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Delação premiada: aspectos relevantes no contexto processual penal português e brasileiro

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Ainda em evolução, a delação premiada ocupa cenário de destaque mundial como um dos principais meios de combate ao crime organizado.

Introdução

A proposta deste artigo é realizar um estudo abordando os aspectos históricos, doutrinários e normativos, sob a perspectiva da recepção e eventuais impactos processuais resultantes da utilização do instituto da delação premiada, como espécie de colaboração processual utilizada pelo poder estatal no curso da persecução penal, situação presente na atualidade do processo penal brasileiro e, ainda, não normatizada no sistema processual penal português.

Para tanto, torna-se necessária a abordagem das características da delação premiada, entendida como uma das espécies de colaboração processual e, também de sua utilização como fonte de prova, no contexto atual do direito processual penal brasileiro e português. Sob o mesmo enfoque, de suma importância a reflexão acerca do panorama das principais implicações consistentes na utilização da delação premiada na busca de fontes de prova no âmbito do processo penal de cunho democrático.

Diante disso, serão analisadas a legislação e doutrina que arregimentam a matéria, ou seja, que regulam os meios de colaboração processual já normatizados, bem como a natureza dos sistemas penais que se utilizam do instituto em estudo, os quais tendem a contribuir para o entendimento e comparação entre a viabilidade da aplicação da delação premiada no ordenamento jurídico penal processual brasileiro e português.

Nesse contexto, o estudo é de destacada importância, uma vez que a utilização da delação premiada à luz do giro constitucional e, sob o enfoque dos princípios norteadores do processo penal democrático possibilitarão a analise da recepção e adequação das formas de colaboração processual, dentro de uma lógica de enquadramento processual penal.

O primeiro capítulo destina-se à origem, caracterização e distinção terminológica da delação premiada, ao passo que se faz necessária a conceituação sob a ótica, histórica, filosófica e jurídica, as quais contribuíram para a efetivação deste instituto no processo penal, desde o período medieval, até os dias atuais.

No segundo capítulo será abordada a análise normativa da delação premiada no processo penal brasileiro em vigência, além dos aspectos e características de natureza legislativa e doutrinária que abarcam a matéria, formalizados na legislação em vigor no Brasil (Lei 12.850/2013[1] e Constituição da República Federativa do Brasil de1988[2]) assim como o Projeto de Lei No Senado (PSL 156/2009)[3], que revelam substancial relevância para a compreensão da matéria, bem como questões relevantes acerca da adequação da delação premiada ao sistema penal de cunho acusatório.

Por conseguinte, o terceiro capítulo objetiva a constatação de possíveis inconstitucionalidades em face da utilização da delação premiada, como forma de colaboração processual e, ainda as implicações relacionadas à valoração da prova no contexto processual penal brasileiro e português sob a ótica da natureza do processo penal de cunho acusatório.

Empregar-se-á o método dedutivo, tendo como objetivo à análise da legislação que rege o assunto, que trata da delação premiada como espécie de colaboração processual no processo penal em vigor no Brasil e em Portugal.

Este trabalho traz comentários de vários autores quanto à delação premiada deste o período mais remoto da humanidade até os dias atuais, assim como dos institutos do direito e processo penal e a aplicabilidade da legislação em vigência tocante às modalidades de colaboração processual em se tratando de matéria criminal.


1.Notas Introdutórias

1.1. Breve Histórico

A delação é conhecida desde a antiguidade, já constatada na Idade Média e observada no texto do Malleus Maleficarum ou Martelo das Bruxas, que em 1487, foi reconhecido como o manual da inquisição subscrito por dois padres. Em referido período os suspeitos eram presos para três finalidades: ser submetido à tortura, ser forçado a confessar e delatar outras pessoas[4].

Luiz Flávio Gomes ressalta que «mais de cinco séculos depois, a gangorra parece ser movimentada. Não deveríamos zombar da Idade Média. Ainda estamos ajustando contas com ela, diz Umberto Eco[5]»

Nesse contexto, oportuno mencionar, que dois inquisidores Dominicanos, Heinrich Kramer (1430-1505) e Jacob Sprenger (1436-1495), utilizaram-se da Bula Papal Summis Desiderantes Affectibus de 5 de dezembro de 1484, para atribuir base científica à doutrina oficial da Igreja Católica, como ponto de fundamento teórico para a bruxaria dos tempos Modernos. Assim é que, o Malleus Maleficarum[6] ou Martelo das Bruxas foi publicado, em 1487 pela primeira vez e reeditado até 1669 por 29 vezes. Denominado Manual de caça às bruxas, esteve em pleno vigor até o fim do século XVII, definindo a bruxaria entre os católicos e protestantes, como um pacto entre o demônio e a bruxa, realizado por meio do ato sexual, como forma de abjuração direta e herética a Deus[7].

