O porte de armas por policiais é uma prerrogativa em razão da função que exercem, nos termos art. 6, II, da Lei n. 10.826/03[1].
Os policiais possuem a faculdade de portarem arma de fogo quando não estiverem em serviço, seja a arma particular ou da corporação a que pertencem, conforme art. 6º, § 1º, da Lei n. 10.826/03[2].
O porte de arma de fogo por policiais fora do horário de serviço deve ser disciplinado pelo regulamento do Estatuto do Desarmamento, conforme dispõe o art. 6º, § 1º, da Lei n. 10.826/03.
O Decreto n. 9.847, de 25 de junho de 2019, regulamenta a Lei n. 10.826/03 para dispor sobre a aquisição, o cadastro, o registro, o porte e a comercialização de armas de fogo e de munição.
O art. 24, § 3º, do Decreto n. 9.847/19 assevera que “Ato do Comandante da Força correspondente disporá sobre as hipóteses excepcionais de suspensão, cassação e demais procedimentos relativos ao porte de arma de fogo de que trata este artigo.”
O § 4º do art. 24, por sua vez, dispõe que “Atos dos comandantes-gerais das corporações disporão sobre o porte de arma de fogo dos policiais militares e dos bombeiros militares.”
O art. 26 do Decreto n. 9.847/19 preceitua que:
Art. 26. Os órgãos, as instituições e as corporações a que se referem os incisos I, II, III, V, VI, VII e X do caput do art. 6º da Lei nº 10.826, de 2003, estabelecerão, em NORMAS PRÓPRIAS, os procedimentos relativos às condições para a utilização das armas de fogo de sua propriedade, AINDA QUE FORA DE SERVIÇO.
§ 2º As instituições, os órgãos e as corporações, ao definir os procedimentos a que se refere o caput, disciplinarão as normas gerais de uso de arma de fogo de sua propriedade, FORA DO SERVIÇO, quando se tratar de locais onde haja aglomeração de pessoas, em decorrência de evento de qualquer natureza, tais como no interior de igrejas, ESCOLAS, estádios desportivos e clubes, públicos e privados.
Nota-se, portanto, de forma inequívoca, que cabe à própria instituição policial regulamentar o porte de arma de seus integrantes, ainda que não estejam em serviço, em quaisquer locais onde haja aglomeração de pessoas, sendo o rol mencionado no § 2º do art. 26 meramente exemplificativo, pois o dispositivo é expresso ao mencionar “evento de qualquer natureza, tais como...”.
De qualquer forma, ainda que o referido dispositivo não fosse meramente exemplificativo, menciona o termo “escolas”, o que, por si só, é suficiente para abranger as universidades.
Sendo assim, as universidades não podem proibir que militares das Forças Armadas, policiais federais, civis, militares e penais, estes quando forem do quadro efetivo; os integrantes das guardas municipais das capitais dos Estados e dos Municípios com mais de 500.000 (quinhentos mil) habitantes; os agentes operacionais da Agência Brasileira de Inteligência e os agentes do Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República; os policiais legislativos do Senado e da Câmara dos Deputados; as guardas portuárias e os integrantes das Carreiras de Auditoria da Receita Federal do Brasil e de Auditoria-Fiscal do Trabalho, cargos de Auditor-Fiscal e Analista Tributário, portem arma de fogo nas dependências das universidades, inclusive em sala de aula.
Isso porque compete à própria instituição a que o policial ou um dos mencionados acima pertencer, mediante edição de norma própria, decidir os casos em que seus integrantes poderão portar arma de fogo fora do horário de serviço, quando houver aglomeração de pessoas, em decorrência de evento de qualquer natureza.
A regra é que seja proibido o porte de arma de fogo em salas de aula (art. 20 do Decreto n. 9.847/19), mas em se tratando de policiais e das categorias acima especificadas, não entram nessa regra, pois o próprio decreto remete a análise da possibilidade de portar arma nesses locais às instituições a que pertencerem (art. 26, § 2º).
A Polícia Militar de Minas Gerais possui a Resolução n. 4.085/10 versa sobre o porte de arma de fogo de propriedade do militar e o porte de arma de fogo pertencente à Polícia Militar de Minas Gerais.
