados, como a imprensa e a defesa. O que a referida lei reservou ao delegado de polícia foi a efetiva presidência das investigações criminais no âmbito do inquérito policial e dos termos circunstanciados de ocorrência (TCO).

Além disso, a Lei nº 12.830/13 garante o poder discricionário da autoridade policial, ao dispor em seu art. 2º, § 4º, que o procedimento não pode ser avocado ou redistribuído por superior hierárquico, salvo nos casos de interesse público ou quando houver violação aos regulamentos capaz de prejudicar as investigações. Mesmo nessas hipóteses, a providência somente poderá ser tomada mediante despacho fundamentado.

No mesmo sentido, a Emenda Constitucional nº 35/2012, do Estado de São Paulo, estabelece, em seu § 2º:

No desempenho da atividade de polícia judiciária, instrumental à propositura de ações penais, a Polícia Civil exerce atribuição essencial à função jurisdicional do Estado e à defesa da ordem jurídica.

No § 3º, a Constituição Paulista reza:

Aos delegados de polícia é assegurada a independência funcional pela livre convicção nos atos de polícia judiciária.

Ao preservar a independência funcional do delegado de polícia, a Constituição paulista assegurou os fundamentos para uma investigação criminal adequada e para a coleta de provas, essenciais ao ajuizamento das ações penais pelo Ministério Público.


4. A Importância da Independência Funcional

A autonomia funcional da autoridade policial decorre naturalmente de sua condição de carreira jurídica e da necessidade de impedir interferências de superiores hierárquicos nos trabalhos investigatórios, o que prejudicaria a instrução provisória e traria grave insegurança jurídica ao investigado, sempre sujeito a alterações no procedimento administrativo que poderiam comprometer sua defesa.

Verifica-se, portanto, que o sistema processual penal brasileiro instituiu um órgão especializado no exercício das investigações criminais, dotado de poderes e garantias indispensáveis à transparência e eficácia dessa atividade de Estado. A Constituição Federal, o Código de Processo Penal e demais leis adjetivas são harmônicas ao reconhecer a autonomia de uma autoridade administrativa na condução das investigações criminais.

A providência mais importante do delegado de polícia é a primeira análise jurídica da ocorrência, pois dela decorrerão todas as demais. Uma qualificação inadequada do fato concreto implicará em graves prejuízos para a instrução penal, podendo até inviabilizar a persecução. É fundamental distinguir ocorrências criminais das não criminais e, nas primeiras, realizar uma adequada qualificação provisória do delito, já que dela decorrerão as providências subsequentes. Se feita de forma incorreta, a oportunidade de produção de provas irrepetíveis estará perdida. Por isso, é imprescindível que a autoridade policial seja bacharel em Direito, com amplos conhecimentos de Direito Penal, para estar apta a proceder a uma correta tipificação do crime, ainda que provisória.

Da mesma forma, é essencial que as provas sejam preservadas e coletadas o mais rapidamente possível, o que exige conhecimentos de Criminalística, Direito Penal e Direito Processual Penal. É sabido que agentes policiais com formação insuficiente frequentemente prejudicam a preservação da cena do crime por falta de conhecimentos técnicos, ocasionando graves danos à instrução criminal.

A observância das garantias constitucionais do acusado é outro aspecto fundamental que depende de sólida formação jurídica por parte de quem realiza a primeira análise da ocorrência e conduz a investigação. Provas produzidas em violação a preceitos constitucionais e legais são processualmente inúteis, além de acarretarem sérias consequências para o suspeito e responsabilidades de reparação por parte da Administração Pública. É frequente a violação de direitos de suspeitos por agentes policiais que, seja por truculência, seja por insuficiente conhecimento da lei, comprometem a atividade investigatória e a própria imagem da corporação policial.

Igualmente relevante é a decisão acerca do ius libertatis do indiciado. A legislação referente à custódia provisória é complexa e exige conhecimentos jurídicos aprofundados, além da serenidade de uma autoridade isenta e não movida por espírito vingativo, incompatível com a apuração das infrações penais. O mais grave vício de uma autoridade pública é o excesso. Decidir sobre as condições de flagrância da ocorrência requer conhecimento jurídico e experiência prática, tendo em vista que a diversidade dos fatos concretos não se ajusta automaticamente às hipóteses legais, demandando equilibrado exercício cognitivo.

Analisar e decidir acerca da caracterização da flagrância é tarefa que exige equilíbrio e conhecimento da legislação processual penal. O mesmo vale para a avaliação da conveniência e oportunidade de representar pela prisão temporária perante a autoridade judicial. O patrulheiro, influenciado pela dinâmica violenta do cotidiano policial e sem os conhecimentos jurídicos necessários, tende facilmente ao excesso.

A presidência de um inquérito policial ou de um termo circunstanciado também constitui atividade complexa, que demanda capacitação jurídica, conhecimentos de criminalística e equilíbrio. A polícia judiciária tem a responsabilidade de fornecer o suporte probatório indispensável à tutela jurisdicional criminal. Trata-se de função de enorme responsabilidade que, se mal desempenhada, prejudicará a acusação, a defesa e o próprio magistrado.

O modelo brasileiro foi particularmente acertado ao submeter os procedimentos administrativos de polícia judiciária ao controle ministerial e judicial. A autoridade policial decide sobre a instauração dos procedimentos e os preside, mas não delibera sobre seu arquivamento, como ocorre no sistema inglês e, na prática, no sistema norte-americano. Cada inquérito policial deve, necessariamente, ser examinado pelo promotor de justiça e pelo magistrado, que decidirão pela instauração do processo criminal ou pelo arquivamento.

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARMO, Luiz Carlos. O delegado de polícia como garantia da segurança jurídica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5726, 6 mar. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/72343. Acesso em: 5 dez. 2025.

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