Mesmo tendo passado por generalizada censura durante o iluminismo, entre os séculos XVII e XVIII a Inquisição, ainda é percebida na atualidade. Luiz Flávio Gomes expõe que Beccaria, em 1764, na obra dos delitos e das penas[8], abordou a delação premiada com reprovação, muito embora tenha observado nela pontuais vantagens, pois em seu dizer «ora as leis convidam à traição, ora a gastigam. Com uma mão o legislador estreita os vínculos de família, de parentesco e de amizade, com a outra prende a quem os rompe e os menospreza; «implora-se o socorro de quem ofende a lei, a nação autoriza a traição que é detestável até mesmo entre os malvados as leis que premiam a traição excitam a guerra clandestina»[9].

Nesse liame, cabe mencionar que no século XVIII, a tortura, como forma de obtenção da confissão já apresentava características inerentes a um processo penal nitidamente obscuro em determinado período da inquisição. Nesse ponto, a maneira de proceder e os desafios inerentes ao curso processual, além dos habitualmente enfrentados em face do direito germânico, também contavam com práticas desprovidas de garantias de oportunizarão de razoável defesa. O acusado era detentor da atribuição de coautoria, ainda que de forma violenta, na obtenção da verdade. Uma espécie de «parceiro voluntário» entendido como parte do próprio mecanismo. Desta forma, uma investigação obtida em segredo pela autoridade judiciária era conduzida com o acusado em ato de nítida ritualização[10].

No que se refere à verdade, cabe entender a impossibilidade de alcançá-la, posto que, nada mais é do que uma mentira, utilizada para justificar o inquisitório, que «legitima», para a sua obtenção, até mesmo o emprego de tortura, o que foi corriqueiramente observado na Idade Média, em porões de Delegacias de Polícia, na guerra do Iraque, que exemplificam bem referido emprego da tortura[11].

Em se tratando do processo inquisitorial, há uma constante invocação da tal 'verdade real'. Cuida-se de conceito que, repetido à exaustão, se presta a meramente justificar a corriqueira violação a todos os limites procedimentais, em nome da perseguição dos supostos malvados e imaginados malfeitos. Em nome da busca inexorável da verdade, o corpo dos suspeitos e acusados era alvo de toda sorte de flagelos, até que o inquisidor pudesse extrair, da boca do torturado, a confirmação daquilo que imaginava saber: a verdade que já conhecida desde antes do início do procedimento. Sob essa estrutura ideológica, o processo era um mecanismo para ratificar a verdade monopolizada pelo acusador-juiz-carrasco[12].

Sabidamente os dois sistemas processuais que se tem conhecimento, (inquisitório e acusatório) tiveram como ponto de partida, razões políticas. Contudo, outros motivos, de origem teológica, econômico, filosófico e jurídico dentre outros, foram cristalinamente importantes, obviamente, no segundo momento, submissas às razões políticas[13].

O sistema Inquisitório tem surgimento no cenário da Igreja Católica, com o marco histórico datado em 1215, a partir do IV Concilio de Latrão[14]. «No início do século XIII, então, presente o problema, Inocêncio III reúne a cúpula da Igreja Católica em São João de Latrão e, ali, em 1215, decide-se (faz-se uma opção) pela força. É o nascimento de um novo modelo processual, ao qual não interessava aquele que estava em vigor, ou seja, os chamados Juízos de Deus, adotado (ou domesticado?) dos invasores “bárbaros” vindos do norte para demolir o império romano»[15].

Por sua vez, o sistema acusatório surge na Inglaterra após a invasão normanda conduzida por Guilherme, que ficou conhecido como o Conquistador. No entanto, a efetiva estruturação do novo sistema processual ocorreu a partir do reinado de Henrique II, possivelmente o rei inglês mais significativo para o direito[16].

O atual sistema penal em vigor no Brasil, embasado no Código de Processo Penal de 1941 (copiado do Códice Rocco, da Itália, de 1930, com traços de condução de Vicenzo Manzini), tem como fundamento, a estruturação de natureza inquisitória[17], ou seja, um Código de inspiração fascista.