O art. 41, § 2º, da Resolução 4.085/10 da PMMG assevera que se o militar não estiver em serviço poderá portar arma desde que não a conduza ostensivamente, além de comunicar o responsável pela segurança do local.
Caso esteja em serviço e fardado, poderá (deverá) portar a arma ostensivamente, já que esta fica no coldre para que possa ser feito o saque imediato da arma, caso seja necessário, além de se dar visibilidade.
É certo que as universidades gozam de autonomia (art. 207 da CF), mas não para decidir se policiais podem entrar armados em suas dependências. Gozam de autonomia didático-científica e administrativa para organizar seus serviços, podendo, inclusive estipular normas de segurança, desde que não contrariem leis e como exposto, a lei é muito clara ao autorizar que o policial entre armado nas universidades, desde que a instituição a que pertencer, permita.
Não há que se falar que por disposição contratual da universidade, o aluno policial, não deve portar arma em sala de aula, na medida em que a própria lei e decreto definem que a atribuição para tratar do porte de arma pelo policial é das instituições a que pertencem.
Portanto, eventual previsão em regulamento das universidades que proíba o aluno policial de adentrar em suas dependências armado, exorbita a competência que possui para dispor acerca de seu funcionamento administrativo e não é válida.
Caso a universidade pretenda regulamentar ou proibir o porte de armas, por alunos policiais, em suas dependências, deverá fazer em conjunto com as instituições envolvidas, em razão do disposto no art. 26 do Decreto n. 9.847/19, não sendo lícito às próprias universidades proibirem o porte de arma de fogo pelo policial em sala de aula.
Nota-se que as restrições ao porte de arma por policiais somente pode ser feita por lei, decreto ou norma da própria instituição policial.
Em que pese toda a previsão normativa mencionada, em caso concreto, o Tribunal de Justiça de São Paulo, sem enfrentar as previsões legais citadas, que possuíam conteúdo semelhante à época da decisão (Decreto 5.123/04), decidiu que o policial militar não pode comparecer armado, às dependências da faculdade, sendo lícito que a universidade determine a retirada do aluno, na medida em que a presença de armas não se compraz com o ambiente escolar e constitui exercício regular de um direito por parte da universidade.[3]
Dessa forma, é possível expor as seguintes conclusões, caso a instituição a qual pertencer o policial permita o porte de arma de fogo em universidades, ainda que estas não permitam:
a) policial militar fardado em serviço: poderá entrar armado em sala de aula;
b) policial militar fardado que não esteja em serviço, como o caso do militar que vai para a aula e em seguida entrará de serviço ou que saiu do serviço e foi para a aula: por estar fardado, não portar arma ostensivamente e em condições de uso imediato, pode comprometer a segurança do policial e dos presentes, razão pela qual poderá estar armado ostensivamente;
c) policial federal, civil ou penal uniformizado, em serviço ou fora de serviço: poderá entrar armado em sala de aula e portá-la ostensivamente, por razões de segurança, conforme explicado no item “b”;
d) policial federal, civil, militar ou penal sem uniforme/farda, em serviço ou fora de serviço: poderá entrar armado em sala de aula, mas não poderá portar a arma ostensivamente, podendo deixá-la por debaixo da blusa, por exemplo, bem como avisar ao chefe da segurança da universidade.
Notas
[1] Art. 6o É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para: II - os integrantes de órgãos referidos nos incisos I, II, III, IV e V do caput do art. 144 da Constituição Federal e os da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP); (Redação dada pela Lei nº 13.500, de 2017)
[2] Art. 6o É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para: (…) § 1o As pessoas previstas nos incisos I, II, III, V e VI do caput deste artigo terão direito de portar arma de fogo de propriedade particular ou fornecida pela respectiva corporação ou instituição, mesmo fora de serviço, nos termos do regulamento desta Lei, com validade em âmbito nacional para aquelas constantes dos incisos I, II, V e VI. (Redação dada pela Lei nº 11.706, de 2008)
[3] Apelação nº 437.010-4/2-00, Rel. Des. DONEGÁ MORANDINI, j. em 12/06/2007.