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Covid-19: os impactos nos contratos imobiliários

30/03/2020 às 11:56
Leia nesta página:

Este artigo tem por objetivo auxiliar a população a respeito da manutenção de contratos, especificamente, de locação de imóvel urbano e contratos de financiamento imobiliário, em razão do novo coronavírus (covid-19).

Comprometidos com o auxílio à população em razão do novo coronavírus (Covid-19), trataremos aqui a respeito da manutenção dos contratos de locação de imóvel urbano, contratos de financiamento imobiliário.

A pandemia do novo coronavírus também ameaça a vida útil de diversos segmentos empresariais por serem direta, ou indiretamente, afetados pela crise econômica que se instaura no país e no mundo decorrentes do fechamento de diversas atividades comerciais. Com o setor imobiliário também não será diferente.

Muitos empresários têm nos questionado, nos Contratos de Locação, se o inquilino teria o direito de não pagar o aluguel neste momento em que ele, eventualmente, perdeu a capacidade de pagamento em virtude de se ver obrigado a fechar o seu estabelecimento.

Não diferente, também observado com relação aos Contratos de Financiamento Imobiliário, em que algumas pessoas poderão suspender o pagamento das prestações, uma vez que poderão não gerar renda no atual cenário de quarentena.

De todo modo, o momento requer muita cautela para atenuarmos os danos e as problemáticas no âmbito jurídico que surgirão.


O QUE VOCÊ PRECISA SABER

Antes de adentramos a estes contratos em específico, devemos nos lembrar do que o Código Civil trata do instituto jurídico das Obrigações, seja ela decorrente de um Contrato de Locação.

Em ambos os casos o fato é que existe uma obrigação de pagar (o aluguel ou as parcelas do financiamento imobiliário), originária de uma fonte contratual, ou seja, oriunda de um contrato firmado, em que o devedor (ou o locatário) se obrigou a pagar o credor (ou locador) pelo objeto daquele contrato, no preço e na forma ali estabelecidas.

A partir disso, surge então para este devedor a chamada responsabilidade, que é a consequência jurídica do descumprimento das obrigações pelo devedor podendo, inclusive, recair sobre o seu patrimônio.

Vejamos o que dispõe o Art. 389 do Código Civil:

“Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.”

Ou seja, não cumprindo o devedor com a sua obrigação (de pagar), responderá este pelas perdas e danos, que na grande maioria dos contratos é substituído por Cláusula Penal ou Multa Contratual, além dos juros moratórios e honorários advocatícios.

Porém, diante deste cenário declarado de pandemia, muitos devedores justificarão o seu inadimplemento por conta do caso fortuito ou força maior, de forma a escusar-se a cumprir com a sua obrigação, a chamada Teoria da Imprevisão.

A pandemia do novo coronavírus poderá ser caracterizada evento de caso fortuito ou de força maior? Se sim, quais serão as situações afetadas e como elas repercutirão para as partes? Essa, sem dúvida, será uma das árduas tarefas que os tribunais enfrentarão nos próximos anos.

Estamos tratando do que dispõe o artigo 393 do Código Civil, que nos apresenta sobre o caso fortuito e de força maior. De acordo com o dispositivo legal, “o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado”. Conclui, ainda, em seu parágrafo único que “o caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir”.

Em resumo, tratam-se o caso fortuito ou de força maior de fatos (ou atos) imprevisíveis ou de difícil previsão que geram consequências inevitáveis, sendo uma referência genérica, abrindo oportunidade às mais variadas interpretações acerca dos conceitos trazidos.

Será que em razão dessa Teoria da Imprevisão, em que se a pessoa perder a sua capacidade de pagamento por um evento imprevisto, após ele ter firmado aquele contrato, o autorizaria a revisá-lo ou até mesmo de requerer a sua resolução?

Primeiramente, é necessário analisarmos os dispositivos legais que emprestam suporte a este direito subjetivo de revisão ou resolução do contrato.

Se tratando da revisão do contrato, o Art. 317 do Código Civil dispõe que o contrato poderá ser revisado pelo juiz quando, por motivos imprevisíveis, vir acontecer alguma manifesta desproporção entre o valor da prestação devida e o momento de sua execução, visando assegurar o quanto possível o real valor da prestação.

Contudo, ocorre que tal dispositivo não poderia ser aplicado diante do momento que estamos enfrentando porque não está havendo desproporção entre aquilo que se contratou à época de assinatura do contrato comparado com o agora.

Ou seja, se foi firmado um financiamento imobiliário para aquisição de um imóvel antes do surto do coronavírus, o imóvel continuará à disposição de quem o comprou mesmo durante a pandemia. De tal sorte na locação imobiliária o imóvel também continuará a ser usufruído pelo locatário, não havendo para ambos os casos qualquer desproporção no valor da prestação no momento de sua execução.

Já com relação a resolução do contrato, por outro lado, o Art. 478 do Código Civil dispõe que nos contratos de prestações continuada, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, poderá o devedor pedir a resolução do contrato.

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Mesmo havendo acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, é importante destacar que não é a prestação em si que está excessivamente onerosa, mas sim algo que tornou essa prestação onerosa para aquela determinada pessoa.

Deste modo, há um elemento principal neste artigo que é quando há uma extrema vantagem para outra. Não haverá extrema vantagem para o locador se este receber os alugueis durante o período de pandemia, por exemplo. Pelo contrário, caso o locador seja comunicado pelo locatário que deixará de pagar os alugueis, bem como as penalidades decorrentes desse descumprimento por fazer uso da Teoria da Imprevisão, aí sim poderá ocasionar em uma extrema vantagem para si em prejuízo do outro.

Portanto, entendemos que não seria o caso de aplicação destes dispositivos da revisão ou resolução do contrato por conta da pandemia, tão pouco da justificativa de caso fortuito ou de força maior. Até porque o risco de o adquirente perder a sua fonte de renda já existia à época da aquisição do bem imóvel, bem como o insucesso empresarial de quem alugou o imóvel para empreender. A escassez de renda, ocasionada pelo COVID-19, por si só, não poderá ser considerado um fato imprevisível que ocasionou consequências inevitáveis.

Devemos recordar também que, em ambos os casos, devemos zelar pela função social do contrato gerada ao manter os pactos ali entabulados. O país não alcançará a recuperação econômica em razão dessa catástrofe humanitária de saúde se os contratos forem em sequência descumpridos, se as prestações simplesmente forem apagadas, sobrepondo à boa-fé de ambas partes, esta que inclusive é uma via de mão dupla, não de uma parte apenas.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não defendemos, definitivamente, a aplicação da Teoria da Imprevisão, ou simplesmente deixar de pagar as obrigações neste momento, salvo as negociações particulares em cada caso, para não gerar uma vantagem exagerada para um em prejuízo de outro, evitando um efeito em cascata que prolongue a recuperação econômica.

Recomendamos, ainda, para os devedores de contratos, seja de locação, seja de financiamento, que negociem com os seus credores e estes avaliem as particularidades de caso a caso, priorizando sempre o bom diálogo.

Portanto, nos colocamos à disposição para qualquer orientação no particular, recomendando-se àqueles que ainda não disponham de assessoria jurídica preventiva que consulte um especialista no assunto para tratar de possíveis soluções.

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Sobre o autor
Brenno Carvalho Tavares

Formado pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás no ano de 2012, pós graduando em Direito Civil e Processo Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), membro da Comissão de Direito Imobiliário da OAB/GO e da Comissão de Direito Condominial, no triênio 2019/2021.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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