O denominado processo misto, reconhecido a partir da forma como Napoleão conduziu o mundo partindo da Europa continental, revelou-se, desde o primeiro momento, uma verdadeira fraude à democracia processual. O sistema napoleônico, para quem o acolhia como forma para proceder, um Sistema Misto, ou seja, um Sistema Inquisitorial que continha características oriundas do Sistema Acusatório, principalmente no que diz respeito às partes, acusação afastada formalmente do órgão responsável pela acusação e debates regidos pela oralidade[18]. «No Brasil, tal modelo foi adotado quase que com a mesma conformação, isto é, aquela copiada do código italiano de 1930, Interessava ao ditador de plantão, ainda mais porque, em face dos jogos de poder do Império, acabou-se por adotar, em 1871 (Lei nº 2.033, de 20.09.1871), no lugar do chamado Juizado de Instrução, o Inquérito Policial[19].»

Sobre a diferenciação dos Sistemas Inquisitório e Acusatório, Alexandre Morais da Rosa, orienta que enquanto o Sistema Inquisitório é regido pelo princípio inquisitivo que determina o procedimento por meio de significantes, no Sistema Acusatório o determinante é regido pelo princípio dispositivo. Enquanto o critério de identificação é orientado pela produção da prova, ou seja, a iniciativa probatória. No processo inquisitório o julgador, se detém no que diz respeito à produção da prova, poderes de busca e produção, enquanto no Acusatório referida atribuição é conferida aos jogadores, o que retira do juiz a atividade de protagonizador. De outra banda, no Sistema Inquisitório a liberdade de atuação do condutor do processo na produção da prova é evidentemente absoluta, enquanto no Sistema Acusatório, o procedimento é regulado com parâmetros de precisão de atuação, justamente para impedir que o juiz assuma um papel que não lhe compete[20].

No que diz respeito ao processo penal atual e o açodamento das garantias individuais em seu curso no Brasil, Amilton Bueno de Carvalho em Direito penal a marteladas: algo sobre Nietzsche e o direto[21], aborda a busca da verdade real, como categoria utilizada desde as petições até os acórdãos pelos atores envolvidos no processo penal, ou seja, acusação, defesa e julgador.

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Nesse pensar a verdade real é buscada como fim do processo penal, que se utiliza de todas as maneiras para atingi-lo. De acordo com referido entendimento, o braço de alcance do direito penal é seletivo e com ponto de atingimento bem definido[22].

Nesse viés, a necessidade da separação das funções do juiz em relação aos atores do processo e exigida pelo «princípio da acusação», o que não permite a alteração de papeis, sob possibilidade de subversão da garantia de igualdade de armas (11.2). A paridade entre os atores processuais é elemento fundamental inerente ao principio acusador[23]. «A assunção do modelo eminentemente acusatório, segundo Binder, não depende do texto constitucional – que o acolhe, em tese, no caso brasileiro, apesar de a pratica o negar -, mas sim de uma autêntica motivação e um compromisso interno e pessoal em (re)construir a estrutura processual sobre alicerces democráticos, nos quais o juiz rejeita a iniciativa probatória e promove o processo entre jogadores (acusação e defesa)»[24]

Cabe destacar que, o Código de Processo Penal atual no contexto brasileiro revela um Sistema Misto, o que lhe confere a inevitável característica de embasamento oriunda do Sistema Inquisitorial, o que implica na agregação de características inerentes da estrutura do Sistema Acusatório[25]. «Verifica-se, pois, que a luz da Constituição deve permear a escuridão do autoritarismo através, da interpretação, do código à luz constitucional, contudo, na prática forense o que se vê é justamente o oposto, com a interpretação da constitucional sob o mais profundo breu do código vigente[26].»

Cumpre destacar que a decisão judicial de natureza penal como resultado do emprego de um processo democrático, é fruto da construção processual interna da condução processual associada entre as partes e julgador atuantes, no mesmo cenário e em plenas condições de igualdade e acesso[27].

Do exposto, necessário traçar um paralelo entre a constatação da delação durante a inquisição, as formas de obtenção de confissão por meio de tortura, á luz das modalidades do sistema penais adotados, assim como dos em vigor[28].

