Medidas para enfrentamento ao COVID-19 e violação ao direito de acesso à informação

As inconstitucionalidades da MP 928/2020.

26/03/2020 às 09:13

Resumo:


  • O Governo editou a Medida Provisória nº 928 em 23 de março de 2020, alterando a Lei 13.979/2020 para enfrentamento da pandemia de COVID-19.

  • A MP incluiu o art. 6º-B, priorizando pedidos de acesso à informação relacionados às medidas de emergência de saúde pública e suspendendo prazos de resposta em órgãos com regime de quarentena ou teletrabalho.

  • A MP gerou controvérsias, sendo questionada a sua constitucionalidade por possíveis inconstitucionalidades formais e materiais, como a violação da publicidade e transparência na administração pública.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Em virtude da pandemia do COVID-19, o Governo editou a Medida Provisória - MP nº 928, que altera a Lei 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, que suspende os prazos para atendimento dos pedidos de informação e retira a possibilidade de recurso.

Em virtude da pandemia do COVID-19, no dia 23 de março de 2020, o Governo editou a Medida Provisória - MP nº 928, que altera a Lei 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, que dispõe sobre medidas de enfrentamento à emergência do novo coronavírus.

Entre as alterações promovidas pelo art. 1º da referida MP está a inserção do art. 6º-B, que dispõe sobre o atendimento dos pedidos de acesso à informação enquanto durar o período de calamidade pública. Veja:

“Art. 6º-B Serão atendidos prioritariamente os pedidos de acesso à informação, de que trata a Lei nº 12.527, de 2011, relacionados com medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública de que trata esta Lei.

§ 1º Ficarão suspensos os prazos de resposta a pedidos de acesso à informação nos órgãos ou nas entidades da administração pública cujos servidores estejam sujeitos a regime de quarentena, teletrabalho ou equivalentes e que, necessariamente, dependam de:

I - acesso presencial de agentes públicos encarregados da resposta; ou

II - agente público ou setor prioritariamente envolvido com as medidas de enfrentamento da situação de emergência de que trata esta Lei.

§ 2º Os pedidos de acesso à informação pendentes de resposta com fundamento no disposto no § 1º deverão ser reiterados no prazo de dez dias, contado da data em que for encerrado o prazo de reconhecimento de calamidade pública a que se refere o Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020.

§ 3º Não serão conhecidos os recursos interpostos contra negativa de resposta a pedido de informação negados com fundamento no disposto no § 1º.

§ 4º Durante a vigência desta Lei, o meio legítimo de apresentação de pedido de acesso a informações de que trata o art. 10 da Lei nº 12.527, de 2011, será exclusivamente o sistema disponível na internet.

§ 5º Fica suspenso o atendimento presencial a requerentes relativos aos pedidos de acesso à informação de que trata a Lei nº 12.527, de 2011.” (NR)

Para essa breve análise iremos explorar apenas dois aspectos, quais sejam: (i) suspenção dos prazos de resposta a pedidos de acesso à informação em órgãos que tenham estabelecido regime de quarentena, teletrabalho ou equivalentes, quando os pedidos dependam de acesso presencial do servidor encarregado da resposta ou quando o órgão público ou setor esteja prioritariamente envolvido com as medidas de enfrentamento da emergência; e (ii) negação da possibilidade de recurso contra negativas a pedidos de informação com fundamento no §1º (art. 6º-B, §3º).

Seria matéria a ser tratada por medida provisória?

Definitivamente, não!

O artigo 62 da Constituição Federal, dispõe que o Presidente da República para a edição de atos normativos com força de lei, MP, impõe a observância de dois requisitos autorizadores cumulativos, quais sejam: a relevância e a urgência.

Ou seja, o atendimento à esses dois elementos são vitais para que a MP seja constitucional formalmente.

Ora, pela simples análise da Lei de Acesso à Informação, especialmente no seu art. 11, percebe-se que o agente público pode informar ao requerente sobre a impossibilidade de conceder acesso imediato à informação pública desde que o faça por meio de resposta justificada, no prazo de vinte dias, a qual indique as razões de fato ou de direito da recusa, total ou parcial, do acesso pretendido.

Sendo assim, já havendo dispositivo legislativo para dispor sobre a impossibilidade de acesso à informação, a MP aparenta ter graves indícios de inconstitucionalidade formal, eis que não há relevância e tampouco urgência para disciplinar sobre a matéria.

Graves indícios de usurpação da publicidade e transparência.

A nossa Carta Cidadã de 1988, que veio com o propósito de ultrapassar todas as barreiras do autoritarismo, dispõe ao longo do seu texto (art. 5º, XXXIII, art. 37 art. 216, § 2º) de diversos dispositivos que garantem ao cidadão o acesso à informação como um direito fundamental e a publicidade como dever da Administração Pública.

No mesmo sentido, a Lei n. 12.527/2011, Lei de Acesso à Informação (LAI), ao longo do seu texto deixa claro que o novo paradigma é a publicidade é a regra e o sigilo é a exceção.

Portanto, o Congresso Nacional ao apreciar não deve converter esse dispositivo da MP nº 92/20 em lei, eis que ao suspender os prazos para atendimento dos pedidos de informação e retirar a possibilidade de recurso, viola de forma carnífice, desarrazoada e desproporcional o direito de acesso a informação, bem como os princípios da publicidade e transparência, cometendo assim inconstitucionalidades tanto formal quanto material.

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Sobre o autor
Jamil Pereira de Santana

Mestre em Direito, Governança e Políticas Públicas pela UNIFACS - Universidade Salvador | Laureate International Universities. Possui pós-graduações em Direito Público (Constitucional, Administrativo e Tributário) pelo Centro Universitário Estácio e em Licitações e Contratos Administrativos pela Universidade Pitágoras Unopar Anhanguera. Atualmente cursa especialização em Direito Societário e Governança Corporativa pela Legale Educacional. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Estácio da Bahia. É 1 Tenente R2 do Exército Brasileiro e membro ativo na Comissão Nacional de Direito Militar da ABA (Associação Brasileira de Advogados), além de integrar a Comissão Especial de Apoio aos Professores da OAB/BA. Compõe o Conselho Editorial da Revista Direitos Humanos Fundamentais da UNIFIEO e da Editora Mente Aberta. Atua como Professor de Direito Administrativo na Múltipla Difusão do Conhecimento, onde também coordena o curso preparatório para a 2 fase do Exame da OAB em Direito Administrativo. Advogado contratado pelas Obras Sociais Irmã Dulce, com experiência em Direito Administrativo e Militar.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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