Bem a propósito, a delação premiada encontra origem no sistema da Cammom Law, sendo adotada em grande ou pequena escala nos países que se utilizam de mencionada tradição jurídica, tais como: o Canadá, Reino Unido, Índia e Paquistão. Sendo que nos Estado Unidos é verificada a importante atenção dispensada à cultura negocial no direito penal, sendo que de uma população carcerária de cerca de 2,2 milhões de pessoas, 91% estão presas em função de acordos[29].

Isso porque vigora nos Estados Unidos a sistemática do plea bargain , instrumento de acordo utilizado entre acusação e acusado no qual invariavelmente a promotoria abre mão de uma ou mais acusações em troca de colaboração, não siginificando, porém, que a delação norte americana represente isenção de pena, mas sim de atenuação de parte dela. O que se verifica no sistema dos Estados Unidos é que há uma transferência da função de julgar dos Tribunais para os órgãos acusatórios[30].

Nesse mesmo sentido, no que tange aos crimes de colarinho branco, aqueles relacionados a crimes cometidos no exercício de atividades comerciais, se verifica a cultura norte americana de estimulação talvez ainda maior de acordos com a retirada de acusações que visam a prisão de pessoas mais graduadas dentro da organização empresarial. Os incentivos à delação chegaram a um patamar tal que no ano de 2010 foi aprovado o Dodd-Frank-Wall Street Reform and Consumer Protections Act, que prevê a remuneração do delator em até 30% do valor obtido pelas autoridades como compensação pelos atos ilícitos determinados pela lei[31].

1.2.Delação premiada: conceituação, distinção terminológica e natureza jurídica

De acordo com Vinicius Gomes de Vasconcelos [32], a colaboração ou delação premiada era abordada pela doutrina em termos de conceituação sob a ótica de sua natureza penal material. No mesmo sentido, acerca da conceituação do instituto da delação premiada Walter Bittar[33] ensina que «instituto de Direito Penal que garante ao investigado, indiciado ou condenado, um prêmio, redução podendo chegar até a liberação da pena, pela sua confissão e ajuda nos procedimentos persecutórios, prestada de forma voluntária (quer dizer, sem qualquer tipo de coação)»

A delação premiada revela como perspectiva primordial, oferecer determinada premiação ao delator, ou seja, premiar o individuo que possa auxiliar a autoridade policial ou judiciária na elucidação de fatos que possam contribuir na obtenção da materialidade e autoria delitivas[34].

Para Jaques de Camargo Penteado, a delação premiada pode ser definida como a «acusação proveniente de uma pessoa que praticou um crime e revela os demais sujeitos ativos dessa mesma infração penal ou evidencia o local em que se encontram bens, direitos ou valores objetos da infração penal[35]».

Cabe citar que mencionado autor aponta a delação premiada como um meio de prova, integrando-se ao processo por meio do interrogatório, nos moldes do artigo 185[36] e seguintes do Código de Processo Penal[37].

Objetivamente a delação pode ser definida como «palavras de um imputado em relação ao fato criminoso, que podem ser ditas na fase pré-processual e processual (fase de conhecimento ou execução). O conteúdo da fala do imputado pode permitir o esclarecimento da autoria, da materialidade ou evidenciar os produtos derivados da infração penal, como bens, direitos e valores[38]».

Oportunamente cabe trazer à tona o entendimento de que para a configuração da delação premiada, se faz imprescindível o reconhecimento da culpa, seja ela total ou parcial, como critério de essencialidade[39].

Cabe apontar ainda a distinção terminológica da colaboração processual, a fim atribuir tratamento adequado às espécies de colaboração processual, ou seja, distinguir corretamente todas as maneiras de observar o enquadramento colaborativo do imputado para com a autoridade policial, judiciária ou Órgão Acusador, que possam propiciar formulação probatória na persecução criminal[40].

Nesse pensar, a distinção operacional dos termos que fazem referência à colaboração processual, delação premiada, delação e o chamamento do correu, mesmo porque, a colaboração processual é classificada como gênero, enquanto as demais possibilidades de cooperação do imputado devem ser compreendidas como espécies, quais sejam: confissão, chamamento do corréu, delação, delação premiada e colaboração processual, sendo esta observada enquanto possibilidade de cooperação que impliquem em benefícios de ordem processual[41].

O chamamento do corréu é destacado pela postura de colaboração do imputado que é percebida somente na fase judicial, sem a condição de reconhecimento de culpabilidade. Já a delação, admite a possibilidade tanto na fase pré-processual, quanto em juízo e, para significativa parcela da doutrina requere confissão prévia[42].

Mariana de Souza Lima Lauand[43], menciona que o termo delação premiada é utilizado somente no direito brasileiro, sendo que os demais ordenamentos utilizam colaboração processual, colaboração premiada ou, ainda, colaboração com a justiça. Nesse contexto «o legislador nacional em nenhum momento fez uso da expressão delação premiada, sendo tal denominação fruto de construção doutrinária e jurisprudencial. Por oportuno, há que se registrar a existência de texto projetado, em trâmite no Congresso Nacional, que se utiliza da terminologia colaboração premiada».

Em seu turno, a colaboração premiada stricto senso, caracteriza-se pela participação do imputado com a apuração de crimes em troca de eventuais benefícios de ordem processual, inerentes ao sistema jurídico americano[44].

De igual importância é a abordagem da natureza jurídica da delação premiada, sob o aspecto do direito processual penal. Bem na verdade, o que se pretende é esclarecer se é cabível a acepção enquanto: fonte de prova, meio de prova ou um meio para a obtenção da prova[45].

Por fonte de prova, deve ser entendida a relação com o fato probandum, compreendendo-se todos os meios viáveis para a elucidação e existência de determinado fato. «Trata-se, pois, de conceito que independe do processo. Também se define fonte de prova como “as pessoas ou coisas a partir das quais se pode obter os elementos de prova”. Percebe-se que a fonte confunde-se com aspectos da realidade que permitam elucidar os fatos.»[46]

Fatalmente o conhecimento das fontes de prova podem implicar na introdução de elementos probatórios no processo, o que é efetivado por meio dos meios de prova. Enquanto às fontes de prova são direcionadas às partes, sendo atribuição delas a identificação e introdução delas no processo. Nessa linha de raciocínio, pode-se conceber que o imputado também pode ser visualizado como fonte de prova, ao passo que possivelmente detém informações sobre os fatos ocorridos, objeto da imputação averiguada[47].

No que se refere aos meios de prova, tem-se os instrumentos pelos quais as denominadas fontes de prova são levadas ao processo, produzindo resultados de relevância probatória que podem ser utilizados pelo sentenciante na decisão judicial. No que diz respeito ao meio de obtenção de prova, se reconhece o mecanismo de natureza processual pelo qual é permitido o acesso à fonte ou meio de prova[48].

Acerca dos meios de prova, Tiago Cintra Essado expõe que «A principal característica do meio de obtenção de prova é a instrumentabilidade. Por si só é inerte e seu manejo pode não levar à descoberta de fatos que interessem à investigação ou processo»[49].

Do exposto se observa que o enquadramento mais adequado ao instituto da delação premiada é reconhecê-la como meio de obtenção de prova, em atenção à natureza de destinação de seu propósito, ou seja, mecanismo de combate velado à criminalidade organizada. Em verdade «A delação, por si só, é neutra, o que guarda nexo com a definição de meio de obtenção de prova, e poderá, a depender do resultado advindo das palavras do imputado, contribuir para a atividade estatal de persecução penal[50].

Nesse sentido, a delação premiada pode não gerar necessariamente resultados processuais, o que inevitavelmente faz com que a natureza enquanto meio de obtenção de prova seja preservada[51].

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Sobre os autores
César Godoy

Advogado na empresa Cesar Godoy Advocacia Mestrando em Ciências Jurídico-Criminais na Universidade Autônoma de Lisboa Especialista em Direito Processual Penal e Direito Penal na UNICURITIBA - Centro Universitário Curitiba Especialista em Direito Civil e Empresarial na PUC-PR Graduado em Direito na Univille - Universidade da Região de Joinville

Adriano Tavares

Advogado, sócio da Tavares Advogados Associados, mestrando em Ciências Jurídicas na Universidade Autônoma de Lisboa.

Carla Cristina Martins

Advogada e mestranda em Ciências Jurídicas pela Universidade Autônoma de Lisboa.

Thiago Schutz

Advogado e mestrando em Ciências Jurídicas pela Universidade Autônoma de Lisboa.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GODOY, César ; TAVARES, Adriano et al. Delação premiada: aspectos relevantes no contexto processual penal português e brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6366, 5 dez. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/78456. Acesso em: 23 abr. 2024.

Mais informações

Relatório produzido na Disciplina de Penal Econômico para obtenção do título de Mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade Autônoma de Lisboa.

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